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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Viagem no tempo: uma restrição espírita


Por Alexandre Fontes da Fonseca – afonseca@if.usp.br 

Pela primeira vez um ensinamento espírita interfere na interpretação de um estudo científico. 

Quem não assistiu e se divertiu com a trilogia “De Volta Para o Futuro” [1] que encantou o mundo com a romântica estória de um rapaz que realiza uma série de viagens no tempo encontrando seus pais, no passado antes de se casarem, a si mesmo e aos seus filhos, no futuro.

Divertimentos à parte, a verdade é que uma variação no fluxo do tempo não só é teoricamente possível, segundo a Teoria Geral da Relatividade de Einstein, como foi comprovada experimentalmente. Apesar do assunto ser considerado, pelas pessoas em geral, uma especulação sem fins práticos, alguns cientistas tem levado esse tema a sério principalmente porque ele está diretamente ligado à questão sobre as relações entre causa e efeito, o que é extremamente relevante na pesquisa de uma teoria unificada da Física. Tanto isso é verdade que uma das mais conceituadas revistas de divulgação científica, a Scientific American, dedicou um número inteiro a questões sobre o tempo. Desejo destacar o artigo intitulado “Como Construir uma Máquina do Tempo” (original em inglês: “How to Build a Time Machine”) [2]. Nesse artigo, o físico teórico Paul Davies apresenta aos leitores os mecanismos de uma viagem no tempo. Em suas próprias palavras Davies afirma: “It wouldn’t be easy, but it might be possible”[2,3]. Cabe citar que três físicos norte americanos publicaram na também conceituada Physical Review Letters [4] uma proposta séria a respeito do assunto. Motivado pelo interesse científico, mesmo que teórico, sobre o assunto, pretendo, nesta matéria, comentar sobre uma restrição do Espiritismo à questão da viagem no tempo. Mesmo que do ponto de vista prático isso esteja muito longe de acontecer, a discussão apresentada aqui tem um caráter didático em ambos os pontos de vista, espírita e científico. 

Não há espaço suficiente para discutirmos os detalhes sobre os mecanismos teóricos da viagem no tempo. As referências citadas servem como guia ao leitor mais interessado em pesquisar o assunto. Primeiramente, vamos expor em linhas gerais as condições em que o tempo fluiria de forma diferente possibilitando uma viagem no tempo, mencionando as evidências experimentais que suportam as pesquisas. Em seguida exporemos uma restrição espírita à viagem no tempo. 

Basicamente, existem duas maneiras de se alterar o fluxo do tempo, isto é, fazer com que ele passe mais devagar ou mais rápido, quando comparado ao fluxo de tempo de  um dado observador, por exemplo, um homem parado numa estação de trem. Uma delas é mudar a velocidade de um determinado objeto ou pessoa. Segundo a Teoria da Relatividade, observadores que estejam em repouso (parados na estação de trem) perceberão que o tempo fluirá mais devagar para aqueles que estiverem se movimentando com relação a eles. A outra forma de alterar o fluxo do tempo é aproximando-se, ou afastando-se, de objetos com massa elavada. Segundo a Teoria Geral da Relatividade, o tempo flui mais lentamente na proximidade de tais objetos massivos. Não percebemos isso no nosso cotidiano porque as diferenças no fluxo do tempo apenas se tornam significativas quando as velocidades de movimento são próximas da velocidade da luz e porque estamos todos à mesma distância média do nosso planeta. 

A variação no fluxo de tempo foi testada experimentalmente sincronizando-se dois relógios de altíssima precisão e colocado-os, em seguida, em aviões que voaram por muitas horas em sentidos contrários [5]. O resultado foi uma significativa diferença entre os relógios. Uma outra verificação experimental foi um pequeno desvio na luz emitida por átomos de hidrogênio que, segundo Hawking[5], é explicado através de trajetórias de elétrons no que ele chamou de anéis fechados, isto é, trajetórias no espaço-tempo que iniciam numa dada posição e instante de tempo e terminam na mesma posição e instante de tempo. 

Antes de discutir a restrição espírita, vejamos o que o professor Paul Davies comentou em seu artigo sobre certos paradoxos de causa e efeito que a viagem no tempo proporciona. Considere a situação em que uma pessoa viaja ao passado e tira a vida de sua mãe. Isso cria um paradoxo pois se a mãe morre, ela não terá aquele filho(a). Se o filho(a) não nasce, ele(a) não poderá, após crescer, viajar ao passado para tirar a vida dela e fica, então, claro o paradoxo. Segundo o professor Davies, esse é um evento que não ocorreria por não ser consistente. Seria como se tentássemos encontrar uma solução para um anel circular de raio R que possuísse comprimento diferente de 2R, em nossa geometria usual. Por outro lado, ele afirma que se uma pessoa viaja ao passado e salva a sua mãe, ainda jovem, da morte, esse evento é perfeitamente viável e consistente. Entre esses dois exemplos, existe um ponto importante que é o livre-arbítrio. Ou a viagem no tempo interfere no livre-arbítrio, pois escolher entre salvar e matar é puramente uma decisão nossa; ou, simplesmente, esta viagem não é possível para os seres vivos. Não temos esse problema com os objetos inanimados. A questão sobre o livre-arbítrio é complexa nesses casos e mereceria uma análise futura. 

A restrição espírita que desejamos ressaltar, porém, é outra. Considere a possibilidade de viagem no tempo para uma época não distante seja no passado ou no futuro, de modo a podermos nos encontrar mais jovem ou mais velho, respectivamente. A situação pode ser caracterizada como havendo dois de nós num dado momento. Do ponto de vista material, do corpo físico, não há nenhum problema. No entanto, se lembrarmos que somos espíritos encarnados estaremos numa situação de conflito com um ensinamento dos espíritos. Segundo a questão número 137 do Livro dos Espíritos [6], o espírito não pode animar dois corpos diferentes simultaneamente. No nosso exemplo, teríamos dois corpos diferentes animados pelo mesmo espírito. Isso está em contradição com a referida resposta dos espíritos. 

De fato, a viagem no tempo ao passado, mesmo distante, também gera o conflito acima. Imagine que a nossa viagem nos levou a muitos séculos atrás. Suponha que nesta época estávamos encarnados vivendo uma de nossas vidas passadas. O nosso espírito estaria ligado a este corpo e ao corpo que veio do presente. Novamente temos a contradição. Mesmo que não estivéssemos encarnados em tal época, nosso espírito estaria no plano espiritual e não poderíamos estar lá e encarnados no corpo que veio do presente ao mesmo tempo. 

Já a viagem ao futuro nos parece possível, pelo menos no ponto de vista da restrição anterior. Suponha que nós entramos numa nave para viajarmos a uma estrela próxima, digamos, 10 anos-luz de distância, a uma velocidade próxima da luz. Após retornarmos ao nosso planeta, terá se passado muito mais tempo na Terra do que conosco dentro da nave (o artigo [2] explica os detalhes). Encontraremos, portanto, a Terra 20 anos no futuro. Nesse caso, nosso espírito não esteve presente na evolução espaço-temporal da Terra e em tal futuro, não encontraremos um outro “eu” mais velho ou reencarnado pois estivemos na nave realizando a viagem. 

Do ponto de vista prático, a viagem no tempo ao passado é algo impossível para objetos e seres de tamanho macroscópico. Isso já não é verdade com relação aos objetos de tamanho microscópico, como o elétron numa trajetória tipo anel fechado acima mencionado. Nesse caso a restrição espírita não apresenta nenhum problema pois tais objetos são apenas materiais. De qualquer forma devemos ter em mente que há muito o que aprender sobre as leis do nosso Universo. 

Finalizando, eu gostaria de ressaltar a idéia de que ao invés de ser confirmada pela ciência, pela primeira vez, uma afirmativa espírita interfere numa análise científica impondo restrições a um fenômeno considerado possível e estudado seriamente pelos cientistas. Segundo Hawking[7], talvez o fato de nunca termos recebido a visita de um ser do futuro seja uma prova de que a viagem no tempo é impossível. Entretanto, eu arrisco a dizer que a razão pela qual isso não tenha ocorrido não seja somente devido às dificuldades científicas e técnicas associadas à viagem no tempo, mas também porque a restrição espírita apresentada nesta matéria seja, de fato, um empecilho real ao fenômeno. É importante frisar que isso é apenas uma opinião e não uma verdade comprovada cientificamente. Mesmo assim, sinto uma admiração cada vez maior pela Doutrina Espírita que demonstra possuir um potencial enorme de informação e conhecimento que, verdadeiramente, nos ajuda a progredir. 

Referências

[1] Página oficial do filme na internet: http://www.bttfmovie.com
[2] P. Davies, Scientific American, September, p.50, (2002).
[3] “Isto não seria fácil, porém não impossível.”
[4] M. S. Morris, K. S. Thorne e U. Yurtsever, Physical Review Letters 61, p. 1446 (1988). A revista Physical Review Letters é uma das revistas científicas mais importantes na área de Física. 
[5] S. Hawking, O Universo Numa Casca de Noz, Editora Mandarim, 2a. Edição, (2002).
[6] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora Edições FEESP, 9a. edição, 1997.
[7] Citado por M. Kaku em Hiperespaço, Editora ROCCO (2000).

Fonte: http://www.ieja.org/portugues/Estudos/Artigos/p_viagtemp.doc

Um comentário:

  1. Excelente conjectura, amigo Alexandre. Mas é preciso salientar que tempo e espaço são conceitos puramente subjetivos, se assim posso me expressar. Kardec trata do assunto em O Livro dos Médiuns (não tenho aqui agora a obra para confirmar o capítulo), esclarecendo que basta o Espírito pensar numa existência pregressa que aparecerá para alguém com as vestes de tal época, ele se reporta no tempo-espaço através do pensamento. Afinal, o que é o mundo espiritual senão a realidade psíquica de cada um? Assim, o mesmo Espírito possuirá a realidade que queira em determinado momento.Em O Céu e o Inferno segundo o Espiritismo, a idéia é clara: vários Espíritos ocupam o mesmo ambiente, porém em situações completamente diversas. Não se pode considerar o corpo físico como entidade atuante nestes processos. Se atribuir-se à Mente (Psiquismo/Espírito) o seu real valor, entender-se-á, senão todas, mas grande parte das conjecturas ou teorias cintíficas, pois não se pode esquecer que no Universo os sistemas se repetem desde o micro ao macrocosmo, basta que as análises não se prendam ao veículo que menos importância tem. Mesmo porque, apesar de alguns estudos já apontarem a possibilidade de uma partícula subatômica percorrer o espaço com uma velocidade maior que a da luz, não se pode ainda admitir que um corpo propriamente físico possa fazê-lo, sem sofrer uma transformação radical. No mais, são muito boas estas discussões, e ainda uma vez, parabéns pelo artigo. Grande abraço. Maria

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