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sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Roustaing procura o Codificador


Por Nazareno Tourinho

Entre Jean-Baptiste Roustaing e Allan Kardec só existiu ligação de caráter meramente epistolar, e assim mesmo porque o primeiro se interessou em escrever para o segundo. Os dois nunca estiveram juntos, trocando um cumprimento face a face. Não há notícia de que Roustaing tenha alguma vez visitado a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, onde atuava o Codificador, nem registro de seu comparecimento às homenagens prestadas pelos espíritas de Bordeaux ao mestre de Lyon, quando ele lá esteve, inclusive ouvindo uma alocução do médico Bouché de Vitray na qual foi citado o nome do famoso bastonário, nascido e residente na cidade.

O contato inicial, via Correio, de Roustaing com Kardec, figura na edição de junho de 1861 da Revista Espírita.

A essa altura O Livro dos Espíritos já fazia sucesso há mais de quatro anos e o advogado da Corte Imperial de Bordeaux começara a se envolver com fenômenos mediúnicos há menos de seis meses.

Estava deslumbrado com a Doutrina.

Trata o seu codificador respeitosamente, chamando-o de “muito honrado chefe espírita”.

Pelo teor da missiva constata-se que se dirigira ao honrado chefe antes e fora orientado no sentido de se aproximar do Sr. Sabô, um destacado espírita em sua terra natal.

Na longa carta, que toma quatro páginas da Revista Espírita, Roustaing se refere “a reencarnação como único meio de ver o reino de Deus”. Depois, consoante não ignora mais o leitor, subscreveria a tese de que a encarnação, e consequentemente a reencarnação, jamais foram necessários (único meio) para a conquista do “reino de Deus”, não passando de um castigo para punir este ou aquele Espírito rebelde, espécie de anjo decaído na versão da teologia católica.

Termina Roustaing declarando que somente não vai a Paris ao encontro de Kardec porque a isso se opõe a sua saúde.

Diante de tão efusivo testemunho de apreço individual e solidariedade ideológica, o Codificador do Espiritismo, em termos amáveis, manifesta simpatia pelo futuro desertor da causa em que se empenhava devotadamente.

Cinco meses depois, relatando na Revista Espírita de novembro de 1861 uma visita recente feita a Bordeaux, Kardec informa ter o movimento espírita local homens de “eminente posição”, e “muitos bons médiuns”, contudo não menciona o nome de Roustaing nem o da sua psicografa, Emilie Collignon, que também residia na cidade.

Conforme se vê, Roustaing não privou da intimidade de Kardec, não conviveu com ele, não desfrutou sequer de sua atenção, salvo quando o incomodou com escritos suspeitosos. É falso, pois, o companheirismo entre ambos, insinuado por alguns rustenistas. Quanto à Emilie Collignon, o que a Coleção da Revista Espírita nos sugere é a preferência do mestre de Lyon por outro médium de Bordeaux, a Sra. Cazemajoux. Em maio de 1861 o Codificador divulga duas mensagens recebidas por esta médium. Em agosto do mesmo ano, mais uma, com assinatura espiritual de Byron. Em fevereiro do ano seguinte, 1862, novas mensagens da Sra. Cazemajoux. Só então é que um escrito de Emilie Collignon, aliás não mediúnico, aparece pela primeira vez na Revista Espírita, publicada por Allan Kardec. E aparece de um modo que, sob o aspecto doutrinário, não a recomenda bem.

Veremos esta particularidade no próximo texto.

Fonte:
TOURINHO, Nazareno.  As Tolices e Pieguices da Obra de Roustaing – Nazareno Tourinho; ensaio crítico-doutrinário; 1ª edição, Edições Correio Fraterno, São Bernardo do Campo, SP, 1999.

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