sexta-feira, 13 de maio de 2011

Roustaing Critica Duramente Kardec

Por Gélio Lacerda da Silva

Na edição de "Os Quatro Evangelhos", de J. B. Roustaing, de 1920, impressa em Portugal, financiada pela Federação Espírita Brasileira, no 1° volume, ao longo de 34 páginas (43 à 76), a título de "Prefácio ", com sub-título "Resposta ao artigo de Allan Kardec (Revista, de junho de 1866)", se lê a manifestação de "J. B. Roustaing, Paris 1882", ofendendo duramente Kardec.

O aludido artigo de Kardec, publicado na "Revista Espírita" de Junho de 1866 (e não 1867, como registra o "Prefácio"), a que responde Roustaing, refere-se à apreciação de Kardec sobre "Os Quatro Evangelhos" de Roustaing

Na "Resposta ao artigo de Allan Kardec", Roustaing manifesta sua inconformação por Kardec não ter aceito sua obra, inclusive critica acerbamente Kardec, como veremos nos trechos a seguir transcritos:

"Aplicando o nosso método de crítica ao artigo de Junho de 1866 aí vamos encontrar tudo o que apresentamos à consideração dos leitores a propósito da introdução do "Evangelho Segundo o Espiritismo". Tudo lá está: o fundo, a forma, o ostracismo, a infalibilidade. É a aplicação do sistema preconcebido a uma obra a que se faz desde logo o mais "belo enterro de primeira classe" que se pudera desejar." pág. 47

Veja o leitor: enquanto o próprio Roustaing reconhece que Kardec promoveu o mais "belo enterro de primeira classe" dos seus livros, os dirigentes da Federação Espírita Brasileira insistem nestas afirmativas inverídicas:

"Em sua apreciação à "Revelação da Revelação", por ocasião do aparecimento desta, Kardec deixou de quarentena somente a teoria quanto ao corpo de Jesus, e aprovou tudo o mais". ("Elos Doutrinários", Ismael Gomes Braga, 3a edição, FEB, 1978, pág. 99).

"Nesse mesmo artigo, Kardec nem aprovou nem reprovou a obra de Roustaing;". ("Introdução ao estudo da Doutrina Espírita", la edição, FEB, 1946, pág. 149).

"E se Roustaing contrariasse "O Livro dos Espíritos" (o próprio Kardec disse que não contrariava), eu jamais o aceitaria". (Luciano dos Anjos, in "Abertura", Santos-SP, Junho de 92, pág. 06).

Os roustainguistas febeanos tentam, a qualquer preço, ludibriar a boa fé dos espíritas transcrevendo este trecho da apreciação de Kardec a "Os Quatro Evangelhos", onde se tem a impressão de que Kardec aprovou a obra de Roustaing, por julgá-la:

"considerável e com o mérito de não estar em contradição, por qualquer de seus pontos, com a doutrina ensinada no "O Livro dos Espíritos" e no dos Médiuns..." ("Introdução ao estudo da Doutrina Espírita", lª edição, FEB, 1946, pág. 149).

Mas Kardec, a seguir, explicou sua declaração acima, sobre a qual os roustainguistas se omitem por conveniência (e deslealdade):

"Dissemos que o livro do Sr. Roustaing não se afasta dos princípios do Livro dos Espíritos e do dos Médiuns. Nossas observações são feitas sobre a aplicação, desses mesmos princípios, à interpretação de certos fatos". ("Revista Espírita", Allan Kardec, junho/1866, págs.188/190, EDICEL).

Adotar princípios idênticos à interpretação de certos fatos não significa chegar às mesmas conclusões.

E a prova disso está em Kardec chegar a conclusões diversas das de Roustaing, ainda em sua critica aos livros de Roustaing:

"E assim, por exemplo, que dá ao Cristo, em vez de um corpo carnal, um corpo fluídico concretizado, com todas as aparências da materialidade e de fato um agênere... Sem a prejulgar, diremos que já foram feitas objeções sérias a essa teoria e que, em nossa opinião, os fatos podem perfeitamente ser explicados sem sair das condições da humanidade corporal". (in "Revista Espírita" acima citada, págs. ] 88/190).

E Kardec também acrescenta razões de ordem moral na sua refutação à tese roustainguista ora comentada. ("A Gênese", Allan Kardec, Cap. XV, n° 66).

Na "Revista Espírita", junho/1863, EDICEL, págs.163/166, Kardec, no seu artigo "Do princípio da não retrogradação do Espírito", contesta outra teoria roustainguista de que a encarnação humana só se dá por castigo.

É de se perguntar: Louve-se a honestidade de Roustaing ao reconhecer que Kardec promoveu o mais "belo enterro de primeira classe" de sua obra ou a esperteza dos roustainguistas febeanos ao afirmarem que Kardec "não foi a favor nem contra... " ?

Kardec, no final de sua crítica aos três volumes de "Os Quatro Evangelhos" de Roustaing, escreveu: "Achamos que certas partes são desenvolvidas muito extensamente, sem proveito para a clareza. A nosso ver,limitando-se ao estritamente necessário a obra poderia ter sido reduzida a dois, ou mesmo a um só volume e teria ganho em popularidade". A FEB, entretanto, não pensou assim e aumentou para quatro volumes a edição feita à sua expensas, em Portugal, e ainda acrescentou-lhes as trinta e quatro páginas da resposta de Roustaing ofensiva a Kardec.

Na sua crítica aos livros de Roustaing, o Codificador do Espiritismo declarou que Roustaing ressuscitou o docetismo, doutrina surgida pouco depois da morte de Jesus, segundo a qual Jesus viveu na Terra, aparentemente, não se revestindo de um corpo carnal sujeito às contingências da vida humana.

A reação de Roustaing veio violenta:

"No jornal "La Vérité", Philalétès falara de "Docetismo". Allan Kardec se apoderou desta expressão para aplicá-la à nossa obra.

"Vamos responder a essa pretensão, a essa insinuação que, se não é intencional. Prova que o autor do sistema preconcebido (Kardec!) não conhecia a doutrina dos Docetas, pois que a considerava semelhante à nossa.

"A revelação feita pelos Espíritos Superiores, tendo em vista a obra dos "Quatro Evangelhos" explicados em espírito e verdade, está de conformidade com as modernas descobertas da ciência, com todas as asserções dos investigadores que vimos de citar. Allan Kardec ignorava esse fato ou o conhecia superficialmente, assim como não sabia bem o que era 0 "Docetismo". pág. 49

Observe-se que Roustaing chamou Kardec de ignorante por identificar as teorias de Roustaing com o Docetismo, segundo ele "doutrina errônea, falsa e condenada". E acusou Kardec, sem piedade, de apropriar-se de expressão de Philalétès sobre o Docetismo e ainda deu a Kardec o título pejorativo de "autor do sistema preconcebido".

Para não nos alongarmos nas ofensas a Kardec, que pululam no extenso "Prefácio", citemos apenas mais este trecho:

"É a esse homem (Roustaing), de coração simples e de espírito humilde, que Allan Kardec acusa, sem dúvida inconscientemente, de fazer do Cristo encarnado pelo espírito um "agênere", e, como o Sr. Philalétès, de cujas palavras se apropriou, de ressuscitar o "Docetismo". Nem um nem outro havia lido Roustaing, ambos eram ignorantes e não culpados, mas espalharam escritos errôneos, o que constitui grande falta. (Nota dos discípulos franceses de Roustaing)." (pág. 52)

Nas edições de " Os Quatro Evangelhos " de Roustaing, que se sucederam à de 1920, a FEB excluiu o "Prefácio" contundente a Kardec, mas, lamentavelmente, custa-nos dize-lo, não o fez por respeito à memória de Kardec e sim, tão somente, para que ela, a FEB, não se enforcasse com a sua própria corda.

Eis os motivos que levaram a Federação Espírita Brasileira a não mais publicar o citado "Prefácio" altamente ofensivo a Kardec:

No livro "Elos Doutrinários", de Ismael Gomes Braga, edição FEB, sempre reeditado, cujos conceitos ali expandidos refletem o pensamento dos diretores da Federação Espírita Brasileira, o "Docetismo" é retirado dos porões infetos do navio, onde foi colocado por Roustaing, e instalado num camarote de 1ª classe.

Confira-se:

"O Professor de Escritura Sagrada, Arendzen, de uma das Universidades inglesas, num estudo do Docetismo, anota um renascimento de idéias docéticas em círculos espiritistas, embora—diz ele—menos fantásticas e extravagantes que as do passado. Sim, confirmamos nós outros, a obra de Roustaing ressuscitou o pensamento fundamental do Docetismo—o corpo fluídico de Jesus.

"Cumpriu, destarte, o Paracleto uma das facetas do seu infindo programa esclarecedor e, realmente, sem qualquer extravagância." (3ª edição, pág. 148).

Aí está, caro leitor: a Federação Espírita Brasileira excluiu os comentários insultuosos a Kardec, não para desagravar a memória deste, que ela denegriu, mas tão s6 para salvar a sua própria pele, uma vez que a FEB, hoje, como vimos acima, reconhece que "Os Quatro Evangelhos" de Roustaing ressuscitaram o Docetismo, conforme afirmou Allan Kardec!

Fonte: Conscientização Espírita

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