Por Alexandre Fontes da Fonseca
O Espiritismo é a única doutrina espiritualista que não foi desenvolvida a partir dos esforços de uma única pessoa ou único grupo de pessoas. Ele constitui-se no ensinamento das vozes do além que, ao mesmo tempo, chamaram a atenção para a existência do mundo espiritual e apresentaram as leis que o regem. As vozes fizeram presença em toda parte mostrando a Kardec que elas não estão circunscritas a nenhum grupo ou local em especial. Esse caráter universal do Espiritismo o torna imune contra qualquer tentativa de torná-lo "doutrina para iniciados" pois onde quer que existam pessoas, as vozes poderão aí estar levando a sua mensagem.
Foi necessário, porém, que alguém com elevada capacidade intelectual e moral, pesquisasse e codificasse todos esses ensinamentos para que pudesse ser melhor apreendido por todos os que se interessassem. Mas, curiosamente, as vozes ao invés de aproveitarem o prestígio que o sobrenome Rivail detinha como educador e cientista, junto às academias de ciência da época, elas sugeriram que as obras destinadas à divulgação da nova doutrina fossem assinadas com um nome até então desconhecido: Allan Kardec. Dessa forma, vemos que as vozes não sugeriram que o Espiritismo nascesse no interior das cátedras, com o brilho que as modernas teorias de até então detinham, mas sim que ele nascesse como uma humilde mas verdadeira doutrina. Isso nos lembra a humildade de Jesus que sendo o maior entre nós preferiu a manjedoura para iniciar seus passos no nosso mundo. Queriam as vozes que os futuros leitores buscassem o Espiritismo não por causa do prestígio de Rivail mas, pelo simples interesse no assunto.
Nos dias de hoje, muita coisa mudou desde a publicação da primeira edição de O Livro dos Espíritos, em 1857.
A ciência desenvolveu novos paradigmas sobre a realidade e a tecnologia atingiu níveis inimagináveis. O ser humano vive mais tempo, em média, e com maior qualidade de vida, no sentido material. Porém, no campo moral, o nível evolutivo da humanidade não difere muito do da época de Kardec, deixando ainda muito a desejar. O desenvolvimento dos direitos humanos, por exemplo, mostra que já temos algum progresso no campo moral mas ainda estamos longe do nível satisfatório que o progresso material atingiu. Sabemos estirpar o tumor que ameaça o equilíbrio orgânico mas não sabemos como eliminar o "câncer" de orgulho e egoísmo que mutila a alma e gera tanta dor e miséria, estando na raiz de todos os males e problemas do nosso mundo.
Um dos objetivos do Espiritismo é ajudar o Homem a retomar o caminho ensinado, em essência, por todas as religiões. Ao mostrar que o amor e a fraternidade são leis tão naturais quanto aquelas que fazem uma maçã cair ao chão, o Espiritismo desmistifica os ensinamentos cristãos tornando-os inteligíveis à todo aquele que busca "algo mais" além da matéria. E, em face do atraso moral de nossa humanidade, existe uma certa urgência na sua transformação para o bem. Assim, tudo o que contribuir para o despertar do ser humano para as necessidades morais será muito bem vindo e terá, com certeza, o apoio daquelas mesmas vozes que iniciaram o processo de codificação.
Isso posto, vamos discutir uma questão que a mais de 10 anos [1] tem sido levantada por alguns irmãos da seara espírita. Se trata da ligação do Espiritismo com a instituição conhecida como Universidade. Existem opiniões divergentes dentre os irmãos espíritas. Alguns defendem fortemente a inserção do Espiritismo na Universidade como disciplina acadêmica e tópico de pesquisa [2], enquanto outros, sem discordarem de forma absoluta, levantam questionamentos importantíssimos para uma análise das possíveis consequências dessa idéia [1]. Por exemplo, o que significaria um título acadêmico em Espiritismo? Um doutor em Espiritismo será melhor do que um espírita sem o título? Sabemos que não. Mas, por outro lado, o reconhecimento do conteúdo espírita como tema de estudo legítimo nas Universidades não ajudaria a promover a divulgação da Doutrina Espírita? Não elevaria o valor da mesma perante os olhos da sociedade? Essas questões não são fáceis de responder. De fato o interesse intelectual pelo Espiritismo cresceria o que não garante, em princípio o interesse na prática moral elevada, mas isso já seria um avanço.
Pretendemos discutir a idéia de que essas consequências positivas para o aumento do interesse no Espiritismo não são condições suficientes que justificariam uma certa ênfase e ansiedade nessa inserção do Espiritismo nos meios acadêmicos. Não discordaremos em absoluto dos que defendem essa inserção mas lembraremos de alguns outros cuidados necessários para que essa não venha a se tornar uma empreitada destinada ao fracasso, como muitas outras na história das religiões.
O primeiro detalhe importante que os interessados nessa inserção não devem esquecer é que o Espiritismo, que é uma doutrina bem estabelecida, não necessita dessa inserção para sua sobrevivência. O Espiritismo representa o ensinamento das vozes que estão por toda a parte ajudando o ser humano a se lembrar dos seus deveres cristãos. Se um dia todos os livros espíritas forem queimados elas, as vozes, poderão ditar outros e o trabalho nunca ficará totalmente perdido.
O segundo detalhe é que os fins não justificam os meios. Quem quer que use a bandeira espírita em nome de qualquer projeto, seja de inserção do Espiritismo nas Universidades, ou seja o que for, deve ser o primeiro a dar o exemplo da doutrina que professa. Um desses exemplos é a forma pela qual o companheiro que pensa diferente é tratado e, particularmente, como o companheiro espírita que pensa diferente é tratado.
O terceiro detalhe e, talvez, o mais importante é que antes de defender o estudo e pesquisa da Doutrina Espírita nos meios acadêmicos, deve o pesquisador espírita ter consciência de como a tem vivenciado dentro e fora desse ambiente. De que adianta a defesa de teses brilhantes relacionadas ao Espiritismo se nossos atos desmentem, logo em seguida, a essência dos seus ensinamentos? Como sabemos que já existem vários irmãos espíritas que já defenderam teses e dissertações sobre temas relacionados com o Espiritismo, esclarecemos que o questionamento acima não é nenhuma crítica particular a ninguém, mesmo porque este autor não conhece pessoalmente nenhum deles.
O questionamento acima é ponto básico para que o verdadeiro ideal não seja esquecido em nome de “ver” o Espiritismo divulgado nos paineis e seminários dentro das Universidades.
O primeiro esforço deve ser o da reforma íntima sem a qual nenhum projeto, por mais nobre e dignificante que seja, não conseguirá ir adiante.
Um outro ponto que precisa ficar claro é que o jovem espírita que esteja iniciando a sua carreira acadêmica não deve se sentir na obrigação de ter que trabalhar em alguma tese ligada ao Espiritismo. O jovem espírita não deve se sentir envergonhado se seu trabalho de tese não tem ligação com o Espiritismo. O jovem espírita, como nenhum outro jovem, não pode correr o risco de iniciar um projeto "às escuras", mal preparado e sem perspectiva de resultados sob pena de prejudicar seu futuro profissional e, por conseguinte, sua influência como espírita no meio acadêmico. Apenas se o jovem espírita encontrar um orientador com interesse real e competência suficiente para propor ou formular um bom projeto de pós-graduação em tema espírita é que ele pode aceitar se assim desejar.
Que fique bem claro que o fato de uma tese ser espírita não torna o autor especial ou melhor do que os outros.
E, muito pelo contrário, o fato de uma tese não ser espírita não torna o autor espírita pior ou menos especial que ninguém. É importante que esse tipo de julgamento não seja feito porque viola os ensinamentos cristãos e, portanto, é atitude anti-doutrinária. Muitas vezes uma boa tese em assunto não-espírita pode levar o autor a ter oportunidades futuras em posições de maior destaque onde, como espírita, ele ou ela poderá fazer muito pela divulgação do Espiritismo.
É preciso buscar o ponto de equilíbrio sobre a questão da falta de “coragem moral”. Ao mesmo tempo que devemos dar exemplos de nossa crença, não devemos “jogar pérolas aos porcos”. A insistência com projetos espíritas que não sejam bem consistentes pode levar ao descrédito do pesquisador e do movimento espírita.
Em resumo, concordamos que uma condição necessária para um progresso na divulgação do Espiritismo junto à sociedade seja a sua inserção nas Universidades através de projetos de pesquisa, teses e cursos. Mas essa condição não é suficiente para o sucesso na divulgação espírita. É preciso que o pesquisador espírita busque ser espírita dentro e fora da Universidade. Que o estudante e o professor espíritas vivenciem o Evangelho dentro e fora dos ambientes acadêmicos.
O Espiritismo na universidade pode até ser necessário como mais um “ajudante” no progresso moral da Humanidade mas, com certeza, não é condição suficiente para isso. O livro O Evangelho Segundo o Espiritismo explica bem o porquê.
Publicado no jornal Alavanca 490, de Março de 2004, pág.03.
O Espiritismo é a única doutrina espiritualista que não foi desenvolvida a partir dos esforços de uma única pessoa ou único grupo de pessoas. Ele constitui-se no ensinamento das vozes do além que, ao mesmo tempo, chamaram a atenção para a existência do mundo espiritual e apresentaram as leis que o regem. As vozes fizeram presença em toda parte mostrando a Kardec que elas não estão circunscritas a nenhum grupo ou local em especial. Esse caráter universal do Espiritismo o torna imune contra qualquer tentativa de torná-lo "doutrina para iniciados" pois onde quer que existam pessoas, as vozes poderão aí estar levando a sua mensagem.
Foi necessário, porém, que alguém com elevada capacidade intelectual e moral, pesquisasse e codificasse todos esses ensinamentos para que pudesse ser melhor apreendido por todos os que se interessassem. Mas, curiosamente, as vozes ao invés de aproveitarem o prestígio que o sobrenome Rivail detinha como educador e cientista, junto às academias de ciência da época, elas sugeriram que as obras destinadas à divulgação da nova doutrina fossem assinadas com um nome até então desconhecido: Allan Kardec. Dessa forma, vemos que as vozes não sugeriram que o Espiritismo nascesse no interior das cátedras, com o brilho que as modernas teorias de até então detinham, mas sim que ele nascesse como uma humilde mas verdadeira doutrina. Isso nos lembra a humildade de Jesus que sendo o maior entre nós preferiu a manjedoura para iniciar seus passos no nosso mundo. Queriam as vozes que os futuros leitores buscassem o Espiritismo não por causa do prestígio de Rivail mas, pelo simples interesse no assunto.
Nos dias de hoje, muita coisa mudou desde a publicação da primeira edição de O Livro dos Espíritos, em 1857.
A ciência desenvolveu novos paradigmas sobre a realidade e a tecnologia atingiu níveis inimagináveis. O ser humano vive mais tempo, em média, e com maior qualidade de vida, no sentido material. Porém, no campo moral, o nível evolutivo da humanidade não difere muito do da época de Kardec, deixando ainda muito a desejar. O desenvolvimento dos direitos humanos, por exemplo, mostra que já temos algum progresso no campo moral mas ainda estamos longe do nível satisfatório que o progresso material atingiu. Sabemos estirpar o tumor que ameaça o equilíbrio orgânico mas não sabemos como eliminar o "câncer" de orgulho e egoísmo que mutila a alma e gera tanta dor e miséria, estando na raiz de todos os males e problemas do nosso mundo.
Um dos objetivos do Espiritismo é ajudar o Homem a retomar o caminho ensinado, em essência, por todas as religiões. Ao mostrar que o amor e a fraternidade são leis tão naturais quanto aquelas que fazem uma maçã cair ao chão, o Espiritismo desmistifica os ensinamentos cristãos tornando-os inteligíveis à todo aquele que busca "algo mais" além da matéria. E, em face do atraso moral de nossa humanidade, existe uma certa urgência na sua transformação para o bem. Assim, tudo o que contribuir para o despertar do ser humano para as necessidades morais será muito bem vindo e terá, com certeza, o apoio daquelas mesmas vozes que iniciaram o processo de codificação.
Isso posto, vamos discutir uma questão que a mais de 10 anos [1] tem sido levantada por alguns irmãos da seara espírita. Se trata da ligação do Espiritismo com a instituição conhecida como Universidade. Existem opiniões divergentes dentre os irmãos espíritas. Alguns defendem fortemente a inserção do Espiritismo na Universidade como disciplina acadêmica e tópico de pesquisa [2], enquanto outros, sem discordarem de forma absoluta, levantam questionamentos importantíssimos para uma análise das possíveis consequências dessa idéia [1]. Por exemplo, o que significaria um título acadêmico em Espiritismo? Um doutor em Espiritismo será melhor do que um espírita sem o título? Sabemos que não. Mas, por outro lado, o reconhecimento do conteúdo espírita como tema de estudo legítimo nas Universidades não ajudaria a promover a divulgação da Doutrina Espírita? Não elevaria o valor da mesma perante os olhos da sociedade? Essas questões não são fáceis de responder. De fato o interesse intelectual pelo Espiritismo cresceria o que não garante, em princípio o interesse na prática moral elevada, mas isso já seria um avanço.
Pretendemos discutir a idéia de que essas consequências positivas para o aumento do interesse no Espiritismo não são condições suficientes que justificariam uma certa ênfase e ansiedade nessa inserção do Espiritismo nos meios acadêmicos. Não discordaremos em absoluto dos que defendem essa inserção mas lembraremos de alguns outros cuidados necessários para que essa não venha a se tornar uma empreitada destinada ao fracasso, como muitas outras na história das religiões.
O primeiro detalhe importante que os interessados nessa inserção não devem esquecer é que o Espiritismo, que é uma doutrina bem estabelecida, não necessita dessa inserção para sua sobrevivência. O Espiritismo representa o ensinamento das vozes que estão por toda a parte ajudando o ser humano a se lembrar dos seus deveres cristãos. Se um dia todos os livros espíritas forem queimados elas, as vozes, poderão ditar outros e o trabalho nunca ficará totalmente perdido.
O segundo detalhe é que os fins não justificam os meios. Quem quer que use a bandeira espírita em nome de qualquer projeto, seja de inserção do Espiritismo nas Universidades, ou seja o que for, deve ser o primeiro a dar o exemplo da doutrina que professa. Um desses exemplos é a forma pela qual o companheiro que pensa diferente é tratado e, particularmente, como o companheiro espírita que pensa diferente é tratado.
O terceiro detalhe e, talvez, o mais importante é que antes de defender o estudo e pesquisa da Doutrina Espírita nos meios acadêmicos, deve o pesquisador espírita ter consciência de como a tem vivenciado dentro e fora desse ambiente. De que adianta a defesa de teses brilhantes relacionadas ao Espiritismo se nossos atos desmentem, logo em seguida, a essência dos seus ensinamentos? Como sabemos que já existem vários irmãos espíritas que já defenderam teses e dissertações sobre temas relacionados com o Espiritismo, esclarecemos que o questionamento acima não é nenhuma crítica particular a ninguém, mesmo porque este autor não conhece pessoalmente nenhum deles.
O questionamento acima é ponto básico para que o verdadeiro ideal não seja esquecido em nome de “ver” o Espiritismo divulgado nos paineis e seminários dentro das Universidades.
O primeiro esforço deve ser o da reforma íntima sem a qual nenhum projeto, por mais nobre e dignificante que seja, não conseguirá ir adiante.
Um outro ponto que precisa ficar claro é que o jovem espírita que esteja iniciando a sua carreira acadêmica não deve se sentir na obrigação de ter que trabalhar em alguma tese ligada ao Espiritismo. O jovem espírita não deve se sentir envergonhado se seu trabalho de tese não tem ligação com o Espiritismo. O jovem espírita, como nenhum outro jovem, não pode correr o risco de iniciar um projeto "às escuras", mal preparado e sem perspectiva de resultados sob pena de prejudicar seu futuro profissional e, por conseguinte, sua influência como espírita no meio acadêmico. Apenas se o jovem espírita encontrar um orientador com interesse real e competência suficiente para propor ou formular um bom projeto de pós-graduação em tema espírita é que ele pode aceitar se assim desejar.
Que fique bem claro que o fato de uma tese ser espírita não torna o autor especial ou melhor do que os outros.
E, muito pelo contrário, o fato de uma tese não ser espírita não torna o autor espírita pior ou menos especial que ninguém. É importante que esse tipo de julgamento não seja feito porque viola os ensinamentos cristãos e, portanto, é atitude anti-doutrinária. Muitas vezes uma boa tese em assunto não-espírita pode levar o autor a ter oportunidades futuras em posições de maior destaque onde, como espírita, ele ou ela poderá fazer muito pela divulgação do Espiritismo.
É preciso buscar o ponto de equilíbrio sobre a questão da falta de “coragem moral”. Ao mesmo tempo que devemos dar exemplos de nossa crença, não devemos “jogar pérolas aos porcos”. A insistência com projetos espíritas que não sejam bem consistentes pode levar ao descrédito do pesquisador e do movimento espírita.
Em resumo, concordamos que uma condição necessária para um progresso na divulgação do Espiritismo junto à sociedade seja a sua inserção nas Universidades através de projetos de pesquisa, teses e cursos. Mas essa condição não é suficiente para o sucesso na divulgação espírita. É preciso que o pesquisador espírita busque ser espírita dentro e fora da Universidade. Que o estudante e o professor espíritas vivenciem o Evangelho dentro e fora dos ambientes acadêmicos.
O Espiritismo na universidade pode até ser necessário como mais um “ajudante” no progresso moral da Humanidade mas, com certeza, não é condição suficiente para isso. O livro O Evangelho Segundo o Espiritismo explica bem o porquê.
Publicado no jornal Alavanca 490, de Março de 2004, pág.03.
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