sexta-feira, 20 de julho de 2012

As lições de Kardec ao crítico

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Por Maria das Graças Cabral

Quando Kardec escreveu e publicou o livro “O que é o Espiritismo” em 1859, tinha como proposta apresentar “num rápido esboço“, o esclarecimento de questões fundamentais, que constantemente vinham à baila. Diante do objetivo proposto para obra, J. Herculano Pires esclarece que Kardec aplica na sua execução o seu “agudo senso de professor formado na escola pestaloziana e orientado pela disciplina e o rigor lógico do pensamento francês”. Com essa formação e estilo, imprimiu a forma decisiva e disciplinada no campo do conhecimento espírita.

A organização do livro se fez da seguinte forma: o primeiro capítulo sob a forma de diálogos, onde Kardec responde às objeções mais comuns da parte dos que desconhecem os princípios fundamentais da doutrina espírita, bem como a refutação dos principais argumentos de seus contraditores; o segundo capítulo apresenta um resumo do Livro dos Médiuns, esclarecendo falsas idéias que se formam em razão do desconhecimento; e o terceiro e último capítulo que traz um resumo do Livro dos Espíritos. O presente texto se deterá apenas ao diálogo travado entre Allan Kardec e o Crítico.

Inicialmente, faz-se por oportuno ressaltar o comportamento prepotente do visitante (crítico), que procurava Kardec objetivando que este o convencesse da realidade dos fenômenos mediúnicos, posto que na sua convicção tudo não passava de pura imaginação, e/ou trapaça.

O crítico acreditava que sua opinião era de grande relevância para o espiritismo. Informava estar escrevendo um livro que segundo sua opinião, ao ser publicado poderia destruir de vez a doutrina espírita. Tal fato poderia ser evitado, caso o interlocutor fosse convencido por Kardec da veracidade dos fenômenos mediúnicos. No caso, sua opinião levaria respeito e credibilidade à doutrina.

Na realidade, queria ser convencido! Considerava-se uma pessoa importante, tendo sua opinião um grande peso para o público, e caberia a Kardec permitindo a sua participação em uma ou duas reuniões experimentais na Sociedade de Paris, fazer com que viesse a mudar de opinião.

Oportuno conferir as palavras iniciais do visitante, quando se reporta ao mestre da seguinte forma: - “Digo-lhe, senhor, que minha razão se recusa a admitir a realidade dos fenômenos extraordinários atribuídos aos Espíritos que, estou persuadido, existem apenas na imaginação. Entretanto, temos que nos inclinar ante a evidência; e isso eu faria se tivesse provas incontestáveis. Venho, pois, solicitar de sua bondade a permissão para assistir, não desejando tornar-se indiscreto, pelo menos a uma ou duas experiências que me convencessem, se isso for possível.”

Vale observar que o crítico alegava que sua razão não admitia a realidade dos fenômenos, levando-o a crer que não passavam de fatos imaginários. Não obstante, se houvessem provas incontestáveis, ele se curvaria às evidências. Insistia que para isso, seria suficiente assistir a uma ou duas sessões experimentais...

Allan Kardec se depara no caso em tela, com uma personalidade prepotente e totalmente ignorante dos princípios espíritas, que se arvorava de crítico do espiritismo! Diante do arrogante interlocutor, o Codificador dá uma lição de equilíbrio emocional, educação, rigor e clareza nas respostas.

Kardec começa argumentando que se a “razão” do crítico se recusa a admitir fatos considerados pelos espíritas como irrecusáveis, é porque tem a sua razão em alta conta, se sobrepondo às convicções de todas as outras pessoas que pensam de forma diferente. Diante de tal fato, não caberia, portanto mais nenhum tipo de diálogo.

Entretanto, o interlocutor propõe que o Mestre procure convencê-lo, posto que, na condição de conhecido antagonista de Kardec, o seu convencimento “constituiria um milagre favorabilíssimo” à causa espírita.

A argumentação do Codificador passa primeiramente pela “desconstrução” do que o oponente considera como um “milagre” favorável à causa espírita. Assevera ao interlocutor que, não seriam apenas uma ou duas sessões suficientes para que este tivesse o real conhecimento do fenômeno mediúnico. Além do que, as reuniões experimentais que organizava, não objetivavam satisfazer a curiosidade, nem muito menos forçar o convencimento de ninguém. Acrescenta que, em relação aos antagonistas com convicções arraigadas, não daria “um passo para desviá-los”, pois não tinha o menor interesse em fazer prosélitos.

Kardec, de forma clara e direta diz ao crítico que aprendeu com o Espiritismo a “dar pouco valor às mesquinhas suscetibilidades do amor próprio,”, pois “aprendeu a não se ofender com palavras“. Caso as palavras do interlocutor viessem a ultrapassar os limites da cortesia e decência, concluiria apenas que este não passava de um homem mal educado, preferindo não partilhar dos defeitos alheios. (O que é o Espiritismo - Cap. I, pag. 14)

Depois de deixar claro que não teria o menor interesse em convencer o visitante, o Mestre adverte-o que caso tivesse a pretensão de se colocar na condição de crítico do espiritismo, deveria antes de mais nada, tornar-se um profundo conhecedor deste. O Codificador preceitua que o crítico não pode limitar-se a dizer que determinada coisa é boa ou má. A condição sine qua non que justificaria e daria credibilidade à sua opinião, passaria pelo estudo profundo da matéria, que o levaria ao conhecimento dos princípios doutrinários objeto da critica.

Pretendendo firmar seu posicionamento, indaga ao interlocutor, como poderia este criticar os fenômenos espíritas, se desconhecia os postulados que os justificavam e serviam de esteio? Acrescenta que “cada qual é perfeitamente livre de aprovar ou desaprovar os princípios do Espiritismo, de deduzir deles as conseqüências boas ou más que lhe aprouverem. Mas a consciência impõe um dever a todo crítico honesto: o dever de não dizer o contrário daquilo que realmente é. Ora, para isso, a primeira condição é calar sobre o que ignora.” (O que é o Espiritismo - Cap. I, pag. 19)

Adiante surge outra questão relevante no diálogo, quando o crítico se diz persuadido de que os fenômenos das mesas girantes, as pancadas, psicografias, não passavam de embuste. Kardec indaga de pronto, quanto este pagou para apreciar o espetáculo. Responde-lhe o interlocutor que nada foi cobrado por parte dos charlatães.

O Mestre refuta mais uma vez o equívoco do visitante, chamando-lhe a atenção para o fato de que nunca tinha visto charlatães desinteressados, esclarecendo-o que mesmo que haja “uma manobra fraudulenta positivamente constatada, o fato nada prova contra a realidade do princípio. Basta levar-se em conta que tudo é passível de abuso.” (O que é o Espiritismo - Cap. I, pag. 18) Ou seja, não se pode generalizar que em todos os fenômenos haja fraude. Que todos os médiuns sejam charlatães, movidos pelo simples prazer de vivenciar o embuste e que, por conseguinte não existiriam fenômenos mediúnicos, sendo tudo mera armação!

Kardec mais uma vez de forma direta e educada, esclarece ao interlocutor que trata de forma diferenciada o incrédulo por ignorância do incrédulo sistemático, pois sempre que percebia as “disposições favoráveis” de alguém, tinha prazer em esclarecê-lo. Não obstante, não perderia seu tempo com aqueles que apresentassem apenas a falsa aparência do desejo de aprender.

Orienta o crítico a instruir-se primeiramente pela teoria, e preceitua: “Leia as obras que tratam da ciência e medite. Nelas encontrará os princípios fundamentais, a descrição de todos os fenômenos.”

Diante do exposto, podemos constatar que Kardec não se preocupava em firmar convencimento de quem não estava intimamente interessado em compreender os preceitos espíritas. O Codificador não tinha o menor interesse de alimentar a curiosidade de ninguém, nem de fazer prosélitos. Também não temia a crítica dos antagonistas, pois confiava na força da Doutrina dos Espíritos.

Em várias oportunidades o Mestre foi categórico na necessidade do estudo sério dos preceitos espíritas, começando pela análise teórica. Isto porque, no seu entendimento para a organização das sessões experimentais fazia-se imprescindível a compreensão de toda a dinâmica dos fenômenos mediúnicos. Para tanto o conhecimento doutrinário daria toda a segurança e confiabilidade para lidar com a complexidade que envolve o processo mediúnico.

Referência Bibliográfica


Kardec, Allan. O Que é o Espiritismo. Editora Lake. SP-SP. 26ª edição. 2001.

Fonte: Blog Um Olhar Espírita - http://umolharespirita1.blogspot.com.br/2012/06/as-licoes-de-kardec-ao-critico.html

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