“É princípio elementar que se julgue uma causa por seus efeitos, mesmo quando não se vê a causa”. (Allan Kardec)
Há um conjunto de perguntas fundamentais que norteiam a manifestação humana, pois as suas prováveis respostas sempre são imprescindíveis para a razão de tudo àquilo que o engenho humano cumpre e realiza. Estas questões são sintetizadas nas seguintes indagações: “O que somos”; “de onde viemos”; e “para onde vamos”. Aliás, é na busca de boas soluções para estes assuntos que surge o mito, a religião, a filosofia e a ciência, que, sobre perspectivas distintas, tentam respondê-las de acordo com os seus próprios paradigmas.
Se por todas as partes se reconhece o engenho e a presença do homem através de suas respectivas ações e obras, a existência de Deus, do mesmo modo, se assinala por tudo aquilo que é e se manifesta no universo no qual vivemos a nossa curta e célere existência, sobretudo daquelas ações que não se realizaram pela obra de nossa própria intervenção clarividente, mas pela disposição soberana de uma potência inicial que tudo regula e prover — mesmo que não sejamos capazes de percebê-la materialmente, aliás.
Neste sentido, tudo aquilo que na natureza se expressa e não é o produto da ação humana é, certamente, o resultado da ação constante e sábia do Criador que opera, silenciosamente, as suas obras, sobretudo pela regulação instintiva que a natureza cumpre no concerto geral de todas as coisas que presenciamos no mundo no qual vivemos, por exemplo. Até porque Deus é uma verdade axiomática, que, aliás, se afirma por seus próprios atos ou ações que se evidenciam, materialmente, todos os dias no mundo que nos circunda. Logo, a sua existência não é apenas o resultado de uma revelação transcendental, contudo o produto de uma obra tangível que pode ser vista por qualquer pessoa sensata e de bom senso — inclusive sem tanto esforço e sem a menor necessidade de uma ligação espiritual com forças extraterrenas que lhe exponha algo significativo.
Sobretudo nos dias de hoje, ainda existem pessoas que acham que Deus é uma dessas balelas criadas pelos mais expertos principalmente para manipular, de acordo com os seus próprios interesses e caprichos, outros sujeitos a realizarem aquilo que elas necessitam para a satisfação das suas próprias necessidades e expectativas. Evidentemente isto é um fato que acontece com certa freqüência em diversas localidades — aliás, quem é que nunca presenciou uma destas ridículas ações em certos templos religiosos, no qual um líder explora a fé alheia com o sentido de adquirir para si uma quantidade maior de capital que lhe possibilite os seus próprios fins? Mesmo assim, achar que Deus não existe porque a religião é explorada como uma arma ideológica é rumor de igual medida e intensidade, pois um princípio elementar de qualquer raciocínio capaz de transpor a barreira da ignorância é conjecturar que de uma obra arguciosa há uma ação perspicaz que se manifesta no seu cumprimento, ou seja, que de uma causa inteligente se realiza, por seus efeitos, uma obra clarividente, mesmo que a origem não seja percebida de forma tangível e material.
O homem ocidental é um ser maculado pela ação interesseira e mesquinha de certos seguimentos religiosos que secularmente exploraram e ainda oprimem uma quantidade considerável de pessoas — que, infelizmente, se auto-aprisionaram na própria ignorância atávica que, por seu turno, os inviabiliza a transpor a barreira do supersticioso e do sobrenatural. Só que a situação é ainda pior, pois, mesmo que não se note ou que não se queira perceber, o Deus que predomina na pregação e na mente de muitos seguidores é Aquele que só realiza as coisas que o fiel pretende ter para satisfazer as suas próprias necessidades e expectativas; ou simplesmente o capital, isto é, o dinheiro que o homem mediano faz de tudo para tê-lo ao seu dispor — inclusive agir de uma maneira egoísta e mesquinha visando apenas o próprio bem, muitas vezes em detrimento do bem estar coletivo. Contudo, o homem de razão, ou seja, qualquer pessoa sensata, justa e com bom senso, sabe — muitas vezes até instintivamente! — que Deus não é um servo que se encontra ao dispor de nossos próprios caprichos e interesses, porém uma causa soberana e primária que tudo regula pela conservação do equilíbrio geral de tudo, principalmente daquilo que é e existe no universo, mesmo que a sua presença não se note a não ser por suas respectivas obras.
Uma boa maneira de se evidenciar a existência ontológica1 de Deus é, evidentemente, pelo seguinte raciocínio:
Qual é a nossa origem? Para a ciência moderna, o homem é o fruto direto de uma evolução biológica que culminou neste ser que raciocina e conjectura. Aliás, este processo teve o seu princípio por um ser unicelular que, no decorrer silencioso e inevitável dos milênios, foi ampliando, gradativamente, a sua respectiva complexidade biológica até que, um belo dia, eis que surge o homem como o fruto final de uma extensa batalha pela vida — que, no entanto, ainda não se finalizou, aliás, como bem sabemos.
Agora, de onde surgiu a vida? Como já sabemos o ser unicelular não surgiu do nada e isto é algo que a ciência também explica, pois, hoje, se conjectura que através de inúmeras reações físico-químicas a matéria inanimada ganha uma força estranha no contexto geral de tudo, ou seja, surge um aglomerado de certas substâncias (geralmente arquitetados pelo “quarteto fantástico da química orgânica”, isto é, o carbono, o hidrogênio, o nitrogênio2 e o oxigênio) que se manifesta de uma nova maneira — inclusive bem peculiar a tudo aquilo que já existiu em outros tempos, que é, justamente, aquela coisa que concebemos como o primeiro ser animado, que, por sinal, é nosso o primeiro antepassado.
Tudo bem, que dizer que a vida surgiu de um conjunto de forças e de elementos naturais que se aglomeraram pelo acaso em determinado momento histórico e que, conseqüentemente, pela ação do nada eis que nos originou, não obstante, sem razão alguma de ser.
Mas, a matéria de onde surgiu? Para esta pergunta, evidentemente, que a ciência também tem uma boa resposta, pois ela considera que a matéria tem a sua origem de um evento cataclísmico que ocorreu de forma aleatória entre 10 ou 20 bilhões de anos, ou seja, que ela se originou de uma imensa explosão cósmica — que, aliás, é a fonte e a origem de tudo! — que, no decorrer de sua ação descontrolada, liberou uma quantidade assombrosa de energia que é a fonte material (e tangível) de tudo aquilo que existe no universo, inclusive das forças cósmicas como o eletromagnetismo, a eletricidade, a gravidade e até da própria vida.
Beleza, que dizer que tudo surgiu de uma imensa e colossal explosão, na qual, no seio de sua efervescência inata, foram forjadas todas as forças e elementos naturais que, no decorrer de bilhões e bilhões de anos, culmina, milagrosamente, na vida; e que, portanto, no perpassar de mais uns milhões de anos, se finaliza no homem e em sua singular e interessantíssima natureza — inclusive até os nossos vícios e virtudes são filhas diretas desta singular série acidental de fatos que, em uma região que nem sabemos onde fica, do nada acontece!
O mais engraçado nisto tudo é que há quem afirme que o gatilho desta série colossal de eventos foi uma provável maturação energética que por qualquer insignificância inicia um rápido e poderoso estouro, no qual tudo aquilo que é e existe no universo (aliás, até o próprio espaço e o tempo!) se origina em seguida, sobretudo pela sua manifestação descontrolada que tudo fez do nada e sem razão alguma de ser.
Facilmente percebemos — sobretudo diante de tudo aquilo que expomos anteriormente — que a ciência do homem moderno é um instrumento sem espírito, ou seja, é um mecanismo explicativo3 no qual as suas ações não podem ser esclarecidas pela manifestação de uma força intangível, como é o caso de Deus, que nas explicações religiosas é (e sempre será!) um elemento imprescindível para tudo aquilo que se concebe no mundo no qual vivemos.
A ciência, portanto, exclui de si qualquer senso de espiritualidade de suas explicações; e a religião, por seu turno, não aceita tudo que a ciência apresenta. Sendo assim, esta luta interminável entre estes dois mecanismos explicativos, que o homem tem ao seu dispor, se finaliza, conseqüentemente, em um ambiente pragmático no qual o ser humano, de maneira geral, prefere seguir uma visão ou outra, desde que corresponda, em muitos casos, à satisfação tacanha de seus próprios interesses mesquinhos e egoístas.
Na prática, qualquer sujeito sensato sabe, instintivamente, que tanto a ciência como a religião são corretas na construção de suas próprias explicações. Aliás, a filosofia tem um papel de destaque nesta junção de perspectivas distintas, pois os seus mecanismos não são nem científicos ou religiosos, contudo existenciais e ontológicos. De qualquer maneira, negar a existência de Deus é uma balela sem precedentes, pois por mais que a ciência descubra ou elabore algo novo, ela sempre esbarra em um ser intangível e transcendental que é a origem de tudo. No caso dela é engraçado este acontecimento, porque podemos desvendar, facilmente, que o Deus da ciência é o acaso, que sobre esta perspectiva, explica e prover tudo que há no universo — mesmo que isto não seja uma coisa tão racional. Negá-lo, portanto, é uma armadilha teórica que o bom senso jamais adotará, pois este proceder é, evidentemente, uma ação insensata e leviana.
Portanto, se a ciência queria ser uma nova perspectiva para a descoberta das respostas eternas que o homem busca — sobretudo uma alternativa capaz de transpor o prodígio e o sobrenatural do mito e da religião — ela termina por ser, não obstante, uma ferramenta que tropeça em seus próprios argumentos, pois a ciência, mesmo que não queira, tem um Deus: O acaso que, silenciosamente, tudo explica e prover.
Sendo assim, a ciência sem Deus é quase uma futilidade — que, aliás, é praticamente insuperável4, inclusive em diversas situações do dia-a-dia. Até porque, por mais que se queira negar, todo efeito inteligente tem — em contrapartida — uma causa perspicaz e clarividente que arquitetou e idealiza, previamente, a sua respectiva existência e manifestação. Portanto, todo argumento científico que é incapaz de compreender este fato auto-explicável também é inábil em transpor, adequadamente, os umbrais da ignorância em direção da sabedoria. Principalmente porque se a religião se fundamenta na crença intuitiva de algo ou alguma coisa, a ciência, por seu turno, deve agir no sentido de construir os argumentos sensatos que abonem as suas descobertas, desde que seja capaz de garantir ao homem uma perspectiva esclarecedora que propenda para a paz e a harmonia de tudo e de todos.
Da mesma maneira se a religião, em si, for incapaz— sobretudo na prática efetiva daquilo que realmente é importante! — de exceder os seus próprios ritos e dogmas, falhará no seu papel de oferecer ao homem uma perspectiva mais sensata no contexto geral de tudo, principalmente na criação, na manutenção e na conservação de um clima amplamente favorável a vivência da paz e da concórdia entre todos os seres, pois toda ética religiosa deve visar uma moral apta ao exercício da justiça e do bom senso.
Deus realmente existe e isto é um fato axiomático, ou seja, é algo que se explica por si mesmo. Aliás, o bom senso sempre termina por confirmar tudo isto, inclusive sem tanto esforço e com uma clareza sempre inconteste. Deus não é, todavia, simplesmente uma manifestação antropomórfica de uma força transcendental e metafísica que tudo prover de acordo com os caprichos humanos, ou seja, O criador é uma inteligência primária e soberana que manifesta a sua existência por suas ações reguladoras — que, por sinal, sempre visam à manutenção da harmonia entre todos os seres que se explanam no universo.
Afinal, Deus não é um capricho da religião ou simplesmente um acaso que a ciência nega de qualquer modo, mas a razão inteligente de tudo aquilo que no universo existe e se manifesta — inclusive o homem tem Nele a sua origem, pois sem Ele, por Ele e com Ele nada se explica de uma maneira justa e sensata.
Além disso, cabe ao homem viver em harmonia com o seu Criador, pois esta potência primitiva é uma força inata que visa à concórdia de todos os seres que Dele e por Ele foram feitos e emanados através de sua ação soberana e sábia.
NOTA
1 Se a Ontologia é parte da filosofia que trata do ser enquanto ser, isto é, como algo que se manifesta e que por si só se explica, logo provar que algo existe pela perspectiva ontológica é, simplesmente, oferecer os elementos que destacam a sua revelação como tal — inclusive em tudo aquilo em que a sua ação se expressa por algo que lhe caracteriza, que, no caso de Deus é uma previdência absoluta no contexto geral de tudo aquilo que é e existe no universo no qual o homem vive, por exemplo. Esta foi, aliás, a estratégia adotada por Allan Kardec na Gênese e, certamente, em toda a codificação, pois ele partiu do seguinte axioma na construção das obras fundamentais que norteiam o Espiritismo: “É princípio elementar que se julgue uma causa por seus efeitos, mesmo quando não se vê a causa”.
2 Que na codificação Espírita é chamado de azoto.
3 O que é um mecanismo? É, simplesmente, um artefato que o engenho humano usa para satisfazer uma necessidade ou uma expectativa que lhe atrapalha, sobretudo no alcance de seus próprios fins, isto é, apenas uma ferramenta que fazemos uso com certos fins em mente. Logo, um mecanismo explicativo é apenas um instrumento arquitetado pela razão humana para responder as suas eternas dúvidas: “O que somos”; “de onde viemos”; e “para onde vamos”.
4 A ciência não chega a ser uma futilidade porque ela sempre oferece ao homem melhores maneiras para a manutenção de sua própria sobrevivência, sobretudo na criação de muitas coisas que, hoje em dia, são até indispensáveis ao nosso próprio existir, como é o caso das vacinas, por exemplo.
REFERÊNCIA
BRYSON, Bill. Breve História de Quase Tudo. Lisboa: Quetzal Editores, 2005. 4ª edição.
Kardec, Allan. A gênese: Os milagres e as predições segundo e o espiristimo. Araras: Instituto de Difusão Espírita, 2005. 42º edição. Págs. 47-49.
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