sexta-feira, 24 de junho de 2011

O Espiritismo está cientificamente demonstrado

Por Egydio Régis

De vez em quando voltamos a ler os velhos compêndios que registram os notáveis trabalhos realizados por homens de valor histórico, a respeito dos fenômenos espíritas.

É uma pena que nós, os espíritas, não valorizamos como deveríamos, um verdadeiro arsenal de provas irrefutáveis sobre a realidade desses fenômenos. Ao invés de divulgá-los maciçamente, de modo a chamar a atenção dos pesquisadores modernos, escondemos esse tesouro sob uma pretensa e arrogante posição de que esses trabalhos não têm valor científico, porque não foram aplicados métodos e recursos tecnológicos que hoje são exigidos pelos cartesianos de plantão. Quem teve a coragem de afirmar que o espiritismo está cientificamente provado? Algum fanático, maluco ou talvez analfabeto?

William Crookes, célebre químico e físico inglês, foi uma das mais vigorosas e fecundas mentalidades contemporâneas. Nascido em Londres, em 1832, faleceu na mesma cidade em 4 de abril de 1919, tendo sido nomeado em primeiro escrutínio, em 1863, membro da “Real Sociedade de Londres”. Aos 20 anos, escreveu trabalhos de grande mérito sobre a luz polarizada; pouco tempo depois descreveu detalhadamente o espectroscópio, publicando seus estudos sobre os espectros solar e terrestre. Publicou outros sobre as propriedades ópticas das opalas e deu a conhecer um microscópio espectral; ocupou-se da densidade da luz e a física lhe é devedora de um fotômetro de polarização. Astrônomo do “Observatório de Radcliffe”, em Oxford, seus trabalhos sobre meteorologia são notáveis e não o são menos os de fotografias celestes.

Em 1855, quando apenas tinha 23 anos, fez trabalhos fotográficos sobre a luz, então reputados os melhores, honrando-o a “Real Sociedade de Londres” com um prêmio em dinheiro, como estímulo para prosseguir os estudos. Em 1879, expôs no “Bakerian Lecture”, o trabalho sobre a “Iluminação de linhas de pressão molecular e trajetória das moléculas”, dando-nos a conhecer um estado da matéria de tenuidade excessiva e do qual apenas se podia formar ideia.

Escreveu, além disso, sobre medicina, higiene e o tratamento da peste bovina, popularizando o uso do ácido fênico; e várias outras obras, entre as quais “Experiments or Repulsion from Radiation”, “Vacuum Molecular Physics” e “Select Methods of Chemical Analisys”. Publicou um tratado de análise química, que é hoje clássico; descobriu o processo de amalgamação com o sódio. Descobriu o “thalium”, novo corpo simples (elemento químico) levando cerca de oito anos a investigar seu peso atômico. Seus estudos sobre o quarto estado da matéria ou estado radiante e o radiômetro, bastariam para dar-lhe a reputação de sábio, que com tanta justiça lhe pertence. Foi presidente da “Royal Society” durante o peíodo de 1913-1915.” (Afinal Quem Somos? de Pedro Granja - 9ª edição - Edicel).

Reproduzindo acima uma breve biografia de William Crookes, quisemos registrar que o homem que teve a dignidade de afirmar em pleno Congresso da Associação Britânica, em 1898: “Trinta anos se passaram desde que publiquei as atas das experiências tendentes a mostrar que, fora dos nossos conhecimentos científicos, existe uma força posta em atividade por uma inteligência diferente da inteligência comum a todos os mortais. Nada tenho de que me retratar em relação a essas experiências e mantenho as minhas verificações já publicadas, podendo a elas acrescentar muita coisa.” E sentencia, do alto de sua sabedoria e respeitável importância na história da ciência: “O espiritismo está cientificamente demonstrado” (Trechos citados por Pedro Granja, extraídos da Revue Spirite de fevereiro de 1899 e de “No Invisível” de Léon Denis). Ele não era nenhum zé ninguém, nenhum pseudocientista ou algum ficcionista maluco. Quem, no mundo científico de ontem ou de hoje, tem maior gabarito para desmenti-lo? Quem estudou, pesquisou, procurou reproduzir os mesmos fenômenos e comprovou que os fenômenos não existiam?

Todos aqueles que tentaram reduzir os fenômenos a embustes, ilusões etc. nunca fizeram trabalhos sérios de pesquisa. Porque os registros históricos demonstram isso. Grandes sábios dos séculos 19 e 20, que se puseram a pesquisar os chamados fenômenos espíritas, mesmo com o intuito de “desmascará-los”, acabaram por se convencer da sua realidade. E, o que é mais importante, não se furtaram em dar publicamente seu testemunho. São exemplos notáveis: Charles Richet, Cesare Lombroso, Sir Oliver Lodge, Frank Podmore, Benjamin Franklin, Thomas Alva Edison, Karl du Prel, Frederich Zölner, Alfred Russel Wallace e tantos outros. Somam-se a mais de uma centena a quantidade de autores que pesquisaram e escreveram sobre os fenômenos espíritas.

Partindo de uma missão de que foi incumbido pela Royal Society de Londres, por ser ele o mais ilustre dos componentes dessa entidade científica, William Crookes deveria pulverizar definitivamente os chamados fenômenos de origem extrafísico, em nome de todo o mundo científico.

Três anos depois das pesquisas com o espírito de Katie King, contrariando todas as expectativas de seus pares, da imprensa, dos religiosos e dos materialistas, entrega seu relatório à Society, afirmando categoricamente que os fenômenos investigados são verdadeiros. A repercussão foi, evidentemente, a mais infame possível. Tentaram ridicularizar e até inventaram uma paixão platônica do sábio pela médium/espírito. O curioso é que nada conseguiu abalar o prestígio de Crookes, apesar de a Society ter arquivado o relatório e sobre ele ter deitado um silêncio absoluto. Não houve, ao que consta, nenhum desmentido ou pronunciamento desautorizando o trabalho do pesquisador. William Crookes continuou respeitado como cientista e realizou seus notáveis trabalhos após esse episódio.

Charles Richet, fisiologista francês, prêmio Nobel de 1913, estudou e pesquisou os chamados fenômenos espíritas, com o objetivo de reduzi-los a fenômenos meramente anímicos, isto é, produzidos pelo próprio indivíduo sem interferência de agentes externos ocultos. Fundador da Metapsíquica, em sua obra “Tratado de Metapsíquica”, comentando as pesquisas de Crookes afirmou: “Não se pode distinguir o Crookes do thalium e dos raios catódicos, do Crookes de Katie King”.

Mas, será que as pesquisas de Crookes foram realmente conduzidas com todo o rigor científico? O que ele era? Um poeta, um filósofo? Era cientista, logo, como procederia um cientista nessas investigações? Vejamos alguns detalhes do seu trabalho com a médium Florence Cook e com o espírito de Katie King, extraídos de seu livro “Fatos Espíritas”:

“A médium era a jovem Florence Cook, de 16 anos, baixa, franzina, trigueira, de cabelos quase pretos e de saúde muito delicada. A aparição tomava o nome de Katie King e revela-se, em plena luz, sob formas de uma mulher formosa, alta, de tez branca e cabelos loiros, em parte cobertos com uma espécie de turbante de cor branca que lhe servia de complemento às roupagens habituais. A médium trajava-se quase sempre de veludo preto.”

Enquanto a aparição passeia livremente pela reluzente sala de jantar, apoiada ao braço de Crookes, conversando com este, com os filhos, esposa e demais assistentes e convidados, o médium rigorosamente controlado, jaz no quarto contíguo às escuras, em estado letárgico, deitado sobre um sofá e separado da sala de jantar por uma cortina ou reposteiro. Em algumas experiências, por exemplo, o médium estava isolado, fechado num círculo elétrico cujas variações de resistência eram indicadas pelo galvanômetro que se encontrava junto dos experimentadores. Outras vezes se empregavam delicados aparelhos, balanças sensivelmente equilibradas, ligadas a alavancas com mecanismo de relojoaria, controladores elétricos idealizados por Cromwell Varley e outros. Certo dia, quando a materialização de Katie King surgiu, Crookes pediu-lhe inesperadamente, que metesse as mãos numa tina preparada com mercúrio onde havia enérgico corante. O galvanômetro, que indicava uma diminuição na resistência do circuito, à medida que o espírito se formava, não sofreu qualquer desvio pela imersão das mãos deste na tina com mercúrio, nem as mãos do médium apresentaram os mais leves vestígios do corante. Observou-se, contudo, que em várias partes do corpo do médium havia manchas do corante, o que comprova que a materialização é efetuada também à custa do seu corpo, hipótese esta perfeitamente admitida pela diminuição de peso que ele experimenta durante a produção de tais fenômenos e pela diminuição da resistência do circuito.” (Afinal Quem Somos? de Pedro Granja - 9ª edição – Edicel - Grifos nossos.).

“Na semana que precedeu à desaparição definitiva de Katie King, o que se realizou a 21 de março de 1874, Katie deu sessões em casa de Crookes, quase todas as noites, a fim de permitir fotografá-la à luz artificial. Cinco máquinas, colocadas em diversos ângulos da sala, foram simultaneamente empregadas para fotografar Katie King no momento em que fazia a aparição. O preparo e revelação das chapas eram cuidadas pelo próprio Crookes, auxiliado por um assistente. Desta forma pôde obter quinze chapas, por noite, perfazendo ao todo quarenta e quatro negativos, alguns excelentes e outros regulares ou medíocres. (Grifos nossos) De todos os presentes, o único que podia estar de pé e andar por onde lhe aprouvesse era Crookes; os demais deviam permanecer sentados. Seguia-a, diz Crookes, muitas vezes para o gabinete e vi por várias vezes Katie e o seu médium simultaneamente; o mais das vezes, porém, só encontrava o médium em estado letárgico; Katie e o seu fato branco haviam desaparecido. Frequentemente vezes levantei um canto da cortina, quando Katie estava de pé junto dela. As sete ou oito pessoas que assistiam às experiências viram, então, nitidamente e ao mesmo tempo, Katie e o médium sob o jato brilhante da luz elétrica. Tenho, afirmou Crookes, uma prova fotográfica de Katie King e Florence Cook (o médium) em grupo.”

Finalizando este rápido repasse sobre as experiências de Crookes, descrevemos o episódio da despedida de Katie, fato capital para provar que médium e espírito eram realmente duas personalidades distintas: “Terminadas as instruções, Katie convidou-me a entrar no gabinete com ela, permitindo-me ficar até o fim. Cerrada a cortina, conversou comigo algum tempo; depois atravessou a sala para ir ter com o médium, que jazia inanimado. Inclinando-se sobre ele, Katie tocou-o e disse-lhe: — Desperta, Florence! desperta! É mister que eu te deixe agora! Miss Cook acordou e, lacrimosa, suplicou a Katie King que ficasse mais algum tempo. — Não posso, querida, a minha missão está cumprida. Durante alguns minutos conversaram juntas , até que as lágrimas de Miss Cook lhe embargaram a voz. Seguindo as instruções de Katie, corri a segurar Miss Cook, prestes a cair, que soluçava convulsivamente. Olhei a seguir em torno, mas a linda Katie King e o seu vestido branco haviam desaparecido “ (William Crookes – Fatos Espíritas - editora FEB).

Eloquente e arrasador, como prova inconteste da materialização de Katie, é o depoimento de Florence Marryat, autora inglesa que escreveu “ There is no Death! e que com Crookes assistiu a última sessão em que Katie se despediu: “Nessa noite, Katie saiu do gabinete e veio sentar-se nos meus joelhos, proporcionado-me o ensejo de verificar o quanto era mais graciosa e mais pesada que seu médium. Mas como em certas ocasiões ela se assemelhava a este último, eu lho observava, e ela, encolhendo os ombros, respondeu:

— Sei disso, mas não posso impedi-lo. De qualquer modo, fui bem mais formosa na minha última existência terrena. Logo mais provar-te-ei. Reentrou no gabinete: depois espreitou, às furtadelas, pela fenda das cortinas, pedindo que me aproximasse. Assim fiz e ela me conduziu para o seu interior. Observei que os reposteiros eram muito transparentes, de modo que permitiam, à luz a gás, iluminar suficientemente o interior. O médium jazia sobre um acolchoado, imerso em profundo sono e Katie desejava ansiosamente que me assegurasse de sua identidade, insistindo para que a tocasse, apalpasse, apertasse as mãos e lhe puxasse os cabelos. Em seguida, perguntou:

— Estás bem certo de encontrar-te em presença de meu médium? Respondi-lhe que disso estava absolutamente convicto e ela assim continuou: — Agora, observa-me. Observa o meu rosto, tal qual fui em vida. Dirigi o olhar para a forma que, momentos antes estivera sentada nos meus joelhos e, extremamente extasiado, distingui o corpo de uma jovem formosíssima, de grandes olhos azuis ou cinzentos, pele alvíssima, abundante cabeleira dourada. Katie parecia enlevada com minha surpresa e sorria, dizendo: — Porventura não sou mais bonita do que minha Florence (o médium)? Levantou-se a seguir, apanhou uma tesoura sobre a mesa, cortou uma madeixa de seus cabelos e outra dos do médium e entregou-mas. Ainda as possuo. Os cabelos de Florence são quase negros e parecem macios como seda; porém, os de Katie são de um vermelho dourado e áspero ao tato.” (Afinal Quem Somos? de Pedro Granja - 9ª edição – Edicel - Grifos nossos.).

Como podemos ver, não é um bando de malucos, iludidos, que deram seu testemunho baseado em pesquisas longas, sérias e incontestáveis. Como ainda afirma o próprio Crookes: “Supor que uma espécie de loucura ou de ilusão domina subitamente um grupo de pessoas inteligentes e sensatas, que estão de acordo sobre as menores particularidades e detalhes dos fatos, parece-me mais incrível do que os próprios fatos que atestam.”

Por tudo isso, não temos a menor dúvida em admitir tranquilamente que está mais do que provado científicamente a existência do espírito independente da matéria , bem como da sua sobrevivência à morte do corpo. Por que os espíritas, que não devem ter nenhuma dúvida a respeito, porque então não seriam espíritas, estão preocupados com os outros? Por que preocuparmo-nos com o reconhecimento dos meios científicos atuais? Ora eles ignoram o trabalho de seus colegas dos séculos passados porque querem. Após os grandes conflitos mundiais, a primeira e a segunda guerra, praticamente silenciaram as vozes do além. A comunidade científica dirigiu seus interesses para outras prioridades, quem sabe muito mais importante para a Humanidade no momento, do que a comprovação do espírito.Necessário se fez, desenvolver a tecnologia, conhecer mais profundamente o corpo humano de modo a descobrir meios de cura e melhora de vida. Importante avançar os meios de comunicação, integrar a Humanidade de todo o globo. O que resolveria proclamar agora a descoberta do espírito? Só para satisfazer o ego dos espíritas?

Hoje, sem dúvida, temos meios tecnológicos infinitamente mais avançados para a realização de um grande trabalho de pesquisa sobre o espírito. E isso virá a seu tempo, talvez mais rápido do que se possa imaginar.Mas é preciso pensar qual a utilidade disso, nos dias atuais. Para a economia mundial, não há maior interesse em investir nessa pesquisa, porque não há retorno , não há lucro. O que dá lucro, é investir na indústria farmacêutica, na indústria da informática,das telecomunicações, nos transportes, etc.Como convencer os grandes capitalistas a investir em alguma coisa que não lhes dará retorno material? Os cientistas de hoje estão engajados e financiados para o desenvolvimento tecnológico e para os lucros industriais. Alguns físicos, químicos e de outras áreas de projeção, não se arriscam em trabalhos que não lhe garantam publicação e prêmio Nobel e, infelizmente, esse negócio de espírito é coisa para religiosos ou místicos.

Leio alguns artigos e escutam alguns jovens espíritas formados em áreas de ciências exatas, choramingando suas mágoas porque os Centros Espíritas não abrem espaço para pesquisas sobre o espírito.Desejam descobrir técnicas e métodos científicos atuais, desprezando o que já foi realizado, por dois motivos, segundo minha opinião: nunca se aprofundaram nos trabalhos já efetuados e citados aqui; dão mais ouvido aos Quevedos da vida, aos cientístas materialistas, professores cínicos, acomodados ou submissos ao ranço religioso. É preciso, pois, ter opinião própria, ter coragem de enfrentar os “donos da verdade”, retomando o trabalho dos antigos, publicando-os, estendendo-os. Procurem médiuns de efeitos físicos e de materialização, independentemente de centro espírita e façam suas experiências utilizando os meios tecnológicos modernos. De nada adianta acusar e ficar de braços cruzados. Quer queiram ou não, a única forma de provar a existência do espírito é através da materialização, já exaustivamente realizada por sábios do mais alto gabarito.

Termino este modesto trabalho para que sirva de exemplo aos que temem assumir suas convicções, reproduzindo a magistral resposta de Sir William Crookes aos repórteres que o entrevistaram, perguntando se ele ainda admitia a possibilidade dos fenômenos, muitos anos depois das pesquisas e no auge de seu prestígio: “Mas eu não disse que esses fenômenos eram possíveis; o que eu disse e afirmo é que são verdadeiros”.

Egydio Regis é orador espírita e estudioso do espiritismo. Foi presidente da União Municipal Espírita de Santos, fundador da Associação dos Centros Espíritas da Baixada Santista e presidente do Centro Espírita Allan Kardec, de Santos. Atualmente mantém uma coluna sobre a Revista Espírita no jornal de cultura espírita Abertura, de Santos-SP.

E-mail: egyregis@uol.com.br

Retirado do site PENSE - http://viasantos.com/pense/arquivo/1243.html

Sobre Primeira Geração de Espíritos

Por Nelson Free Man

Quando pensamos em primeira geração de Espíritos, vem-nos à mente qual a condição que estes teriam para progredir e evoluir na sua escalada para a perfeição. Essa dúvida até é pertinente, ao considerarmos que o Espírito é criado "simples e ignorante" segundo o esclarecimento que nos deram aqueles que se manifestaram na elaboração da Doutrina dos Espíritos.

Ao termos a informação de que Deus cria desde sempre, implica associar à criação de espíritos?

Se considerarmos que o Espírito é uma criação Divina, o que é, não implicaria em sua criação desde o sempre, visto que levaria ao entendimento de infinito, ou seja, concomitantemente com qualquer primeira criação Divina. A lógica diz que um Espírito, para ser criado, deverá ocupar um lugar qualquer para o seu progresso. E esse lugar, se refletirmos, é o Universo, necessário ao Espírito criado.

Ao termos a informação de que o Princípio Inteligente é elaborado, sendo, em alguns casos, considerado como alguma coisa criada, implica que esse Princípio Inteligente, caso fosse criado, o fosse antes do espírito?"

Essa proposição está interligada, e a resposta estaria no entendimento do que é antes e do que é depois. Alguns entendem o Espírito como o Princípio Inteligente, o que é um equívoco; são ambos distintos. Somente depois de elaborado esse Princípio Inteligente, o Espírito passa a ser identificado como o Princípio Inteligente do Universo.

Ao termos a informação de que os espíritos trabalham nos elementos da Natureza, implica que sejam, antes, encarnados?"

Podemos fazer uma correlação com o assunto, e julgar esse tão pertinente, quanto entender o trabalho do Espírito no mundo Espiritual. No mundo espiritual, a lógica nos aponta o início da sua caminhada progressiva, como espírito simples e ignorante que é, e que não foi criado para a ociosidade, já que está submetido às Leis Divinas e Naturais.

Como dito no comentário anterior, o Espírito não é o Princípio Inteligente, mas está intimamente a ele interligado. Com o atributo da inteligência a manipulação de tudo que cerca o Espírito concorre para o seu progresso. Manipular os elementos da Natureza, com capacidade e observância às Leis Divinas, prepara-o, por lógica, às encarnações que se sucederão. Entende-se dessa maneira, o porquê dos Espíritos Superiores delegarem essas tarefas aos espíritos inferiores, o que pressupõe aqueles “simples e ignorantes”.

Perguntemo-nos, ainda, se a imutabilidade de Deus se desvanece, ao ordenar (por em ordem), progressivamente suas criações, sendo uma delas, o espírito?

A imutabilidade Divina está nas suas Leis, e a criação é gradativa e progressiva, obedecendo a essas mesmas Leis. Exemplo disso são as sementes, que após germinarem, geram árvores frondosas, que darão frutos e mais sementes.

A gradação e o progresso da criação, por obedecerem a leis perfeitas, não alterariam a imutabilidade Divina, pois tudo está contido nessas mesmas Leis. E assim, nos leva a lógica a entender também a criação do Espírito. Ele é um processo dentro das Leis Divinas. O que podemos e devemos compreender é que não há um Deus (antropomórfico) numa fábrica, criando Espíritos.

Perguntaríamos, estudando a codificação Espírita, se a primeira geração de espíritos não tinha, como todos os demais posteriores, gravados em sua consciência (individualidade) as Leis Divinas e, portanto, as Leis Morais?

Como a resposta a essa pergunta é unânime pelo "sim", uma vez que essa informação encontra-se ditada pelos Espíritos da codificação, podemos inferir a possibilidade do progresso e do avanço para a evolução da primeira geração de Espíritos criados. E, com isso, deixaremos de alimentar a premissa de que um Espírito de primeira geração não reunisse as condições necessárias para progredir e evoluir.

Outra pergunta que nos vem à mente é se, contemplados pela Doutrina Espírita, já não temos a informação de que o espírito, pela primeira vez encarnado, não habita um mundo compatível com o seu nível de conhecimento? Sendo simples e ignorante, a lógica não diz que o seu meio será esse?"

Nesse tema, há que se compreenderem as gradações dos mundos habitados. A inferioridade de um Espírito, pela lógica, não está circunscrita ao seu progresso moral, somente. Como simples e ignorante, ele necessita passar pelas tribulações mundanas (físicas e morais).

E isso não implica presumir que a sua encarnação deva ser juntamente com Espíritos que já tenham experiências reencarnatórias, tampouco que o Mundo no qual ele encarnará tenha os recursos humanos já produzidos. Bastam-lhe os recursos naturais.

Fonte: NEFCA - Núcleo Espírita de Filosofia e Ciências Aplicadas
Foto: Caverna de Lauscaux na França

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Quando o mundo despertou

Por Octávio Caúmo Serrano

Embora os fenômenos sempre fossem abundantes, havia um total desconhecimento das leis da natureza e as ações do plano divino eram tomadas por sobrenaturais. Tudo muito místico e apavorante. Com a chegada do Espiritismo, iniciado na obra que conhecemos como “O Livro dos Espíritos”, tudo passou a ser natural e analisado pela lógica do pensamento. Evidentemente, dentro das possibilidades de cada um, ainda restritos que somos pelas limitações humanas.

O pouco que já sabemos, contudo, enaltece e explica a assertiva de Jesus que nos orientou dizendo que o conhecimento da verdade seria a libertação. Por isso cientistas do porte de Isaac Newton dizem que “o que sabemos é uma gota e o que ignoramos é um oceano”.

Com a chegada do Espiritismo, apesar das limitações que nos impedem a sua total compreensão, sabemos, ao menos, que Deus não comete injustiças e que ninguém no solo do planeta está pagando dívidas que não contraiu. Cada um deve ressarcir a lei individualmente, para quitar suas contas passadas e incorporá-las como experiência de aprendizado, a verdadeira sabedoria que o homem conquista e que quase nunca pode ser obtida nos bancos acadêmicos. Esses dão a informação, o conhecimento, mas não a sapiência, porque ela é produto da experimentação pessoal e cada um deve buscá-la por si próprio.

Com as revelações espíritas, o pânico da morte foi amenizado, embora ainda não estejamos em condições de compreendê-la por inteiro. Mas a morte, como perda do bem mais precioso – a vida – e a separação definitiva daqueles a quem amamos, já é crença do passado. A morte espírita é o prêmio que recebemos por cumprir a pena que nos competia no vale das aflições purificadoras neste purgatório da encarnação. É o final da pena da clausura que nos dá direito à liberdade. Numa expressão comum, é a volta para casa depois de perigosa viagem ao covil dos habitantes dos mundos atrasados.

Com a chegada do Espiritismo, passamos a ser o primeiro herdeiro de nossa herança, o primeiro médico para a nossa doença e o primeiro doutrinador para as nossas perturbações espirituais. A função do Espiritismo, basicamente, é o combate ao materialismo, para que possamos produzir com os bens da Terra os tesouros do céu, aquele que o ladrão não rouba. O nosso real acervo e a nossa verdadeira propriedade, conforme consta do capítulo XVI, item 9 de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”.

Com a chegada do Espiritismo, riqueza e pobreza, inteligência e idiotia, beleza e fealdade passaram a ser simples consequências de encarnações que já vivemos, nas quais fomos descuidados quanto ao que nos competia no progresso individual e também no coletivo. Como herança do passado, vivemos o presente. Tomara tenhamos cuidado para fazer do presente um mais agradável futuro.

Ao aprender que somos um espírito eterno que nada pode destruir, e que todo o conhecimento que acumulamos é patrimônio inalienável e jamais nos será tirado, seja qual for o regime de governo, a luta vale mais a pena e deve ir até o último dia de vida na matéria, independente dos obstáculos a serem vividos. Se conseguirmos adquirir uma virtude nesta encarnação, por exemplo, a paciência, seremos criaturas pacientes por toda a eternidade.

A confirmação do que dizemos está na questão 894 de “O Livro dos Espíritos”. Quando indagaram dos superiores: “As pessoas que fazem o bem espontaneamente, sem que tenham de lutar contra nenhum sentimento contrário, têm o mesmo mérito que as que têm de lutar contra sua própria natureza e superá-la?, a resposta foi que “Só não precisam lutar os que já progrediram; lutaram anteriormente e triunfaram. Por isso os bons sentimentos não lhes custam nenhum esforço e suas ações parecem tão simples; para eles, o bem se tornou um hábito. Portanto, deve-se honrá-los como a velhos guerreiros que conquistaram suas graduações”.

“Como vocês ainda estão longe da perfeição, esses exemplos os assustam pelo contraste e tanto mais admiram quanto mais raros são. No entanto, saibam que nos mundos mais adiantados que o seu o que entre vocês é exceção lá é regra. Nos mundos adiantados, o sentimento do bem se encontra por toda parte, de maneira espontânea, porque são mundos habitados apenas por Espíritos bons e uma única má intenção seria uma monstruosa exceção. Esta é a razão porque lá os homens são felizes. E assim será a Terra quando a humanidade for transformada e quando compreender e praticar a caridade em sua verdadeira acepção.”

Aprendemos que nossos erros são nosso carrasco e nossos acertos o nosso advogado no dia do julgamento final, independente das alegrias ou problemas que nos causem já nesta mesma encarnação. Para quem não acredita na continuidade da vida e na necessidade da volta reparatória pelo verdadeiro perdão de Deus que é a reencarnação, o caminho é mais penoso, embora todos um dia compreenderão essas verdades porque têm no íntimo de sua alma a centelha que os identifica como filhos do Criador. Para nós, todavia, o caminho pode ser mais suave se além de crermos nos decidirmos a viver de acordo com o que já conhecemos.

18 de abril de 1857, data da proclamação da independência da humanidade. Ninguém mais está preso a algo que não queira, a menos que insista em sofrer apesar de toda a liberdade que tem para ser feliz. O missionário francês que fez a ligação entre Deus e os homens, com a intermediação dos Espíritos Superiores, num gesto de humildade usou o pseudônimo Allan Kardec para assinar “O Livro dos Espíritos”, esta extraordinária obra que é a carta de alforria para todas as criaturas. Que Deus o abençoe e o recompense.

Publicado em Abril de 2010
Revista RIE – Revista Internacional de Espiritismo

"O Blog dos Espíritas" passa de cem mil acessos

Desde que "O Blog dos Espíritas" colocou um contador para medir a sua visitação, em trinta de outubro de 2009, que temos registrado um grande índice de visitantes, o que confirma que nossa luta pela correta divulgação da Doutrina Espírita e a defesa da pureza doutrinária, sem os excessos místicos e religiosos encontrados no movimento espírita brasileiro, tem conseguido a simpatia de muitos adeptos.

Não à toa superamos a marca de cem mil visitantes, que nos visitam para conhecer a Doutrina Espírita, seus grandes pensadores, as polêmicas existentes no movimento, mas, acima de tudo, conhecer o trabalho realizado por Allan Kardec.

Agradecemos a todos aqueles que entram em contato conosco, com suas dúvidas e sugestões, e o interesse demonstrado por nosso blog desde 2009. Isso nos motiva a nos manter no foco traçado.

Muito obrigado.

domingo, 12 de junho de 2011

Parapsicología Y Espiritismo

Por Francisco Amado

Clique aqui para a versão em português.

Los adversarios del Espiritismo desconocen todo al respecto y hacen tremenda confusión. Los propios Espiritas, a su vez, en su abrumadora mayoría están en la misma situación. ¿Por qué? Es fácil explicar. Los adversarios parten del preconcepto y actúan precipitadamente. Los espiritas, en general, hacen lo mismo: formulan una idea personal de la Doctrina, un estereotipo mental al que se apegaron. Olvidando que la Doctrina está en las Obras Básicas.

No hay razones sensatas para el combate tan vehemente y ríspido a una doctrina – tal como se da contra el Espiritismo – que sigue el Evangelio de Jesús en toda su moral, basado en el bien y en el amor a Dios y al prójimo, discordando apenas en lo que tañe a ciertas convicciones filosóficas de algunas otras. La intolerancia religiosa es fruto de ideas preconcebidas y de la presunción de ser el dueño de la verdad. El combate al Espiritismo se debe, en la inmensa mayoría de los casos, al desconocimiento de sus ideas y a la confusión que es sembrada en el medio por aquellos que no se disponen a examinarla con racionalidad y, aun mismo así, lanzan sus juicios juzgamientos. Con todo, la doctrina de Cristo fructificó a pesar de la falsa interpretación y oposición de aquellos que no la comprendían. Si las personas que menoscaban el Espiritismo siguiesen la enseñanza del apóstol Paulo, cuando nos exhorta a examinar todo y retener lo que es bueno, ciertamente habría otro posicionamiento ante determinadas ideas que repudian sin conocimiento de causa.

Hay verdaderamente dos cosas diferentes: saber y creer que se sabe. La ciencia consiste en saber; en creer que se sabe reside la ignorancia” – (Hipócrates)

Conozca mejor algunas ideas preconcebidas por muchas personas con relación al Espiritismo:

1) ¿El Espiritismo hace uso de bolas de cristal, practicas de quiromancia, astrología, hipnotismo, magia o parapsicología?

De entre una serie de prácticas rotuladas erróneamente como espiritas, están estas y también otras como la terapia regresiva a vidas pasadas (TRVP), la transcomunicación instrumental (TCI), la cristal terapia, la cromoterapia, la ufología etc. La mayoría de ellas no posee fundamentación doctrinaria lógica, y no encuentran respaldo en las obras de Allan Kardec, por tanto, no son practicas espiritas.

Cualquier Centro Espirita que se utilice de tales prácticas se está desviando de sus verdaderos nobles objetivos. Las noticias frecuentemente vinculadas por la prensa en general de que los espiritas previenen el futuro, hicieron ofrendas a lemanja, están ligados al culto demoniaco, de entre otras, comprueban el desconocimiento que existe sobre la doctrina espirita, a pesar de su actual expansión y creciente número de adeptos. El Espiritismo no es responsable por los que abusan de su nombre y lo explotan. Así como la ciencia médica no lo es por los charlatanes que venden sus drogas o como la religión también no lo es por los sacerdotes que abusan de su ministerio.

2) ¿El Espiritismo hace macumba, despacho o cualquier otro ritual?

El Espiritismo no tiene culto material y no tiene rituales, no prescribe cualquier vestimenta, ni función sacerdotal, no usa imágenes, ni hace sacrificios de animales o seres humanos, no tiene símbolos o señales cabalísticas, no hace ceremonias matrimoniales, o de bautismo, ni exorcismo.

Resumiendo, la doctrina espirita, teniendo como principal objetivo el cultivo de los valores del Espíritu, está totalmente exenta de actos exteriores. Su nomenclatura se basa en las obras de la codificación, y sus prácticas mediúmnicas son ejecutadas dentro de un ambiente evangélico de armonía y oración, sin cualquier culto exterior o movimiento verborrea y estereotipados. Sus reuniones mediúmnicas son cerradas al público y conducidas con rigor, donde no existen velas, cantos, danzas, cigarro, bebida o cobro de tasas. Se comprende, por tanto, que cualquier culto que contenga tales prácticas, no puede y no debe recibir la designación de espirita “Dios es Espíritu, e importa que los que lo adoran lo adoren en espíritu y en verdad”. (Juan, 4:24)

3) ¿Cual es la diferencia del Espiritismo Kardecista de los otros? ¿Qué es el Espiritismo de mesa blanca?

La doctrina espirita no comporta ninguna ramificación. Como ya he hecho la pregunta "02", por sus creencias no requiere ningún ritual o aparato. La designación popular de mesa blanca puede haber advenido del hecho de que las reuniones mediúmnicas espiritas ocurren, por simple acomodación, con los participantes dispuestos alrededor de una mesa, algunas veces, con una toalla blanca puesta sobre ellas, lo que es absolutamente dispensable. Como tales reuniones tienen un carácter íntimo y privado, disciplinado y benéfico, el termino mesa blanca surgió para diferenciar el Espiritismo de otros cultos, siendo ese término utilizado popularmente también como sinónimo de Kardecista. Se trata de un equívoco generalizado, una vez que solo hay un Espiritismo – termino creado por el propio Allan Kardec – el cual tiene su base fundada en las obras básicas codificadas por el, a saber: El Libro de los Espíritus, El libro de los Mediums, El Evangelio Según el espiritismo, El Cielo y el Infierno y la Génesis. El Espiritismo no adopta prácticas exteriores para ser diferenciado. Así en esa mesa blanca, alto o bajo Espiritismo, Espiritismo elevado, etc., son sinónimos de la doctrina espirita.

4) ¿Todos los médiums son espiritas?

La mediúmnidad es una facultad inherente a cualquier persona. No todos los que tienen la capacidad de establecer un contacto mediúmnico son, por ese motivo, espiritas. Ese falso juzgamiento hace que muchas personas tengan una idea errónea de lo que es el Espiritismo y de el se aparten sin buscar conocerlo.

5) ¿Para ser espirita hay que ser médium?

El espirita es aquel que cree, estudia y sigue la doctrina espirita. Es reconocido por el esfuerzo que hace en mejorar dentro de los principios cristianos, no teniendo necesariamente que trabajar con la mediúmnidad. La facultad mediúmnica como misión, o mediunato, como todas las demás facultades, no debe ser impuesta. Una vez detectada y en acuerdo con el deseo del médium, debe ser desarrollada en sesiones espiritas apropiadas, con dedicación sincera y humildad, para ser verdaderamente productiva.

6) ¿Por qué confunden el Espiritismo con la Umbanda?

La Umbanda es un culto religioso respetado por los espiritas como todos los otros lo son, hasta aun mismo porque está amparado en el principio general de la libertad de creencia contenido en la Constitución de Brasil. Con todo, ella no es Espiritismo. Su acervo de símbolos, objetos, instrumentos, practicas etc., no se ajustan de ninguna manera a la doctrina espirita. Aquellos que confunden Umbanda con espiritismo se apegan a las siguientes afirmaciones: la Umbanda es espiritualista, rinde culto a Dios, se fundamenta en fenómenos producidos por espíritus desencarnados, acepta la reencarnación y hace caridad. Todavía, la Umbanda tiene culto material, rituales, vestimentas especificas, imágenes, altares, puntos riscados y denominaciones totalmente especiales para los médiums (cávalo) y espíritus (exus, pretos-viejos, caboclos, ibegis), que no existen en el Espiritismo. Más allá de esas abismales diferencias, la Umbanda no se rige por la codificación de Allan Kardec. Por tanto, está claro que, aunque espiritualista y teniendo características mediúmnicas, la Umbanda no constituye variante ni modalidad del espiritismo. Esa confusión se da por el desconocimiento de lo que es la doctrina espirita y consecuente interpretación errónea de los fenómenos de la mediúmnidad.

El Espiritismo es definido por Kardec como “ la ciencia que estudia el origen , la naturaleza y el destino de los Espíritus, también como su relación con el mundo corpóreo. Es al mismo tiempo, una ciencia de observación y una filosofía de consecuencias morales”.

Es el pensamiento apoyándose sobre si mismo para reajustarse a la realidad.

Las Hermanas Fox

Por Arthur Conan Doyle

Clique aqui para a versão em português.

En el mes de marzo de 1848, acontecieron en un pequeño poblado de Hydesville, en los Estados Unidos de América del Norte, los primero fenómenos espiritas de los tiempos modernos, lo que representó el preludio del advenimiento de la Doctrina Espirita, consumado con la Codificación Kardeciana.

Hydesville es un poblado típico del Estado de New York y, cuando sucedieron esos fenómenos, contaba con un pequeño número de casas de madera, del tipo más simple. En una de esas cabañas, habitaba la familia de John D. Fox, compuesta de los padres y varios hijos, entre otros Margarita, de catorce años, Katie de once años, además de Leah, que residía en otra ciudad.

La familia Fox había pasado a morar en esa casa el día 11 de diciembre de 1847. Algún tiempo después de ese cambio, sus componentes pasaron a oír arañones, ruidos insólitos y patadas, vibrando en el forro de la sala, en el suelo, en las paredes y en los muebles, los cuales pasaron a constituir verdadera preocupación para aquella humilde familia.

Todos quedaron preocupados con los acontecimientos. En una semana la señora Fox quedo grisácea. Y, como todo hacía pensar que los fenómenos estaban ligados a las dos niñas, Margaret y Kate, estas fueron apartadas de la casa. Más, en la casa de su hermano, David Fox, para donde fue Margaret, y en la casa de su Hermana Leah, cuyo nombre de casada era Sra. Fish, en Rochester, donde Kate quedó hospedada, los mismos ruidos se hicieron oír. Inauditos esfuerzos fueron dispensados para que el público ignorase esas manifestaciones; luego, sin embargo, ellas se tornaron conocidas. Leah, la hermana más vieja, tuvo que interrumpir las clases de música, pues, pasando también a ser intermediario de los fenómenos, aunque en menor escala, fue llevada a no continuar con las clases.

Los fenómenos se producían con tal intensidad que, de la casa de las hermanas Fox, pasaron a ser oídos en la residencia de Rev. A.H. Jervis, ministro metodista residente en Rochester. Luego, después, ellos también se hicieron sentir en la residencia del Diacono Hale, de Greece, ciudad vecina de Rochester.

En la noche del 31 de marzo de 1848, se descubrió un medio de entrar en contacto con la identidad espiritual que producía los fenómenos. La hija menor de la pareja, Kate, dijo, batiendo las palmas, Sr, Pe Rachado, haga lo que yo hago. De forma inmediata, se repitieron las palmadas. Cuando ella paró, el sonido también paro enseguida. Cara a aquella respuesta, Margaret, entonces, fijo, brincando; “Lo que ella había solicitado fue repetido con increíble exactitud. Kate, adelantándose, dijo, en su simplicidad infantil; ¡Oh! ¡Mama! Yo sé lo que es. Mañana es primero de abril y alguien quiere decirnos una mentira.

La señora Fox se acordó, entonces, de hacer el intento concluyente; solicitó a la entidad que diese las edades de todos sus hijos, lo que fue hecho con notable precisión.

Se había establecido, de esta forma, un sistema de comunicación con el mundo espiritual. Se creó un alfabeto convencional, por medio de pancadas y, por intermedio de ese sistema bastante rudimentario, se descubrió que el Espíritu comunicante era un antiguo vendedor ambulante de nombre Charles Rosna, que, aquel modo, procuraba revelar su presencia y entrar en contacto con las personas de la casa. El individuo portador de ese nombre fue, años antes, asesinado en la casa de Hydesville, en la cual, sin saberlo, fue a residir posteriormente la familia Fox. El asesinado revelo que había sido asesinado con un cuchillo de carnicero, cinco años antes; que el cuerpo había sido llevado a la bodega; que es sólo la noche siguiente que había sido enterrado; había pasado por la despensa, por las escaleras, y enterrado cerca de tres metros del suelo. Afirmó también que el móvil del crimen había sido el dinero, alrededor de quinientos dólares.

En la noche del 1 de Abril, comenzaron a escavar el suelo en la bodega, llegando a una masa de agua. Se procedió a nuevas investigaciones en el verano del mismo año, y fueron descubiertos hierro, carbón y cal, cabellos y huesos humanos, mientras tanto, solamente en el día 22 de noviembre de 1904, con la caída de una pared, se descubrió el esqueleto. También se encontró un cofre que perteneció al vendedor ambulante.

Después de establecer ese sistema de intercambio con el mundo espiritual, en el que los hechos narrados fueron solo apenas el preludio, otras entidades espirituales entraron a manifestarse, haciendo entre otras la revelación de que las dos hijas de Fox — Margaret e Kate — eran médiums por cuyo inconsciente e involuntaria intervención se produjeron los fenómenos. A ellas estaba reservada la misión de cooperar en el importante movimiento de ideas lo cual por semejante forma, no tardaría de atraer la atención del mundo.

Los acontecimientos tuvieron inusitada repercusión en Hydesville, en Rochester, y en otras ciudades circunvecinas.

Al transferir su residencia para Rochester, la familia de John Fox deparó con el primer óbice: el pastor de la iglesia, a la que pertenecían, íntimo a las niñas, bajo pena de expulsión, a abjurar de tales prácticas. Esa imposición fue repelida por las hermanas Fox y, por eso, ellas fueron expulsadas de aquella comunidad religiosa.

Surgieron, posteriormente, las comisiones nombradas para averiguar la veracidad de los fenómenos y se pronunciaron acerca de su naturaleza. La primera, después de larga y minuciosa pesquisa, concluyó por reconocer la veracidad de la intervención espiritual, en la producción de los hechos que el público se obstinaba en atribuir a artificio de aquellas humildes niñas sin considerar que en eso no había para ellas interés alguno. La segunda comisión fue nombrada, llegando al mismo resultado, con decepción para todos.

Nombraron por fin a una tercera comisión, compuesta de notables personas e insospechados y, cuando terminó ella su riguroso encuesta, gran parte de la población de Rochester se reunió en el mayor salón de la ciudad, conocido por Corinthian Hall, con la intención de oír los resultados.

Se dio, entonces, un hecho increíble: como la conclusión a que habían llegado los miembros de la comisión, confirmaba definitivamente, las investigaciones anteriores, el público, indignado por lo que estimaba ser una burla por parte de las jóvenes médiums, que, al lado de sus padres, aguardaban serenamente el veredicto, se levanto en actitud hostil y, en una ola aullante, pretendió invadir el recinto, con la intención de masacrarlas. Fue necesaria la pronta intervención del venerable cuáquero George Willets, para evitar aquel linchamiento. Willets llegó al extremo de decir que, si quisieran matar a las niñas, los fanáticos habrían de pasar sobre su cadáver.

Las niñas sufrieron en las manos de los investigadores. En el transcurso de las investigaciones, de las comisiones, que también tenían algunas señoras entre sus miembros, atacan a las niñas, sometiéndolas a investigaciones brutales y aflictivas. Sus vestidos que fueron amarrados, apretados a los cuerpos, y ellas colocadas sobre vidrios y otros aislantes. La comisión se vio obligada a referir que cuando ellas se hallaban de pie sobre las almohadas, con un lienzo amarrado a la borda de sus vestidos, amarradas por las caderas, todos nosotros oímos los golpes distintos en las paredes, en el suelo y en otros objetos”. Por fin, esa comisión declaró, eficazmente, que sus preguntas, de las cuales algunas fueron hechas mentalmente, habían sido respondidas correctamente.

Las persecuciones sufridas por las hermanas Fox fueron inenarrables. Un periódico denominado Rochester Democrat había tirado una edición con el titular “Exposición Completa de la Mistificación de las Batidas”. El resultado de las investigaciones obligó a su editor a para detener la distribución del periódico.

Uno de los investigadores afirmó que, si no se descubriese cualquier fraude, iba a tirarse en las Cataratas del Génesis. El tuvo que mudar de opinión en su afirmación.

En 1850, fueron recibidas en dos salas separadas, en Rochester, dos mensajes simultáneos, del Espíritu de Benjamín Franklin, cuyo tenor era el siguiente:

“Habrá grandes cambios en el siglo diecinueve. Cosas que, actualmente, parecen oscuras y misteriosas, para vosotros, se tornaran claras a vuestros ojos. Los misterios van a ser revelados. El mundo será esclarecido.”

Fuente: Historia del Espiritismo
Traducido por: M. C. R.

sábado, 11 de junho de 2011

A Emancipação da Mulher e o Espiritismo

Por Jaci Regis

Os avanços na emancipação da mulher foram conquistados por elas mesmas, a custo de muita controvérsia, ataques e incompreensões. Estamos falando da cultural cristã, ocidental.

Como foi possível pensar-se que haveria harmonia no mundo, que atingiríamos um patamar de civilização superior, deixando de lado, excluindo, mais da metade dos seres humanos?

As conquistas das mulheres rompem com um paradigma ignóbil, secular, através de todas as culturas. Todavia, a Igreja cristã não rompeu com as pressões culturais e o cristianismo não criou, quando se implantou, condições para que as mulheres tivessem acesso à cultura, ao poder e ao saber. Ao contrário, as reprimiu.

A mulher, sob o ponto de vista da moral cristã e, certamente, também pela cultura islâmica, é considerada a serpente que instalou o pecado no mundo. Adão, na teologia, foi influenciado por Eva e esta é quem, afinal, precipitou a expulsão do Paraíso pelo administrador, Jeová. A Igreja chegou a duvidar se a mulher tinha alma.

A sexualidade está no meio dessa tragédia. Objeto sexual dos homens, as mulheres sempre estiveram presentes na história, ora como heroínas, ora como prostitutas, a mais das vezes como prostitutas, mesmo sem sê-lo, sempre que rompiam certos primados moralistas e colocavam em cheque o poder masculino.

Os marcos do processo de emancipação feminina no Ocidente:
1. Direito a votar
2. Educação em todos os graus
3. Profissionalização, a princípio para determinadas profissões e, hoje, sem barreiras.
4. Liberação sexual
5. Participação política, social e empresarial.

As estruturas culturais estabelecem certos primados que se cristalizam nas mentes e permanecem através dos tempos, produzindo comportamentos que tornam o injusto em justo, os insensatos em sensatos. A divisão do trabalho entre homens e mulheres, embora não uniforme em todas as culturas, privilegiou o homem e concebeu uma forma de dominação a qual, devido às pressões culturais e religiosas, foi absorvida, aceita e transmitida, mesmo pelas próprias mulheres.

Por isso, sempre que esse modelo é rompido, instala-se a inquietação; as mudanças de paradigmas confundem e abrem, para a maioria, em determinado momento, um abismo de dissolução social, de perda de limites.

Com o tempo, quase sempre, as coisas se acomodam, com largo período de transição em que o rompimento se transforma em transgressão, dando oportunidade à exaltação de certos instintos reprimidos.

Hoje, nos regimes muçulmanos, a mulher é objeto sexual e reprimida, inclusive com chicotadas, com a obrigação de cobrir o corpo.

Mas a cultura ocidental também discriminou o corpo. Objeto de censura pela Igreja, estabeleceu uma dicotomia entre alma e corpo. Este, devido a ser veículo da sexualidade, foi considerado objeto de concupiscência, de pecado. Escondê-lo, não tocá-lo mesmo, em algumas situações, era providência de salvaguarda do pecado.

O corpo da mulher, especialmente, foi objeto de ordenações moralistas, incluídas em livros sagrados das religiões.

A partir do término da Segunda Guerra Mundial, todavia, o corpo da mulher foi cada vez mais exposto, até chegar à nudez completa em teatros, televisão, cinema e revistas, quando não em público comum.

A emancipação de grande parte das mulheres ocidentais, porque há muitas ainda sob o regime repressivo, direto ou indireto, aceito e concedido por sociedades específicas, marca o desenvolvimento da cultura dos países do Ocidente.

Fatalmente chegará às culturas islâmicas e, mais tarde, à africana, incluindo aí também o mundo asiático, tão cheio de nuanças e labirintos comportamentais.

Lembremo-nos de que na China, por exemplo, nascer mulher é um estorvo que justifica o sacrifício de meninas ou seu abandono. No resto da Ásia, a mulher perambula entre o Islamismo e crenças múltiplas, que chamaremos para simplificar, de budistas, onde o casamento é um negócio entre famílias e a mulher objeto, precisando, em muitos casos, de dotes para conseguir um marido.

Na África, a mutilação do clitóris nas meninas é produto da ignorância e da negação do prazer às mulheres. Aliás, a negação do prazer sexual da mulher foi prática adotada também pela cultura ocidental, que pregava que o orgasmo feminino era sinal de inferioridade moral.

A emancipação da mulher, como vimos, não é simples questão de progresso social e libertação de uma grande parte do gênero humano. Implica em mudanças radicais nas estruturas sociais, familiares, religiosas e humanas. Resulta na inclusão e modificação de costumes, leis, formas de relação, direitos e deveres.

PODERIA SER PIONEIRO, MAS...

O Livro dos Espíritos, em 1857, consagrou a emancipação da mulher como sinal de progresso da civilização. Mas, poderemos afirmar que a emancipação da mulher é que produz o progresso, pelo menos em grande parte.

822-a – De acordo com isso, para uma legislação ser perfeitamente justa deve consagrar a igualdade de direitos entre o homem e a mulher?

– De direitos, sim; de funções, não. É necessário que cada um tenha um lugar determinado; que o homem se ocupe de fora e a mulher do lar, cada um segundo a sua aptidão. A lei humana para ser justa deve consagrar a igualdade de direitos entre o homem e a mulher; todo privilégio concedido a um ou a outro é contrário à justiça. A emancipação da mulher segue o processo da civilização, sua escravização marcha com a barbárie. Os sexos, aliás, só existem na organização física, pois os Espíritos podem tomar um e outro, não havendo diferenças entre eles a esse respeito. Por conseguinte, devem gozar dos mesmos direitos.

A questão 822-a deve ser analisada em duas partes. A primeira é contextual. Refere-se ao momento social, político e religioso da época, pois ao estabelecer as funções do homem e da mulher de forma tão radical, está superada pelos fatos.

A segunda, ao contrário, é permanente, universal. Trata da emancipação da mulher como direito adquirido a ser reconhecido, necessariamente, como sinal de progresso e civilização.

Infelizmente o movimento espírita, cuja identidade jamais foi realmente libertadora, por copiar, absorver e aceitar as diretrizes da cultura cristã, não promoveu, pioneiramente, a emancipação da mulher. Basta ver alguns exemplos.

Em 1939, respondendo a uma série de questões, o espírito Emmanuel, tido como o orientador do movimento espírita brasileiro, deu respostas que integraram o livro “O Consolador”, no qual sedimenta o desejo, de roustainguistas e cristãos, em transformar o Espiritismo numa religião e onde, de modo geral, desconhece a orientação de Kardec.

Inquirido sobre o movimento feminista, na questão 67, ele afirma: “A ideologia feminista dos tempos modernos, porém, com suas diversas bandeiras políticas e sociais, pode ser um veneno para a mulher desavisada dos seus grandes deveres espirituais na face da Terra. Se existe um feminismo legítimo esse deve ser o da reeducação da mulher para o lar, nunca para uma ação contraproducente fora dele. É que os problemas femininos não poderão ser solucionados pelos códigos do homem, mas somente à luz generosa e divina do Evangelho.”

Seguindo essa orientação, o movimento espírita, em geral, fixou-se em pontos hoje superados e o foram pela força da opinião pública, pelo esforço de “materialistas” e contra as pressões da Igreja e outras religiões, inclusive o Espiritismo cristão.

Na questão 189 do mesmo livro, respondendo sobre “O que deve fazer a mãe terrestre para cumprir evangelicamente os seus deveres, conduzindo os filhos para o bem e para a verdade?” Emmanuel, depois de enumerar algumas das tarefas sacrificiais e superlativas que a mãe deveria desempenhar, conclui: “Buscará na piedosa Mãe de Jesus, o símbolo das virtudes cristãs, transmitindo aos que a cercam os dons sublimes da humildade e da perseverança, sem qualquer preocupação com as glórias efêmeras da vida material.”

A figura da Virgem Maria foi tomada pela Igreja como símbolo de perfeição, de virtudes excelsas, enfim, como o exemplo maior a seguir, sexual e mundanamente.

Esse modelo infelicitou as mulheres e foi usado machistamente pelos poderes da religião católica para sufocá-las, tanto quanto o Alcorão tem sido usado para mantê-las à margem da sociedade, sob o tacão do homem.

Vejamos algumas posições do movimento espírita sobre a questão feminina:

Divórcio – Embora Kardec já o aceitasse, os religiosos espíritas sempre foram contra. Alegaram que todos os casamentos eram preparados antes da encarnação e tinham no bojo o compromisso de resgatar erros do passado, devendo, pois, serem mantidos a qualquer custo.

Controle da Natalidade – Os religiosos espíritas se postaram contra, por ferir a lei divina e acreditavam que o número de filhos teria sido combinado antes da encarnação e que o casal não temesse que fora desse limite não teria filhos. Por isso a pílula anticoncepcional foi rejeitada. Só passou a ser aceita quando Frâncico Cândido Xavier, no famoso programa da TV Tupi, Pinga Fogo (1971), foi a favor.

Sexualidade em Geral e da Mulher em Especial – As análises são geralmente moralistas e fora do contexto real. Vicejaram nos meios doutrinários as mesmas histórias sobre o papel da mulher como regeneradora do homem.

Lembro-me de uma historiazinha, creio que num folheto editado pela Federação Espírita Brasileira (FEB), na qual a cena se passa numa estrada onde um homem preguiçoso estava deitado, enquanto uma mulher passava levando um fardo. Um observador perguntou ao Instrutor qual seria o destino daquela mulher. E ele disse: casar-se com o preguiçoso para regenerá-lo.

Poderíamos chamar o movimento espírita de machista e as mulheres espíritas, até algum tempo atrás (e quantas já se libertaram?) de acomodadas com as histórias dos erros da vida passada, com a conformação com casamentos castradores em nome do resgate de dívidas.

Esse engessamento da vontade é contrário à Lei Divina.

Claro que sempre se falou do livre-arbítrio, mas com o dedo em riste sobre as consequências da liberdade. Por isso, ainda hoje se diz que é melhor aguentar o peso da frustração para gozar no Além ou em outras encarnações.

ENSINO ATUAL, MAS...

Os ensinos espíritas, de modo geral, são muito atuais. O problema tem sido a sua interpretação, muito conforme os princípios do cristianismo, por sua natureza castradora da mulher. Na Igreja, só os padres têm o poder divino. As mulheres eram servas e, muitas, desterradas pela falsa fé aos conventos carmelitas onde se privaram do ar, da vida, da sexualidade, do amor, para perder-se em orações infindáveis por onde tentavam canalizar a energia vital reprimida.

Não podemos esquecer o quadro das realidades espirituais que as múltiplas vidas nos apresentam. Mas aprisionar o Espírito a possíveis erros e “pecados” do passado é castrá-lo e é, por fim, uma atitude negativa.

De modo geral, o movimento espírita é conservador no sentido de que se separa da realidade existencial, política e humana, centrando-se no comércio com os mortos, na assistência social e na evangelização, no seu sentido mais estrito de salvação e superação pela privação dos problemas da alma.

As palestras são de modo geral superficiais e doutrinantes.

Allan Kardec disse que pelo seu poder moralizador, por suas tendências progressistas, pela amplitude de suas vistas, pela generalidade das questões que abrange, o Espiritismo é mais apto do que qualquer outra doutrina a secundar o movimento de regeneração. (A Gênese - cap. XVIII, item 25).

Das duas uma: ou Kardec estava delirando, pensando num Espiritismo atuante, progressista e revolucionário ou os dirigentes espíritas não têm capacidade, disposição ou cultura para entender o que ele pretendeu para a Doutrina.

Fonte: Jornal de Cultura Espírita “Abertura” - dezembro de 2001, ano XIV, nº 166 - Santos-SP.

Jaci Regis (1932-2010), psicólogo, jornalista, economista e escritor espírita, foi o fundador e presidente do Instituto Cultural Kardecista de Santos (ICKS), idealizador do Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita (SBPE), fundador e editor do jornal de cultura espírita “Abertura” e autor dos livros “Amor, Casamento & Família”, “Comportamento Espírita”, “Uma Nova Visão do Homem e do Mundo”, “A Delicada Questão do Sexo e do Amor”, “Novo Pensar - Deus, Homem e Mundo”, dentre outros.

Retirado do site Via Pense - http://viasantos.com/pense/arquivo/1318.html

sábado, 4 de junho de 2011

O Rustenismo nas obras de Chico Xavier

Por Sérgio Aleixo

O rustenismo é deturpação perigosa, porque se alastra sorrateiro, não em suas obras principais, mas mediante livros psicografados por Chico Xavier. Conforme prevê o assim chamado “Pacto Áureo” (05/10/1949), “cabe aos espíritas do Brasil porem em prática a exposição contida no livro Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, de maneira a acelerar a marcha evolutiva do Espiritismo”. Pois bem! Isto passou ao art. 63 do estatuto da Casa-Máter do rustenismo no mundo, que registra:

O Conselho [Federativo Nacional da F.E.B.] fará sentir a todas as sociedades espíritas do Brasil que lhes cabe pôr em prática a exposição contida no livro Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, de Francisco Cândido Xavier.

Entre outras piadas de além-túmulo, no capítulo I desta obra, “a amargura divina” de Jesus “empolga” toda uma “formosa assembleia de querubins e arcanjos” e ele, “que dirige este globo”,[1] não sabe sequer onde é o Brasil. Não bastasse isto, no cap. XXII, o confuso Roustaing emerge do estatuto da F.E.B. para ser equiparado a L. Denis e a G. Delanne, figurando adiante destes na condição de cooperador de Kardec para “o trabalho da fé”. Subsiste ainda o questionamento levantado por Julio Abreu Filho em O Verbo e a Carne, isto é, por que Humberto de Campos se referiu a Roustaing, Denis e Delanne em Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho de 1938 e, no livro Crônicas de Além-Túmulo, de 1937, reportou-se tão só a Denis e Delanne?

Em O Consolador, de Emmanuel, há, igualmente, certas estranhezas. Será que houve, então, uma afronta à integridade conceitual do movimento espírita, do tipo “pílula dourada”, sob a chancela do trabalho do médium de maior projeção dos últimos tempos? Foi isto à revelia dele ou, por outra, com sua anuência? Mas como provar qualquer hipótese? Da própria F.E.B., em 1942, Chico Xavier recebeu a informação de que seus originais, após publicação, eram inutilizados por aquela instituição.[2]

A contradição seguinte parece mesmo sugerir o douramento da pílula rustenista na obra de Chico Xavier: o problema do Espírito Santo, expresso nos ns. 303 e 312 de O Consolador. O Espírito Santo não pode ser “a centelha do espírito divino, que se encontra no âmago de todas as criaturas” e, a um só tempo, uma “falange de Espíritos”. Só a primeira resposta, à questão 303, faz sentido à luz do Evangelho e da codificação kardeciana. Já a segunda, à pergunta 312, reflete o rustenismo e, se for interpolação febiana, que ironia, porque se esmera em elucidar outra interpolação, mas bíblica.

O texto oferecido pelo interlocutor da F.E.B. (negritado abaixo), conforme parecer insuspeito do tradutor da Bíblia de Jerusalém (Paulinas, 1985), apresenta “um inciso ausente dos antigos manuscritos gregos, das antigas versões e dos melhores manuscritos da Vulgata, [...] uma glosa marginal introduzida posteriormente” em 1.ª João, cap. 5, vv. 7-8, onde se lê: “Porque há três que testemunham [no céu: o Pai, o Verbo e o Espírito Santo, e esses três são um só; há três que testemunham na terra]: o espírito, a água e o sangue, e esses três são um só”.

Portanto, o interlocutor febiano, no n. 312 de O Consolador, driblou a parte do texto bíblico que se refere ao testemunho de Jesus em “espírito, água e sangue”, para só se referir à glosa marginal, ensejando a Emmanuel esta interpretação da Trindade: “Pai” => Deus, “Verbo” => Jesus, e “Espírito Santo” => “legião dos Espíritos redimidos e santificados que cooperam com o Divino Mestre, desde os primeiros dias da organização terrestre”. Definição tipicamente rustenista do Espírito Santo, assim como, por vezes, do Espírito da Verdade e mesmo do Consolador: “conjunto dos Espíritos puros, dos Espíritos superiores e dos bons Espíritos”; ou “falange sagrada dos Espíritos do Senhor”.[3]

Há, no entanto, um prefácio amistoso de Emmanuel ao livro Vida de Jesus, de Antonio Lima (F.E.B.) Na obra é defendida a tese do corpo meramente fluídico do Cristo. Da mesma forma em relação a Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, que menciona Roustaing ao lado de Delanne e Denis como cooperador de Kardec, e que é prefaciado por Emmanuel. Sobre A Grande Síntese, de P. Ubaldi, escritor que reeditou a queda angélica e a involução como pressuposto para a evolução, postulados afins do rustenismo, o jesuíta disse:

Aqui, fala a Sua Voz [de Jesus] divina e doce, austera e compassiva. [...] é o Evangelho da Ciência, renovando todas as capacidades da religião e da filosofia, reunindo-as à revelação espiritual e restaurando o messianismo do Cristo, em todos os institutos da evolução terrestre. Curvemo-nos diante da misericórdia do Mestre e agradeçamos de coração genuflexo a sua bondade. Acerquemo-nos deste altar da esperança e da sabedoria, onde a ciência e a fé se irmanam para Deus.[4]

Ante um comunicado destes, natural é que alguns mais exaltados digam que Kardec foi superado por Ubaldi. Quanto a este pensador italiano, ao indigesto Roustaing e até ao excêntrico Ramatis, será que adeptos de suas doutrinas heterodoxas podem ter pleiteado para publicações afins o “aval” dos já cultuados instrutores de Chico Xavier, na intenção de facilitar a infiltração de tais obras no movimento espírita? E Chico? Analisava tudo? Infelizmente, não. Ele dizia que não era da sua competência entrar na apreciação sequer dos livros que psicografava, sendo um simples “animal de carga”.[5] E os Espíritos que davam os “avais”? Eram mesmo os seus guias? Em caso positivo, são confiáveis?

Normal é que o estudioso se reserve o direito de duvidar, até porque a codificação kardeciana assegura que “o melhor [médium] é o que, simpatizando somente com os bons Espíritos, tem sido enganado menos vezes”, assim como preconiza que, “por melhor que seja um médium, jamais é tão perfeito que não tenha um lado fraco, pelo qual possa ser atacado”.[6] Kardec já advertira também: “Pelo próprio fato de o médium não ser perfeito, Espíritos levianos, embusteiros e mentirosos podem interferir em suas comunicações, alterar-lhes a pureza e induzir em erro o médium e os que a ele se dirigem”. Consignara o mestre que este é, sim, “o maior escolho do Espiritismo” e que o meio determinante para evitá-lo é o “discernimento”; e por quê? Kardec assim responde:

As boas intenções, a própria moralidade do médium nem sempre são suficientes para o preservarem da ingerência dos Espíritos levianos, mentirosos ou pseudossábios, nas comunicações. Além dos defeitos de seu próprio Espírito, pode dar-lhes guarida por outras causas, das quais a principal é a fraqueza de caráter e uma confiança excessiva na invariável superioridade dos Espíritos que com ele se comunicam.[7]

O problema, todavia, é mais complexo, transcende a simetria óbvia entre a F.E.B. e a obra de Roustaing. Não constitui rustenismo a doutrina das almas gêmeas, que, segundo Emmanuel, são criadas umas para as outras e umas às outras destinadas na eternidade, contrariando o comentário kardeciano ao n. 303-a de O Livro dos Espíritos, que diz: “É necessário rejeitar esta ideia de que dois espíritos, criados um para o outro, devem um dia fatalmente reunir-se na eternidade”. A F.E.B. até questionou o ensino das almas gêmeas na obra O Consolador, ali o deixando, contudo, a pedido do próprio jesuíta.[8]

Quanto a isto, já não faz o menor sentido a hipótese de interpolação da Casa-Máter por força do rustenismo, que nunca professou a existência de almas gêmeas, assim como jamais disse, por exemplo, que Marte é mais avançado em civilização do que a Terra, ou que os exilados adâmicos vieram de um suposto orbe não purificado física e moralmente, que guarda muitas afinidades com nosso mundo e orbitaria o “magnífico sol” Capela; na verdade, segundo a astronomia, um sistema de sóis com ausência de planetas.[9]

De fato, consta que Emmanuel teria dito a Chico Xavier que deveria permanecer com Jesus e Kardec caso lhe aconselhasse algo em desacordo com as palavras de ambos.[10] Mas nenhum ensino contrário a Kardec deixou de ser publicado por essa razão. Eis o fato.[11] De mais consistente lógica e de melhor proveito à clareza analítica, portanto, é que se atribua ao próprio Emmanuel tudo aquilo que dos seus livros conste. Só Chico Xavier teve o poder de dirimir as dúvidas, mas nunca o fez, nunca levantou uma suspeita sequer sobre a F.E.B.; ao contrário, não é difícil encontrar-lhe pronunciamentos com os mais efusivos aplausos à Casa do “Anjo” Ismael, assim como ao grande J. Herculano Pires, maior opositor do rustenismo febiano. O médium sempre aparece ao lado de todos os partidos.

De tudo, restam os objetos, milhares de milhares de livros, o papel e a tinta, a confusão nas estantes, sempre bem acessível aos neófitos que chegam às casas espíritas e aos incautos leitores em busca de um Consolador que lhes dê milagrosas respostas. Só se pode julgar do que foi publicado. Eis a verdade. Cabe, pois, aos espíritas atentos a apreciação rigorosa de toda obra mediúnica, segundo os padrões de Kardec. Este deve ser o procedimento dos adeptos estudiosos, e a produção atribuída a qualquer Espírito não pode nem deve escapar a isso, seja quem for ou quem se diga ser.

Não passa de temeridade, com lamentáveis consequências já em curso, a ideia de que não se deve agir deste modo para não confundir ou chocar os simples. Na prática, isto é licitar ao Espiritismo que erros manifestos sejam arrolados à conta de patrimônio das consolações que prodigaliza a seus adeptos.

Encaminhemos os simples à segurança e pureza da fonte original do Espiritismo, à codificação kardeciana, em vez de entretê-los com equívocos que, mais tarde, os surpreenderão desprevenidos e, quem sabe, os convidarão à apostasia. O que disse Erasto a Kardec?

Deve-se eliminar sem piedade toda palavra e toda frase equívocas, conservando no ditado somente o que a lógica aprova ou o que a Doutrina já ensinou. [...] Na dúvida, abstém-te, diz um dos vossos antigos provérbios. Não admitais, pois, o que não for para vós de evidência inegável. Ao aparecer uma nova opinião, por menos que vos pareça duvidosa, passai-a pelo crivo da razão e da lógica. O que a razão e o bom-senso reprovam, rejeitai corajosamente. Mais vale rejeitar dez verdades do que admitir uma única mentira, uma única teoria falsa. Com efeito, sobre essa teoria poderíeis edificar todo um sistema que desmoronaria ao primeiro sopro da verdade, como um monumento construído sobre a areia movediça.[12]

Para o movimento espírita, no entanto, isto não há passado de meras frases de efeito, inseridas em retóricas quase sempre desmentidas pelo cotidiano institucional da maior parte dos adeptos do espiritismo à moda da Casa-Máter do rustenismo. Sobre o assunto espinhoso deste capítulo, decerto que muito a propósito são as reflexões de nosso valoroso confrade Artur Felipe de A. Ferreira, em seu artigo “De Que Lado Está Emmanuel?”.[13]

[1] Revista Espírita. Jan/1864. Um Caso de Possessão. Senhorita Júlia. Nota: O sábio Hahnemann é quem afirma ali que o Espírito de Verdade dirige este globo, ou seja, a Terra.
[2] Cf. SCHUBERT, Sueli Caldas. Testemunhos de Chico Xavier, p. 23-24. Apud DA SILVA, Gélio Lacerda. Conscientização Espírita. Chico Xavier, Emmanuel e a F.E.B.
[3] Os Quatro Evangelhos. Vol. I, n. 9; Vol. II, n. 187; Vol. IV, n. 1. Nota: Quanto ao Espírito da Verdade, é curioso, o rustenismo muito se divide, porque subsiste na obra a instrução dos bons Espíritos que, em Bordéus — na casa de Roustaing e na de Sabo —, chegaram a revelar que se tratava de Jesus, como o próprio advogado fez questão de consignar a Kardec, bem antes do cisma que promoveria. (Cf. Revista Espírita. Jun/1861. Correspondência.) Evidentemente, os Espíritos que passaram a substituir os Iniciadores se valeram de uma autêntica revelação destes para impor aos bordeleses mais incautos lamentáveis sistemáticas a título de comandos do Cristo, de Moisés, dos evangelistas, de Maria e dos apóstolos. J.-B. Roustaing, infelizmente, faliu ante provável missão que não chegou a cumprir, tornando um pouco mais árdua a gigantesca tarefa do gênio lionês. Não foi sem motivo que disse o mestre sobre o livro rustenista: “[...] ao lado de coisas duvidosas, em nosso ponto de vista, encerra outras incontestavelmente boas e verdadeiras, e será consultada com proveito pelos espíritas sérios [...]”. (Revista Espírita. Jun/1866. Os Evangelhos Explicados.)
[4] Ob. cit. 18.ª ed. Trad.: Carlos Torres Pastorino e Paulo Vieira da Silva. Vol. II.
[5] Cf. Emmanuel. 15.ª ed., F.E.B., Prefácio, p. 21. Cf. DVD Pinga-Fogo 2. Clube de Arte. Cf. ALEIXO. Ensaios da Hora Extrema. Não Há Médiuns Infalíveis. http://ensaiosdahoraextrema.blogspot.com/2011_02_21_archive.html.
[6] O Livro dos Médiuns. XX, 226, 9.ª e 10.ª
[7] Revista Espírita. Fev/1859. Escolhos dos Médiuns.
[8] Cf. n. 323 e nota à primeira edição.
[9] Cf. Emmanuel, “A Tarefa dos Guias Espirituais”. A Caminho da Luz, cap. 3. Cf. ALEIXO. Ensaios da Hora Extrema. Kardec e os Exilados. http://ensaiosdahoraextrema.blogspot.com/2010_03_29_archive.html
[10] Diálogo dos Vivos [em parceria com Herculano Pires], cap. 23: Permanecer com Jesus e Kardec.
[11] Cf. ALEIXO. Ensaios da Hora Extrema. Léon Denis, Emmanuel e as Almas Gêmeas; Mística Marciana e Segurança Doutrinária; Kardec e os Exilados; Sobre André Luiz. http://ensaiosdahoraextrema.blogspot.com/.
[12] O Livro dos Médiuns, 230.
[13] http://coerenciaespirita.blogspot.com/2008/10/de-que-lado-est-emmanuel.html

Fonte: O Primado de Kardec - http://oprimadodekardec.blogspot.com/2011/02/capitulo-13-o-rustenismo-nas-obras-de.html

A Postura de Kardec

Por Sérgio Aleixo

Pode-se ler em Os Quatro Evangelhos de J.-B. Roustaing — Resposta a seus Críticos e a seus Adversários [1883] que o próprio advogado de Bordéus admitiu ser a análise de Kardec, na Revista Espírita de junho de 1866, “o mais belo enterro de primeira classe que se pudera desejar” para a Revelação da Revelação.[1]

O parecer de Kardec julgou prolixo o livro que o advogado bordelês lhe remetera já desde sua apresentação original, em três volumes. O mestre disse: “A nosso ver, se a obra se tivesse limitado ao estritamente necessário, poderia ter sido reduzida a dois, ou mesmo a um só volume, com isso ganhando em popularidade”. E ainda assim a F.E.B. houve por bem publicá-la em quatro tomos. Prova do quanto valiam para alguns de seus diretores as sábias orientações de Allan Kardec.

Em face da crítica meridiana do mestre lionês, os volumes em exame foram considerados pela quase totalidade dos espíritas, no dizer do próprio Roustaing, “uma obra inútil”.[2] Este, o real motivo do descontrole do advogado bordelês e de seus discípulos ao acusarem o Codificador da Doutrina Espírita — pasmem — de autoritarismo, ostracismo, infalibilidade e até falsa sabedoria, ignorância.[3]

Em janeiro do ano de publicação da Resposta rustenista a seus críticos e adversários desencarnou a viúva de Kardec. Nem estas ilustres memórias os discípulos de Roustaing foram capazes de respeitar. O advogado bordelês partira já em 1879. Quatro anos antes. Enquanto entre os vivos estiveram Kardec e sua doce Gabi, aqueles dissidentes declarados não ousaram enfrentar-lhes o que teria sido a merecida réplica, que coube, por fim, ao Jornal Le Spiritisme, da União Espírita Francesa, com a edição de J.-B. Roustaing perante o Espiritismo — Resposta a seus discípulos.

Esta réplica do Le Spiritisme se encontra sem tradução para o vernáculo porque, aos viajados rustenistas, não interessou tal publicação, a eles que se dizem tão interessados na grandeza da Causa Espírita. Que publiquem este histórico contraditório da União Espírita Francesa e mostrem ao menos esta nesga de amor à História do Espiritismo sem o vil desejo de reescrevê-la a favor de sua seita dissidente.

O debate sério era procedimento habitual do Codificador; ao contrário do que acontece nos meios paroquianos do movimento espírita, esquecidos do Kardec histórico. Os seguintes tópicos bem o lembram:

Nossa Revista será, assim, uma tribuna livre, em que a discussão jamais se afastará das normas da mais estrita conveniência. Numa palavra: discutiremos, mas não disputaremos.[4]

[...] jamais daremos satisfação aos amantes do escândalo. Entretanto, há polêmica e polêmica; uma há, diante da qual jamais recuaremos: é a discussão séria dos princípios que professamos. [...] É a isso que chamamos polêmica útil, e o será sempre quando ocorrer entre pessoas sérias que se respeitam bastante para não se afastarem das conveniências. Podemos pensar de modo diverso sem, por isso, deixar de nos estimarmos.[5]

O Espiritismo quer ser claro para todos e não deixar aos seus futuros adeptos nenhum motivo para discussão de palavras. Por isso todos os pontos susceptíveis de interpretação serão elucidados sucessivamente.[6]

Por maior, mais bela e justa que seja uma ideia, é impossível que reúna, desde o princípio, todas as opiniões. Os conflitos que dela resultam são a consequência inevitável do movimento que se processa, e são mesmo necessários, para melhor fazer ressaltar a verdade. É também útil que eles surjam no começo, para que as ideias falsas sejam mais rapidamente desgastadas.[7]

Achar os espíritas em falta e em contradição com seus princípios seria uma boa sorte para os seus adversários; assim, vede como se empenham em acusar o Espiritismo de todas as aberrações e de todas as excentricidades pelas quais não poderia ser responsável. A doutrina não é ambígua em nenhuma de suas partes; é clara, precisa, categórica nos mínimos detalhes; só a ignorância e a má-fé podem enganar-se sobre o que ela aprova ou condena. É, pois, um dever de todos os espíritas sinceros e devotados repudiar e desaprovar abertamente, em seu nome, os abusos de todo gênero que pudessem comprometê-la, a fim de não lhes assumir a responsabilidade. Pactuar com os abusos seria acumpliciar-se com eles e fornecer armas aos adversários.[8]

Somos absolutos demais em nossas ideias? Somos um cabeça-dura com quem nada se pode fazer? Ah! meu Deus! cada um tem os seus pequenos defeitos; temos o de não pensar ora branco, ora preto; temos uma linha traçada e dela não nos desviaremos para agradar a quem quer que seja. É provável que sejamos assim até o fim. [...]

Falar dessas opiniões divergentes que, em última análise, se reduzem a algumas individualidades, e em parte alguma formam corpo, não será, talvez digam algumas pessoas, ligar a isto muita importância, assustar os adeptos fazendo-os crer em cisões mais profundas do que realmente o são? não é, também, fornecer armas aos inimigos do Espiritismo?

É precisamente para prevenir esses inconvenientes que disto falamos. Uma explicação clara e categórica, que reduz a questão ao seu justo valor, é mais adequada para assegurar do que para amedrontar os adeptos; eles sabem como proceder e aí encontram argumentos para a réplica.[9]

Em sua análise de Os Quatro Evangelhos,[10] Kardec mostrou a elegância de um verdadeiro missionário: lúcido, equilibrado, leal, mas firme, decidido, ciente da justeza de suas razões. O mestre deixou aos Espíritos que ditaram a suposta Revelação da Revelação a responsabilidade pelas coisas “duvidosas” que disseram, como as adjetivou o próprio Codificador. Ainda assim, recomendou sua leitura aos conscienciosos.

Confiante na razão, Kardec não negou ao discernimento dos espíritas sérios a capacidade de rejeitar as teses rustenistas. Deixou claro, porém, que, “até mais ampla confirmação, não poderiam ser consideradas como partes integrantes da Doutrina Espírita”. E já em 1868, no livro A Gênese, XV, 66, Kardec demonstrou que não houve endosso, e sim contradita.[11]

O Codificador desejava que tudo estivesse sob a mais intensa luz. Jamais adotou a providência inquisitorial da imposição de silêncio sobre o quer que fosse. Todavia, muitos espíritas, julgando-se mais cautelosos que o mestre o foi, afirmam não falarem de assuntos polêmicos porque não querem divulgar “o mal”.

Mas o que falta à maioria destes tais é a segurança que só o conhecimento das razões doutrinárias lhes poderia proporcionar. Isto, entretanto, somente se consegue ao preço de intensos estudos, nunca ao baixíssimo valor de memorizações de frases de efeito, fundadas em retóricas piegas, de todo ignorantes do que seja realmente o sentimento do bem.

[1] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 47.
[2] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 47.
[3] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, pp. 47 e 49.
[4] Revista Espírita. Jan/1858. Introdução.
[5] Revista Espírita. Nov/1858. Polêmica Espírita.
[6] Revista Espírita. Jun/1863. Do Princípio da Não Retrogradação dos Espíritos.
[7] O Evangelho Segundo o Espiritismo. Introdução, II.
[8] Revista Espírita. Jun/1865. Nova Tática dos Adversários do Espiritismo.
[9] Revista Espírita. Abr/1866. O Espiritismo Independente.
[10] Cf. Revista Espírita. Jun/1866. Os Evangelhos Explicados.
[11] Cf. Cap. 8: Jesus Não Era Um Agênere.

Fonte: O Primado de Kardec - http://oprimadodekardec.blogspot.com/2011/02/capitulo-2-postura-de-kardec.html

quarta-feira, 1 de junho de 2011

As Irmãs Fox

Por Arthur Conan Doyle

No mês de março de 1848, aconteceram, no pequeno povoado de Hydesville, nos Estados Unidos da América do Norte, os primeiros fenômenos espíritas dos tempos modernos, o que representou o prelúdio do advento da Doutrina Espírita, consumado com a Codificação Kardequiana.

Hydesville é um pequeno povoado típico do Estado de New York e, quando da ocorrência desses fenômenos, contava com um pequeno número de casas de madeira, do tipo mais simples. Numa dessas cabanas, habitava a família de John D. Fox, composta dos pais e vários filhos, dentre outros Margareth, de quatorze anos, Kate de onze anos, além de Leah, que residia noutra cidade.

A família Fox havia passado a morar nessa casa no dia 11 de dezembro de 1847. Algum tempo após essa mudança, seus ocupantes passaram a ouvir arranhões, ruídos insólitos e pancadas, vibradas no forro da sala, no assoalho, nas paredes e nos móveis, os quais passaram a constituir verdadeira preocupação para aquela humilde família.

Todos ficaram abalados com os acontecimentos. Numa semana a senhora Fox ficou grisalha. E, como tudo sugeria que os fenômenos estivessem ligados às duas meninas, Margareth e Kate, estas foram afastadas de casa. Mas, em casa do seu irmão, David Fox, para sonde foi Margareth, e na casa de sua Irmã Leah, cujo nome de casada era Sra. Fish, em Rochester, onde Kate ficou hospedada, os mesmos ruídos se fizeram ouvir. Esforços inauditos foram dispendidos para que o público ignorasse essas manifestações; logo, porém, elas se tornaram conhecidas. Leah, a irmã mais velha, teve que interromper as aulas de música, pois, passando também a ser intermediária dos fenômenos, embora em menor escala, foi levada a não continuar com as lições.

Os fenômenos se produziam com tal intensidade que, da casa das irmãs Fox, passaram a ser ouvidos na residência do Rev. A.H. Jervis, ministro metodista residente em Rochester. Logo, após, eles também se fizeram sentir na residência do Diácono Hale, de Greece, cidade vizinha de Rochester.

Na noite de 31 de março de 1848, descobriu-se um meio de entrar em contato com a entidade espiritual que produzia os fenômenos. A filha menor do casal, Kate, disse, batendo palmas: Sr. Pé Rachado, faça o que eu faço. De forma imediata, repetiram-se as palmadas. Quando ela parou, o som também parou em seguida. Em face daquela resposta, Margareth, então, disse, brincando: "Agora faça exatamente como eu. Conte um, dois, três, quatro, e bateu palmas." O que ela havia solicitado foi repetido com incrível exatidão. Kate, adiantando-se, disse, na sua simplicidade infantil: "Oh! mamãe! eu já sei o que é. Amanhã é primeiro de abril e alguém quer nos pregar uma mentira."

A senhora Fox lembrou-se, então, de fazer uma tentativa concludente: solicitou à entidade que desse as idades de todos os seus filhos, o que foi feito com notável precisão.

Havia-se estabelecido, desta forma, um sistema de comunicação com o mundo espiritual. Criou-se um alfabeto convencional, por meio de pancadas e, por intermédio desse sistema bastante rudimentar, descobriu-se que o Espírito comunicante era um antigo vendedor ambulante de nome Charles Rosna, que, daquele modo, procurava revelar a sua presença e entrar em contato com as pessoas da casa. O indivíduo portador desse nome fora, anos antes, assassinado na casa de Hydesville, na qual, sem o saber, viera posteriormente residir a família Fox. O assassinado revelou que havia sido morto com uma faca de açougueiro, cinco anos antes; que o corpo tinha sido levado para a adega; que só na noite seguinte é que havia sido sepultado; tinha passado pela despensa, descido a escada, e enterrado a três metros aproximadamente do solo. Adiantou, também, que o móvel do crime fora o dinheiro que possuía, cerca de quinhentos dólares.

Na noite de 1.° de abril, começaram a escavar o solo na adega, atingindo um lençol de água. Procedendo-se a nova pesquisa no verão do mesmo ano, foram descobertos uma tábua, carvão e cal, cabelos e ossos humanos, entretanto, somente no dia 22 de novembro de 1904, com a queda de uma parede, descobriu-se o esqueleto. Também foi achado um baú que pertenceu ao mascate.

Após estabelecer esse sistema de intercâmbio com o mundo espiritual, de que os fatos narrados foram apenas o prelúdio, outras entidades espirituais entraram a manifestar-se, fazendo entre outras a revelação de que as duas filhas de John Fox — Margareth e Kate — eram médiuns, por cuja inconsciente e involuntária intervenção se produziram os fenômenos. A elas estava reservada a missão de cooperar no importante movimento de idéias o qual, por semelhante forma, não tardaria a atrair a atenção do mundo.

Os acontecimentos tiveram inusitada repercussão em Hydesville, em Rochester, e em outras cidades circunvizinhas.

Ao transferir a sua residência para Rochester, a família de John Fox deparou com o primeiro óbice: o pastor da igreja, a que pertenciam, intimou as meninas, sob pena de expulsão, a abjurarem tais práticas. Essa imposição foi repelida pelas irmãs Fox e, por isso, elas foram expulsas daquela comunidade religiosa.

Surgiram, posteriormente, as comissões nomeadas para averiguarem a veracidade dos fenômenos e se pronunciarem acerca da sua natureza. A primeira, depois de longa e minuciosa pesquisa, concluiu por reconhecer a veracidade da intervenção espiritual, na produção dos fatos que o público se obstinava em atribuir a artifício daquelas humildes meninas sem considerar que nisso não havia para elas interesse algum. A segunda comissão foi nomeada, chegando ao mesmo resultado, com desapontamento para todos.

Nomearam por fim uma terceira comissão, composta de pessoas notáveis e insuspeitas e, quando terminou ela o seu rigoroso inquérito, grande parte da população de Rochester se reuniu no maior salão da cidade, conhecido por Corinthian Hall, com o fito de ouvir o resultado.

Deu-se, então, um fato incrível: como a conclusão a que haviam chegado os membros da comissão, confirmava, definitivamente, as pesquisas anteriores, o público, indignado pelo que teimava em ser uma burla por parte das jovens médiuns, que, ao lado de seus pais, aguardavam serenamente o veredicto, levantou-se em atitude hostil e, numa onda ululante, pretendeu invadir o recinto, com o intuito de massacrá-las. Foi necessária a pronta intervenção do venerando quaker George Willets, para evitar aquele linchamento. Willets chegou ao extremo de dizer que, se quisessem matar as meninas, os fanáticos teriam que passar sobre o seu cadáver.

As meninas sofreram nas mãos dos investigadores. No decurso das pesquisas, das comissões, que também tinham algumas senhoras entre os seus membros, estas despiram as meninas, submetendo-as a investigações brutais e aflitivas. Seus vestidos foram amarrados, apertados nos corpos, e elas colocadas sobre vidros e outros isolantes. A comissão se viu obrigada a referir que, Quando elas se achavam de pé sobre as almofadas, com um lenço amarrado à borda dos seus vestidos, amarradas pelas cadeiras, todos nós ouvimos as batidas distintas nas paredes, no assoalho e em outros objetos". Por fim, essa comissão declarou, enfaticamente, que as suas perguntas, das quais algumas feitas mentalmente, tinham sido respondidas corretamente.

As perseguições sofridas pelas irmãs Fox foram inenarráveis. Um jornal denominado Rochester Democrat havia tirado uma edição com a manchete "Exposição Completa da Mistificação das Batidas". O resultado das pesquisas obrigou o seu editor a sustar a distribuição do jornal.

Um dos pesquisadores afirmou que, senão se descobrisse qualquer fraude, ia atirar-se nas Cataratas do Genesse. Ele teve que mudar de opinião em sua afirmação.

Em 1850, foram recebidas em duas salas separadas, em Rochester, duas mensagens simultâneas, do Espírito de Benjamim Franklin, cujo teor era o seguinte:

"Haverá grandes mudanças no século dezenove. Coisas que, atualmente, parecem obscuras e misteriosas, para vós, tornar-se-ão claras aos vossos olhos. Os mistérios vão ser revelados. O mundo será esclarecido."

Fonte: A História do Espiritismo

A Segunda Vista

Por Allan Kardec

Conhecimento do Futuro. Previsões.

Se, no estado sonambúlico, as manifestações da alma se tornam, de alguma sorte, ostensivas, seria absurdo pensar que, no estado normal, ela estivesse confinada em seu envoltório de maneira absoluta, como o caracol está encerrado em sua concha. Não é, de nenhum modo, a influência magnética que a desenvolve; essa influência não faz senão torná-la patente pela ação que exerce sobre os nossos órgãos. Ora, o estado sonambúlico não é sempre uma condição indispensável para essa manifestação; as faculdades que vimos se produzirem nesse estado, se desenvolvem, algumas vezes, espontaneamente no estado normal de certos indivíduos. Disso resulta, para eles, a faculdade de ver além dos limites de nossos sentidos; percebem as coisas ausentes por toda a parte onde a alma estende a sua ação; vêem, se podemos nos servir desta expressão, através da visão comum, e os quadros que descrevem, os fatos que contam, se apresentam a eles como o efeito de uma miragem, e é o fenômeno designado sob o nome de segunda vista. No sonambulismo, a clarividência é produzida pela mesma causa; a diferença é que, nesse estado, ela está isolada, independente da vida corpórea, ao passo que lhe é simultânea, naqueles que dela são dotados no estado de vigília.

A segunda vista quase nunca é permanente; em geral, esse fenômeno se produz espontaneamente, em certos momentos dados, sem ser um efeito da vontade, e provoca uma espécie de crise que modifica, algumas vezes, sensivelmente o estado físico: o olho tem alguma coisa de vago; parece olhar sem ver; toda a fisionomia reflete uma espécie de exaltação.

É de notar-se que as pessoas que dela gozam, não suspeitam disso; essa faculdade lhes parece natural como aquela de ver pelos olhos; para elas, é um atributo de seu ser, e que não lhes parece, de nenhum modo, fazer exceção. Acrescentai a isso que o esquecimento segue, muito freqüentemente, essa lucidez passageira, cuja lembrança, cada vez mais vaga, acaba por desaparecer como a de um sonho.

Há graus infinitos no poder da segunda vista, desde a sensação confusa, até a percepção tão clara e tão limpa como no sonambulismo. Falta-nos uma palavra para designar esse estado especial, e sobretudo os indivíduos que dele são suscetíveis: tem se servido da palavra vidente, e embora não dê exatamente o pensamento, adotá-la-emos até nova ordem, por falta de melhor.

Se aproximamos agora os fenômenos da clarividência sonambúlica e da segunda vista, compreende-se que o vidente possa ter a percepção das coisas ausentes; como o sonâmbulo, ele vê à distância; segue o curso dos acontecimentos, julga de sua tendência e pode, em alguns casos, prever-lhes o resultado.

É esse dom da segunda vista que, no estado rudimentar, dá a certas pessoas o tato, a perspicácia, uma espécie de segurança em seus atos, e que se pode chamar a justeza do golpe de vista moral. Mais desenvolvida, desperta os pressentimentos, mais desenvolvida ainda, mostra os acontecimentos realizados, ou no ponto de se realizarem; enfim, chega ao seu apogeu, é o êxtase desperto.

O fenômeno da segunda vista, como dissemos, é quase sempre natural e espontâneo; mas parece se produzir, mais freqüentemente, sob o império de certas circunstâncias. Os tempos de crise, de calamidade, de grandes emoções, todas as causas, enfim, que superexcitam o moral, provocam-lhe o desenvolvimento. Parece que a Providência, em presença dos perigos mais iminentes, multiplica, ao nosso redor, a faculdade de preveni-los.

Houve videntes em todos os tempos e em todas as nações; parece que certos povos a isso estejam mais naturalmente predispostos; diz-se que, na Escócia, o dom da segunda vista é muito comum. Encontra-se, assim tão freqüentemente, entre as pessoas do campo e os habitantes das montanhas.

Os videntes foram diversamente olhados segundo os tempos, os costumes e o grau de civilização. Aos olhos das pessoas céticas, passam por cérebros desarranjados, alucinados; as seitas religiosas deles fizeram profetas, sibilas, oráculos; nos séculos de superstição e de ignorância, eram feiticeiros que se queimavam. Para o homem sensato, que crê na força infinita da Natureza, e na inesgotável bondade do Criador, a dupla vista é uma faculdade inerente à espécie humana, pela qual Deus nos revela a existência de nossa essência material. Qual é aquele que não reconhece um dom dessa natureza em Jeanne d’Arc e numa multidão de outros personagens que a história qualifica de inspirados?

Tem-se falado, freqüentemente, de cartomantes que dizem coisas surpreendentes de verdade. Estamos longe de nos fazer apologistas de ledores de sorte, que exploram a credulidade de espíritos fracos, e cuja linguagem ambígua se presta a todas as combinações de uma imaginação ferida; mas não há nada de impossível em que, certas pessoas, fazendo esse ofício, tenham o dom da segunda vista, mesmo com o seu desconhecimento; desde então as cartas não são, em suas mãos, senão um meio, senão um pretexto, uma base de conversação; elas falam segundo o que vêem, e não segundo o que indicam as cartas que apenas olham.

Ocorre o mesmo com outros meios de adivinhação, tais como as linhas das mãos, o resíduo de café, as claras de ovo e outros símbolos místicos. Os sinais da mão, talvez, tenham mais valor do que todos os outros meios, de nenhum modo por si mesmos, mas porque o suposto adivinho, tomando e apalpando a mão do consulente, se está dotado da segunda vista, encontra-se em relação mais direta com este último, como ocorre nas consultas sonambúlicas.

Podem colocar-se os médiuns videntes na categoria das pessoas gozando da dupla vista. Como estes últimos, com efeito, os médiuns videntes crêem ver pelos olhos, mas, em realidade, é a alma que vê, e é a razão pela qual vêem tão bem de olhos fechados, quanto de olhos abertos; segue-se, necessariamente, que um cego poderia ser médium vidente tão bem quanto aquele cuja visão está intacta. Um estudo interessante a fazer seria saber se esta faculdade é mais freqüente nos cegos. Seríamos levados a crer, tendo em vista que, assim como se pode disso se convencer pela experiência, a privação de se comunicar com o exterior, em razão da ausência de certos sentidos, em geral, dá mais poder à faculdade de abstração da alma e, por conseguinte, mais desenvolvimento ao sentido íntimo pelo qual ela se põe em relação com o mundo espiritual.

Os médiuns videntes podem, pois, ser comparados às pessoas que gozam da visão espiritual; mas seria, talvez, muito absoluto considerar estes últimos como médiuns; porque a mediunidade consistindo unicamente na intervenção dos Espíritos, o que se faz por si mesmo não pode ser considerado como um ato mediúnico. Aquele que possui a visão espiritual vê pelo seu próprio Espírito, e nada implica, no desenvolvimento de sua faculdade, a necessidade do concurso de um Espírito estranho.

Isto posto, examinemos até que ponto a faculdade da dupla vista pode nos permitir descobrir as coisas ocultas e de penetrar no futuro.

De todos os tempos, os homens quiseram conhecer o futuro, e poder-se-iam escrever volumes sobre os meios inventados pela superstição para levantar o véu que cobre o nosso destino. A Natureza foi muito sábia no-lo escondendo; cada um de nós tem a sua missão providencial na grande colmeia humana, e concorre à obra comum na sua esfera de atividade. Se soubéssemos, antecipadamente, o fim de cada coisa, ninguém duvide que a harmonia geral com isso sofreria. Um futuro feliz assegurado tiraria do homem toda atividade, uma vez que não teria necessidade de nenhum esforço para chegar ao objetivo que se propôs: seu bem-estar; todas as forças físicas e morais seriam paralisadas, e a marcha progressiva da Humanidade seria detida. A certeza da infelicidade teria as mesmas conseqüências pelo efeito do desencorajamento; todos renunciariam lutar contra o decreto definitivo do destino. O conhecimento absoluto do futuro seria, pois, um presente funesto que nos conduziria ao dogma da fatalidade, o mais perigoso de todos, o mais antipático ao desenvolvimento das idéias. É a incerteza, do momento de nosso fim neste mundo que nos faz trabalhar até a última batida de nosso coração. O viajor arrastado por um veículo abandona-se ao movimento que deve conduzi-lo ao objetivo, sem pensar em se fazer desviar, porque sabe da sua impossibilidade; tal seria o homem que conhecesse o seu destino irrevogável. Se os videntes pudessem transgredir essa lei da Providência, seriam os iguais da divindade; também, tal não é, de nenhum modo, a sua missão.

Nos fenômenos da dupla vista, estando a alma em parte desligada do envoltório material que limita as nossas faculdades, não há mais, para ela, nem duração, nem distâncias; abarcando o tempo e o espaço, tudo se confunde no presente. Livre de seus entraves, ela julga os efeitos e as causas melhor do que não podemos fazê-lo: vê as conseqüências das coisas presentes e pode nos fazer pressenti-las; é nesse sentido que se deve entender o dom da presciência atribuído aos videntes.

Suas previsões não são senão o resultado de uma consciência mais clara do que existe, e não uma predição de coisas fortuitas sem laço com o presente; é uma dedução lógica do conhecido para chegar ao desconhecido, que depende, muito freqüentemente, de nossa maneira de fazer. Quando um perigo nos ameaça, se somos advertidos, estamos no caso de fazermos o que é preciso para evitá-lo: com a liberdade de fazê-lo ou não.

Em semelhante caso, o vidente se encontra em presença do perigo que se nos acha oculto; ele o assinala, indica o meio de afastá-lo, senão o acontecimento segue o seu curso.

Suponhamos um carro conduzido numa estrada terminando num abismo, que o condutor não pode perceber; é bem evidente que, se nada vem fazê-lo desviar, irá nele se precipitar; suponhamos, por outro lado, um homem colocado de maneira a dominar a estrada em linha reta; que esse homem, vendo a perda inevitável do viajor, possa adverti-lo para desviar-se a tempo, o perigo será conjurado. De sua posição, dominando o espaço, vê o que o viajor, cuja visão está circunscrita pelos acidentes do terreno, não pode distinguir; pode ele ver se uma causa fortuita vai pôr obstáculo à sua queda; conhece, pois, antecipadamente, o resultado do acontecimento e pode predizê-lo.

Que esse mesmo homem, colocado sobre uma montanha, perceba ao longe, no caminho, uma tropa inimiga se dirigindo para uma aldeia que quer incendiar; ser-lhe-á fácil, calculando o espaço e a velocidade, prever o momento da chegada da tropa. Se, descendo à aldeia, diz simplesmente: A tal hora a aldeia será incendiada, o acontecimento vindo se cumprir, ele passará, aos olhos da multidão ignorante, por um adivinho, um feiticeiro, ao passo que, muito simplesmente, viu o que os outros não podiam ver, e disso deduziu as conseqüências.

Ora, o vidente, como esse homem, abarca e segue o curso dos acontecimentos; não lhe prevê o resultado pelo dom da adivinhação; ele o vê! Pode, pois, vos dizer se estais no bom caminho, vos indicar o melhor, e vos anunciar o que encontrareis no fim do caminho; é, para vós, o fio de Ariadne que vos mostra a saída do labirinto.

Há distância daí, como se vê, à predição propriamente dita, tal como a entendemos na acepção vulgar da palavra. Nada é tirado ao livre arbítrio do homem, que permanece sempre senhor para agir ou não agir, que cumpre ou deixa de cumprir os acontecimentos pela sua vontade ou pela sua inércia; se lhe indica o meio para chegar ao objetivo, cabe-lhe dele fazer uso. Supô-lo submetido a uma fatalidade inexorável pelos menores acontecimentos da vida, é deserdá-lo de seu mais belo atributo: a inteligência; é assimilá-lo ao animal. O vidente não é, pois, de nenhum modo, um adivinho; é um ser que percebe o que não vemos; é para nós o cão do cego. Nada, pois, aqui, contradiz os objetivos da Providência sobre o segredo de nosso destino; é ela mesma que nos dá um guia.

Tal é o ponto de vista sob o qual deve ser encarado o conhecimento do futuro nas pessoas dotadas de dupla vista. Se esse futuro fosse fortuito, se dependesse do que se chama o acaso, se não se ligasse em nada às circunstâncias presentes, nenhuma clarividência poderia penetrá-lo, e toda previsão, nesse caso, não poderia oferecer nenhuma certeza. O vidente, e por isso entendemos o verdadeiro vidente, o vidente sério, e não o charlatão que o simula, o verdadeiro vidente, dizemos, não diz nada do que o vulgo chama a boa sorte; ele prevê o resultado do presente, nada mais, e isso já é muito.

Quantos erros, quantas falsas deligências, quantas tentativas inúteis não evitaríamos, se tivéssemos sempre um guia seguro para nos esclarecer; quantos homens estão deslocados no mundo por não terem sido lançados no caminho que a Natureza traçou para as suas faculdades!

Quantos fracassos por ter seguido os conselhos de uma obstinação irrefletida! Uma pessoa poderia lhe dizer: "Não tenteis tal coisa porque as vossas faculdades intelectuais são insuficientes, porque ela não convém nem ao vosso caráter, nem à vossa constituição física, ou bem ainda porque não sereis secundado segundo a necessidade; ou bem ainda porque vos enganais sobre a importância dessa coisa, porque encontrareis tal entrave que não prevedes." Em outras circunstâncias, ter-lhe-ia dito: "Triunfareis em tal coisa, se a tomardes de tal ou tal maneira; se evitardes tal deligência que pode vos comprometer." Sondando as disposições e o caráter, ter-lhe-ia dito: "Desconfiai de tal armadilha que se quer vos estender;" depois teria acrescentado: "Estais prevenidos, meu papel está findo; eu vos mostro o perigo; se sucumbirdes não acuseis nem a sorte, nem a fatalidade, nem a Providência, mas só a vós. Que pode o médico, quando o enfermo não tem em nenhuma conta os seus conselhos?"

Fonte: Obras Póstumas