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sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Adulterando Kardec

Por Carlos de Brito Imbassahy

Curiosamente, na 5ª edição francesa de “Le livre des Médiums” vamos encontrar no cap. III, item 35, uma recomendação de Allan Kardec, para os que queiram conhecer os fundamentos primários da Doutrina Espírita onde indica, pela ordem, as seguintes obras:

1 – O Que é o Espiritismo;
2 – O Livro dos Espíritos;
3 – O Livro dos Médiuns e
4 – Seleta de artigos publicados pela Revista Espírita.

Os evangélicos, que querem transformar o Espiritismo em mais uma seita cristã alegam que Kardec teria omitido desta lista o Livro que, no seu lançamento, teve o nome de “La morale de l’Evangile selon le Spiritisme” porque ele é posterior ao lançamento do Livro dos Médiuns, mas não explica como é que Kardec, no caso, incluiu duas outras obras posteriores ao próprio ESE – “O Evangelho Segundo o Espiritismo” –, na tradução brasileira, sendo que uma delas aparece em primeiro lugar na referida relação.

O raciocínio dos evangélicos só chega a seus interesses pessoais e se esquece da generalização dos fatos. E mais, com este título acima (A moral do Evangelho conforme o Espiritismo), Kardec o cita em diversos tópicos da 1ª edição de “O Que é o Espiritismo”, o que prova que este é posterior àquele, portanto, se o nome do ESE não está incluído na lista é porque Kardec não o achava de importância primordial para o estudo da codificação por ele elaborada.

Cabe, ainda, esclarecer que, segundo consta, teria sido o editor Lacroix que teria recomendado a Kardec, a partir da segunda edição, simplificar o nome da obra tirando do seu título o conceito de “Moral” deixando, apenas,“O Evangelho ”. A má fé, por vezes, a ignorância em outros casos, julga, dessa maneira, que este livro só teria sido publicado a partir desta edição com o nome simplificado. Mesmo assim, como explicar que a quarta obra relacionada seja uma Seleta que Kardec organizou depois de ter escrito todos os seus livros básicos? Convenientemente, basta tirar o conceito de “seleta” e deixar como se foram alguns artigos da Revista Espírita e não a aludida seleção feita pelo seu autor.

Há Centros que se dizem espíritas, inclusive uma Associação que se compõe de divulgadores da doutrina cujo único estudo que fazem ao que se referem, é a dos Evangelhos. Não se trata de ser contra os Evangelhos; pelo contrário, embora adulterados pela Igreja e nem sempre fiéis à História de Jesus, seus textos têm uma finalidade digna, contudo, para seus estudos há igrejas em demasia que o fazem com muita peculiaridade, portanto, para tal, basta que o evangélico se transfira para uma delas ou funde a sua própria, mas que não transforme o Espiritismo codificado por Kardec em mais uma delas, descaracterizando a obra deste distinto autor.

É preciso que haja respeito a uma doutrina digna e sensata, dedicada a estudiosos, justamente, que não se prendem a textos bíblicos e que podem receber, com pureza os belos ensinamentos de Jesus, sem que sejam impostos como sendo fundamentais a seus estudos.

E Kardec, com muita precisão, ao definir “o que é o Espiritismo”, no preâmbulo do livro que tem este nome, teve o enorme cuidado de dizer que o Espiritismo é uma Ciência de conclusões filosóficas, sem se referir, em um só momento, aos Evangelhos. Por que, então impingir tal idéia aos que querem ser espíritas fiéis a Kardec? Não seria mais justo que tais evangélicos fundassem sua própria doutrina, que mereceria integral respeito de todos, certos que somos de que ela estaria voltada para o bem!?

O que não é digno será tentar descaracterizar o Espiritismo transformando-o em mais um estudo voltado para o Cristianismo puro como o fazem suas Igrejas.

Pior ainda são certas traduções das obras de Kardec completamente adulteradas, com o fito de transformá-las em algo coerente com o docetismo de seu tradutor; mudaram-se textos, cortaram-se outros, enfim, mutilaram, na tradução, o pensamento do mestre para que suas obras, pelo menos, na versão brasileira, não contrariassem pontos de vistas que jamais seriam defendidos pelo codificador.

Respeitemos, pois, Kardec.

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