terça-feira, 31 de maio de 2011

Contribuições do Espiritismo para uma Nova Família

Por Jaci Regis

A família atual sofre ataques profundos em sua estrutura, apressando as mudanças, no conjunto das mutações que revoluciona o comportamento social, abalando velhas estruturas e tradições.

Como conceituar a família atual, comparativamente à tradição? Como executar as funções de pai e mãe num momento tão inseguro como atualmente? Como encaminhar os filhos ou ensiná-los ao autogoverno, em meio a tantas variáveis e da imaturidade natural?

Teria o Espiritismo contribuição objetiva para encaminhar a questão familiar de maneira a ajudar os pais e a família a encontrar um caminho de realização?

Pretendo analisar as questões relativas ao núcleo familiar, na procura de indicações que formulem uma filosofia espírita da família, contribuindo para a dar ao núcleo doméstico a eficiência afetiva que é fundamental para o bom encaminhamento dos Espíritos que reencarnam.

EM BUSCA DE UM NOVO MODELO

Após 1945, a estrutura moral e de valores da sociedade foi definitivamente balada. Após os horrores da II Guerra Mundial do século 20, o modelo que vinha sendo corroído mais aceleradamente com a queda da moral vitoriana do século 19 e pelos efeitos da I Guerra Mundial de 1914-1918, mostrou-se inadequado, falso e hipócrita.

Desde então buscam-se novas formas de relacionamento, sem encontrar um novo rumo. O que se vê é um não-modelo ou um modelo a procura de um sentido, moral e social, com fundas repercussões na instituição da família.

A família nuclear de hoje, na cultura ocidental e cristã, com seu reduzido numero de participantes, é o retrato atual de um longo e diversificado processo de depuração da instituição familiar.

O modelo de relação familiar que herdamos decorre da implantação do cristianismo no mundo ocidental. Analisando a conceituação básica do pensamento cristão, sob a ótica espírita, devido a visão de homem e de mundo adotada, podemos dizer que o cristianismo jamais entendeu a criatura humana, sua estrutura espiritual, medos e ansiedades. Centralizado na obsessão de salvar a humanidade, criou um sistema moralista baseado na negação do ser e na repressão sexual.

A figura paterna passa por revisão avassaladora tanto pelos filhos, como pelo próprios pais. A mãe já não quer ser a rainha do lar, mas deseja participar social e profissionalmente e assumir a condição de mulher desejante, enfim, uma pessoa com direito à busca de si mesma, sem a tutela paterna ou do marido.

Balançam as opções. Persistir no não-modelo , isto é, abandonar e desprezar todo o acervo histórico e moral existente e deixar as coisas correrem ao sabor das casualidades ou manter o modelo a procura de um sentido, resgatando parte do passado e buscando novas orientações, que é o que permanece no limbo das transições em curso.

É verdade que não há como abandonar os fundamentos morais mais substanciais da doutrina cristã. O que incomoda e torna frágil a estrutura familiar é a falta de uma base conceitual límpida, sem coerção e pré-conceitos que se mostram antinaturais.

MUTAÇÕES

Analisarei alguns itens que transformaram o velho modelo familiar.

A - Liberação Sexual da Mulher

Nada mais justo que a mulher tivesse conquistado o direito a sua sexualidade. Seria absurdo persistir no parâmetros que a Igreja cristã estabeleceu para a mulher, seja sexual, humana ou socialmente.

As mulheres têm agora a liberdade de usar sua sexualidade conforme sua consciência. No uso do livre arbítrio, essa liberação será legítima conforme for utilizada de maneira equilibrada e responsável, de maneira a manter a dignidade da pessoa.

É inegável que essa liberação abalou profundamente os alicerces da antiga família . Não apenas por essa elevação social e humana da mulher, mas por todas as transformações que daí decorreram e decorrem para as instituições do casamento, da divisão do trabalho no lar e pela eliminação do poder legal e institucional do homem na estrutura da família. Ou seja o rompimento da base sobre a qual a Igreja edificou o instituto da família.

B - Questionamento do Casamento

A indissolubilidade do casamento, pregada secularmente pela Igreja é um contrassenso, felizmente erradicada pela maioria dos países cristãos. As pessoas até nominalmente cristãs, sem dar importância à posição das igrejas em geral, casam e descasam.

O Espiritismo sempre foi favorável ao divórcio. Kardec disse-o claramente.

Muitas vezes os casamentos são desfeitos pelo voluntarianismo, pelo egoísmo e pela impaciência na adaptação. Outras, entretanto, são decorrentes de situações dramáticas, de sofrimentos e comportamentos que atingem a dignidade. Nesses casos, não há porque mantê-los. Eis o que diz O Livro dos Espíritos:

940 . A falta de simpatia entre os seres destinados a viver juntos não é igualmente uma fonte de sofrimento, tanto mais amarga quanto envenena toda a existência?

- Muito amarga, de fato: mas é uma dessas infelicidades de que, na maioria das vezes, sois a primeira causa. Em primeiro lugar as vossas leis estão erradas, pois acreditais que Deus vos obriga a viver com aqueles que vos desagradam?

A própria instituição do casamento formal, legal, é questionada por muitos. Todavia, o anseio de construir uma família e a procura de uma convivência duradoura, dominam o cenário. Novas formas no relacionamento entre os cônjuges decorrerão do nivelamento mental, moral e até profissional dos parceiros. A antiga família contemplava a supremacia do homem, o “cabeça da família”, o que saía para prover os recursos e a submissão da mulher que devia ficar na casa para os serviços domésticos. O novo panorama exige a mudança desse modelo, com funções compartilhadas pelo casal. O casamento do futuro será baseado no afeto e no amor.

C - Sexualidade Sem Compromisso

Em virtude da liberação sexual da mulher, a sexualidade teve novos contornos na sociedade atual. Muitas máscaras caíram, muita hipocrisia desfez-se e também muito exagero e mesmo libertinagem se instalou. O alastramento da Aids é uma consequência dessa desestruturação moral. “Transar” já é normal. A virgindade feminina não é considerada fundamental. Entretanto, as famílias bem estruturadas deverão criar um clima de confiança e equilíbrio, de compreensão dos fatores sexuais, de modo a induzir os filhos a iniciar-se na sexualidade de maneira consciente, no seu tempo adequado, com apoio e acompanhamento dos pais.

D - Limitação dos Filhos

Na onda de transformações, as famílias encolheram. Dificuldades naturais e outros fatores levaram os casais na sociedade cristã a pensarem numa família nuclear reduzida. O problema da limitação dos filhos repercute na produção de remédios e métodos anticonceptivos. Alguns notadamente insensíveis e perniciosos, como a utilização do aborto como método anticoncepcional, o que não se pode aceitar. Parece-me, dentro da lei do livre arbítrio, que a decisão de limitar o número de filhos pertence ao casal. O planejamento, entretanto, não será legitimado se for baseado no egoísmo ou na futilidade.

A paternidade realça o valor do homem para si mesmo, tanto quanto a maternidade eleva a mulher no seu próprio conceito. São estados de consciência que gratificam o Espírito, preparando-o para movimentar energias e possibilidades. (Amor, Casamento & Família, Jaci Regis, pág. 69).

REESTRUTURAÇÃO MENTAL

A introdução de um modelo renovador deve começar pela mudança da estrutura mental da pessoa e, posteriormente, pela reestrutura mental da sociedade. Sabemos que a sociedade cria sua própria moral que atua de forma condicionadora sobre o indivíduo. Logo a organização familiar estabelecida pela Igreja, séculos após séculos de indução, criou modelos mentais fixos, a custos reorganizados na mente.

Quando Allan Kardec queixava-se da inexistência de um vocabulário específico para as idéias espíritas, sabia que uma palavra de significado consagrado em tradição secular correspondia a fixações mentais condicionadas.

Assim, a palavra família, por exemplo, embora designe uma estrutura bem conhecida, essencialmente, tem entendimento diferente e contraditório quanto a sua real significação.

No sentido de criação de uma mentalidade mais aberta, devemos considerar que tanto a concepção espiritualista univivencial, como também a materialista, entendem que a família é uma reunião fortuita e circunstancial de pessoas corporais dotadas, para os espiritualistas, de uma alma, criada no momento da concepção e para os materialistas apenas como um organismo vivo.

A concepção espírita é totalmente diferente, uma vez que concebe a vida corpórea como um segmento da vida espiritual dinâmica e imortal. Isto é, que a sociedade humana atual é composta de Espíritos reencarnados, ou seja, seres inteligentes perfeitamente definidos e delineados, dentro da lei da evolução, da qual a reencarnação é instrumento.

Dessa forma, postula que a família, antes de tudo, é um encontro de Espíritos. A família, na visão kardecista, é uma reunião de Espíritos afinizados em níveis de moralidade e evolução.

Na visão cristã e materialista, os filhos, por exemplo, não escolhem a família. São gerados aleatoriamente pelos pais e têm que sofrer suas influências, sem poder dela se esquivar, imposta que foi, pelo azar ou pelo destino, a convivência com eles.

Na compreensão kardecista, dentro de uma possível programação pré-reencarnatória, muitos filhos escolheram as famílias em que se encarnam, dentro da relação afetiva e sintônica que estabelece as ligações emotivas das pessoas.

Na visão cristã e materialista, a criança é um ser inocente criada na gestação, entregue aos azares do destino, cujo futuro dependerá de situações aleatórias, que da qual ao crescer se exigirá caráter ilibado, bom. No caso materialista desembocando na finitude da existência e no cristão, para garantir, depois da morte, um lugar no céu ou condenação. ao inferno.

Na visão kardecista a criança é, essencialmente, um Espírito com acervo evolutivo específico, que se submete a um processo de aprimoramento, na encarnação, da qual sairá mais experiente, em trânsito para a continuidade de seu projeto evolutivo, que recebemos como companheiro de jornada evolutiva.

NOVO MODELO

Primeiro é necessário definir como o Espiritismo analisa a vida corpórea.

Aí a compreensão espírita permeia uma posição de extremo equilíbrio. Embora enfatizando a natureza imortal do ser, apoiada na visão evolutiva e da reencarnação, de modo algum a doutrina despreza ou diminui a vida terrena. Nem poderia, uma vez que ela não é uma exceção, nem castigo ou exílio, como às vezes se propala, dando seguimento à afirmação cristã da precariedade da vida humana, como mera transição para o céu ou o inferno.

Em outras palavras, o Espiritismo dá grande ênfase à vida terrena. Para o espírita a encarnação não é um constrangimento.

No nosso nível evolutivo, ela é uma decorrência natural, desejada e imprescindível. Na medida que o Espiritismo nos liberta das velhas contradições do cristianismo a respeito da ação divina e do pecado, vamos compreendendo que encarnar representa uma condição necessária e que cada vida corpórea, matizada pelo esquecimento do passado, representa uma aventura, um caminho a ser percorrido com surpresas, vitórias, fracassos.

Nessa vida o Espírito exprime seus sentimentos, medos, desvios e acertos. Mas é também da sabedoria divina, que a encarnação promove um processo de desvinculação das personalidades anteriores e, embora guardando, como é compreensível, o imo de si mesmo, apresenta-se no mundo aberto, desguarnecido, pronto para receber influenciações que são decisivas para definir.

Isto é, o esquecimento das vidas passadas é, justamente, o instrumento capaz de permitir ao reencarnado viver a vida como se fosse a primeira e única vez que o faz.

Por isso esse modelo não cria qualquer diferença ou condena as manifestações comuns e naturais, sejam sexuais ou afetivas que geralmente constroem as relações familiares.

Não encontro base para engessar o pensamento em formas expiatórias relativas a erros do passado. Ou seja, não considero que todas as agregações familiares sejam previamente combinadas antes da encarnação. Não descarto essa possibilidade, mas não a tomo como básica na compreensão das relações afetivas entre o casal e os filhos e no conjunto familiar em geral.

Isso é necessário para libertar a mente de fantasmas e evitar justificar comportamentos agressivos, ódios, apegos excessivos ou outras formas que constituem uma grande parte da relação familiar, sempre com consequências funestas.

O amor, a afeição são forças interiores da estrutura espiritual e não precisam de justificativas sobre possíveis ligações anteriores para se consolidarem.

Vivendo intensamente a realidade do presente, embora com a visão ampla e libertadora da doutrina espírita, construiremos a família dentro de modelos dinâmicos, exercendo as funções paternais com desembaraço e consciência.

O NÓ DOS CONFLITOS

Os mecanismos da reencarnação são dispostos de modo que ao encarnar o Espírito, desvincula-se de suas personalidade, embora mantendo o acervo próprio de sua individualidade.

Com isso, o Espírito pode reiniciar seu aprendizado terreno, como se fora a primeira vez que o fizesse. O esquecimento do passado é um instrumento básico para permitir a reciclagem das personalidades, condição indispensável à criação de oportunidades de crescimento e refazimento.

Essa realidade nos livra de permanecer na relação humana na posição dúbia de querer ver além do tempo, a motivação pessoal de certos conflitos.

Diante do cônjuge de difícil convivência não há como vê-lo como alguém que nos cobra a culpa por erros do passado, a pretexto de pagar dívidas passadas. Amá-lo, suporta-lo ou tolerá-lo ou não, será fruto da consciência dos fatores que cada um tem que analisar para a tomada de decisões. Da mesma forma o filho rebelde e difícil não tem que ser olhado como uma desafeto que volta para cobrar alguma coisa.

São desafios difíceis, mas que podem ser enfrentados, a partir de uma visão menos utilitarista da vida

Essa diversidade de visão caracteriza formas muitos diferentes de analisar a vida terrena e deveria desencadear motivações pedagógicas e comportamentais profundamente positivas na relação familiar, considerando a posição espírita.

Muitos pais reclamam das dificuldades em criar um ambiente doméstico equilibrado e basicamente positivo. Dizem, com certa razão, que existem, hoje em dia, concorrentes poderosos à conivência familiar. A inserção da mulher no mercado de trabalho, por exemplo, tirou o papel de dona de casa . Se o casal trabalha fora, há de haver uma concentração mental e moral capaz de suprir a ausência com a criação de uma psicosfera familiar segura, de modo que os filhos se sintam importantes, notados e amados, ainda que sem a presença constante dos pais.

Essa circunstância obriga a entregar os filhos em mão de terceiros, sejam parentes, empregados ou instituições, mas isso, como se pode comprovar, não afasta os filhos dos pais desde que, como disse, se deem aos filhos de maneira consistente.

Na verdade, a maioria dos problemas dos filhos é decorrentes do abandono devido a futilidades e egoísmos materno ou paterno, de modo que vibracionalmente eles sentem que são deixados de lado, que não são importantes ou amados.

A concorrência da televisão pode e deve ser contornada com a formação do hábito da conversa positiva, do diálogo e da união familiar em torno de tarefas de ideal, de serviço ao próximo, de utilidade humana, ao lado da merecida e equilibrada cota de laser, recreação, conforme as condições permitirem.

Verificamos que a função paterna e materna, não se complica, mas exige uma atuação mais próxima, mais constante e uma abertura mental dos genitores para olhar os filhos com novo olhar.

A visão imortalista produz efeitos benéficos na estrutura do ser. No caso de uma gravides, por exemplo, a mãe e, ao seu lado o pai, acompanharão o desenvolvimento do feto com ternura e expectativa, sabendo embora que aí se está gerando um corpo que servirá de expressão viva de um Espírito vivido, que virá ao encontro de seu lar para receber amor, compreensão, diretrizes.

Certamente ele será um bebê, criança e viverão a realidade da convivência. Os pais chorarão por ele, se preocuparão com as doenças, com os problemas e o futuro dele. Mas tudo isso dentro de uma ótica mais equilibrada e compreensiva.

CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS

Bem compreendido o Espiritismo é instrumento de libertação e expansão da consciência. A reencarnação, como vimos, é um instrumento do processo evolutivo do ser imortal. É um segmento repetitivo, na nossa fase atual, de aprendizado e reajustamento psicológico, emotivo e moral.

No vocabulário espírita, as expressões castigo, punição, expiação, provas , relativamente ao ser e à vida corpórea, devem ser entendidas, sobretudo, como oportunidades . Ou seja, a divindade não pune, oportuniza.

Devido às realidades espirituais dos habitantes deste planeta e as implicações culturais, o lar só será o doce lar, conforme forem cultivados pelos seus componentes valores positivos. Isso não significa uma homogeneidade total, pois, pragmaticamente, a família é um polo de conflitos. De conflitos porque reúne em seu espaço afetivo todas as paixões e aspirações humanas. Nele reúnem-se Espíritos vivenciados, em busca de uma nova oportunidade de crescimento que a encarnação permite.

Essa visão espírita é extremamente moral, mas não moralista. O Espiritismo baseia-se nos fundamentos da moral de Jesus de Nazaré. Todavia, a filosofia de vida é determina o comportamento. As informações e mesmo o conhecimento formal e intelectual das coisas, nem sempre consegue mudar os impulsos afetivos, nem direcionar convenientemente as emoções.

O sentimento é que estabelece a forma de vivenciar.

E o sentimento é produto de um complexo de percepções do Espírito, que tem que manipular, entretecer-se com variáveis afetivas que incluem o medo, o desejo, a rejeição e o amor, este compreendido, antes de tudo, como uma forma de sentir-se aceito, protegido, sustentado afetivamente.

É a partir dessa matriz que o comportamento se realiza na relação, pois podemos saber que não devemos fazer algo mas fazemos, temos conhecimento que certas formas de agir são prejudicais e mesmo assim as executamos.

Dito isto, consideremos a base moral das relações. É certo que existe uma moral social, coletiva, cultural. São crenças, costumes e leis que estabelecem os limites da relação entre as pessoas, nas quais a família se insere. Pois a moral, em resumo, é a maneira como cada um se relaciona consigo mesmo e com os outros.

Todavia, é também da concepção espírita que existe uma Lei Natural que estabelece limites e canalizações da afetividade, de modo a que a pessoa se encaminhe, pelo melhor caminho possível, para encontrar uma relativa harmonização com a Lei.

Essa compreensão será a baliza da moralidade.

Fonte: Jornal de cultura espírita Abertura, maio de 2000, ano XIII, nº 148 - Santos-SP.

Jaci Regis (1932-2010), psicólogo, jornalista, economista e escritor espírita, foi o fundador e presidente do Instituto Cultural Kardecista de Santos (ICKS), idealizador do Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita (SBPE), fundador e editor do jornal de cultura espírita “Abertura” e autor dos livros “Amor, Casamento & Família”, “Comportamento Espírita”, “Uma Nova Visão do Homem e do Mundo”, “A Delicada Questão do Sexo e do Amor”, “Novo Pensar - Deus, Homem e Mundo”, dentre outros.

Retirado do site PENSE - http://viasantos.com/pense/arquivo/1338.html

Parapsicologia e Espiritismo

Por Francisco Amado

Os adversários do Espiritismo desconhecem tudo a respeito e fazem tremenda confusão. Os próprios Espíritas, por sua vez, na sua esmagadora maioria estão na mesma situação. Por quê? É fácil explicar. Os adversários partem do preconceito e agem por precipitação. Os espíritas, em geral, fazem o mesmo: formulam uma idéia pessoal da Doutrina, um estereótipo mental a que se apegaram. Esquecendo que a Doutrina está nas Obras Básicas.

Não há razões sensatas para o combate tão veemente e ríspido a uma doutrina - tal qual se dá contra o Espiritismo - que segue o Evangelho de Jesus Cristo em toda a sua moral, baseada no bem e no amor a Deus e ao próximo, discordando apenas no que tange certas convicções filosóficas de algumas outras. A intolerância religiosa é fruto das idéias preconcebidas e da presunção de se ser o dono da verdade. O combate ao Espiritismo se deve, na imensa maioria dos casos, ao desconhecimento das suas idéias e à confusão que é semeada no meio por aqueles que não se dispõem a examiná-las com racionalidade e, mesmo assim, lançam seus julgamentos. Contudo, a doutrina do Cristo frutificou apesar da falsa interpretação e oposição daqueles que não a compreendiam. Se as pessoas que detratam o Espiritismo seguissem o ensinamento do apóstolo Paulo, quando nos exorta a examinar tudo e reter o que é bom, certamente teriam outro posicionamento diante de determinadas idéias que repudiam sem conhecimento de causa.

"Há verdadeiramente duas coisas diferentes: saber e crer que se sabe. A ciência consiste em saber; em crer que se sabe reside a ignorância" - (Hipócrates).

Conheça melhor algumas idéias pré-concebidas por muitas pessoas com relação ao Espiritismo:

1)O Espiritismo faz uso de bolas de cristal, prática de quiromancia, astrologia, hipnotismo, magia ou parapsicologia?

Dentre uma série de práticas rotuladas erroneamente como espíritas, estão estas e também outras como a terapia regressiva a vidas passadas (TRVP), a transcomunicação instrumental (TCI), a cristalterapia, a cromoterapia, ufologia etc. A maioria delas não possui fundamentação doutrinária lógica, e não encontram respaldo nas obras de Allan Kardec, portanto, não são práticas espíritas.

Qualquer Centro Espírita que se utilize de tais práticas está se desviando dos seus verdadeiros e nobres objetivos. As notícias freqüentemente veiculadas pela mídia em geral de que os espíritas previram o futuro, fizeram oferendas a Iemanjá, estão ligados a culto demoníaco, dentre outras, comprovam o desconhecimento que existe sobre a doutrina espírita, apesar da sua atual expansão e crescente número de adeptos. O Espiritismo não é responsável pelos que abusam do seu nome e o exploram. Assim como a ciência médica não o é pelos charlatões que vendem suas drogas ou como a religião também não o é pelos sacerdotes que abusam do seu ministério.

2) O Espiritismo faz macumba, despacho ou qualquer outro ritual?

O Espiritismo não tem culto material e nem tem rituais, não prescreve qualquer vestimenta, nem função sacerdotal, não usa imagens, nem faz sacrifícios de animais ou seres humanos, não tem símbolos ou sinais cabalísticos, não faz cerimônias matrimoniais, ou de batismo, nem exorcismo.

Resumindo, a doutrina espírita, tendo como principal objetivo o cultivo dos valores do Espírito, é totalmente isenta de atos exteriores. Sua nomenclatura se baseia nas obras da codificação e suas práticas mediúnicas são executadas dentro de um ambiente evangélico de harmonia e oração, sem qualquer culto exterior ou movimentos e palavreado estereotipados. Suas reuniões mediúnicas são fechadas ao público e conduzidas com rigor, onde não existem velas, cantos, danças, cigarro, bebida ou cobrança de taxas. Compreende-se, portanto, que qualquer culto que contenha tais práticas, não pode e não deve receber a designação de espírita. "Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade" - (João, 4:24).

3) Qual a diferença do Espiritismo Kardecista para os outros? O que é Espiritismo de mesa branca?

A doutrina espírita não comporta nenhuma ramificação. Como já colocado na questão '02', por suas convicções dispensa qualquer ritual ou aparato. A designação popular de mesa branca pode ter advindo do fato de que as reuniões mediúnicas espíritas ocorrem, para simples acomodação, com os participantes dispostos ao redor de uma mesa, algumas vezes, com uma toalha branca recoberta sobre ela, o que é absolutamente dispensável. Como tais reuniões tem caráter íntimo e privado, disciplinado e beneficente, o termo mesa branca surgiu para diferenciar o Espiritismo de outros cultos, sendo este termo utilizado popularmente também como sinônimo de Kardecista. Trata-se de um equívoco generalizado, uma vez que só há um Espiritismo - termo criado pelo próprio Allan Kardec -, o qual tem sua base fundada nas obras básicas codificadas por ele, a saber: O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho Segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno e A Gênese. O Espiritismo não adota práticas exteriores para ser diferenciado. Assim, nem mesa branca, alto ou baixo Espiritismo, Espiritismo elevado, etc, são sinônimos de doutrina espírita.

4) Todos os médiuns são espíritas?

A mediunidade é uma faculdade inerente a qualquer pessoa. Nem todos os que têm a capacidade de estabelecer um contato mediúnico são, por esse motivo, espíritas. Esse falso julgamento faz com que muitas pessoas tenham uma idéia errônea do que seja o Espiritismo e dela se afastem sem buscar conhecê-la.

5) Para ser espírita tem que ser médium?

Espírita é aquele que crê, estuda e segue a doutrina espírita. É reconhecido pelo esforço que faz em aprimorar-se dentro dos princípios cristãos, não tendo necessariamente que trabalhar com a mediunidade. A faculdade mediúnica como missão, ou mediunato, como todas as demais faculdades, não deve ser imposta. Uma vez detectada e em acordo com o desejo do médium, deve ser desenvolvida em sessões espíritas apropriadas, com dedicação sincera e humildade, para ser verdadeiramente produtiva .

6) Por quê confundem o Espiritismo com umbanda?

A umbanda é um culto religioso respeitado pelos espíritas como todos os outros o são, até mesmo porque está amparado no princípio geral da liberdade de crença contido na Constituição do Brasil. Contudo, ela não é Espiritismo. Seu acervo de símbolos, objetos, instrumentos, práticas, etc, não se ajustam de maneira alguma à doutrina espírita. Aqueles que confundem umbanda com Espiritismo se apegam às seguintes afirmações: a umbanda é espiritualista, rende culto a Deus, fundamenta-se em fenômenos produzidos por espíritos desencarnados, aceita a reencarnação e faz caridade. Todavia, a umbanda tem culto material, rituais, vestimentas específicas, imagens, altares, pontos riscados e denominações totalmente especiais para médiuns (cavalos) e espíritos (exús, pretos-velhos, caboclos, ibegis), que não existem no Espiritismo. Além dessas abismais diferenças, a umbanda não se rege pela codificação de Allan Kardec. Portanto, está claro que, embora espiritualista e tendo características mediúnicas, a umbanda não constitui variante nem modalidade do Espiritismo. Essa confusão se dá pelo desconhecimento do que seja a doutrina espírita e conseqüente interpretação errônea dos fenômenos da mediunidade.

O Espiritismo é definido por Kardec como “a ciência que estuda a origem, a natureza e a destinação dos Espíritos, bem como sua relação com o mundo corpóreo. É ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma filosofia de conseqüências morais”

É o pensamento debruçado sobre si mesmo para reajustar-se à realidade.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

O Rustenismo e a Infalibilidade Bíblica

Por Sérgio Aleixo

Roustaing e seus discípulos ainda não haviam chegado à Era da Razão, porque se mostraram por demais entusiastas de teorias mirabolantes, vertidas na linguagem prolixa de Espíritos enganadores, que só fizeram lançá-los às vagas místicas dos tempos mágicos da antiga Era Mitológica.

Eles julgavam que textos bíblicos, como os versículos da revelação do anjo a Maria e depois a José, por exemplo, “não podem e não devem ser recusados”.[1] E por esta pseudorrazão, para eles, “o que de Maria nasceu se formou por obra do Espírito Santo”; entendiam que a concepção, a gravidez e o parto “não podiam ser e não foram reais”, mas “apenas aparentes”, porque, “se reais tivessem sido, estaríamos em presença de um fato contrário às leis naturais que presidem à geração dos corpos no seio da humanidade terrena”.[2]

Bem se vê a opção do misticismo roustainguista: desumanizar o Cristo, “coisificar” Jesus (“o que” de Maria nasceu). Roustaing e seus discípulos, pois, rejeitaram a ordem natural biológica, criada por Deus e atestada pela Ciência, em favor da infalibilidade das Escrituras, dogma humano. Não surpreende que tenham a concepção delirante de que, até que se verifique a chegada de um certo “Espírito Regenerador”, bem como sua influência sobre o Papa, os médiuns “obterão somente fatos isolados, estranhos à ordem comum dos fatos”.[3]

Ao oposto da racionalidade do Espiritismo, a “escola” de Roustaing acredita que, por estar escrito na Bíblia, um texto possui valor de dogma, abrigando necessariamente um suposto significado espiritual. Seria o caso das palavras bíblicas que dizem não ter Jesus pai, ou mãe, ou mesmo genealogia.[4] Evidentemente, foram escritas numa preocupação com a tese do pecado original. Como subtrair Jesus a uma tal maldição? Negar-lhe a genealogia, a natureza biológica.

Acreditando que se empenhava em autenticar o texto evangélico, Roustaing afirmou que a influência “magneto-espírita” produziu “ilusão completa na mulher virgem e em todos os que testemunharam o fato”, ou seja, que “a concepção, a gravidez, o parto podem ser imitados”.[5] O magnetizador, segundo ele, foi o próprio Jesus, que “se serviu da faculdade mediúnica da Virgem Maria para, fluidicamente, simular nela a gravidez”; e esta ideia absurda foi justificada — pasmem — pela necessidade de o Messias vir ao planeta Terra “respeitando as tradições e os preconceitos da nação judaica”.[6]

Então, diziam Roustaing e seus discípulos que “Jesus Cristo não foi um homem carnal, revestido de um corpo material humano, qual o do homem terreno, sujeito como este à morte; não, ele não morreu efetivamente no Gólgota”.[7]

Ensinavam estas excrescências e depois acusavam Kardec e os espíritas de ser-lhes “indispensável um Jesus sangrento, choroso, gemebundo, andrajoso e ofegante”; invertendo a ordem natural, a “escola” de Roustaing afiançava que “há dois mil anos o populacho e os crentes tudo sacrificam para gozar desse espetáculo fictício e legendário, mas que para um e outros é real”; e decretava que “o Cristo, natureza superior, não podia sofrer segundo o nosso modo de entender material e terra a terra, eis o que, daqui por diante, devemos aceitar como verdade”. [8]

Herdeiros do melhor do Iluminismo, acostumados à análise crítica e ao raciocínio lógico-naturalista de Allan Kardec e de seus elevados Protetores, os espíritas deveriam preferir, segundo os rustenistas, a impostura à verdade; deveriam considerar como realidade histórica a mal-acabada reedição de um simples mito delirante concebido por longínqua seita gnóstica.

Aliás, risível é que se diga no opúsculo rustenista que “a tradição mais bela e generosa é a que nos legaram os grandes missionários da humanidade, sacrificando suas vidas”,[9] pois o rustenismo nega o sacrifício do maior de todos estes missionários ao dizer que Jesus “não morreu efetivamente”; que, neste sentido, tudo não passou de “um espetáculo fictício e legendário”, destinado a entreter “o populacho e os crentes”. Tática semelhante à do ladrão astuto que grita: “Pega ladrão!”.

[1] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 58.
[2] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 59.
[3] Os Quatro Evangelhos. Vol. III, n. 196, F.E.B., 5.ª ed., 1971, pp. 65-66.
[4] Hebreus 7:3.
[5] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 55.
[6] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 61.
[7] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 59.
[8] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 68.
[9] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 76.

Fonte: http://oprimadodekardec.blogspot.com/2011/02/capitulo-7-o-rustenismo-e.html

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Origem da crença nos demônios

Por Allan Kardec

1. - Em todos os tempos os demônios representaram papel saliente nas diversas teogonias, e, posto que consideravelmente decaídos no conceito geral, a importância que se lhes atribui, ainda hoje, dá à questão uma tal ou qual gravidade, por tocar o fundo mesmo das crenças religiosas. Eis por que útil se torna examiná-la, com os desenvolvimentos que comporta.

A crença num poder superior é instintiva no homem. Encontramo-la, sob diferentes formas, em todas as idades do mundo. Mas, se hoje, dado o grau de cultura atingido, ainda se discute sobre a natureza e atributos desse poder, calcule-se que noções teria o homem a respeito, na infância da Humanidade.

2. - Como prova da sua inocência, o quadro dos homens primitivos extasiados ante a Natureza e admirando nela a bondade do Criador é, sem dúvida, muito poético, mas pouco real. De fato, quanto mais se aproxima do primitivo estado, mais o homem se escraviza ao instinto, como se verifica ainda hoje nos povos bárbaros e selvagens contemporâneos; o que mais o preocupa, ou, antes, o que exclusivamente o preocupa é a satisfação das necessidades materiais, mesmo porque não tem outras.

O único sentido que pode torná-lo acessível aos gozos puramente morais não se desenvolve senão gradual e morosamente; a alma tem também a sua infância, a sua adolescência e virilidade como o corpo humano; mas para compreender o abstrato, quantas evoluções não tem ela de experimentar na Humanidade! Por quantas existências não deve ela passar!

Sem nos remontarmos aos tempos primitivos, olhemos em torno a gente do campo e perscrutemos os sentimentos de admiração que nela despertam o esplendor do Sol nascente, do firmamento a estrelada abóbada, o trino dos pássaros, o murmúrio das ondas claras, o vergel florido dos prados. Para essa gente o Sol nasce por hábito, e uma vez que desprende o necessário calor para sazonar as searas, não tanto que as creste, está realizado tudo o que ela almejava; olha o céu para saber se bom ou mau tempo sobrevirá; que cantem ou não as aves, tanto se lhe dá, desde que não desbastem da seara os grãos; prefere às melodias do rouxinol, o cacarejar da galinhada e o grunhido dos porcos; o que deseja dos regatos cristalinos, ou lodosos, é que não sequem nem inundem; dos prados, que produzam boa erva, com ou sem flores.

Eis aí tudo o que essa gente almeja, ou, o que é mais, tudo o que da Natureza apreende, conquanto muito distanciada já dos primitivos homens.

3. - Se nos remontarmos a estes últimos, então, surpreendê-los-emos mais exclusivamente preocupados com a satisfação de necessidades materiais, resumindo o bem e o mal neste mundo somente no que concerne à satisfação ou prejuízo dessas necessidades.

Acreditando num poder extra-humano e porque o prejuízo material é sempre o que mais de perto lhes importa, atribuem-no a esse poder, do qual fazem, aliás, uma idéia muito vaga. E por nada conceberem fora do mundo visível e tangível, tal poder se lhes afigura identificado nos seres e coisas que os prejudicam.

Os animais nocivos não passam para eles de representantes naturais e diretos desse poder. Pela mesma razão, vêem nas coisas úteis a personificação do bem: dai, o culto votado a certas plantas e mesmo a objetos inanimados.

Mas o homem é comumente mais sensível ao mal que ao bem; este lhe parece temor suplanta o reconhecimento.

Durante muito tempo o homem não compreendeu senão o bem e o mal físicos; os sentimentos morais só mais tarde marcaram o progresso da inteligência humana, fazendo-lhe entrever na espiritualidade um poder extra-humano fora do mundo visível e das coisas materiais. Esta obra foi, seguramente, realizada por inteligências de escol, mas que não puderam exceder certos limites.

4. - Provada e patente a luta entre o bem e o mal, triunfante este muitas vezes sobre aquele, e não se podendo racionalmente admitir que o mal derivasse de um benéfico poder, concluiu-se pela existência de dois poderes rivais no governo do mundo. Daí nasceu a doutrina dos dois princípios, aliás lógica numa época em que o homem se encontrava incapaz de, raciocinando, penetrar a essência do Ser Supremo.

Como compreenderia, então, que o mal não passa de estado transitório do qual pode emanar o bem, conduzindo-o à felicidade pelo sofrimento e auxiliando-lhe o progresso? Os limites do seu horizonte moral, nada lhe permitindo ver para além do seu presente, no passado como no futuro, também não lhe permitia compreender que já houvesse progredido, que progrediria ainda individualmente, e muito menos que as vicissitudes da vida resultavam das imperfeições do ser espiritual nele residente, o qual preexiste e sobrevive ao corpo, na dependência de uma série de existências purificadoras até atingir a perfeição.

Para compreender como do mal pode resultar o bem é preciso considerar não uma, porém, muitas existências; é necessário apreender o conjunto do qual - e só do qual - resultam nítidas as causas e respectivos efeitos.

5. - O duplo princípio do bem e do mal foi, durante muitos séculos, e sob vários nomes, a base de todas as crenças religiosas. Vemo-lo assim sintetizado em Oromase e Arimane entre os persas, em Jeová e Satã entre os hebreus. Todavia, como todo soberano deve ter ministros, as religiões geralmente admitiram potências secundárias, ou bons e maus gênios. Os pagãos fizeram deles individualidades com a denominação genérica de deuses e deram-lhes atribuições especiais para o bem e para o mal, para os vícios e para as virtudes. Os cristãos e os muçulmanos herdaram dos hebreus os anjos e os demônios.

6. - A doutrina dos demônios tem, por conseguinte, origem na antiga crença dos dois princípios. Compete-nos examiná-la aqui tão-somente no ponto de vista cristão para ver se está de acordo com as noções mais exatas que possuímos hoje, dos atributos da Divindade.

Esses atributos são o ponto de partida, a base de todas as doutrinas religiosas; os dogmas, o culto, as cerimônias, os usos e a moral, tudo é relativo à idéia mais ou menos justa, mais ou menos elevada que se forma de Deus, desde o fetichismo até o Cristianismo. Se a essência de Deus continua a ser um mistério para as nossas inteligências, compreendemo-la no entanto melhor que nunca, mercê dos ensinamentos do Cristo. O Cristianismo racionalmente ensina-nos que: Deus é único, eterno, imutável, imaterial, onipotente, soberanamente justo e bom, infinito em todas as perfeições.

Foi por isso que algures dissemos - (1ª Parte cap. VI, "Doutrina das penas eternas") "Se se tirasse a menor parcela de um só dos seus atributos, não haveria mais Deus, por isso que poderia coexistir um ser mais perfeito." Estes atributos, na sua plenitude absoluta, são, pois, o critério de todas as religiões, estalão da verdade de cada um dos princípios que ensinam. E para que qualquer desses princípios seja verdadeiro, preciso é que não encerre um atentado às divinas perfeições. Vejamos se assim é, de fato, na doutrina vulgar dos demônios.

Os demônios segundo a Igreja

7 . Satanás, o chefe ou o rei dos demônios, não é, segundo a Igreja, uma personificação alegórica do mal, mas uma entidade real, praticando exclusivamente o mal, enquanto que Deus pratica exclusivamente o bem.

Tomemo-lo, pois, tal qual no-lo representam. Satanás existe de toda a eternidade, como Deus, ou ser-lhe-á posterior? Existindo de toda a eternidade é incriado, e, por conseqüência, igual a Deus. Este Deus, por sua vez, deixará de ser único, pois haverá um deus do mal. Mas se lhe for posterior? Neste caso passa a ser uma criatura de Deus. Como tal, só praticando o mal por incapaz de fazer o bem e tampouco de arrepender-se, Deus teria criado um ser votado exclusiva e eternamente ao mal. Não sendo o mal obra de Deus, seria contudo de uma das suas criaturas, e nem por isso deixava Deus de ser o autor, deixando igualmente de ser profundamente bom. O mesmo se dá, exatamente, em relação aos seres maus chamados demônios.

8. - Tal foi, por muito tempo, a crença neste sentido. Hoje dizem (1): "Deus, que é a bondade e santidade por excelência, não os havia criado perversos e maus. A mão paternal que se apraz imprimir em todas as suas obras o cunho de infinitas perfeições, cumulara-os de magníficos predicados. As qualidades eminentíssimas de sua natureza, juntara as liberalidades da sua graça; em tudo os fizera iguais aos Espíritos sublimes de glória e felicidade; subdivididos por todas as suas ordens e adstritos a todas as classes, eles tinham o mesmo fim e idênticos destinos. Foi seu chefe o mais belo dos arcanjos. Eles poderiam até ter alcançado a confirmação de justos para todo o sempre, e serem admitidos ao gozo da bem-aventurança dos céus. Este último favor, que deverá ser o complemento de todos os outros, constituía o prêmio da sua docilidade, mas dele desmereceram por insensata e audaciosa revolta."

(1) As citações seguintes são extraídas da pastoral de Monsenhor Gousset, cardeal-arcebispo de Reims, para a quaresma de 1865. Atentos ao mérito pessoal e à posição do autor, podemos considerá-las a última expressão da Igreja sobre a doutrina dos demônios.

"Qual foi o escolho da sua perseverança? Que verdade desconheceram? Que ato de adoração, de fé, recusaram a Deus? A Igreja e os anais das santas escrituras não no-lo dizem positivamente, mas certo parece que não aquiesceram à mediação do Filho de Deus, nem à exaltação da natureza humana em Jesus-Cristo."

"O Verbo Divino, criador de todas as coisas, é também o mediador e salvador único, na Terra como no Céu. O fim sobrenatural não foi dado aos anjos e aos homens senão na previsão de sua encarnação e méritos, pois não há proporção alguma entre a obra dos Espíritos eminentes e a recompensa, que é o próprio Deus. Nenhuma criatura poderia alcançar tal fim, sem esta maravilhosa e sublime intervenção da caridade. Ora, para preencher a distância infinita que separa a sua essência das suas obras, preciso fora reunisse à sua pessoa os dois extremos, associando à divindade as naturezas ou do anjo, ou do homem: e preferiu então a natureza humana. Esse plano, concebido de toda eternidade, foi manifestado aos anjos muito antes da sua execução: o Homem-Deus foi-lhes mostrado como Aquele que deveria confirmá-los na graça e guiá-los à glória, sob a condição de o adorarem durante a missão terrestre, e para todo o sempre no céu. Revelação inesperada, arrebatadora visão para corações generosos e gratos, mas - mistério profundo - humilhante para espíritos soberbos! Esse fim sobrenatural, essa glória imensa que lhes propunham não seria unicamente a recompensa de seus méritos pessoais. Nunca poderiam atribuir a si próprios os títulos dessa glória! Uni mediador entre Deus e eles! Que injúria à sua dignidade! E a preferência espontânea pela natureza humana? Que injustiça! que afronta aos seus direitos!"

"E chegarão eles a ver esta Humanidade, que lhes é tão inferior, deificada pela união com o Verbo, sentada à mão direita de Deus em trono resplandecente? Consentirão enfim que ela ofereça a Deus, eternamente, a homenagem da sua adoração?"

"Lúcifer e a terça parte dos anjos sucumbiram a tais pensamentos de inveja e de orgulho. S. Miguel e com ele muitos exclamaram: "Quem é semelhante a Deus? Ele é o dono de seus dons, o soberano Senhor de todas as coisas. Glória a Deus e ao Cordeiro, que tem de ser imolado à salvação do mundo." O chefe dos rebeldes, porém, esquecido de que a Deus devia a sua nobreza e prerrogativas, raiando pela temeridade, disse: "Sou eu quem ao céu subirá; fixarei residência acima dos astros; sentar-me-ei sobre o monte da aliança, nos flancos do Aquilão, dominarei as nuvens mais elevadas e serei semelhante ao Altíssimo." Os que de tais sentimentos partilharam, acolheram essas palavras com murmúrios de aprovação, e partidários houve em todas as hierarquias. A sua multidão, contudo, não os preserva do castigo."

9. - Esta doutrina suscita várias objeções:

1ª - Se Satã e os demônios eram anjos, eles eram perfeitos; como, sendo perfeitos, puderam falir a ponto de desconhecer a autoridade desse Deus, em cuja presença se encontravam? Ainda se tivessem logrado uma tal eminência gradualmente, depois de haver percorrido a escala da perfeição, poderíamos conceber um triste retrocesso; não, porém, do modo por que no-los apresentam, isto é, perfeitos de origem.

A conclusão é esta: - Deus quis criar seres perfeitos, porquanto os favorecera com todos os dons, mas enganou-se: logo, segundo a Igreja, Deus não é infalível! (1)

(1) Esta doutrina monstruosa é corroborada por Moisés, quando diz (Gênese, cap. VI, vv. 6 e 7): "Ele se arrependeu de haver criado o homem na Terra e, penetrado da mais intima dor, disse: Exterminarei a criação da face da Terra; exterminarei tudo, desde o homem aos animais, desde os que rastejam sobre a terra até os pássaros do céu, porque me arrependo de os ter criado." Ora, um Deus que se arrepende do que fez não é perfeito nem infalível; portanto, não é Deus. E são estas as palavras que a Igreja proclama! Tampouco se percebe o que poderia haver de comum entre os animais e a perversidade dos homens, para que merecessem tal extermínio.

2ª - Pois que nem a Igreja e nem os sagrados anais explicam a causa da rebelião dos anjos para com Deus e apenas dão como problemática (quase certa) a relutância no reconhecimento da futura missão do Cristo, que valor - perguntamos -que valor pode ter o quadro tão preciso e detalhado da cena então ocorrente? A que fonte recorreram, para inferir se de fato foram pronunciadas palavras tão claras e até simples colóquios? De duas uma: ou a cena é verdadeira ou não é. No primeiro caso, não havendo dúvida alguma, por que a Igreja não resolve a questão? Mas se a Igreja e a História se calam se a coisa apenas parece certa, claro, não passa de hipótese, e acena descritiva é mero fruto da imaginação. (2)

(2) Encontra-se em Isaías, cap. XIV, Vv. 11 e seguintes: "Teu orgulho foi precipitado nos infernos; teu corpo morto baqueou par terra; tua cama verterá podridão, e vermes tua vestimenta. Como caíste do Céu, Lúcifer, tu que parecias tão brilhante ao romper do dia? Como foste arrojado sobre a Terra, tu que ferias as nações com teus golpes; que dizias de coração: Subirei aos céus, estabelecerei meu trono acima dos astros de Deus, sentar-me-ei acima das nuvens mais altas e serei igual ao Altíssimo! E todavia foste precipitado dessa glória no inferno, até o mais fundo dos abismos. Os que te virem, aproximando-se, encarar-te-ão, dizendo: "Será este o homem que turbou a Terra, que aterrou seus remos, que fez do mundo um deserto, que destruiu cidades e reteve acorrentados os que se lhe entregaram prisioneiros?" Estas palavras do profeta não se relerem à revolta dos anjos,' são, sim, uma alusão ao orgulho e à queda do rei de Babilônia, que retinha os judeus em cativeiro, como atestam os últimos versículos. O rei de Babilônia é alegoricamente designado por Lúcifer, mas não se faz aí qualquer menção da cena supra descrita. Essas palavras são do rei que as tinha no coração e se colocava por orgulho acima de Deus, cujo povo escravizara. A profecia da libertação do povo judeu, da rainha de Babilônia e do destroço dos assírios é, ao demais, o assunto exclusivo desse capítulo.

3ª- As palavras atribuídas a Lúcifer revelam uma ignorância admirável num arcanjo que, por sua natureza e grau atingido, não deve participar, quanto à organização do Universo, dos erros e dos prejuízos que os homens têm professado, até serem pela Ciência esclarecidos. Como poderia, então, dizer que fixaria residência acima dos astros, dominando as mais elevadas nuvens?!

É sempre a velha crença da Terra como centro do Universo, do céu como que formado de nuvens estendendo-se às estrelas, e da limitada região destas, que a Astronomia nos mostra disseminadas ao infinito no infinito espaço! Sabendo-se, como hoje se sabe, que as nuvens não se elevam a mais de duas léguas da superfície terráquea, e falando-se em dominá-las por mais alto, referindo-se a montanhas, preciso fora que a observação partisse da Terra, sendo ela, de fato, a morada dos anjos. Dado, porém, ser esta em região superior, inútil fora alçar-se acima das nuvens. Emprestar aos anjos uma linguagem tisnada de ignorância, é confessar que os homens contemporâneos são mais sábios que os anjos. A Igreja tem caminhado sempre erradamente, não levando em conta os progressos da Ciência.

10. - A resposta à primeira objeção acha-se na seguinte passagem:

"A escritura e a tradição denominam céu o lugar no qual se haviam colocado os anjos, no momento da sua criação. Mas esse não era o céu dos céus, o céu da visão beatifica, onde Deus se mostra de face aos seus eleitos, que o contemplam claramente e sem esforço, porque aí não há mais possibilidade nem perigo de pecado; a tentação e a dúvida são aí desconhecidas; a justiça, a paz e a alegria reinam imutáveis, a santidade e a glória imperecíveis. Era, portanto, outra região celeste, uma esfera luminosa e afortunada, essa em que permaneciam tão nobres criaturas favorecidas pelas divinas comunicações, que deveriam receber com fé e humildade até serem admitidas no conhecimento da sua realidade essência do próprio Deus."

Do que precede se infere que os anjos decaídos pertenciam a uma categoria menos elevada e perfeita, não tendo atingido ainda o lugar supremo em que o erro é impossível. Pois seja: mas, então, há manifesta contradição nesta afirmativa: - Deus em tudo os tinha criado semelhantes aos espíritos sublimes que, subdivididos em todas as ordens e adstritos a todas as classes, tinham o mesmo fim e idênticos destinos, e que seu chefe era o mais belo dos arcanjos. Ora, em tudo semelhantes aos outros, não lhes seriam inferiores em natureza; idênticos em categorias, não podiam permanecer em um lugar especial. Intacta subsiste, portanto, a objeção.

11. - E ainda há uma outra que é, certamente, a mais séria e a mais grave.

Dizem: - "Este plano (a intervenção do Cristo), concebido desde toda a eternidade, foi manifestado aos anjos muito antes da sua execução." Deus sabia, portanto, e de toda a eternidade, que os anjos, tanto quanto os homens, teriam necessidade dessa intervenção. Ainda mais: - o Deus onisciente sabia que alguns dentre esses anjos viriam a falir, arcando com a eterna condenação e arrastando a igual sorte uma parte da Humanidade. E assim, de caso pensado, previamente condenava o gênero humano, a sua própria criação. Deste raciocínio não há fugir, porquanto de outro modo teríamos que admitir a inconsciência divina, apregoando a não presciência de Deus. Para nós é impossível identificar uma tal criação com a soberana bondade. Em ambos os casos vemos a negação de atributos, sem a plenitude absoluta dos quais Deus não seria Deus.

12. - Admitindo a falibilidade dos anjos como a dos homens, a punição é conseqüência, aliás justa e natural, da falta; mas se admitirmos concomitantemente a possibilidade do resgate, a regeneração, a graça, após o arrependimento e a expiação, tudo se esclarece e se conforma com a bondade de Deus. Ele sabia que errariam, que seriam punidos, mas sabia igualmente que tal castigo temporário seria um meio de lhes fazer compreender o erro, revertendo alfim em benefício deles. Eis como se explicam as palavras do profeta Ezequiel: - "Deus não quer a morte, porém a salvação do pecador." (1)

(1) Vede 1ª' Parte, cap. VI, nº 25, citação de Ezequiel.

A inutilidade do arrependimento e a impossibilidade de regeneração, isso sim,importaria a negação da divina bondade. Admitida tal hipótese, poder-se-ia mesmo dizer, rigorosa e exatamente, que estes anjos desde a sua criação, visto Deus não poder ignorá-lo, foram votados à perpetuidade do mal, e predestinados a demônios para arrastarem os homens ao mal.

13. - Vejamos agora qual a sorte desses tais anjos e o que fazem:

"Mal apenas se manifestou a revolta na linguagem dos Espíritos, isto é, no arrojo dos seus pensamentos, foram eles banidos da celestial mansão e precipitados no abismo. Por estas palavras entendemos que foram arremessados a um lugar de suplícios no qual sofrem a pena de fogo, conforme o texto do Evangelho, que é a palavra mesma do Salvador. Ide, malditos, ao fogo eterno preparado pelo demônio e seus anjos. S. Pedro expressamente diz: que Deus os prendeu às cadeias e torturas infernais, sem que lá estejam, contudo, perpetuamente, visto como só no fim do mundo serão para sempre enclausurados com os réprobos. Presentemente, Deus ainda permite que ocupem lugar nesta criação, à qual pertencem, na ordem de coisas idênticas à sua existência, nas relações enfim que deviam ter com os homens, e das quais fazem o mais pernicioso abuso. Enquanto uns ficam na tenebrosa morada, servindo de instrumento da justiça divina contra as almas infelizes que seduziram, outros, em número infinito, formam legiões e residem nas camadas inferiores da atmosfera, percorrendo todo o globo. Envolvem-se em tudo que aqui se passa, tomando mesmo parte muito ativa nos acontecimentos terrenos."

Quanto ao que diz respeito às palavras do Cristo sobre o suplício do fogo eterno, já nos explanamos no cap. IV, "O Inferno".

14. - Por esta doutrina, apenas uma parte dos demônios está no inferno; a outra vaga em liberdade, envolvendo-se em tudo que aqui se passa, dando-se ao prazer de praticar o mal e isso até o fim do mundo, cuja época indeterminada não chegará tão cedo, provavelmente. Mas, por que uma tal distinção? Serão estes menos culpados? Certo que não, a menos que se não revezem, como se pode inferir destas palavras: "Enquanto uns ficam na tenebrosa morada, servindo de instrumento da justiça divina contra as almas infelizes que seduziram."

Suas ocupações consistem, pois, em martirizar as almas que seduziram. Assim, não se encarregam de punir faltas livre e voluntariamente cometidas, porém as que eles próprios provocaram. São ao mesmo tempo a causa do erro e o instrumento do castigo; e, coisa singular, que a justiça humana por imperfeita não admitiria - a vitima que sucumbe por fraqueza, em contingências alheias e porventura superiores à sua vontade, é tanto ou mais severamente punida do que o agente provocador que emprega astúcia e artifício, visto como essa vitima, deixando a Terra, vai para o inferno sofrer sem tréguas, nem favor, eternamente, enquanto que o causador da sua primeira falta, o agente provocador, goza de uma tal ou qual dilação e liberdade até o fim do mundo.

Como pode a justiça de Deus ser menos perfeita que a dos homens?

15. - Mas, ainda não é tudo: "Deus permite que ocupem lugar nesta criação, nas relações que com o homem deviam ter e das quais abusam perniciosamente." Deus podia ignorar, no entanto, o abuso que fariam de uma liberdade por ele mesmo concedida? Então, por que a concedeu? Mas nesse caso é com conhecimento de causa que Deus abandona suas criaturas à mercê delas mesmas, sabendo, pela sua onisciência, que vão sucumbir, tendo a sorte dos demônios. Não serão elas de si mesmas bastante fracas para falirem, sem a provocação de um inimigo tanto mais perigoso quanto invisível? Ainda se o castigo fora temporário e o culpado pudesse remir-se pela reparação!... Mas não: a condenação é irrevogável, eterna! Arrependimento, regeneração, lamentos, tudo supérfluo!

Os demônios não passam portanto de agentes provocadores e de antemão destinados a recrutar almas para o inferno, isto com a permissão de Deus, que antevia, ao criar estas almas, a sorte que as aguardava. Que se diria na Terra de um juiz que recorresse a tal expediente para abarrotar prisões? Estranha idéia que nos dão da Divindade, de um Deus cujos atributos essenciais são: - justiça e bondade soberanas!

E dizer-se que é em nome de Jesus, dAquele que só pregou amor, perdão e caridade, que tais doutrinas são ensinadas! Houve um tempo em que tais anomalias passavam despercebidas, porque não eram compreendidas nem sentidas; o homem, curvado ao jugo do despotismo, submetia-se à fé cega, abdicava da razão. Hoje, porém, que a hora da emancipação soou, esse homem compreende a justiça, e, desejando-a tanto na vida quanto na morte, exclama: - Não é, não pode ser tal, ou Deus não fora Deus.

16. - "O castigo segue por toda a parte os seres decaídos: o inferno está neles e com eles: nem paz nem repouso, transformadas em amargores as doçuras da esperança, que se lhes torna odiosa. A mão de Deus desferiu-lhes o castigo no ato mesmo de pecarem, e sua vontade galvanizou-se no mal.

"Tornados perversos, obstinam-se em o ser e sê-lo-ão para sempre.

"São, depois do pecado, o que é o homem depois da morte. A reabilitação dos que caíram torna-se também impossível; a sua perda é, desde então, irreparável, mantendo-se eles no seu orgulho perante Deus, no seu ódio contra o Cristo, na sua inveja contra a Humanidade.

"Não tendo podido apropriar-se da glória celeste pelo desmesurado da sua ambição, esforçam-se por implantar seu império na Terra, banindo dela o reino de Deus. O Verbo encarnado cumpriu, apesar disso, os seus desígnios para salvação e glória da Humanidade. Também por isso procuram por todos os meios promover a perda das almas pelo Cristo resgatadas: o artifício e a importunação, a mentira e a sedução, tudo põem em jogo para arrastá-las ao mal e consumar-lhes a perda.

"E como são infatigáveis e poderosos, a vida do homem com inimigos tais não pode deixar de ser uma luta sem tréguas, do berço ao túmulo.

"Efetivamente esses inimigos são os mesmos que, depois de terem introduzido o mal no mundo, chegaram a cobri-lo com as espessas trevas do erro e do vício; os mesmos que, por longos séculos, se fizeram adorar como deuses e que reinaram em absoluto sobre os povos da antigüidade; os mesmos, enfim, que ainda hoje exercem tirânica influência nas regiões idólatras, fomentando a desordem e o escândalo até no seio das sociedades cristãs. Para compreender todos os recursos de que dispõem ao serviço da malvadez, basta notar que nada perderam das prodigiosas faculdades que são o apanágio da natureza angélica. Certo, o futuro e sobretudo a ordem natural têm mistérios que Deus se reservou e que eles não podem penetrar; mas a sua inteligência é bem superior à nossa, porque percebem de um jacto os efeitos nas causas e vice-versa. Esta percepção permite-lhes predizer acontecimentos futuros que escapam às nossas conjeturas. A distância e variedade dos lugares desaparecem ante a sua agilidade. Mais prontos que o raio, mais rápidos que o pensamento, acham-se quase instantaneamente sobre diversos pontos do globo e podem descrever, a distância, os acontecimentos na mesma hora em que ocorrem.

"As leis pelas quais Deus rege o Universo não lhes são acessíveis, razão por que não podem derrogá-las, e, por conseguinte, predizer ou operar verdadeiros milagres; possuem no entanto a arte de imitar e falsificar, dentro de certos limites, as divinas obras; sabem quais os fenômenos resultantes da combinação dos elementos, predizem com maior ou menor êxito os que sobrevêm naturalmente, assim como os que por si mesmos podem produzir. Daí os numerosos oráculos, os extraordinários vaticínios que sagrados e profanos livros recolheram, baseando e acoroçoando tantas e tantas superstições.

"A sua substância simples e imaterial subtrai-os às nossas vistas; permanecem ao nosso lado sem que os vejamos, interessam-nos a alma sem que nos firam o ouvido. Acreditando obedecer aos nossos pensamentos, estamos no entanto, e muitas vezes, debaixo da sua funesta influência. As nossas disposições, ao contrário, são deles conhecidas pelas impressões que delas transparecem em nós, e atacam-nos ordinariamente pelo lado mais fraco. Para nos seduzirem com mais segurança, costumam servir-se de sugestões e engodos conformes com as nossas inclinações. Modificam a ação segundo as circunstâncias e os traços característicos de cada temperamento. Contudo, suas armas favoritas são a hipocrisia e a mentira."

17. - Afirmam que o castigo os segue por toda parte; que não sabem o que seja paz nem repouso. Esta asserção de modo algum destrói a observação que fizemos quanto ao privilégio dos que estão fora do inferno, e que reputamos tanto menos justificado por isso que podem fazer, e fazem, maior mal. É de crer que esses demônios extra-infernais não sejam tão felizes como os bons anjos, mas não se deverá ter em conta a sua relativa liberdade? Eles não possuirão a felicidade moral que a virtude defere, mas são incontestavelmente mais felizes que os seus comparsas do inferno flamífero. Depois, para o mau, sempre há um certo gozo na prática do mal, de mais a mais livremente. Perguntai ao criminoso o que prefere: se ficar na prisão, ou percorrer livremente os campos, agindo à vontade? Pois o caso é exatamente o mesmo.

Afirmam, outrossim, que o remorso os persegue sem tréguas nem misericórdia, esquecidos de que o remorso é o precursor imediato do arrependimento, quando não é o próprio arrependimento. "Tornados perversos, obstinam-se em o ser, e sê-lo-ão para sempre." Mas desde que se obstinam em ser perversos, é que não têm remorsos; do contrário, ao menor sentimento de pesar, renunciariam ao mal e pediriam perdão. Logo, o remorso não é para eles um castigo.

18. - "São, depois do pecado, o que é o homem depois da morte. A reabilitação dos que caíram torna-se, portanto, impossível."

Donde provém essa impossibilidade? Não se compreende que ela seja a conseqüência de sua similitude com o homem depois da morte, proposição que, ao demais, é muito ambígua.

Acaso provirá da própria vontade dos demônios? Porventura da vontade divina? No primeiro caso a pertinácia denota uma extrema perversidade, um endurecimento absoluto no mal, e nem mesmo se compreende que seres tão profundamente perversos pudessem jamais ter sido anjos de virtude, conservando por tempo indefinido, na convivência destes, todos os traços da sua péssima índole e natureza.

No segundo caso, ainda menos se compreende que Deus inflija como castigo a impossibilidade da reparação, após uma primeira falta. O Evangelho nada diz que com isso se pareça.

19. - "A sua perda é desde então irreparável, mantendo-se eles no seu orgulho perante Deus." E de que lhes serviria não manterem tal orgulho, uma vez que é inútil todo o arrependimento? O bem só poderia interessá-los se eles tivessem uma esperança de reabilitação, fosse qual fosse o seu preço. Assim não acontece, no entanto, e pois se perseveram no mal é porque lhes trancaram a porta da esperança. Mas por que lhes trancaria Deus essa porta? Para se vingar da ofensa decorrente da sua insubmissão. E, assim, para saciar o seu ressentimento contra alguns culpados, Deus prefere não somente vê-los sofrer, mas agravar o mal com mal maior; impelir à perdição eterna toda a Humanidade, quando por um simples ato de demência podia evitar tão grande desastre, aliás previsto de toda a eternidade!

Trata-se, no caso vertente, de um ato de demência, de uma graça pura e simples que pudesse transformar-se em estimulo do mal? Não, trata-se de um perdão condicional, subordinado a uma regeneração sincera e completa. Mas, ao invés de uma palavra de esperança e misericórdia, é como se Deus dissera: "Pereça toda a raça humana antes que minha vingança." E com semelhante doutrina ainda muita gente se admira de que haja incrédulos e ateus! E é assim que Jesus nos representa seu Pai? Ele que nos deu a lei expressa do esquecimento e do perdão das ofensas, que nos manda pagar o mal com o bem, que prescreve o amor dos nossos inimigos como a primeira das virtudes que nos conduzem ao céu, quereria desse modo que os homens fossem melhores, mais justos, mais indulgentes que o próprio Deus?
Os demônios segundo o Espiritismo

20. Segundo o Espiritismo, nem anjos nem demônios são entidades distintas, por isso que a criação de seres inteligentes é uma só. Unidos a corpos materiais, esses seres constituem a Humanidade que povoa a Terra e as outras esferas habitadas; uma vez libertos do corpo material, constituem o mundo espiritual ou dos Espíritos, que povoam os Espaços. Deus criou-os perfectíveis e deu-lhes por escopo a perfeição, com a felicidade que dela decorre. Não lhes deu, contudo, a perfeição, pois quis que a obtivessem por seu próprio esforço, a fim de que também e realmente lhes pertencesse o mérito. Desde o momento da sua criação que os seres progridem, quer encarnados, quer no estado espiritual. Atingido o apogeu, tornam-se puros espíritos ou anjos segundo a expressão vulgar, de sorte que, a partir do embrião do ser inteligente até ao anjo, há uma cadeia na qual cada um dos elos assinala um grau de progresso.

Do expresso resulta que há Espíritos em todos os graus de adiantamento, moral e intelectual, conforme a posição em que se acham, na imensa escala do progresso.

Em todos os graus existe, portanto, ignorância e saber, bondade e maldade. Nas classes inferiores destacam-se Espíritos ainda profundamente propensos ao mal e comprazendo-se com o mal. A estes pode-se denominar demônios, pois são capazes de todos os malefícios aos ditos atribuídos. O Espiritismo não lhes dá tal nome por se prender ele à idéia de uma criação distinta do gênero humano, como seres de natureza essencialmente perversa, votados ao mal eternamente e incapazes de qualquer progresso para o bem.

21. - Segundo a doutrina da Igreja os demônios foram criados bons e tornaram-se maus por sua desobediência: são anjos colocados primitivamente por Deus no ápice da escala, tendo dela decaído. Segundo o Espiritismo os demônios são Espíritos imperfeitos, suscetíveis de regeneração e que, colocados na base da escala, hão de nela graduar-se. Os que por apatia, negligência, obstinação ou má-vontade persistem em ficar, por mais tempo, nas classes inferiores, sofrem as conseqüências dessa atitude, e o hábito do mal dificulta-lhes a regeneração. Chega-lhes, porém, um dia a fadiga dessa vida penosa e das suas respectivas conseqüências; eles comparam a sua situação à dos bons Espíritos e compreendem que o seu interesse está no bem, procurando então melhorarem-se, mas por ato de espontânea vontade, sem que haja nisso o mínimo constrangimento. "Submetidos à lei geral do progresso, em virtude da sua aptidão para o mesmo, não progridem, ainda assim, contra a vontade." Deus fornece-lhes constantemente os meios, porém, com a faculdade de aceitá-los ou recusá-los. Se o progresso fosse obrigatório não haveria mérito, e Deus quer que todos tenhamos o mérito de nossas obras. Ninguém é colocado em primeiro lugar por privilégio; mas o primeiro lugar a todos é franqueado à custa do esforço próprio.

Os anjos mais elevados conquistaram a sua graduação, passando, como os demais, pela rota comum.

22. - Chegados a certo grau de pureza, os Espíritos têm missões adequadas ao seu progresso; preenchem assim todas as funções atribuídas aos anjos de diferentes categorias.

E como Deus criou de toda a eternidade, segue-se que de toda a eternidade houve número suficiente para satisfazer às necessidades do governo universal. Deste modo uma só espécie de seres inteligentes, submetida à lei de progresso, satisfaz todos os fins da Criação.

Por fim, a unidade da Criação, aliada à idéia de uma origem comum, tendo o mesmo ponto de partida e trajetória, elevando-se pelo próprio mérito, corresponde melhor à justiça de Deus do que a criação de espécies diferentes, mais ou menos favorecidas de dotes naturais, que seriam outros tantos privilégios.

23. - A doutrina vulgar sobre a natureza dos anjos, dos demônios e das almas, não admitindo a lei do progresso, mas vendo todavia seres de diversos graus, concluiu que seriam produto de outras tantas criações especiais. E assim foi que chegou a fazer de Deus um pai parcial, tudo concedendo a alguns de seus filhos, e a outros impondo o mais rude trabalho. Não admira que por muito tempo os homens achassem justificação para tais preferências, quando eles próprios delas usavam em relação aos filhos, estabelecendo direitos de primogenitura e outros privilégios de nascimento. Podiam tais homens acreditar que andavam mais errados que Deus?

Hoje, porém, alargou-se o circulo das idéias: o homem vê mais claro e tem noções mais precisas de justiça; desejando-a para si e nem sempre encontrando-a na Terra, ele quer pelo menos encontrá-la mais perfeita no Céu.

E aqui está por que lhe repugna à razão toda e qualquer doutrina, na qual não resplenda a Justiça Divina na plenitude integral da sua pureza.

Fonte: O Céu e o Inferno ou A Justiça Divina segundo o Espiritismo

¿Existió André Luiz?

Por Randy

Clique aqui para a versão em português.

El famoso y supuesto autor espiritual André Luiz, que dispensa presentaciones, nos es presentado por Francisco Cándido Xavier como un espíritu inferior que, sin más ni menos, el movimiento espirita elevó a la categoría de espíritu puro.

Si, espíritu puro, pues a los espíritus puros es dado saber todo y André Luiz aparenta tener respuestas para todo. Más, solamente bajo su único punto de vista, sin consolidación ninguna con ningún tipo de medida o consolidación.

Y cuando una información no es medida y cuando no hay el menor interés en medirla, estamos obligados, por plena comprensión del contenido del Libro de los Médiums, a cuestionar la propia identidad del espíritu.

No hay pruebas – ningunas- de la identidad del espíritu. Extrañamente, cuando Kardec recopiló la codificación, los espíritus comunicantes hacia cuestión de identificarse - y con nombres que utilizaron encarnados y que eran plenamente conocidos. La lista es grande y extremadamente significativa. Claro que los nombres en si no dicen nada, más el conjunto de informaciones con identidad también auxilian después en la credibilidad de una información, es claro, medida por el CUEE.

Más… Quien era André Luis?... ¿Cuál era su importancia para la historia en la construcción del pensamiento filosófico? ¿Vamos a apelar - su importancia para la construcción del pensamiento cristiano? ¿Qué gran científico habría sido para mejorar la ciencia espirita? ¿Qué lastro intelecto moral poseía él para, aun mismo sin considerar el CUEE, le daría alguien crédito?

No lo sabemos. Lo que sabemos son las extrañas palabras de Waldo Vieira, co-autor de varios libros firmados por André Luiz, en el sentido de que Chico Xavier defraudado comunicaciones. Eso es grave y eso es muy serio. Tenemos aun comprobaciones de plagio de obras científicas en sites de análisis cético. Y tenemos pareceres de científicos destruyendo las fantasiosas teorías científicas de aquel supuesto autor espiritual.

¿Entonces, ese supuesto espíritu, realmente existió?

¿Qué pruebas tenemos de eso? ¿Basta la palabra de UM médium? ¿El mismo acusado de fraude por su pareja?

Surgieron leyendas de que sería un médico brasileño famoso. Hasta fueron pintados cuadros. ¿Más… donde está la comprobación? Si un Erasto llega a un médium y dicta un compendio de gloriosos axiomas científico/morales y dice: soy Erasto, por que el supuesto espíritu más leído del país nunca dijo: ¿Soy fulano?

Vamos a acordarnos de que ese mismo supuesto espíritu, según las propias palabras de su supuesto autor encarnado, acababa de salir del inexistente Umbral. Bien, si salió de allá, era inferior… Al final, aunque sea posible evolucionar en el plano espiritual, la reencarnación es compulsoria para esa evolución. ¿Entonces, un supuesto espíritu salió del Umbral y luego enseguida se vuelve un sabio con millares de seguidores encarnados?

¿De Donde habría salido, entonces, S. Agustín, S. Luis, Erasto?

Y ese mismo supuesto espíritu, salido del Umbral, dicta impiadosamente una nueva doctrina simulando ser Espiritismo y…las personas le siguen??? ¿Entonces, estamos siguiendo a imperfectos y los superiores son dejados a un lado?

Vamos a hacer otras indagaciones, todas sin respuesta:

-¿Por qué Francisco Xavier nunca recibió comunicación de un espíritu de la codificación?

-¿Por qué este mismo autor jamás recibió una sola comunicación de Kardec?

-¿Por qué jamás se leyó a partir de él una única comunicación del Espíritu de Verdad?

-¿Cuáles, de hecho, fueron las comunicaciones de espíritus de hecho superiores recibidos por este autor?

-¿Y por qué, al final de cuentas, las personas en general no intentan responder a esas preguntas sin pasión e idolatría?

¿Quién es entonces André Luiz? ¿Habrá existido? o fue apenas el fruto de animismo de su autor encarnado- acusado de fraude por su socio?

OBS: estamos totalmente abiertos a la contestación de estas ideas, desde que sean debidamente enviadas. Al final, son preguntas. Tal vez nosotros mismos desconocemos respuestas importantes. Vamos a ver… Siempre hay alguien que las responde. Cuando no es aquí**, son las mariquitas de otros lugares que no apartan los ojos de aquí por agitación personal.

*Randy é moderador da comunidade "Eu sou Espírita - Espiritismo" do Orkut.
** O autor refere-se à citada comunidade do Orkut.

Roustaing crítica duramente Kardec

Por Gélio Lacerda da Silva

Clique aqui para a versão em português.

En la edición de “Los Cuatro Evangelios”, de J. B. Roustaing, de 1920, impresa en Portugal, financiada por la Federación Espirita Brasileña, en el 1ª volumen, a lo largo de las 34 páginas (43 a la 76), a titulo de Prefacio, con el subtitulo “Respuesta al artículo de Allan Kardec (Revista, de junio de 1866)”, se lee la manifestación de "J. B. Roustaing, París 1882”, ofendiendo directamente a Kardec.

El aludido artículo de Kardec, publicado en la “Revista Espirita” de junio de 1886 (y no en 1867, como registra el “Prefacio”), a la que responde Roustaing, se refiere a la apreciación de Kardec sobre “Los Cuatro Evangelios” de Roustaing.

En la “Respuesta al artículo de Allan Kardec”, Roustaing manifiesta su inconformidad por Kardec no haber aceptado su obra, inclusive critica acerbamente a Kardec, como veremos en los trechos que siguen transcritos:

“Aplicando nuestro método de critica al artículo de Junio de 1866 ahí vamos a encontrar todo lo que exponemos para la consideración de los lectores a propósito de la introducción del “Evangelio Según el Espiritismo”. Todo está allá: el fondo, la forma, el ostracismo, la infalibilidad. Es la aplicación del sistema preconcebido que se hace a una obra más “bello entierro de primera clase” que se pudiera desear.” Pág. 47

Vea el lector: en cuanto al propio Roustaing reconoce que Kardec promovió el más “bello entierro de primera clase” de sus libros, los dirigentes de la Federación Espirita Brasileña insisten en estas afirmativas no verídicas:

“En su apreciación a la “Revelación de las Revelaciones”, por ocasión del aparecimiento de esta, Kardec dejo en cuarentena solamente la teoría en cuanto al cuerpo de Jesús, y aprobó todo lo demás”. (“("Enlaces doctrinal", Ismael Gómez Braga, tercera edición, FEB, de 1978, pág. 99).

“En ese mismo artículo, Kardec ni aprobó, ni desaprobó la obra de Roustaing;”. (“Introducción al estudio de la Doctrina Espirita”, la edición, FEB, 19466, pág. 149).

“Y si contrariase “El Libro de los Espíritus” (el propio Kardec dijo que no lo contrariaba), yo jamás lo aceptaría”. (Luciano de los Ángeles, en “Abertura”, Santos-Sp, Junio de 92, pág. 06).

Los roustainguistas febeanos intentan, a cualquier precio, engañar la buena fe de los espiritas transcribiendo este trecho de la apreciación de Kardec a “Los Cuatro Evangelios”, donde se tiene la impresión de que Kardec aprobó la obra de Roustaing, por juzgarla:

“considerable y con el mérito de no estar en contradicción, en cualquiera de sus puntos, con la doctrina enseñada en el “Libro de los Espíritus” y en el de los Mediums… (“Introducción al estudio de la Doctrina Espirita”, 1ª edición, FEB, 1946, pág. 149).

Más Kardec, a continuación, explico su declaración por encima, sobre la cual los roustainguistas se omiten por conveniencia (y deslealtad):

“Dijimos que el libro del Sr. Roustaing no se aparta de los principios del Libro de los Espíritus y de el de los Mediums. Nuestras observaciones son hechas sobre la aplicación, de esos mismos principios, a la interpretación de ciertos hechos”. (Revista Espirita”, Allan Kardec, junio/1866, págs. 188/190, EDICEL).

Adoptar principios idénticos a la interpretación de ciertos hechos no significa llegar a las mismas conclusiones.

Y la prueba de eso está en Kardec llegar a diversas conclusiones de las de Roustaing, aun en su crítica a los libros de Roustaing:

“Y así, por ejemplo, que da a Cristo, en vez de un cuerpo carnal, un cuerpo fluídico concretizado, con todas las apariencias de la materialidad y de hecho un agênere… Sin prejuzgar, diremos que ya fueron hechas objeciones serias a esa teoría y que, en nuestra opinión, los hechos pueden perfectamente ser explicados sin salir de las condiciones de la humanidad corporal”. (en “Revista Espirita” antes citada, págs. 88/190).

Y Kardec también acrecienta razones de orden moral en su refutación a la tesis roustanguista ahora comentada. (“La Génesis” Allan Kardec, Cap. XV, nº 66).

En la “Revista Espirita”, junio/1863, EDICEL, pags.163/166, Kardec, en su artículo “Del principio de la no retrogradación del Espíritu”, contesta otra teoría roustanguista de que la encarnación humana solo se da por castigo.

Uno se pregunta: ¿Se elogió la honestidad de Roustaing al reconocer que Kardec promovió el más “bello entierro de primera clase” de su obra o la inteligencia de febeanos roustainguistas afirmaron que Kardec “no fue ni a favor ni en contra…”?

Kardec, en el final de su critica a los tres volúmenes de “Los Cuatro Evangelios” de Roustaing, escribió: “Hallamos que ciertas partes son desarrolladas muy extensamente, sin provecho para la claridad. A nuestro ver, limitándose a lo estrictamente necesario la obra podría haber sido reducida a dos, o aun mismo a un solo volumen y habría ganado popularidad”. La FEB, entretanto, no pensó así y aumento para cuatro volúmenes la edición hecha a sus expensas, en Portugal, y aun acrecentó las treinta y cuatro páginas de la respuesta ofensiva de Roustaing a Kardec.

En su crítica a los libros de Roustaing, el Codificador del Espiritismo declaró que Roustaing resucitó el docetismo, doctrina surgida poco después de la muerte de Jesús, según, según la cual Jesús vivió en la Tierra, aparentemente, no revistiéndose de un cuerpo carnal sujeto a las contingencias de la vida humana.

La reacción de Roustaing vino violenta:

“El el periódico” La Vérite”, Philalétès habla de “Docetismo”. Allan Kardec se apoderó de esta expresión para aplicarla a nuestra obra.

“Vamos a responder a esa pretensión, a esa insinuación que, si no es intencionada. Si prueba que el autor del sistema preconcebido (¡Kardec!) no conocía la doctrina de los Docetas, pues que la consideraba semejante a la nuestra.

“La revelación fue hecha por los Espíritus Superiores, teniendo en vista la obra de los “Cuatro Evangelios” explicados en espíritu y verdad, está de conformidad con las modernos descubrimientos de la ciencia, con todas las aserciones de los investigadores que vamos a citar. Allan Kardec ignoraba ese hecho o el lo conocía superficialmente, así como no sabía bien lo que era el “Docetismo”. Pag.49
Se Observa que Roustaing llamó a Kardec ignorante por identificar las teorías de Roustaing con el Docetismo, según el “doctrina errónea, falsa y condenada”. Y acusó a Kardec, sin piedad, de apropiarse de la expresión de Philalétès sobre el Docetismo y aun dio a Kardec el titulo peyorativo de “autor del sistema preconcebido”.

Para no alargarnos en las ofensas a Kardec, que pululan en el extenso “prefacio”, citemos apenas este trecho más:

"Es este hombre (Roustaing), de corazón sencillo y espíritu humilde, que Allan Kardec acusa, sin duda inconscientemente, de hacer a Cristo encarnado por el espíritu de un “agênere” y, como el Sr. Philalétès, de cuyas palabras se apropió, de resucitar el “Docetismo”. Ni uno ni otro había leído a Roustaing, ambos eran ignorantes y no culpables, más transmitieron escritos erróneos, lo que constituyo una gran falta. (Nota de los discípulos franceses de Roustaing). “(pag.52)

En las ediciones de “Los Cuatro Evangelios” de Roustaing, que se sucedieron a la de 1920, l FEB, excluyó el “Prefacio” contundente a Kardec, más lamentablemente, nos cuesta decirlo, no lo hizo por respeto a la memoria de Kardec y si, tan solamente, para que, la FEB, no se ahorcase con su propia cuerda.

Estos son los motivos que llevaron a la Federación Espirita Brasileña a no publicar el citado “prefacio” altamente ofensivo a Kardec:

En el libro “Enlaces Doctrinarios” de Ismael Gomes Braga, edición FEB, siempre reeditado, cuyos conceptos allí expandidos reflejan el pensamiento de los directores de la Federación Espirita Brasileña, el “Docetismo” es retirado de los sótanos infestados del navío, donde fue colocado por Roustaing, e instalado en un camarote de 1ª clase.

Véase a continuación:

“El profesor de Escritura Sagrada, Arendzen, de una de las Universidades inglesas, en un estudio del Docetismo, anota un renacimiento de ideas docéticas en círculos espiritas, aunque- dice el-menos fantásticas y extravagantes que las del pasado. Si, nosotros confirmamos, la obra de Roustaing resucitó el pensamiento fundamental del Docetismo- el cuerpo fluídico de Jesús.

“Cumplido, por lo tanto, el Paracleto una de las facetas de su interminable programa esclarecedor y, realmente, sin cualquier extravagancia.” (3ª edición, pág. 148).

Ahí está, querido lector: la Federación Espirita Brasileña excluyó los comentarios insultantes a Kardec, no para reparar la memoria de este, que denigró, más si tan solo para salvar su propia piel, una vez que la FEB, hoy, como vimos antes, reconoce que, “Los Cuatro Evangelios” de Roustaing resucitaron del Docetismo conforme afirmó Allan Kardec!

Fuente: Concienciación Espirita.

Los Cuatro Evangelios, de J.B. Roustaing

Por Gélio Lacerda da Silva

Clique aqui para a versão em português.

Nos `propusimos analizar partes de los libros de Jean Baptiste Roustaing titulado “Los cuatro Evangelios” , denominados también “Revelación de la Revelación” y “Espiritismo Cristiano”, editados por la Federación Espirita Brasileña y por ella adoptados para estudio, ininterrumpido, desde su fundación.

Anotar todos los conceptos anti doctrinarios de los cuatro gruesos volúmenes sería necesario escribir otros tantos libros.

A los títulos citados antes se suceden las palabras: “Seguidos de los mandamientos explicados en espíritu y verdad por los Evangelistas asistidos por los Apóstoles y Moisés”. Traducción de Guillon Ribeiro (ex - presidente de la FEB). Tenemos la 5 ª edición, 1971.

De inicio, una “Nota de la editora” enalteciendo las cualidades intelectuales del traductor Guillon Ribeiro que fue presidente de la Federación Espirita Brasileña durante 26 años consecutivos, desencarnado el 26 de Octubre de 1943.

En la hoja hay una “RECOMENDACION”:

“Para que el lector mejor pueda comprender y asimilar la enseñanza contenida en esta obra, es necesario que primeramente lea los siguientes obras de Allan Kardec:
“El Libro de los Espíritus”
“El Libro de los Mediums”
LA EDITORA.”

Se esclarece, desde ya, que Roustaing trasplantó para sus libros la terminología espirita de los libros de Kardec, motivo por el que la FEB hace esa recomendación. Tan solo, porque, con relación a la esencia de la doctrina espirita, Roustaing la modificó completamente, como más adelante se verá, introduciendo así el primer cisma en el Espiritismo.

En las páginas 9 a la 12, bajo el titulo “DOS PALABRAS”, el traductor se revela deslumbrado con la obra de Roustaing y se confiesa “Muy por debajo al encargo recibido”.

Aquí una pequeña muestra de "DOS PALABRAS", que ocupa cuatro páginas del libro:

“de ningún modo pretendemos realzar aquí, en dos palabras, el valor y la importancia verdaderamente extraordinaria de esta obra incomparable, única hasta hoy en el mundo, donde, día a día, a la medida que va siendo calmadamente estudiada y meditada, aumentará su grandiosidad y su profundidad. Para ello, tal vez no huiríamos de escribir, cuando no nos faltase la capacidad”.

Se nota la fascinación del traductor, juzgando escribir por lo menos un volumen, a titulo de prefacio a la obra de Roustaing, si no le faltase capacidad. Si realizase su intento, estaría apenas siguiendo el estilo prolijo de su maestro Roustaing, ya mencionado por Kardec, cuando este, en su crítica a “Los Cuatro evangelios” de Roustaing, afirmó que “la obra podría haber sido reducida a dos, o incluso a un solo volumen y habría ganado popularidad.” (Revista Espirita”. Edición, junio/1866)

Y acrecienta el traductor:

“En ella se encierra toda una revelación de verdades divinas que aun en ninguna otra ha sido dada a entrever al hombre. Ella nos pone ante los ojos, bañados en una claridad intensísima, que a veces aun nos ofusca los ojos tan poco acostumbrados a la luminosidad de las cosas espirituales, ese código de sabiduría que se ha de tornar el código único de los Hombres. Los Evangelios de Jesús. Suficientes para comprobar su valor inapreciable. "

El traductor, por cierto, conocía los libros de Kardec, más su fascinación por los libros de Roustaing da la medida exacta de lo poco o nada que para el representaba las enseñanzas de la Codificación Kardeciana. Ante “la claridad intensísima” de la obra roustainguistas, que le ofusco los ojos, vemos al traductor imitando a Pablo cuando, a la entrada de Damasco, quedó temporalmente ciego por la luminosidad de Jesús.

Concluyendo el resumen de las “Dos Palabras”:

“ Si, a pesar de esa asistencia y de esa misericordia, estamos muy por debajo del encargo recibido, como es nuestra convicción, que nos perdonen los que al leer esta traducción de la obra inmortal de los “Cuatro Evangelios explicados en espíritu y verdad”…”

Por cuestión de respeto, no diremos que la “verdad” roustanguista es una grosera mentira, más afirmamos, convencidos, y el lector constatará, que la verdad de Roustaing no es la verdad espirita.

Es curioso resaltar que, en los libros de Roustaing, el autor enaltece apasionadamente la obra. En el “Evangelio Según el Espiritismo”, de Allan Kardec, edición FEB, también traducido por Guillon Ribeiro, este no escribe siquiera una palabra sobre el libro. En lugar de eso, en la 77 edición, por ejemplo, se leen elogios de la Federación Espirita Brasileña a la traducción del traductor.

En su “Prefacio” en las paginas 57/67, Roustaing explica el porque de “Los Cuatro Evangelios”:

“Leí el Libro de los Espíritus. en las páginas de ese volumen encontré: una moral pura, una doctrina racional, de armonía con el espíritu y progreso de los tiempos modernos, consoladora para la razón humana; la explicación lógica y transcendente de la ley divina o natural, de las leyes de adoración, de trabajo, de reproducción, de destrucción, de sociedad, de progreso, de igualdad, de libertad, de justicia, de amor y caridad, de perfeccionamiento moral, de sufrimientos y gozos futuros.

“Enseguida, depare con explicaciones juiciosas acerca del alma en el estado de encarnación y en el de libertad; del fenómeno de la muerte, de la individualidad y de las condiciones de individualidad del alma después de la muerte; de lo que se llamó ángel y demonio; de los caminos y medios, de los agentes secretos u ostensivos de los que se sirve Dios para el funcionamiento, el desenvolvimiento, el progreso físico de los mundos; del progreso y desenvolvimiento físico, moral e intelectual de todas sus criaturas.

“Encontré una explicación racional de la pluralidad de los mundos; de la ley de renacimiento presidiendo, por el progreso incesante no solo de la materia como de la inteligencia, de la vida y de la armonía universal, en lo infinito y en la eternidad.

“Comprendí, más que nunca, ante la pluralidad de los mundos y de las humanidades, así como de sus jerarquías; de la pluralidad de las existencias y de la expectativa jerárquica, que los hombres, en nuestro planetas son de una inferioridad moral notoria; de una inferioridad intelectual acentuada relativamente a las leyes que están sujetos en la Tierra los diversos reinos de la Naturaleza y las leyes naturales a que obedecen los mundos y las humanidades superiores, por medio de las cuales aquellas leyes se conjugan en la unidad y en la solidaridad.
(- - -)

“Leí enseguida el Libro de los Mediums…, consulté la Historia,… Por ilustrar los libros de las dos revelaciones, el Antiguo y Nuevo Testamento…

"Mas, si por un lado la moral sublime de Cristo resplandeció mis ojos en toda su pureza, en todo su fulgor, como frotando de una fuente divina, por otro lado, todo permaneció oscuro, incomprensible e impenetrable a mi razón, en lo tocante a la revelación sobre el origen y la naturaleza espiritual de Jesús, sobre su posición espirita en relación a Dios y a nuestro planeta, sobre sus poderes y su autoridad.
“En cuanto a la revelación, sobre el origen, la naturaleza al mismo tiempo humana u extra-humana de Jesús, sobre el modo de cómo apareció en la Tierra, todo, como antes, se conservó igualmente oscuro, incomprensible e impenetrable a mi razón.

()

Como se ve, “Los Cuatro Evangelios” dieron dictados a Roustaing para atenderlo en sus dudas en cuanto al origen y naturaleza de Jesús. Los Espíritus mistificadores, con todo, fueron más allá de la expectativa de Roustaing; lo satisficieron con la teoría de un Jesús de naturaleza extra-humana, no engendrado por María, en fin, un agênere, resucitando la ideología docetista del cuerpo aparente de Jesús, surgida después de su muerte, que el apóstol Juan denunció de “Anticristo” (Juan, 1ª Ep. Univ., 4: 1ª3, y 2ª Ep., 1:7), y aun, en esos libros de Roustaing, la falange de espíritus embusteros contesta a varias enseñanzas espiritas contenidas en los libros de Allan Kardec.

Hay también, en el 1º volumen de “los Cuatro Evangelios” de Roustaing, una “Introducción” por el escrita, de la pág., 69 a la 126: son 58 páginas con repetidas referencias al “cuerpo fluídico” de Jesús o a su “naturaleza extra-humana”, y a la virginidad de María”, expresiones que se extienden, exhaustivamente a lo largo de los cuatro gruesos volúmenes.

El deslumbramiento de Roustaing por la tesis docetista “de que Jesús no vino en carne”, condenada por el apóstol Juan, es de tal monta que, mientras el Espiritismo dice “Fuera de la Caridad no hay Salvación”, Roustaing coloca como piedra angular de su doctrina “la naturaleza extra-humana de Jesús”. Si el espiritismo se preocupa con la esencia de las enseñanzas de Jesús, Roustaing se fascina con la teoría del Jesús de apenas “cuerpo fluídico”.

Retirado del libro “Concienciación Espirita”

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Roustaing Critica Duramente Kardec

Por Gélio Lacerda da Silva

Na edição de "Os Quatro Evangelhos", de J. B. Roustaing, de 1920, impressa em Portugal, financiada pela Federação Espírita Brasileira, no 1° volume, ao longo de 34 páginas (43 à 76), a título de "Prefácio ", com sub-título "Resposta ao artigo de Allan Kardec (Revista, de junho de 1866)", se lê a manifestação de "J. B. Roustaing, Paris 1882", ofendendo duramente Kardec.

O aludido artigo de Kardec, publicado na "Revista Espírita" de Junho de 1866 (e não 1867, como registra o "Prefácio"), a que responde Roustaing, refere-se à apreciação de Kardec sobre "Os Quatro Evangelhos" de Roustaing

Na "Resposta ao artigo de Allan Kardec", Roustaing manifesta sua inconformação por Kardec não ter aceito sua obra, inclusive critica acerbamente Kardec, como veremos nos trechos a seguir transcritos:

"Aplicando o nosso método de crítica ao artigo de Junho de 1866 aí vamos encontrar tudo o que apresentamos à consideração dos leitores a propósito da introdução do "Evangelho Segundo o Espiritismo". Tudo lá está: o fundo, a forma, o ostracismo, a infalibilidade. É a aplicação do sistema preconcebido a uma obra a que se faz desde logo o mais "belo enterro de primeira classe" que se pudera desejar." pág. 47

Veja o leitor: enquanto o próprio Roustaing reconhece que Kardec promoveu o mais "belo enterro de primeira classe" dos seus livros, os dirigentes da Federação Espírita Brasileira insistem nestas afirmativas inverídicas:

"Em sua apreciação à "Revelação da Revelação", por ocasião do aparecimento desta, Kardec deixou de quarentena somente a teoria quanto ao corpo de Jesus, e aprovou tudo o mais". ("Elos Doutrinários", Ismael Gomes Braga, 3a edição, FEB, 1978, pág. 99).

"Nesse mesmo artigo, Kardec nem aprovou nem reprovou a obra de Roustaing;". ("Introdução ao estudo da Doutrina Espírita", la edição, FEB, 1946, pág. 149).

"E se Roustaing contrariasse "O Livro dos Espíritos" (o próprio Kardec disse que não contrariava), eu jamais o aceitaria". (Luciano dos Anjos, in "Abertura", Santos-SP, Junho de 92, pág. 06).

Os roustainguistas febeanos tentam, a qualquer preço, ludibriar a boa fé dos espíritas transcrevendo este trecho da apreciação de Kardec a "Os Quatro Evangelhos", onde se tem a impressão de que Kardec aprovou a obra de Roustaing, por julgá-la:

"considerável e com o mérito de não estar em contradição, por qualquer de seus pontos, com a doutrina ensinada no "O Livro dos Espíritos" e no dos Médiuns..." ("Introdução ao estudo da Doutrina Espírita", lª edição, FEB, 1946, pág. 149).

Mas Kardec, a seguir, explicou sua declaração acima, sobre a qual os roustainguistas se omitem por conveniência (e deslealdade):

"Dissemos que o livro do Sr. Roustaing não se afasta dos princípios do Livro dos Espíritos e do dos Médiuns. Nossas observações são feitas sobre a aplicação, desses mesmos princípios, à interpretação de certos fatos". ("Revista Espírita", Allan Kardec, junho/1866, págs.188/190, EDICEL).

Adotar princípios idênticos à interpretação de certos fatos não significa chegar às mesmas conclusões.

E a prova disso está em Kardec chegar a conclusões diversas das de Roustaing, ainda em sua critica aos livros de Roustaing:

"E assim, por exemplo, que dá ao Cristo, em vez de um corpo carnal, um corpo fluídico concretizado, com todas as aparências da materialidade e de fato um agênere... Sem a prejulgar, diremos que já foram feitas objeções sérias a essa teoria e que, em nossa opinião, os fatos podem perfeitamente ser explicados sem sair das condições da humanidade corporal". (in "Revista Espírita" acima citada, págs. ] 88/190).

E Kardec também acrescenta razões de ordem moral na sua refutação à tese roustainguista ora comentada. ("A Gênese", Allan Kardec, Cap. XV, n° 66).

Na "Revista Espírita", junho/1863, EDICEL, págs.163/166, Kardec, no seu artigo "Do princípio da não retrogradação do Espírito", contesta outra teoria roustainguista de que a encarnação humana só se dá por castigo.

É de se perguntar: Louve-se a honestidade de Roustaing ao reconhecer que Kardec promoveu o mais "belo enterro de primeira classe" de sua obra ou a esperteza dos roustainguistas febeanos ao afirmarem que Kardec "não foi a favor nem contra... " ?

Kardec, no final de sua crítica aos três volumes de "Os Quatro Evangelhos" de Roustaing, escreveu: "Achamos que certas partes são desenvolvidas muito extensamente, sem proveito para a clareza. A nosso ver,limitando-se ao estritamente necessário a obra poderia ter sido reduzida a dois, ou mesmo a um só volume e teria ganho em popularidade". A FEB, entretanto, não pensou assim e aumentou para quatro volumes a edição feita à sua expensas, em Portugal, e ainda acrescentou-lhes as trinta e quatro páginas da resposta de Roustaing ofensiva a Kardec.

Na sua crítica aos livros de Roustaing, o Codificador do Espiritismo declarou que Roustaing ressuscitou o docetismo, doutrina surgida pouco depois da morte de Jesus, segundo a qual Jesus viveu na Terra, aparentemente, não se revestindo de um corpo carnal sujeito às contingências da vida humana.

A reação de Roustaing veio violenta:

"No jornal "La Vérité", Philalétès falara de "Docetismo". Allan Kardec se apoderou desta expressão para aplicá-la à nossa obra.

"Vamos responder a essa pretensão, a essa insinuação que, se não é intencional. Prova que o autor do sistema preconcebido (Kardec!) não conhecia a doutrina dos Docetas, pois que a considerava semelhante à nossa.

"A revelação feita pelos Espíritos Superiores, tendo em vista a obra dos "Quatro Evangelhos" explicados em espírito e verdade, está de conformidade com as modernas descobertas da ciência, com todas as asserções dos investigadores que vimos de citar. Allan Kardec ignorava esse fato ou o conhecia superficialmente, assim como não sabia bem o que era 0 "Docetismo". pág. 49

Observe-se que Roustaing chamou Kardec de ignorante por identificar as teorias de Roustaing com o Docetismo, segundo ele "doutrina errônea, falsa e condenada". E acusou Kardec, sem piedade, de apropriar-se de expressão de Philalétès sobre o Docetismo e ainda deu a Kardec o título pejorativo de "autor do sistema preconcebido".

Para não nos alongarmos nas ofensas a Kardec, que pululam no extenso "Prefácio", citemos apenas mais este trecho:

"É a esse homem (Roustaing), de coração simples e de espírito humilde, que Allan Kardec acusa, sem dúvida inconscientemente, de fazer do Cristo encarnado pelo espírito um "agênere", e, como o Sr. Philalétès, de cujas palavras se apropriou, de ressuscitar o "Docetismo". Nem um nem outro havia lido Roustaing, ambos eram ignorantes e não culpados, mas espalharam escritos errôneos, o que constitui grande falta. (Nota dos discípulos franceses de Roustaing)." (pág. 52)

Nas edições de " Os Quatro Evangelhos " de Roustaing, que se sucederam à de 1920, a FEB excluiu o "Prefácio" contundente a Kardec, mas, lamentavelmente, custa-nos dize-lo, não o fez por respeito à memória de Kardec e sim, tão somente, para que ela, a FEB, não se enforcasse com a sua própria corda.

Eis os motivos que levaram a Federação Espírita Brasileira a não mais publicar o citado "Prefácio" altamente ofensivo a Kardec:

No livro "Elos Doutrinários", de Ismael Gomes Braga, edição FEB, sempre reeditado, cujos conceitos ali expandidos refletem o pensamento dos diretores da Federação Espírita Brasileira, o "Docetismo" é retirado dos porões infetos do navio, onde foi colocado por Roustaing, e instalado num camarote de 1ª classe.

Confira-se:

"O Professor de Escritura Sagrada, Arendzen, de uma das Universidades inglesas, num estudo do Docetismo, anota um renascimento de idéias docéticas em círculos espiritistas, embora—diz ele—menos fantásticas e extravagantes que as do passado. Sim, confirmamos nós outros, a obra de Roustaing ressuscitou o pensamento fundamental do Docetismo—o corpo fluídico de Jesus.

"Cumpriu, destarte, o Paracleto uma das facetas do seu infindo programa esclarecedor e, realmente, sem qualquer extravagância." (3ª edição, pág. 148).

Aí está, caro leitor: a Federação Espírita Brasileira excluiu os comentários insultuosos a Kardec, não para desagravar a memória deste, que ela denegriu, mas tão s6 para salvar a sua própria pele, uma vez que a FEB, hoje, como vimos acima, reconhece que "Os Quatro Evangelhos" de Roustaing ressuscitaram o Docetismo, conforme afirmou Allan Kardec!

Fonte: Conscientização Espírita