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sábado, 31 de maio de 2014

Fenômeno de transfiguração

Por Allan Kardec

Revista Espírita, Março de 1859

O fato que se segue foi extraído de uma carta que em setembro de 1857 recebemos de um dos nossos correspondentes em Saint-Etienne. Depois de falar de várias comunicações de que foi testemunha, ele acrescenta:

“Fato dos mais admiráveis se passa numa das famílias de nossas relações. Das mesas girantes passaram à poltrona que fala; depois um lápis foi fixado ao pé da poltrona e ela indicou a psicografia; praticaram-na durante muito tempo, mais como distração do que como coisa séria. Por fim a escrita designou uma das moças da casa e ordenou que lhe passassem as mãos sobre a cabeça, depois de fazê-la deitar-se. Ela adormeceu quase imediatamente e depois de um certo número de experiências, transfigurou-se. A moça tomava os traços, a voz e os gestos de parentes mortos; dos avós que jamais havia visto e de um irmão falecido há alguns meses. As transfigurações ocorriam sucessivamente na mesma sessão. Ela falava um dialeto que não é o de nossa época, segundo me disseram, pois não conheço o atual nem o outro. O que posso afirmar é que numa sessão onde havia tomado a aparência de seu irmão, vigoroso, folgazão, me deu essa jovem de treze anos um rude aperto de mão.

Há aproximadamente 18 meses a dois anos o fenômeno se repete constantemente e da mesma maneira, com a única diferença que agora se produz natural e espontaneamente, sem imposição de mãos”.

Embora bastante raro, este fenômeno não é excepcional. Já nos falaram de diversos casos semelhantes e nós mesmo testemunhamos algo parecido em sonâmbulos no estado de êxtase, bem como nalguns estáticos que não se encontravam em estado sonambúlico. Por outro lado, é certo que as emoções violentas operam uma mudança na fisionomia, dando-lhe uma expressão completamente diferente daquela do estado normal. Não vemos, também, criaturas cujos traços móveis se prestam, de acordo com a vontade, a modificações que lhes dão a aparência de outras pessoas? Vemos por aí que a rigidez da face não é tal que não possa prestar-se a modificações passageiras mais ou menos profundas. Nada há, pois, de admirar que um fato semelhante possa ocorrer neste caso, quiçá por uma causa independente da vontade.

Eis as respostas que a respeito disto obtivemos de São Luís na sessão da Sociedade no dia 25 de fevereiro último.

1. ─ O caso de transfiguração de que acabamos de falar é verdadeiro?

─ Sim.

2. ─ Nesse fenômeno existe um efeito material?

─ O fenômeno de transfiguração pode dar-se de modo material, a tal ponto que as suas diversas fases poderiam ser reproduzidas em daguerreotipia.

3. ─ Como se produz esse efeito?

─ A transfiguração, como o entendeis, não passa de uma modificação da aparência, uma mudança ou uma alteração dos contornos, que pode ser produzida pela ação do próprio Espírito sobre o seu envoltório ou por uma influência exterior. O corpo nunca muda, mas, por força de uma contração nervosa, reveste aparências diversas.

4. ─ Podem os espectadores ser enganados por uma falsa aparência?

─ Pode também acontecer que o perispírito represente o papel que bem conheceis. No caso citado houve contração nervosa, muito ampliada pela imaginação. Aliás, esse fenômeno é muito raro.

5. ─ O papel do perispírito seria análogo ao que ocorre nos fenômenos de bicorporeidade?

─ Sim.

6. ─ Então nos casos de transfiguração é necessário que haja um desaparecimento do corpo real, de modo que os espectadores não vejam senão o perispírito sob forma diferente?

─ Não propriamente desaparecimento físico, mas oclusão. Entendei-vos sobre os vocábulos.

7. ─ Do que acabais de dizer parece podermos concluir que no fenômeno de transfiguração pode haver dois efeitos: I ─ alteração dos traços do corpo real, por força de uma contração nervosa; II ─ aparência variável do perispírito, tornado visível. É isso mesmo?

─ Certamente.

8. ─ Qual a causa primeira desse fenômeno?

─ A vontade do Espírito.

9. ─ Todos os Espíritos podem produzi-lo?

─ Não. Os Espíritos nem sempre podem fazer o que querem.

10. ─ Como explicar a força anormal dessa moça, transfigurada na pessoa de seu irmão?

─ Não possui o Espírito uma grande força? Aliás, é a do corpo em seu estado normal.

OBSERVAÇÃO: Este fato nada tem de surpreendente. Muitas vezes vemos pessoas muito fracas, dotadas momentaneamente de uma força prodigiosa, devida a uma superexcitação. 

11. ─ Desde que, no fenômeno de transfiguração, o olho do observador pode ter uma imagem diferente da realidade, dar-se-á o mesmo em certas manifestações físicas? Por exemplo: quando uma mesa se ergue sem contato das mãos e a vemos acima do solo, é realmente a mesa que se desloca?

─ Ainda perguntais?

12. ─ O que a levanta?

─ A força do Espírito. 

OBSERVAÇÃO: Este fenômeno já foi explicado por São Luís e dele tratamos de modo completo nos números de maio e junho de 1858, a propósito da teoria das manifestações físicas. Disseram-nos que neste caso a mesa ou qualquer outro objeto que se move está animado de uma vida factícia momentânea que lhe permite obedecer à vontade do Espírito.

Algumas pessoas quiseram ver no fato uma simples ilusão de óptica que, por uma espécie de miragem, as faria ver uma mesa no espaço, quando realmente ela estava no solo. Se assim fosse, a coisa não seria menos digna de atenção. É curioso como aqueles que querem contestar ou criticar os fenômenos espíritas expliquem-nos por causas que também seriam verdadeiros prodígios e igualmente difíceis de compreender. Mas por que tratar o assunto com tanto desdém? Se a causa que apontam é real, por que não aprofundá-la? O físico procura conhecer a causa do menor movimento da agulha magnética; o químico, da mais ligeira mudança na atração molecular[1]. Por que, então, ver com indiferença fenômenos tão estranhos como esses de que falamos, quer sejam eles consequência de simples desvio do raio visual, quer uma nova aplicação das leis conhecidas? Isto não é lógico.

Certamente não seria impossível que por um efeito de óptica análogo ao que nos faz ver um objeto na água mais alto do que realmente está, por causa da refração dos raios luminosos, uma mesa nos parecesse no espaço quando estivesse no solo. Há, porém, um fato que resolve definitivamente o problema. É quando a mesa cai ruidosamente no chão e se quebra. Isto não parece uma ilusão de óptica.

Voltemos à transfiguração.

Se uma contração muscular pode modificar os traços fisionômicos, não o será senão dentro de certos limites; mas certamente se uma mocinha toma a aparência de um velho, nenhum efeito fisiológico lhe faria criar barba. Então devemos procurar uma causa alhures. Recordando quanto dissemos anteriormente a respeito do papel do perispírito em todos os fenômenos de aparição, mesmo de pessoas vivas, compreender-se-á que aí está a chave do fenômeno de transfiguração. Com efeito, desde que o perispírito pode isolar-se do corpo; que pode tornar-se visível; que, por sua extrema sutileza, pode tomar diversas aparências, conforme a vontade do Espírito, concebe-se sem dificuldade que assim se passe com uma pessoa transfigurada: o corpo continua o mesmo; só o perispírito mudou de aspecto. Mas então, perguntareis, em que se torna o corpo? Por que motivo o observador não vê uma imagem dupla, isto é, de um lado o corpo real e do outro o perispírito transfigurado? Fatos estranhos, dos quais falaremos dentro em pouco, provam que por força da fascinação que, em tais circunstâncias, se opera no observador, o corpo real pode, de alguma sorte, ser oculto pelo perispírito.

O fenômeno que é objeto deste artigo já nos foi comunicado há muito tempo. Se dele ainda não havíamos falado é que não nos propomos transformar a nossa Revista em simples catálogo de fatos destinados a alimentar a curiosidade; uma árida compilação sem apreciação e sem comentários. Nossa tarefa seria então muito fácil, mas nós a levamos mais a sério. Antes de mais nada, dirigimo-nos aos homens de raciocínio; àqueles que como nós querem compreender as coisas, tanto mais que isto é possível. Ora, ensinou-nos a experiência que os fatos, por mais estranhos e multiplicados que sejam, não são elementos de convicção. Quanto mais estranhos forem, menos convincentes serão. Quanto mais extraordinário é um fato, tanto mais anormal se nos afigura e menos dispostos estaremos a acreditar. Queremos ver, e tendo visto, ainda duvidamos; desconfiamos de ilusão e de conivência. Já isto não acontece quando para os fatos encontramos uma causa plausível. Vemos diariamente criaturas que atribuíam os fenômenos espíritas à imaginação e à credulidade cega e que hoje são adeptos fervorosos, precisamente porque agora tais fenômenos não lhes repugnam à razão: explicam-nos, compreendem a sua possibilidade e creem, mesmo sem ter visto.

Tendo que falar de certos fatos, deveríamos esperar que os princípios fundamentais estivessem suficientemente desenvolvidos, a fim de compreendermos as suas causas. Entre esses fatos está a transfiguração. Para nós, o Espiritismo é mais do que uma crença: é uma ciência, e nos sentimos felizes por ver que os nossos leitores nos compreenderam.
________________________

[1] No original lemos attraction musculaire, manifesto erro tipográfico, explicável pela reiteração, no texto, do vocábulo muscular, em relação à alteração da fisionomia. Deveria ser a expressão original attraction moléculaire. Trata-se, por outro lado, de um fenômeno de química geral e não de química orgânica, por isso traduzimos atração molecular. (Nota do tradutor)

Nota: Significado de Daguerreotipia - s.f. Processo fotográfico imaginado por Daguerre, e que consistia em fixar numa película de prata pura, aplicada ao cobre, a imagem obtida na câmara escura.

Fonte: IPEAK - http://www.ipeak.com.br/site/busca_janela_conteudo.php?sec=roteiro&id=2666&idioma=1

terça-feira, 13 de maio de 2014

[VÍDEO] - O Caráter do Espiritismo, por Cosme Massi

Cosme Massi explana sobre o caráter da revelação espírita. Programa da Allan Kardec TV.


domingo, 11 de maio de 2014

Sobre o uso de práticas exteriores de cultos nos grupos

Por Allan Kardec

Frequentes vezes me tem sido indagado se é útil começar as sessões com preces e atos exte­riores de culto religioso. A resposta não é apenas minha, mas também dos Espíritos que trataram des­se assunto.

É, sem dúvida, não apenas útil, porém neces­sário rogar, através de uma invocação especial, por uma espécie de prece, o concurso dos bons Espíritos. Essa prática predispõe ao recolhimento, condição especial a toda reunião séria. O mesmo não se dá quanto às práticas exteriores de culto, através das quais certos grupos creem dever abrir suas sessões e que têm mais de um inconveniente, apesar da boa intenção com que são sugeridas.

Tudo nas reuniões espíritas deve se passar re­ligiosamente, isto é, com gravidade, respeito e re­colhimento. Mas é preciso não esquecer que o Espiritismo se dirige a todos os cultos. Por conseguinte ele não deve adotar as formalidades de nenhum em particular. Seus inimigos já foram muito longe, tentando apresentá-lo como uma seita nova, buscando um pretexto para combatê-lo. É preciso, pois, não fortalecer essa opinião pelo emprego de rituais dos quais não deixariam de tirar partido, para dizer que as assembleias espíritas são reuniões de protestantes, de cismáticos, etc. Seria uma leviandade supor que essas fórmulas são de natureza a acomodar certos antagonistas. O Espiritismo, chamando a si os homens de todas as crenças, para uni-Ios sob a bandeira da caridade e da fraternidade, habituando-os a se olharem como irmãos, qualquer que seja sua maneira de adorar a Deus, não deve melindrar as convicções de ninguém pe­lo emprego de sinais exteriores de qualquer culto.

São poucas as reuniões espíritas, por menores que sejam os grupos, que, sobretudo na França, não tenham membros ou assistentes pertencentes a diferentes religiões. Se o Espiritismo se colocasse abertamente na área de uma delas, afastaria as outras. Ora, como há espíritas em todas, assistiríamos à formação de grupos católicos, judeus, ou protestantes, assim perpetuando o antagonismo religioso que o Espiritismo tende a abolir.

Esta é, também, a razão pela qual deve-se abster, nas reuniões, de discutir dogmas particulares, o que, necessariamente, melindraria certas consciências. As questões morais, entretanto, são de todas as religiões e de todos os países. O Espiritismo é um terreno neutro sobre o qual todas as opiniões religiosas se podem encontrar e dar-se as mãos. Ora, a desunião poderia nascer da controvérsia. Não esqueçais de que a desunião é um dos meios através dos quais os inimigos do Espiritismo buscam atacá-lo. É com esse fim que eles induzem certos grupos a se ocuparem de questões irritantes ou comprometedoras, sob o pretexto astucioso de que não se deve colocar a luz sob o al­queire. Não vos deixeis prender nessa armadilha! Sejam os dirigentes de grupos firmes na recusa de todas as sugestões deste gênero, se não quiserem passar por cúmplices dessas maquinações.

O emprego dos aparatos exteriores do culto teria idêntico resultado: uma cisão entre os adep­tos. Uns terminariam por achar que não são devidamente empregados, outros, pelo contrário, que o são em excesso. Para evitar esse inconveniente, tão grave, aconselhamos a abstenção de qualquer prece litúrgica, sem exceção mesmo da Oração Dominical por mais bela que seja. Como, para fazer parte de um grupo espírita, não se exige que ninguém abjure sua religião, permita-se que cada um faça a seu bel prazer e mentalmente, a prece que julgar a propósito. O importante é que não haja nada de ostensivo e, sobretudo, nada de oficial. O mesmo se pode dizer com relação ao sinal da cruz, ao hábito de se colocar de joelhos, etc... Sem esta linha de conduta neutra, não se pode impedir, por exemplo, que um muçulmano, integrante de um grupo espírita, se prosterne e coloque a face contra a terra, recitando em voz alta sua fórmula sacramental: "Só há um Deus e Máomé é o seu profeta!"

O inconveniente não existe quando as preces feitas em intenção de qualquer pessoa, são independentes de todo e qualquer culto particular. Di­to tudo isso, creio supérfluo salientar o quanto haveria de ridículo em fazer-se toda uma assistência repetir em coro uma prece ou fórmula qualquer, como alguém me afirmou já ter visto ser praticado.

Deve ficar bem entendido que o que acaba de ser dito não se aplica senão aos grupos e sociedades, constituídos de pessoas estranhas umas às outras, porém nunca às reuniões íntimas de família, nas quais, naturalmente, cada pessoa é livre de agir como bem entender, uma vez que, em tal ambiente, não se corre o risco de melindrar a ninguém.

Fonte: Viagem Espírita em 1862 » Instruções particulares dadas aos grupos em resposta a algumas das questões propostas » XI

Retirado do site IPEAK - http://www.ipeak.com.br/site/estudo_janela_conteudo.php?origem=6367&idioma=1

domingo, 4 de maio de 2014

[VÍDEO] - Espiritismo com Kardec & Espiritismo sem Kardec

Palestra do orador espírita Alamar Régis no Paltalk à Rede Amigo Espírita:

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Exame das comunicações medianímicas que nos são dirigidas

Por Allan Kardec 

Muitas  das  comunicações  nos  foram  dirigidas  de  diferentes  grupos,  seja  para  nos pedir a nossa opinião e nos colocar no estado de julgar suas tendências, seja, da parte de alguns, com esperança de vê-las aparecer na Revista; todas nos foram remetidas com a faculdade de dispormos delas como entendêssemos, para o bem da coisa. Delas fizemos o exame a classificação, e não se admirará da impossibilidade que temos de inseri-las to- das, quando souber-se que além daquelas que publicamos, há mais de três mil e seiscentas que, somente elas, teriam absorvido cinco anos completos da Revista, sem contar um certo número de manuscritos, mais ou menos volumosos, dos quais falaremos dentro em pouco. O relatório desse exame nos fornecerá o assunto de algumas reflexões das quais cada um poderá tirar seu proveito.

Entre elas, encontramos as notoriamente más pelo fundo e pela forma, produtos evidentes de Espíritos ignorantes, obsessores ou mistificadores, e que juram com os nomes mais  ou  menos  pomposos  com  os  quais  se  revestem;  publicá-las,  teria  sido  dar  armas fundadas à crítica. Uma circunstância digna de nota é que a totalidade das comunicações dessa categoria emana de indivíduos isolados e não de grupos. Soa fascinação poderia fazê-los tomar a sério e impedi-los de ver nelas o lado ridículo. O isolamento, como se sabe, favorece a fascinação, ao passo que as reuniões encontram um controle na pluralidade das opiniões.

No  entanto,  reconhecemos  com  prazer  que  as  comunicações  dessa  natureza  formam, na massa, uma pequena minoria; a maioria das outras encerram bons pensamentos e excelentes conselhos, mas não se segue que sejam todas boas para serem publicadas, e isto pelos motivos que vamos expor.

Os bons Espíritos ensinam quase a mesma coisa por toda a parte, porque por toda parte há os mesmos vícios a reformar e as mesmas virtudes a pregar; está aí um dos caracteres distintivos do Espiritismo; freqüentemente, a diferença não está senão na maior ou menor correção e elegância do estilo. Para apreciar as comunicações, com relação à publicidade, não é preciso vê-las de seu ponto de vista, mas no do público. Concebemos a satisfação que se sente em obter alguma coisa de bom, sobretudo em começando, mas, além de que certas pessoas possam se iludir sobre o mérito intrínseco, não se pensa que em cem outros lugares obtém-se coisas semelhantes, e o que é de um grande interesse individual pode ser a banalidade para a massa.

É preciso considerar, além disso, que há algum tempo as comunicações adquiriram, sob todos os aspectos, proporções e qualidades que deixam bem longe para trás aquelas que se obtinham há alguns anos; o que se admirava então parece pálido e mesquinho junto do que se obtém hoje. Na maioria dos centros verdadeiramente sérios, o ensino dos Espíritos aumentou com a compreensão do Espiritismo. Uma vez que por toda parte recebem-se  instruções  quase  idênticas,  sua  publicação  não  pode  interessar  senão  com  a condição de apresentar qualidades salientes, como forma ou como importância instrutiva, seria, pois, iludir-se crendo que toda coletânea deve achar leitores numerosos e entusiastas. Outrora, a menor conversa espírita era uma novidade que atraía a atenção; hoje, que os Espíritas e os médiuns não se contam mais, o que era uma raridade é um fato quase banal tornado hábito e que ficou distanciado pela amplitude e importância das comunicações atuais, como os deveres do escolar o são para o trabalho do adulto.

Temos sob os olhos a coleção de um jornal publicado no princípio das manifestações, sob o título de a Mesa falante, título característico da época; esse jornal teve, diz-se, de quinze a dezoito centenas de assinantes, cifra enorme para a época; ele continha uma multidão de pequenas conversas familiares e de fatos medianímicos que eram então um poderoso atrativo de curiosidade. Nele inutilmente procuramos alguma coisa para reproduzir em nossa Revista; tudo o que ali teríamos haurido seria hoje pueril e sem interesse. Se esse jornal não tivesse cessado de aparecer, por circunstâncias independentes do assunto, não teria podido viver senão com a condição de se colocar no nível do progresso  da  ciência,  e,  se  ele  reaparecesse agora  nas  mesmas  condições,  não  teria  cinqüenta assinantes. Os Espíritas são imensamente mais numerosos do que então, é verdade; mas são mais esclarecidos e querem um ensinamento mais substancial.

Se as comunicações não emanassem senão de um único centro, ninguém duvida de que os leitores se multiplicariam em razão do número de adeptos; mas não é preciso perder de vista que os focos que os produzem se contam por milhares, e que por toda a parte onde se obtêm coisas superiores, não se pode se interessar por aquilo que é fraco ou medíocre.

O que dizemos não é para desencorajar de fazer publicações, longe disso, mas para mostrar a necessidade de uma escolha rigorosa, condição sine qua non de sucesso; os Espíritos, elevando os seus ensinos, tornaram-nos difíceis e mesmo exigentes. As publicações locais podem ter uma imensa utilidade sob um duplo aspecto, o de difundir nas massas o ensino dado na intimidade, depois o de mostrar a concordância que existe nesse  ensinamento  sobre  diferentes  pontos;  as  aplaudiremos  sempre  e  as  encorajaremos todas as vezes que sejam feitas em boas condições.

Convém de início descartar tudo o que, sendo de um interesse privado, não interessa senão àquele que lhe concerne; depois, tudo o que é vulgar pelo estilo e pelos pensamentos, ou pueril pelo assunto; uma coisa pode ser excelente em si mesma, muito boa para dela fazer sua instrução pessoal, mas o que deve ser entregue ao público exige condições especiais; infelizmente o homem está inclinado a pensar que tudo o que lhe apraz deve aprazer aos outros; o mais hábil pode  se enganar, e tudo é se enganar o menos possível. Há Espíritos que se divertem em entreter essa ilusão em alguns médiuns; é porque não saberíamos muito recomendar a estes últimos de não relacioná-las ao seu próprio julgamento, e é nisso que os grupos são úteis, pela multiplicidade das opiniões que permitem recolher; aquele que, nesse caso, recusasse a opinião da maioria, se crendo mais iluminado que todos, provaria super abundantemente a má influência sob a qual se acha.

Fazendo aplicação destes princípios de ecletismo às comunicações que nos são dirigidas, diremos que, sobre três mil e seiscentas, há mais de três mil de uma moralidade irrepreensível e excelentes como fundo, mas que sobre esse número não há senão trezentas para a publicidade, e apenas cem de um mérito sem paralelo. Essas comunicações nos tendo vindo de um grande numero de pontos diferentes, disso inferimos que essa proporção deve ser quase real. Pode-se julgar por aí da necessidade de não publicar inconsideradamente tudo o que vem dos Espíritos, querendo-se atingir o objetivo que se propõe, tanto sob o aspecto material quanto o do efeito moral e "da opinião que os indiferentes podem se fazer do Espiritismo.

Resta-nos a dizer algumas palavras dos manuscritos ou trabalhos de grande fôlego que nos são dirigidos, entre os quais, sobre trinta deles não encontramos senão cinco ou seis tendo um valor real. No mundo invisível, como sobre a Terra, os escritores não faltam, mas os bons escritores são raros; tal Espírito está apto a ditar uma boa comunicação isolada, a dar um excelente conselho particular, que é incapaz de produzir um trabalho de conjunto completo podendo suportar o exame, quaisquer que sejam, aliás, as suas pretensões e o nome do qual lhe apraz se vestir, não é uma garantia; quanto mais esse nome é elevado, mais obriga; ora, é mais fácil tomar um nome do que justificá-lo; por isso, ao lado de alguns bons pensamentos, freqüentemente, encontram-se idéias as mais excêntricas e os traços, os menos equivocados, da mais profunda ignorância. Foram nessas espécies  de  trabalhos  medianímicos  que  notamos  o  mais  de  sinais  de  obsessão,  dos quais um dos mais freqüentes é a injunção da  parte do Espírito de fazê-los imprimir. E alguns pensam erradamente que tal recomendação basta para encontrar um editor interessado no negócio.

É  sobretudo  em  semelhante  caso  que  um  exame  escrupuloso  é  necessário,  não querendo se expor a fazer escola às suas custas; além disso, é o melhor meio de afastar os  Espíritos  presunçosos  e  pseudo-sábios  que  se  retiram  forçosamente  quando  não  acham instrumentos dóceis que possam fazer suas palavras serem aceitas como artigos de fé. A intromissão desses Espíritos nas comunicações é, fato conhecido, o maior escolho do Espiritismo. Não se saberia, pois, cercar-se muito de precauções para evitar as publicações lamentáveis; mais vale, em semelhante caso, pecar por excesso de prudência, no interesse da causa.

Em resumo, publicando-se as comunicações dignas de interesse, faz-se uma coisa útil; publicando aquelas que são fracas, insignificantes ou más, faz-se mais mal do que bem. Uma consideração não menos importante é a da oportunidade; umas há das quais a publicação seria intempestiva, e por isso mesmo nociva: cada coisa deve vir a seu tempo; várias daquelas que nos são dirigidas estão neste caso, e embora muito boas, devem ser adiadas; quanto às outras, acharão seu lugar segundo as circunstâncias e seu objeto.

Fonte: Revista Espírita - Sexto Ano - Maio 1863

Estude a Doutrina Espírita online

Por O Blog dos Espíritas

Convidamos aos interessados a participarem do estudo online que se iniciará amanhã, 02 de Maio de 2014, às 22 horas, do livro O que é o Espiritismo? de Allan Kardec, na sala virtual "Espiritismo com Kardec" do programa Paltalk.

O Paltalk, para quem não o conhece, é um programa online para ser usado na internet em formato de bate-papo no qual o usuário tem recursos de áudio, vídeo e texto, tudo ao mesmo tempo. Suas salas de estudo são semelhantes às do antigo mIRC, o que deve facilitar seu uso para quem usou a extinta plataforma. Mais informações sobre o Paltalk estão neste link.

Após criar um apelido (nickname) no Paltalk, entre na pasta South America, e depois na pasta Brazil. Na relação de salas que aparecerá, dê um duplo clique na sala "Espiritismo com Kardec", no dia e horário anteriormente mencionados.

A sala "Espiritismo com Kardec" visa estudar as obras de Allan Kardec e outros autores espíritas, a exemplo de Herculano Pires, Nazareno Tourinho, Gélio Lacerda e Léon Denis. Os encontros são realizados semanalmente, às sextas-feiras, às 22 horas.

Mais informações acerca da proposta da sala "Espiritismo com Kardec" na figura abaixo:


Bons estudos!