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quarta-feira, 10 de julho de 2013

Ser espírita, ser social

Por Erika Renata Dias de Araújo

A ausência de debates e ações sobre questões sociais e políticas é  um fato no movimento espírita brasileiro. Tanto, que é de causar estranheza e até mesmo críticas, um espírita engajado politicamente ou participando atividade de movimentos sociais. Mas por que isto acontece?

A visão equivocada do Espiritismo como religião está na raiz do problema. Desde a Antiguidade a religião é utilizada como forma de dominação das massas, manobra que atingiu seu apogeu na Idade Média e perdura até hoje variando de intensidade nos diferentes países. Tantas vezes utilizada pelos detentores do poder para tal fim, já faz parte da mentalidade coletiva de muitas culturas a idéia de que devemos nos resignar com a realidade em que nos encontramos, mesmo sendo a mais desumana possível, pois é da vontade de Deus que seja assim.

No meio espírita, especificamente, a resignação e benevolência são confundidas com comodismo e estagnação. “O importante é trabalhar no bem” é sentença repetida e imperam as ações de caráter assistencialista, que embora tenham seu mérito no tocante à situações urgentes, não promovem o bem estar social, pois não mudam a realidade. Além disso, essas práticas denotam a falta de compreensão do que seja caridade. E qual afinal o conceito de caridade segundo a Doutrina Espírita? Caridade é um sentimento profundo de amor a si mesmo e ao próximo, é por isso, atitude individual, a humildade e o desinteresse pessoal são suas marcas mais patentes. Depreende-se que caridade é muito mais do que distribuir sopa aos idosos ou doar roupas.

O Espiritismo é consolador e transformador, pois dá conhecimento ao homem sobre a vida futura. Dá ao mesmo, então, outro ponto de vista que começa pelo conhecimento de si mesmo sob novo ângulo e um olhar mais profundo da realidade que o rodeia. Sem dúvida, o conhecimento da vida futura estreita a importância dos problemas relativos à matéria, mas, ainda assim,  a vida corporal possui importância capital para a evolução do Espírito e é mesmo uma necessidade deste.

É claro que devemos buscar o nosso aperfeiçoamento e um importante passo neste sentido se dá através do exercício da resistência às influências perniciosas da matéria. Em O Livro dos Espíritos encontramos alguns pontos interessantes sobre a finalidade da encarnação dos Espíritos (questão 132): 
“Deus a impõe com o fim de levá-los à perfeição: para uns, é uma expiação; para outros, uma missão. Mas, para chegar a essa perfeição, eles devem sofrer todas as vicissitudes da existência corpórea; nisto é que está a expiação. A encarnação tem ainda outra finalidade, que é a de pôr o Espírito em condições de enfrentar a sua parte na obra da Criação. É para executá-la que ele toma um aparelho em cada mundo, em harmonia com a matéria essencial do mesmo, afim de nele cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. E dessa maneira, concorrendo para a obra geral, também progredir.” (Grifos nossos). 
Nesta passagem e em muitas outras como a Lei de Trabalho e Lei de sociedade, fica evidente que ao Espírito encarnado será cobrado não só as escolhas e atitudes que repercutem em seu progresso individual como de suas escolhas, atitudes e omissões no que concerne ao progresso coletivo, do qual é parte obrigatória. A sociedade existe pela necessidade humana de ajuda mútua, de se relacionar e para que os seres aprendam uns com os outros. Por isso os Espíritos respondem a Kardec (questão 766 e ss) que a vida em sociedade é útil ao progresso individual e geral, condenando ainda, o isolamento voluntário.

Desta percepção decorre que é obrigação de qualquer ser humano buscar o melhor para si e para os outros, de trabalhar por si e pelos outros, de contribuir para a harmonia do planeta em que vive. Entretanto, essa responsabilidade é ainda maior para o Espírita, porque compreendendo os laços de fraternidade e solidariedade que devem unir os seres, compreendendo que o trabalho é uma lei de Deus, compreendendo que deve trabalhar para extirpar de si o egoísmo... se omitir em questões sociais e políticas que influenciam na vida de todos é um equívoco ainda mais grave.

Ainda em O Livro dos Espíritos, destacamos a questão 799: 
De que maneira o Espiritismo pode contribuir para o progresso?   — Destruindo o materialismo, que é uma das chagas da sociedade, ele faz os homens compreenderem onde está o seu verdadeiro interesse. A ‘vida futura não estando mais velada pela dúvida, o homem compreenderá melhor que pode assegurar o seu futuro através do presente. Destruindo os preconceitos de seita, de casta e de cor, ele ensina aos homens a grande solidariedade que os deve unir como irmãos.” (Grifos nossos). 
A começar pela pergunta feita por Kardec, essa questão revela-se de suma importância. Poderíamos refazê-la perguntando: “De que maneira os Espíritas podem contribuir para o progresso?” e a resposta seria a mesma. A frase que diz que compreendendo a vida futura “o homem compreenderá melhor que pode assegurar o seu futuro através do presente” possui grande significado filosófico. O Espiritismo bem compreendido nos leva a pensar as diversas dimensões da existência, de outra forma, mais responsável, mais consciente.  Desde os mínimos gestos cotidianos: nas suas relações no trabalho, no seio da família, e até a participação direta num movimento social, numa entidade comunitária, num sindicato etc.

Os Espíritos respondem ainda a Kardec: “Destruindo os preconceitos de seita, de casta e de cor, ele ensina aos homens a grande solidariedade que os deve unir como irmãos.”. Os Espíritas são convocados a destruir preconceitos de toda espécie e fazer implantar a solidariedade e a fraternidade. Isso equivale ou não a uma profunda transformação social?

Apenas engana a si mesmo aquele que vai ao Centro Espírita ouvir palestras tomar passes e não muda seu ângulo de visão, tampouco suas atitudes. Engana-se ainda mais, quem se diz Espírita e não toma para si sua parcela de contribuição para o aperfeiçoamento da vida na Terra. De que outra forma podemos “assegurar o futuro pelo presente”, senão participando ativamente agora da construção do futuro? Como fazer isso alheio aos embates políticos e às ações sociais? Como amar ao próximo e não lutar para o correto aproveitamento dos recursos naturais? Como ser consciente sem se engajar nos problemas que tangem à categoria de trabalho da qual se faz parte? Como pensar no progresso coletivo sem se preocupar com quem ocupa o poder?

Como se vê, é a própria Doutrina Espírita quem convoca seus adeptos para a participação ativa na vida social, intervindo de acordo com suas afinidades e aptidões, portanto, ser Espírita é também  exercer plenamente seu papel como ser social, como agente transformador de uma realidade que começa em cada um e se expande para além de nós  mesmos. E na dinâmica social, que também é divina, quanto mais vivenciamos o Espiritismo, melhores seres humanos nos tornamos, consequentemente, mais consciência tomamos das circunstâncias que nos rodeiam, não intervir em sua melhoria é faltar com um dever.


“Um homem não pode fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupado em fazer o errado em outra. A vida é um todo indivisível.”

-Mahatma Gandhi-

Fonte: NEFCA - Núcleo Espírita de Filosofia e Ciências Aplicadas - http://www.nefca.org.br/artigo/ser-espirita-ser-social

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

O Social e o Imortal em Chico Xavier

Por José Rodrigues

A passagem de Chico Xavier por este mundo deixa duas contribuições marcantes. No campo social e na investigação da imortalidade. Sem ser rico, contribuiu, pela literatura que veiculou, para farta redistribuição de renda no Brasil. Poucas pessoas, neste país e no mundo, terão tido tanta influência para que bens se transferissem de mãos, visando atingir estratos sociais inferiorizados. Uma peculiaridade da estrutura social brasileira, com das mais elevadas concentrações de renda do planeta, teve, no conteúdo da literatura e no exemplo pessoal do médium, farto apoio para se desenvolver. Uma prática compensatória, sem dúvida, sociologicamente combatida, sob o pressuposto de sua perenização, mas pelo menos discutível, tanto que também defendida por líderes, como Betinho, na sua luta contra a fome.

Se cerca de um terço da população brasileira estão abaixo da linha de pobreza e quase 50 milhões de pessoas encontram-se na faixa da indigência, há mesmo que se fazer transbordar a panela dos que têm para os despossuídos, até que medidas de maior alcance, especialmente no campo da educação, ajam no sentido do encurtamento das diferenças.

Os princípios de uma ética social, o sabemos, estão bem claros na obra também literária de Allan Kardec, afinal, a fonte da inspiração original de um conjunto de ações, inclusive dos espíritos, no chamado sentido do bem. Ainda assim, milhões, certamente, nunca leram, ou o fizeram sem maior aprofundamento filosófico, o texto kardequiano, ao contrário da literatura, a partir de simples mensagens de poucas linhas, retransmitidas por Chico Xavier. Talvez um trabalho silencioso, de tocar a emoção, o sentimento, provocando questionamentos íntimos e o ponto deflagrador de uma ação para além do círculo da casa e da família.

No da comprovação da imortalidade, sempre haverá aqueles que duvidam. Desde as materialização de Kate King, controladas pelo físico William Crookes, a academia emite sinais de desconfiança nas provas da continuidade da vida para além das formas físicas conhecidas. Além disso, brasileiros, de todos os níveis de conhecimento, deram pouquíssima ênfase a esse aspecto, ao contrário do filosófico e moral. Sem esquecer que vasto contingente estruturou uma carapaça religiosa, mística e paralisante, em torno da mediunidade e do que consideram Espiritismo.

As comunicações de espíritos, especialmente de jovens, numa fase da produção mediúnica de Chico Xavier, com informações de caráter exclusivo dos seus respectivos familiares, tiveram forte impacto de credibilidade. Para isto, como para todo o trabalho incansável do médium, tem peso específico sua estrutura moral, seu exemplo de vida. No mínimo, tem-se disponível muita substância para a investigação da imortalidade, são centenas de famílias que podem dar testemunho sobre o antes e o depois da morte de seus parentes.

Por fim e não menos importante, está a contribuição de um homem despojado, que elegeu o próximo como amigo, sem distinções. Diríamos que Francisco Cândido Xavier, nesse ministério de igualdade, antecipou a humanidade em alguns milhares de anos.

José Rodrigues, jornalista e economista, é um dos coordenadores do site Pense - Pensamento Social Espírita.