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terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

[RE]- Refutação de um artigo do jornal l'Univers

Por Allan Kardec

Em sua edição de 13 de abril último, traz o jornal l’Univers um artigo de autoria do Abade Chesnel, no qual o problema do Espiritismo é longamente discutido. Nós o teríamos deixado sem resposta, como tantos outros aos quais não ligamos nenhuma importância, se se tratasse de uma dessas diatribes grosseiras que revelam de parte dos seus autores a mais absoluta ignorância daquilo que atacam. Temos a satisfação de reconhecer que o artigo do Abade Chesnel é redigido com um espírito completamente diferente. Pela moderação e conveniência da linguagem, ele merece uma resposta, tanto mais necessária quanto o artigo contém um erro grave e pode dar uma ideia muito falsa, quer do Espiritismo em geral, quer em particular do caráter e do objetivo de Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas.

Eis o artigo, na íntegra.

“Todo o mundo conhece o espiritualismo do Sr. Cousin, essa filosofia destinada a substituir pouco a pouco a religião. Sob o mesmo título, hoje possuímos um corpo de doutrinas reveladas, que pouco a pouco se vai completando, e um culto realmente muito simples, mas de maravilhosa eficácia, pois que poria os devotos em comunicação real, sensível e quase que permanente com o mundo sobrenatural.

“Esse culto tem reuniões periódicas, iniciadas pela invocação de um santo canonizado. Depois de constatada, entre os fiéis, a presença de São Luís, rei de França, pedem-lhe que proíba a entrada dos Espíritos malignos no templo e leem uma ata da sessão anterior. Depois, a convite do presidente, um médium sobe à tribuna, perto do secretário encarregado de anotar as perguntas feitas por um dos fiéis e as respostas ditadas ao médium pelo Espírito invocado. A assembleia assiste gravemente, piedosamente, a esta cena de necromancia, que por vezes é muito longa e, quando a ordem do dia se esgota, o povo se retira, mais convencido do que nunca da verdade do espiritualismo. No intervalo entre duas sessões, cada fiel não se esquece de manter contato assíduo, mas privado, com os Espíritos que lhe são mais acessíveis ou mais queridos. São muitos os médiuns, e quase que não existem segredos na outra vida que os médiuns não acabem por penetrar. Uma vez revelados aos fiéis, esses segredos não são subtraídos ao público. A Revue Spiritualiste, que se publica mensalmente, com regularidade, não recusa a assinatura aos profanos e quem quiser poderá comprar os livros que contêm o texto revelado, com seu comentário autêntico.

“Seríamos levados a crer que uma religião que consiste unicamente na evocação dos mortos é muito hostil à Igreja Católica, que nunca deixou de proibir a prática da necromancia. Mas esses sentimentos mesquinhos, por mais naturais que pareçam, são estranhos, assegura-se, ao coração dos espiritualistas. Eles fazem justiça ao Evangelho e a seu Autor. Reconhecem que Jesus viveu, agiu, falou e sofreu, como contam os nossos quatro evangelistas. A doutrina evangélica é verdadeira, mas essa revelação, de que Jesus foi o instrumento, longe de excluir o progresso, deve ser completada. O espiritualismo é que vai dar ao Evangelho a sã interpretação que lhe falta e a complementação que ele espera há dezoito séculos.

 “Além disso, quem poderá estabelecer limites ao progresso do Cristianismo ensinado, interpretado e desenvolvido tal qual o é pelas almas desprendidas da matéria, estranhas às paixões terrestres, aos nossos preconceitos e aos interesses humanos? O próprio infinito se nos desvela. Ora, o infinito não têm limites e tudo nos leva a esperar que a revelação do infinito prosseguirá ininterruptamente. À medida que se escoarem os séculos, ver-se-ão revelações acrescidas a revelações, sem que jamais se esgotem esses mistérios, cuja extensão e profundidade parece que aumentam à medida que se libertam da obscuridade que até agora os envolvia.

“Daí resulta, como consequência, que o espiritualismo é uma religião, porque nos põe em íntima relação com o infinito e absorve, alargando-o, Cristianismo, que de todas as formas religiosas, presentes ou passadas é, como facilmente se reconhece, a mais elevada, a mais pura e a mais perfeita. Entretanto, engrandecer o Cristianismo é tarefa difícil, que não pode ser realizada sem derrubar as barreiras por detrás das quais ele se mantém entrincheirado. Os racionalistas não respeitam nenhuma barreira. Menos ardentes e melhor avisados, os espiritualistas só encontram duas, cuja redução lhes parece indispensável, a saber: a autoridade da Igreja Católica e o dogma das penas eternas.

“Constitui esta vida a única prova que ao homem é dado atravessar? A árvore ficará eternamente do lado em que caiu? O estado da alma, após a morte, é definitivo, irrevogável e eterno? Não, responde a necromancia espiritualista. Com a morte nada acaba. Tudo recomeça. A morte é para cada um de nós o ponto de partida de uma nova encarnação, de uma nova vida e de uma nova experiência.

“Segundo o panteísmo alemão, Deus não é o ser, mas o eterno vir a ser. Seja Deus como for, para os espiritualistas parisienses o homem não tem outro destino senão o devir progressivo ou regressivo, conforme seus méritos e obras. A lei moral ou religiosa tem uma verdadeira sanção nas outras vidas, onde os bons são recompensados e os maus punidos, mas durante um período mais ou menos longo, de anos ou de séculos, e não por toda a eternidade.

“O espiritualismo seria a forma mística do erro cujo teólogo é o Sr. Jean Reynaud? Talvez. Seria possível ir mais longe e dizer que entre o Sr. Reynaud e os novos sectários existe uma ligação mais estreita que a da identidade de doutrinas? Talvez, ainda. Mas esta questão, por falta de informações seguras, não será aqui resolvida de maneia definitiva.

“O que importa, muito mais que o parentesco ou as alianças heréticas do Sr. Jean Reynaud, é a confusão de ideias cuja manifestação é o progresso do espiritualismo; é a ignorância em matéria de religião que possibilita tanta extravagância; é a leviandade com que homens, aliás estimáveis, acolhem essas revelações do outro mundo, que não possuem nenhum mérito, nem mesmo o da novidade.

 “É desnecessário remontar a Pitágoras e aos sacerdotes do Egito para descobrir as origens do espiritualismo contemporâneo. Encontrá-la-emos ao manusear os anais do magnetismo animal.

“Desde o século XVIII a necromancia representava um papel importante nas práticas do magnetismo. Vários anos antes que se tratasse dos Espíritos batedores na América, certos magnetizadores franceses obtinham, conforme diziam, da boca dos mortos ou dos demônios, a confirmação das doutrinas condenadas pela Igreja, notadamente a dos erros de Orígenes, relativamente à conversão futura dos anjos maus e dos réprobos.

“É preciso dizer, também, que o médium espiritualista, no exercício de suas funções, pouco difere do sujeito nas mãos do magnetizador, e que o círculo abarcado pelas revelações do primeiro nem mesmo ultrapassa o que limita a visão do segundo.

“Os ensinamentos que a curiosidade pública obtém em assuntos privados, por meio da necromancia, em geral nada ensinam além daquilo que já é sabido. A resposta do médium espiritualista é obscura nos pontos em que as nossas pesquisas pessoais não puderam esclarecer; é clara e precisa naquilo que nos é bem conhecido; emudece em relação a tudo quanto escapa aos nossos estudos e esforços. Numa palavra, parece que o médium tem uma visão magnética de nossa alma, mas não descobre nada além do que nela encontra já escrito. Esta explicação, que parece muito simples, está entretanto sujeita a graves dificuldades. Com efeito, ela supõe que uma alma naturalmente possa ler no fundo de outra alma, sem o auxílio de sinais e independentemente da vontade daquele que se tornaria, para o primeiro que chegasse, um livro aberto e perfeitamente legível. Ora, os anjos bons ou maus não possuem naturalmente esse privilégio, nem quanto a nós, nem nas relações diretas que mantêm entre si. Só Deus penetra imediatamente os Espíritos e perscruta o íntimo dos corações mais obstinadamente fechados à sua luz.

 “Se os mais estranhos fatos espiritualistas que se contam são autênticos, é então necessário recorrer a outros princípios para explicá-los. Geralmente esquecemos que os fatos se referem a um assunto que preocupa fortemente o coração ou a inteligência; que provocou longas pesquisas, e sobre o qual frequentemente falamos fora do âmbito espiritualista. Nessas condições, que não devem ser postas de lado, um certo conhecimento das coisas que nos interessam não ultrapassa em nada os limites naturais do poder dos Espíritos.

“Seja como for, no espetáculo que hoje nos oferecem, não há mais que uma evolução do magnetismo, que se esforça por tornar-se uma religião.

“Sob a forma dogmática e polêmica que deve ao Sr. Jean Reynaud, a nova religião incorreu na condenação do Concílio de Périgueux, cuja autoridade, como todos se recordam, foi gravemente negada pelo culpado.

“Na forma mística que hoje toma em Paris, merece ela ser estudada, ao menos como um sinal dos tempos em que vivemos. O espiritualismo já aliciou um certo número de homens, entre os quais alguns são honrosamente conhecidos no mundo. Esse poder de sedução que ele exerce; o progresso lento, mas ininterrupto que lhe é atribuído por testemunhas fidedignas; as pretensões que alardeia; os problemas que apresenta; o mal que pode fazer às almas, eis, sem dúvida, muitos motivos reunidos para atrair a atenção dos católicos. Tomemos cuidado para não emprestarmos à nova seita mais importância do que ela merece. Mas, a fim de evitar os exageros que tudo ampliam, não caiamos na mania de tudo negar ou amesquinhar. Nolite omni spiritui credere, sed probate spiritus si ex Deo sint, quoniam multi pseudoprophetae prodierunt in mundum. I João, 4: 1).” [1]

[1] “Não creiais em todo Espírito, mas provai se os Espíritos são de Deus, porque são muitos os falsos profetas que já se levantaram no mundo.” (1ª Epístola de João, 4:1).    

L’ABBÉ FRANÇOIS CHESNEL 

Sr. Abade,

O artigo que publicastes no l’Unirers, relativamente ao Espiritismo, contém vários erros, que importa retificar e que, sem a menor dúvida, provêm de um incompleto estudo da matéria. Para refutá-los todos fora necessário retomar, desde os alicerces, todos os pontos da teoria, bem como os fatos que lhe servem de base, o que não tenho a intenção de fazer aqui. Limito-me aos pontos principais.

Fizestes bem em reconhecer que as ideias espíritas aliciaram um certo número de homens, entre os quais alguns honrosamente conhecidos no mundo. Esse fato, cuja veracidade ultrapassa em muito aquilo que imaginais, incontestavelmente merece a atenção das pessoas sérias, porque tantas personalidades notáveis pela inteligência, pelo saber e pela posição social não se apaixonariam por uma ideia despida de qualquer fundamento. A conclusão natural é que no fundo de tudo isto deve haver alguma coisa.

Certamente objetareis que certas doutrinas, meio religiosas, meio sociais, nos últimos tempos encontraram sectários nas próprias fileiras da aristocracia intelectual, o que não as impediu de cair no ridículo. Assim, pois, os homens de inteligência podem ser arrastados por utopias.

A isto responderei que as utopias têm vida curta. Cedo ou tarde a razão lhes faz justiça. Será assim com o Espiritismo, se ele for uma utopia. Mas, se for uma verdade, triunfará de todas as oposições, de todos os sarcasmos, direi mesmo, de todas as perseguições, se as perseguições pertencerem ainda ao nosso século, e os detratores perderão seu tempo. Custe o que custar, seus opositores terão que aceitá-lo, como foram aceitas tantas coisas contra as quais se levantaram protestos em nome da razão. O Espiritismo é uma verdade? O futuro o dirá. Parece, entretanto, já haver um pronunciamento, tal a rapidez com que se propagam essas ideias. E notai bem que não é na classe ignorante e iletrada que se encontram aderentes. É, ao contrário, entre gente esclarecida.

Importa ainda considerar que todas as doutrinas filosóficas são obras de homens, cujos ideais são mais ou menos grandiosos, mais ou menos justos. Todas têm um chefe, em torno do qual se reuniram outros homens partidários do mesmo ponto de vista.

Quem é o autor do Espiritismo? Quem imaginou, certa ou errada, essa teoria? É verdade que se procurou coordená-la, formulá-la, explicá-la. Mas a ideia primeira, quem a concebeu? Ninguém. Ou melhor, todo mundo, porque todos puderam ver, e aqueles que não viram foi porque não quiseram ver ou porque quiseram ver a seu modo, sem romper o círculo de suas ideias preconcebidas, o que os fez ver e julgar mal. O Espiritismo decorre de observações que cada um pode fazer, que não constituem privilégio de ninguém, o que explica a sua irresistível propagação. Ele não é resultado de nenhum sistema individual, circunstância que o distingue de todas as outras doutrinas filosóficas.

Essas revelações do outro mundo, dizeis, não têm nem mesmo o mérito da novidade. Seria, pois, um mérito a novidade? Quem alguma vez afirmou que isto foi uma descoberta moderna? Essas comunicações, sendo uma consequência da Natureza e produzindo-se pela vontade de Deus, fazem parte das leis imutáveis com as quais ele rege o mundo. Consequentemente, elas devem ter existido desde que o homem existe na Terra. Eis por que as encontramos na mais remota Antiguidade, entre todos os povos, tanto em sua história profana quanto na sagrada. A ancianidade e a universalidade desta crença são argumentos em seu favor. Tirar daí conclusões que lhes fossem desfavoráveis seria, antes de tudo, uma falta de lógica.

Dizeis, a seguir, que a faculdade dos médiuns pouco difere da dos sujeitos em mãos dos magnetizadores ou, por outras palavras, do sonâmbulo. Admitamos, até, que haja perfeita identidade. Qual seria a causa dessa admirável clarividência sonambúlica que não encontra obstáculo nem na matéria nem na distância, e que se exerce sem o concurso dos órgãos da visão? Não seria a demonstração mais patente da existência e da individualidade da alma, eixo da religião?

Se eu fosse sacerdote e quisesse fazer um sermão, provando que há em nós algo mais que o corpo, demonstrá-lo-ia de maneira irrecusável pelos fenômenos do sonambulismo natural ou artificial. Se a mediunidade não passa de uma variedade do sonambulismo, nem por isso são os seus efeitos menos dignos de observação. Neles eu encontraria uma prova a mais em favor de minha tese e dela faria uma arma nova contra o ateísmo e o materialismo.

Todas as nossas faculdades são obra de Deus. Quanto maiores e mais maravilhosas, mais elas atestam o seu poder e a sua bondade.

Por mim, que durante trinta e cinco anos fiz estudos especiais sobre o sonambulismo; que o considerei como uma modalidade não menos profunda de quantas modalidades há de médiuns, afirmo, como todos aqueles que não julgam examinando apenas uma face do problema, que o médium é dotado de uma faculdade particular que não permite confundi-lo com o sonâmbulo e que a completa independência de seu pensamento é provada por fatos da maior evidência para quem quer que se coloque nas condições requeridas para observar imparcialmente. Abstração feita das comunicações escritas, qual foi o sonâmbulo que já fez brotar um pensamento de um corpo inerte? Qual o que produziu aparições visíveis e até tangíveis? Qual o que pôde manter um corpo pesado no espaço sem ponto de apoio? Será por um efeito sonambúlico que em minha casa, há quinze dias, em presença de vinte testemunhas, um médium desenhou o retrato de uma jovem falecida há dezoito meses, a qual ele não havia conhecido e cujo retrato foi reconhecido pelo pai, que se achava presente? Será por efeito do sonambulismo que uma mesa responde com precisão às perguntas que lhe são feitas, e até a perguntas mentais?

Certamente, bem poderíamos admitir que o médium estivesse magnetizado. Difícil seria acreditar que a mesa fosse sonâmbula.

Dizeis que o médium não fala com clareza senão de coisas conhecidas. Como explicar o fato seguinte e centenas de outros do mesmo gênero, ocorridos inúmeras vezes e de meu conhecimento pessoal? Um dos meus amigos, excelente médium psicógrafo, pergunta a um Espírito se uma pessoa que ele havia perdido de vista há quinze anos ainda está viva. “Sim”, respondeu ele: “vive ainda. Mora em Paris, na rua tal, número tal”. Ele vai e encontra a pessoa no endereço indicado.

Trata-se de uma ilusão? Seu pensamento poderia sugerir-lhe tal resposta? Se em certos casos as respostas podem coincidir com o pensamento, seria racional concluir que se trata de uma lei geral?

Nisto, como em todas as coisas, os juízos precipitados são sempre perigosos, porque podem ser infirmados por fatos que não foram observados.

Aliás, senhor Abade, minha intenção não é dar aqui um curso de Espiritismo, nem discutir se ele é certo ou errado. Como já ficou dito, bastaria lembrar os numerosos fatos por mim citados na Revista Espírita, bem como as explicações dadas em meus diversos escritos.

Chego, então, à parte do artigo de Vossa Reverendíssima que me parece mais importante.

Destes ao vosso artigo o título: “Uma religião nova em Paris”. Supondo que este fosse, realmente, o caráter do Espiritismo, aí estaria um primeiro erro, pois ele está longe de circuns­crever-se a Paris. Conta milhões de aderentes espalhados nas cinco partes do mundo, e Paris não foi o foco primitivo.

Em segundo lugar, é ele uma religião? Fácil é demonstrar o contrário.

O Espiritismo está baseado na existência de um mundo invisível, formado de seres incorpóreos que povoam o espaço e que não são outra coisa senão as almas dos que viveram na Terra ou em outros globos, onde deixaram os seus envoltórios materiais. São esses seres aos quais demos, ou melhor, que se deram o nome de Espíritos. Esses seres, que nos rodeiam continuamente, exercem sobre os homens, malgrado seu, uma poderosa influência. Representam um papel muito ativo no mundo moral e, até certo ponto, no mundo físico. Assim, pois, o Espiritismo pertence à Natureza e pode-se dizer que, numa certa ordem de ideias, é uma força, como a eletricidade é outra, sob diferente ponto de vista, e como a gravitação universal é uma terceira.

Ele nos desvenda mundos invisíveis, assim como o microscópio nos revelou o mundo dos infinitamente pequenos, de cuja existência não suspeitávamos. Assim, pois, os fenômenos cuja fonte é esse mundo invisível devem ter-se produzido e se produziram em todos os tempos, como bem o menciona a História de todos os povos. Apenas os homens, em sua ignorância, atribuíram tais fenômenos a causas mais ou menos hipotéticas e, a esse respeito, deram livre curso à imaginação, como o fizeram com todos os fenômenos cuja natureza conheciam imperfeitamente.

Melhor observado desde que se vulgarizou, o Espiritismo vem lançar luz sobre uma porção de problemas até aqui insolúveis ou mal resolvidos. Seu verdadeiro caráter é, pois, o de uma ciência e não de uma religião e a prova é que conta como adeptos homens de todas as crenças, os quais, nem por isso, renunciaram às suas convicções: católicos fervorosos, que praticam todos os deveres de seu culto; protestantes de todas as seitas; israelitas, muçulmanos e até budistas e bramanistas. Há de tudo, menos materialistas e ateus, porque essas ideias são incompatíveis com os princípios espíritas.

Assim, pois, o Espiritismo se fundamenta em princípios gerais independentes de toda questão dogmática. É verdade que ele tem consequências morais, como todas as ciências filosóficas. Essas consequências são compatíveis com o Cristianismo, porque o Cristianismo é, de todas as doutrinas, a mais esclarecida, a mais pura, razão por que, de todas as seitas religiosas do mundo, são as cristãs as mais aptas a compreender o Espiritismo em sua verdadeira essência.

O Espiritismo não é, pois, uma religião. Do contrário, teria seu culto, seus templos, seus ministros. Sem dúvida cada um pode transformar suas opiniões numa religião e interpretar à vontade as religiões conhecidas, mas daí à constituição de uma nova igreja há uma grande distância e penso que seria imprudência seguir tal ideia. Em resumo, o Espiritismo ocupa-se da observação dos fatos e não das particularidades desta ou daquela crença; da pesquisa das causas; da explicação que os fatos podem dar dos fenômenos conhecidos, tanto na ordem moral quanto na ordem física, e não impõe nenhum culto aos seus partidários, do mesmo modo que a Astronomia não impõe o culto aos astros, nem a Pirotecnia o culto ao fogo.

Ainda mais: assim como o sabeísmo nasceu da Astronomia mal compreendida, o Espiritismo, mal compreendido na Antiguidade, foi a fonte do politeísmo. Hoje, graças às luzes do Cristianismo, podemos julgá-lo com mais segurança. Ele nos põe em guarda contra os sistemas errados, frutos da ignorância. E a própria religião pode haurir nele a prova palpável de muitas verdades contestadas por certas opiniões. Eis porque, contrariando a maior parte das ciências filosóficas, um dos seus efeitos é reconduzir às ideias religiosas aqueles que se tresmalharam num cepticismo exagerado.

A Sociedade a que vos referis tem seu objetivo expresso no próprio título. A denominação Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas não se assemelha ao de nenhuma seita. Ela tem um caráter tão diverso que os seus estatutos proíbem tratar de questões religiosas. Está classificada na categoria das sociedades científicas, porque, na verdade, seu objetivo é estudar e aprofundar todos os fenômenos resultantes das relações entre o mundo visível e o invisível. Tem seu presidente, seu secretário, seu tesoureiro, como todas as sociedades. Não convida o público às suas sessões, nas quais não há discursos nem qualquer coisa com o caráter de um culto qualquer. Processa seus trabalhos com calma e recolhimento, primeiramente porque é uma condição necessária para as observações e em segundo lugar porque sabe que devem ser respeitados aqueles que não vivem mais na Terra. Ela os chama em nome de Deus, porque crê em Deus, em sua onipotência, e sabe que nada se faz neste mundo sem a sua permissão. Abre as sessões com um apelo geral aos bons Espíritos, porque, sabendo que existem bons e maus Espíritos, cuida para que estes últimos não se venham intrometer fraudulentamente nas comunicações que são recebidas e induzir em erro.

Que prova isto? Que não somos ateus. Mas de modo algum implica que sejamos adeptos de uma religião. Disto teria ficado convencida a pessoa que vos descreveu o que se passa entre nós, se tivesse acompanhado os nossos trabalhos, principalmente se os tivesse julgado com menos leviandade e talvez com espírito menos prevenido e menos apaixonado.

Os fatos protestam, portanto, por si próprios, contra a qualificação de nova seita que dais à Sociedade, certamente por não a conhecerdes melhor.

Terminais o artigo chamando a atenção dos católicos para o mal que o Espiritismo faz às almas. Se as consequências do Espiritismo fossem a negação de Deus, da alma, de sua individualidade após a morte, do livre-arbítrio do homem, das penas e recompensas futuras, seria uma doutrina profundamente imoral. Longe disso, ele prova, não pelo raciocínio, mas pelos fatos, essas bases fundamentais da religião, cujo inimigo mais perigoso é o materialismo. Ainda mais: por suas consequências ensina a suportar com resignação as misérias desta vida; acalma o desespero e ensina os homens a se amarem como irmãos, conforme os divinos preceitos de Jesus. Se soubésseis, como eu, quantos incrédulos endurecidos ele encaminhou; quantas vítimas arrancou ao suicídio pela perspectiva da sorte reservada àqueles que abreviam a vida, contrariando a lei de Deus; quantos ódios acalmou, aproximando inimigos! É a isto que chamais fazer mal às almas? Não. Não podeis pensar assim e apraz-me supor que, se o conhecêsseis melhor, o julgaríeis de outra maneira.

Direis que a religião pode fazer tudo isto. Longe de mim contestá-lo, mas acreditais que para aqueles que ele encontrou rebeldes teria sido melhor que continuassem numa incredulidade absoluta? Se o Espiritismo triunfou sobre ela; se lhes apresentou claramente aquilo que se lhes afigurava obscuro; evidente aquilo que lhes parecia duvidoso, onde está o mal? Por mim direi que em vez de perder almas, ele as salvou.

Atenciosamente,

ALLAN KARDEC.

Fonte: Revista Espírita, maio de 1859

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Ser espírita, ser social

Por Erika Renata Dias de Araújo

A ausência de debates e ações sobre questões sociais e políticas é  um fato no movimento espírita brasileiro. Tanto, que é de causar estranheza e até mesmo críticas, um espírita engajado politicamente ou participando atividade de movimentos sociais. Mas por que isto acontece?

A visão equivocada do Espiritismo como religião está na raiz do problema. Desde a Antiguidade a religião é utilizada como forma de dominação das massas, manobra que atingiu seu apogeu na Idade Média e perdura até hoje variando de intensidade nos diferentes países. Tantas vezes utilizada pelos detentores do poder para tal fim, já faz parte da mentalidade coletiva de muitas culturas a idéia de que devemos nos resignar com a realidade em que nos encontramos, mesmo sendo a mais desumana possível, pois é da vontade de Deus que seja assim.

No meio espírita, especificamente, a resignação e benevolência são confundidas com comodismo e estagnação. “O importante é trabalhar no bem” é sentença repetida e imperam as ações de caráter assistencialista, que embora tenham seu mérito no tocante à situações urgentes, não promovem o bem estar social, pois não mudam a realidade. Além disso, essas práticas denotam a falta de compreensão do que seja caridade. E qual afinal o conceito de caridade segundo a Doutrina Espírita? Caridade é um sentimento profundo de amor a si mesmo e ao próximo, é por isso, atitude individual, a humildade e o desinteresse pessoal são suas marcas mais patentes. Depreende-se que caridade é muito mais do que distribuir sopa aos idosos ou doar roupas.

O Espiritismo é consolador e transformador, pois dá conhecimento ao homem sobre a vida futura. Dá ao mesmo, então, outro ponto de vista que começa pelo conhecimento de si mesmo sob novo ângulo e um olhar mais profundo da realidade que o rodeia. Sem dúvida, o conhecimento da vida futura estreita a importância dos problemas relativos à matéria, mas, ainda assim,  a vida corporal possui importância capital para a evolução do Espírito e é mesmo uma necessidade deste.

É claro que devemos buscar o nosso aperfeiçoamento e um importante passo neste sentido se dá através do exercício da resistência às influências perniciosas da matéria. Em O Livro dos Espíritos encontramos alguns pontos interessantes sobre a finalidade da encarnação dos Espíritos (questão 132): 
“Deus a impõe com o fim de levá-los à perfeição: para uns, é uma expiação; para outros, uma missão. Mas, para chegar a essa perfeição, eles devem sofrer todas as vicissitudes da existência corpórea; nisto é que está a expiação. A encarnação tem ainda outra finalidade, que é a de pôr o Espírito em condições de enfrentar a sua parte na obra da Criação. É para executá-la que ele toma um aparelho em cada mundo, em harmonia com a matéria essencial do mesmo, afim de nele cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. E dessa maneira, concorrendo para a obra geral, também progredir.” (Grifos nossos). 
Nesta passagem e em muitas outras como a Lei de Trabalho e Lei de sociedade, fica evidente que ao Espírito encarnado será cobrado não só as escolhas e atitudes que repercutem em seu progresso individual como de suas escolhas, atitudes e omissões no que concerne ao progresso coletivo, do qual é parte obrigatória. A sociedade existe pela necessidade humana de ajuda mútua, de se relacionar e para que os seres aprendam uns com os outros. Por isso os Espíritos respondem a Kardec (questão 766 e ss) que a vida em sociedade é útil ao progresso individual e geral, condenando ainda, o isolamento voluntário.

Desta percepção decorre que é obrigação de qualquer ser humano buscar o melhor para si e para os outros, de trabalhar por si e pelos outros, de contribuir para a harmonia do planeta em que vive. Entretanto, essa responsabilidade é ainda maior para o Espírita, porque compreendendo os laços de fraternidade e solidariedade que devem unir os seres, compreendendo que o trabalho é uma lei de Deus, compreendendo que deve trabalhar para extirpar de si o egoísmo... se omitir em questões sociais e políticas que influenciam na vida de todos é um equívoco ainda mais grave.

Ainda em O Livro dos Espíritos, destacamos a questão 799: 
De que maneira o Espiritismo pode contribuir para o progresso?   — Destruindo o materialismo, que é uma das chagas da sociedade, ele faz os homens compreenderem onde está o seu verdadeiro interesse. A ‘vida futura não estando mais velada pela dúvida, o homem compreenderá melhor que pode assegurar o seu futuro através do presente. Destruindo os preconceitos de seita, de casta e de cor, ele ensina aos homens a grande solidariedade que os deve unir como irmãos.” (Grifos nossos). 
A começar pela pergunta feita por Kardec, essa questão revela-se de suma importância. Poderíamos refazê-la perguntando: “De que maneira os Espíritas podem contribuir para o progresso?” e a resposta seria a mesma. A frase que diz que compreendendo a vida futura “o homem compreenderá melhor que pode assegurar o seu futuro através do presente” possui grande significado filosófico. O Espiritismo bem compreendido nos leva a pensar as diversas dimensões da existência, de outra forma, mais responsável, mais consciente.  Desde os mínimos gestos cotidianos: nas suas relações no trabalho, no seio da família, e até a participação direta num movimento social, numa entidade comunitária, num sindicato etc.

Os Espíritos respondem ainda a Kardec: “Destruindo os preconceitos de seita, de casta e de cor, ele ensina aos homens a grande solidariedade que os deve unir como irmãos.”. Os Espíritas são convocados a destruir preconceitos de toda espécie e fazer implantar a solidariedade e a fraternidade. Isso equivale ou não a uma profunda transformação social?

Apenas engana a si mesmo aquele que vai ao Centro Espírita ouvir palestras tomar passes e não muda seu ângulo de visão, tampouco suas atitudes. Engana-se ainda mais, quem se diz Espírita e não toma para si sua parcela de contribuição para o aperfeiçoamento da vida na Terra. De que outra forma podemos “assegurar o futuro pelo presente”, senão participando ativamente agora da construção do futuro? Como fazer isso alheio aos embates políticos e às ações sociais? Como amar ao próximo e não lutar para o correto aproveitamento dos recursos naturais? Como ser consciente sem se engajar nos problemas que tangem à categoria de trabalho da qual se faz parte? Como pensar no progresso coletivo sem se preocupar com quem ocupa o poder?

Como se vê, é a própria Doutrina Espírita quem convoca seus adeptos para a participação ativa na vida social, intervindo de acordo com suas afinidades e aptidões, portanto, ser Espírita é também  exercer plenamente seu papel como ser social, como agente transformador de uma realidade que começa em cada um e se expande para além de nós  mesmos. E na dinâmica social, que também é divina, quanto mais vivenciamos o Espiritismo, melhores seres humanos nos tornamos, consequentemente, mais consciência tomamos das circunstâncias que nos rodeiam, não intervir em sua melhoria é faltar com um dever.


“Um homem não pode fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupado em fazer o errado em outra. A vida é um todo indivisível.”

-Mahatma Gandhi-

Fonte: NEFCA - Núcleo Espírita de Filosofia e Ciências Aplicadas - http://www.nefca.org.br/artigo/ser-espirita-ser-social

domingo, 2 de junho de 2013

O que é lícito pedir ao Espiritismo

Por Amílcar Del Chiaro Filho

Há pessoas que procuram na religião a satisfação utilitarista. Acreditam que a religião deverá lhes dar a vitória, o sucesso, a felicidade para essa vida, e a salvação eterna para a outra. Hoje, algumas seitas religiosas pregam isso abertamente, e convidam os que querem deixar para traz a infelicidade, o fracasso, a se unirem a elas.

Algumas pessoas chegam a dizer, que resolveram mudar de religião, para serem felizes. No dia a dia dos centros espíritas temos deparados com essa situação. Muitos o procuram no desejo de obter benefícios imediatos, como: curas, enriquecimento, conquistas amorosas, anular um desafeto, e outras coisas mais.

Contudo, a finalidade do Espiritismo não é o de arranjar a vida das pessoas. Os espíritos superiores, embora nos amem e nos auxiliem, não são serviçais à nossa disposição para os pequenos interesses humanos.

Quando as pessoas insistem nesses pedidos, e não percebem o extraordinário novo campo de visão que se lhe abre à frente, acabam por perder a proteção dos bons espíritos, e os maus, os ignorantes tomam conta da situação, pois estão sempre prontos a atender a todos os pedidos, mesmo os injustos. Esses espíritos podem satisfazer certos pedidos, porém cobram muito caro a satisfação concedida.

Quando Jesus de Nazaré ofereceu a Água Viva do Evangelho para a mulher samaritana, afirmando que quem bebesse da água que ele oferecia nunca mais teria sede, a mulher pediu para que o Rabi Galileu lhe desse da tal água, porque assim ela não precisaria buscá-la diariamente. Ela não compreendeu que o Mestre não a isentava do trabalho, das lutas evolutivas, do aperfeiçoamento, mas alargava os seus horizontes espirituais.

O que devemos procurar no Espiritismo? Devemos procurar a elevada compreensão do processo que é a vida. O Espiritismo oferece essa compreensão. Ele é, no dizer de Herculano Pires, a plataforma para as novas conquistas da humanidade.

É proibido, então, à mãe que chora a perda de seu filhinho, buscar notícias que a console? É proibido ao homem que vê a esposa doente, em risco de vida, pedir a cura ou a esperança? Aquele que não consegue um emprego e precisa sustentar a família não pode pedir aos espíritos que o ajude a se empregar? O homem de negócios que está atormentado pelos fracassos sucessivos, não pode ir buscar orientação junto a uma casa espírita? Nada disso é proibido, e é natural que o centro espírita preste esse socorro e vários outros, mas é preciso que ensine a libertação, ou seja, o conhecimento espírita. É preciso que compreendam que os espíritos não fazem pelo homem, aquilo que ao homem compete fazer.

É comum ao ser humano, o desejo de se ver liberto das dores, angústias e dificuldades. É comum procurarem meios mais ou menos mágicos para resolver seus problemas. No Espiritismo não poderia ser diferente. Quase sempre, aqueles que se decepcionam com a Doutrina Espírita e a abandonam, são os que querem soluções mágicas. Não existem soluções sem esforços, luta, trabalho.

Não raro a dor, o problema aparentemente insolúvel, é o chamamento para uma nova postura, um novo caminho, um novo ideal. O fato de sermos espíritas ou médiuns, não nos dá privilégios, e sim responsabilidades. Não feche os olhos para a luz. Não peça o que o Espiritismo não lhe pode dar, e não se decepcionará com ele.

Fonte: http://portalespirito.com/amilcar/o-que-eh-licito.htm

domingo, 30 de setembro de 2012

[ESE] - Aliança da Ciência com a Religião

Por Allan Kardec

A Ciência e a Religião são as duas alavancas da inteligência humana. Uma revela as leis do mundo material, e a outra as leis do mundo moral. Mas aquelas e estas leis, tendo o mesmo princípio, que é Deus, não podem contradizer-se. Se umas forem à negação das outras, umas estarão necessariamente erradas e as outras certas, porque Deus não pode querer destruir a sua própria obra. A incompatibilidade, que se acredita existir entre essas duas ordens de idéias, provém de uma falha de observação, e do excesso de exclusivismo de uma e de outra parte. Disso resulta um conflito, que originou a incredulidade e a intolerância.

São chegados os tempos em que os ensinamentos do Cristo devem receber o seu complemento; em que o véu lançado intencionalmente sobre algumas partes dos ensinos deve ser levantado, em que a Ciência, deixando de ser exclusivamente materialista, deve levar em conta o elemento espiritual; e em que a Religião, deixando de desconhecer as leis orgânicas e imutáveis, essas duas forças, apoiando-se mutuamente e marchando juntas, sirvam uma de apoio para a outra. Então a Religião, não mais desmentida pela Ciência, adquira uma potência indestrutível, porque estará de acordo com a razão e não se lhe poderá opor a lógica irresistível dos fatos.

A Ciência e a Religião não puderam entender-se até agora, porque, encarando cada uma as coisas do seu ponto de vista exclusivo, repeliam-se mutuamente. Era necessária alguma coisa para preencher o espaço que as separava, um traço de união que as ligasse. Esse traço está no conhecimento das leis que regem o mundo espiritual e suas relações com o mundo corporal, leis tão imutáveis como as que regulam o movimento dos astros e a existência dos seres. Uma vez constatadas pela experiência essas relações, uma nova luz se fez: a fé se dirigiu à razão, esta nada encontrou de ilógico na fé, e o materialismo foi vencido.

Mas nisto, como em tudo, há os que ficam retardados, até que sejam arrastados pelo movimento geral, que os esmagará, se quiserem resistir em vez de se entregarem. É toda uma revolução moral que se realiza neste momento, sob a ação dos Espíritos. Depois de elaborada durante mais de dezoito séculos, ela chega ao momento de eclosão, e marcará uma nova era da humanidade. São fáceis de prever as suas conseqüências: ela deve produzir inevitáveis modificações nas relações sociais, contra o que ninguém poderá opor-se, porque elas estão nos desígnios de Deus e são o resultado da lei do progresso, que é uma lei de Deus.

Fonte: O Evangelho Segundo o Espiritismo - tradução de José Herculano Pires

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Kardec Foi um Filósofo?

Allan Kardec
Por Jaci Regis
Três questões serão debatidas neste trabalho:

1.) Como conciliar o fato de o Espiritismo se declarar, simultaneamente, uma revelação e uma filosofia;
2.) É possível caracterizar a obra de Kardec como uma obra filosófica?
3.) Como resolver o paradoxo da fé raciocinada?

O objetivo final é provar que o Espiritismo é uma filosofia.

I

No livro “A Gênese”, Allan Kardec afirma que o Espiritismo é uma revelação e procura mostrar o seu caráter. Mas, também, ao longo de sua obra e de forma taxativa, caracteriza-o como uma filosofia.

Devemos, pois, em primeiro lugar, tentar compreender o que sejam filosofia e revelação. Comecemos por filosofia.

Não tem sido fácil definir o que seja filosofia. Entretanto, existe um conceito espontâneo de que a filosofia é uma parte essencial da atividade do homem. Ligada à sabedoria, ao exame e à discussão exaustiva, embora não conclusiva, das causas e dos seres, a filosofia tem sido caracterizada como uma atividade superior do homem, um exercício indispensável ao saber e à certeza.

Historicamente, distinguem-se duas formas de exercício da filosofia: de um lado a socrático-platônica, que exprime uma concepção do eu, isto é, uma autorreflexão do espírito sobre os seus supremos valores teóricos e práticos, sobre os valores do verdadeiro, o bom e o belo. De outro, a aristotélica, que apresenta, antes de tudo, uma concepção do universo. Embora tenha havido uma regularidade pendular entre essas duas concepções, tende-se a uma acumulação, a uma conjugação desses pontos, pois a filosofia é simultaneamente as duas coisas: uma concepção do eu e uma concepção do universo.

Em síntese, pode-se compreender que a filosofia é uma autorreflexão do espírito sobre seu comportamento e, ao mesmo tempo, uma aspiração ao conhecimento das últimas ligações entre as coisas.

Quanto à revelação, analisaremos, ainda que rapidamente, as colocações feitas por Allan Kardec no capítulo I de “A Gênese”, servindo-nos da tradução de Guillon Ribeiro (edição da FEB). Nele, o autor define revelação como “dar a conhecer uma coisa secreta ou desconhecida”. Logo, “deste ponto de vista, todas as ciências que nos fazem conhecer os mistérios da Natureza são revelações e pode dizer-se que há para a Humanidade uma revelação incessante” (item 2). E adiante: “O que de novo ensinam aos homens (os grandes gênios, messias, missionários) quer na ordem física, quer na ordem filosófica, são revelações (grifo de Kardec). “Se Deus suscita reveladores para as verdades científicas, pode, com mais forte razão, suscitá-las para as verdades morais, que constituem elementos essenciais do progresso. Tais são os filósofos, cujas ideias atravessam os séculos” (item 6). No tocante à revelação religiosa, diz Kardec: “implica a passividade absoluta e é aceita sem verificação, sem exame e discussão” (item 7).

Finalmente, quanto ao Espiritismo, afirma Kardec: “é uma verdadeira revelação, na acepção científica da palavra”, isto é, dá “a conhecer o mundo invisível que nos cerca e no meio do qual vivemos sem o suspeitarmos, assim como as leis que o regem, suas relações com o mundo visível, a natureza e o estado dos seres que o habitam e, por conseguinte, o destino do homem depois da morte” (item 12).

Kardec coloca o Espiritismo como uma “revelação científica” que é caracterizada por ser “divina a sua origem e da iniciativa dos Espíritos, sendo a sua elaboração fruto do trabalho do homem”. É uma revelação científica, enfatiza: “por não ser ensino (dos Espíritos) privilégio de indivíduo algum, mas ministrado a todos do mesmo modo; por não serem os que o transmitem e os que o recebem seres passivos, dispensados do trabalho da observação e da pesquisa, por não renunciarem ao raciocínio e ao livre-arbítrio; porque não lhes é interdito o exame, mas, ao contrário, recomendado; enfim, porque a doutrina não foi ditada completa, nem imposta à crença cega; porque é deduzida pelo trabalho do homem, da observação aos fatos que os Espíritos lhe põem sob os olhos e das instruções que lhe dão, instruções que ele estuda, comenta, compara, a fim de tirar ele próprio as ilações e aplicações” (item 13 - grifos de Kardec).

Isso fica mais claro ainda quando ele analisa a questão: “qual a autoridade da revelação espírita, uma vez que emana de seres de limitadas luzes e não infalíveis?” Nessa aparente fragilidade, o Codificador aponta sua característica básica, ao afirmar que o Espiritismo é fruto da elaboração entre pessoas de dois planos de vida. Os Espíritos propõem, mas os homens concorrem com o seu raciocínio e seu critério, tudo submetem ao cadinho da lógica e do bom senso. Isto é, o homem se beneficia dos conhecimentos especiais que os Espíritos dispõem pela posição em que se acham, sem abdicar do uso da própria razão (item 57).

Esse caráter específico da revelação espírita é, também, uma inovação no campo filosófico, antes dominado apenas pela cogitação a partir de um ponto de observação unilateral, isto é, da busca e da inquietação do homem perante o mistério e as contradições do ser, diante de si mesmo, da existência e do universo. Agora, esse mesmo cogitar é enriquecido pela contribuição de homens que passaram a existir numa dimensão diferente, — os Espíritos — mas dentro da humanidade.

Sendo, em lato senso, urna elaboração da razão humana — encarnada e desencarnada — o Espiritismo é uma reflexão sobre o ser e o universo, abrangendo a totalidade e não se detendo no particular. A palavra “revelação” é, num primeiro sentido, uma contradição nesse quadro e só é aceita por Kardec a partir de uma visão didática, para que a intervenção das inteligências desencarnadas seja compreendida no processo.

II

Poderá a obra de Allan Kardec ser categorizada como filosófica? Ou melhor seria considerá-la uma obra didática? Encontramos no seu transcorrer uma reflexão sobre o ser, o belo, o bom? Há, em seu bojo, cogitações sobre a natureza essencial das coisas, uma visão do universo e das relações últimas entre os objetos? Sim, a resposta é afirmativa.

Entretanto, o fato desses temas serem abordados não significa, necessariamente, que a obra seja filosófica. O que caracteriza esse aspecto é o fato de apresentar uma reflexão, propor soluções e inovar na abordagem de temas que, sendo universais e se constituírem razão da cogitação da inteligência, se enquadrem num quadro amplo da inquietação do homem.

Analisada sob esse ângulo, a obra de Kardec é, em seu conjunto, uma reflexão filosófica. O próprio “O Livro dos Espíritos” é um filosofar dialético entre duas inteligências humanas, reunidas no ato de refletir sobre os fundamentos do ser, do destino e de Deus. Semelhante ao diálogo do Banquete, de Platão, Kardec e o Espírito da Verdade, maieuticamente confabulam num mesmo nível de inquietude. Esse debate dialético não espelha um superior ministrando lições a um inferior. Mas, duas potências do saber dialogam, exprimindo visões específicas que resultam na síntese doutrinária do Espiritismo. A partir desse diálogo, Kardec, seja nos comentários que aduz às questões ou em capítulos inteiros de “O Livro dos Espíritos”, evidencia o tratamento filosófico das ideias.

O que caracteriza, por outro lado, a filosofia kardecista, se assim podemos falar, é a sua praticidade. Marx afirmou que “os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diferentes maneiras; trata-se é de transformá-lo”, exigindo a crítica radical, que vai às raízes e à práxis, isto é, à ação revolucionária. Essa tese foi lançada por Marx por volta de 1845, doze anos antes de “O Livro dos Espíritos”. Pode-se dizer que Kardec também realizou, a seu modo, uma filosofia de ação, de pratos, transformadora e revolucionária, ao propor uma nova reflexão sobre os fundamentos da vida, do ser e do mundo, inaugurando a visão espírita. E, também, promoveu a elevação dos Espíritos à categoria de seres existentes e não potenciais, ao abrir, por assim dizer, a cortina que separava o homem vivente no plano corpóreo ao homem vivente no plano extrafísico.

A filosofia que Kardec desenvolveu foi discursiva-racional, não considerando a intuição como uma fonte autônoma de conhecimento. Embora reconhecendo a totalidade emocional, volitiva e cognitiva do Espírito, não poderia deixar de cingir-se à razão como juíza do saber. Não nega a intuição como uma das formas de apreensão da realidade. Todavia, “toda intuição tem que legitimar-se perante o tribunal da razão”.

Embora seguindo, sob certos aspectos, um esquema muito ligado às preocupações teológicas, Kardec manteve-se numa linha de equilíbrio racional, definindo, por fim, o Espiritismo como filosofia moral, com o que se libertou das amarras de uma teologia. A reflexão sobre a reencarnação, como instrumento de desenvolvimento das potências do Espírito, define a filosofia espírita, em oposição à teologia.

Na verdade, o esquema kardecista seguiu, em linhas gerais, a própria estrutura do pensamento filosófico da época. Foi a partir do século 19 que as ciências se libertaram definitivamente da filosofia, mudando esta seu campo de atividade e atuação formal.

O didatismo de Kardec não prejudica a sua obra, nem lhe descaracteriza a fundamentação filosófica. Exprime, apenas, uma face da capacidade de comunicação própria do autor, cujo estilo sem adjetivação excessiva, o torna objetivo, desprendido de palavras e formulações tortuosas. Deve-se ter em mente que o professor Rivail mostrou em sua obra — cerca de 21 volumes — um poder de objetividade, de concisão ainda não suficientemente estudado, antecipando-se aos progressos da linguagem atuais tanto da informática, quanto da linguística. O fato de escrever numa linguagem direta, limpa, inova mais uma vez, enriquecendo o conteúdo filosófico.

Se acompanharmos o pensamento kardecista, não apenas nos livros fundamentais, mas ao longo das edições da “Revista Espírita”, haveremos de reconhecer a posição de Kardec como homem prático, jornalista, administrador, pesquisador, orador, líder, polemista, escritor, o que naturalmente não lhe poupava tempo para elucubrações excessivamente teóricas. No espaço de apenas 14 anos escreveu mais de 20 livros, incluindo as edições da “Revista Espírita”, que redigiu sozinho e desenvolveu uma atividade realmente exaustiva. Realizou, todavia, uma teorização sobre os fatos, de modo que não se perdessem os resultados das pesquisas e das observações.

Flammarion chamou-lhe de “Bom Senso Encarnado”, mas negou-lhe o caráter de cientista. Todavia, com o desenvolvimento das ciências humanas, já não se pode negar a Kardec, também, esse título porque realizou, como Bozzano, embora em menor escala, é verdade, um árduo trabalho de pesquisa, observações pessoais e coleta de dados. Com todo esse material, deduziu um conjunto de ideias e fundamentos. Foi filósofo do real, da ação, da prática, apoiando-se em dados experimentais. Deduziu sobre os fundamentos morais do universo — refletindo sobre a natureza do homem, suas dimensões físico-espirituais, o processo evolutivo a que está submetido, sua imortalidade e seu destino. Especulou sobre o absoluto, Deus, como centro de interesse e equilíbrio do Universo.

Mesmo nos livros que numa falsa visão cultural são chamado de “religiosos”, manteve essa postura filosófica. Tanto no “Evangelho Segundo o Espiritismo”, como no “O Céu e o Inferno”, que abordam temas da teologia, comportou-se de maneira coerente com sua visão filosófica e é sob este ângulo que examina, tanto a contribuição de Jesus de Nazaré, que libera dos aspectos místicos, para concentrar-se no conteúdo moral de seu ensino, quanto os aspectos da Justiça Divina, em “O Céu e o Inferno”.

III

Se Allan Kardec estruturou a Doutrina Espírita como uma filosofia moral, porque, contraditoriamente, adotou o tema “Fé raciocinada”? Se, como ele repetidas vezes afirmou, o Espiritismo é uma doutrina positiva, repudiando todo o misticismo, qual o motivo que o teria levado a mencionar a fé como uma condição importante para o homem?

Mostramos que a estrutura filosófica do Espiritismo é discursiva-racional e que abrange tanto uma concepção do ser, como uma concepção do universo e, mais ainda, projeta-se como uma práxis, atuando no mundo para modificá-lo. Trata-se como se vê, de tentativa para sintetizar a angústia humana, convergindo, inevitavelmente, para o campo moral. Ora, as religiões sempre se colocaram como guardiãs da moralidade, embora, quase sempre, decaindo para um moralismo. Kardec não podia negligenciar o fato de que a moralidade é a meta principal do Espiritismo — embora enfocada sob uma visão libertadora. Daí o ter afirmado que o Espiritismo é forte por tocar os pontos principais das religiões: Deus, o espírito e as penas futuras. Chegou mesmo a tentar colocar o Espiritismo como o elo, a aliança entre a ciência e a religião.

E aí se situa a sabedoria da proposta espírita. Não é uma postura inflexível porque é progressiva e isso lhe garante a mobilidade, abrindo-se para compreender as múltiplas formas de expressão do Espírito em sua caminhada evolutiva. E, nessa caminhada, a religião tem sido um fator marcante, embora nem sempre positivo, ao contrário, o que levou Kardec a lamentar que “infelizmente as religiões hão sido sempre instrumentos de dominação” (“A Gênese”, cap. I, item 8).

No domínio da fé, temos uma atitude específica do Espírito. Ela é intuitiva, é a apreensão da totalidade, a germinação da certeza interna, surgida da vivência, dos valores. David Hume, filósofo inglês, definiu-a dessa forma: “a fé é muito mais um ato da parte afetiva de nossa natureza do que de sua parte pensante”.

Ao postular a “fé raciocinada”, Kardec inseria um paradoxo, considerando as bases da filosofia espírita, chamando-nos à reflexão. Definindo essa contradição, Kardec afirma: “fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da humanidade” (“O Evangelho Segundo o Espiritismo”, tradução de Guillon Ribeiro - FEB). Quer dizer, ele afirma que a inabalavidade da fé depende da razão, ou seja, que a apreensão intuitiva da totalidade, como uma certeza interna, pode ser falsa, incorrer em erro de interpretação, se não passar pelo crivo da razão. Dessa atitude surge uma nova fé que seria motivadora, totalizadora, porque submetida ao juízo racional.

Dentro dessa perspectiva, o Espiritismo se propõe a aliar a ciência e a religião, mas, todavia, não se reduz nem a uma nem a outra, mas transcende-as. Dialeticamente, aceitando a ciência e a religião como posições reais no conhecimento e vivência humanas, o Espiritismo procura transformá-las. De um lado, sendo ciência do Espírito, completa a ciência convencional cujo objeto é o conhecimento do meio físico como o único concreto e possível. De outro, destruindo o sobrenatural em que a religião se assenta, liberta o homem de um conceito estreito e falacioso da vida, propondo-se como filosofia moral, onde os conceitos morais coexistem com a racionalidade e desataviados dos prejuízos do culto.

Kardec rejeitou o fato de que o homem crer em Deus e orar se caracterizasse como um ato místico. Ao contrário, afirmou ser uma atitude positiva, decorrente da abertura que o Espiritismo, filosoficamente, promove. Logo, a fé que Kardec aborda é, sobretudo, saber, crença baseada na razão. E se estrutura como uma nova postura do homem perante a vida, pois que não nega o impulso da experiência interna na apreensão da totalidade, mas indica o caminho da crítica e da atividade construtiva, para que a fé não continue sendo contemplação e alienação místicas.

IV
Sendo o Espiritismo uma nova visão do homem e do mundo, caracteriza-se como um pensar filosófico, como uma filosofia estruturada na pesquisa do conhecimento, do ser e do universo. Tendo base experimental, seu filosofar é existencial, atua no mundo para modificá-lo. O pensamento kardecista — isto é, espírita — apresenta-se como um sistema de ideias claramente definido e eficientemente deduzido. Essa afirmativa nos leva à conclusão de que o professor Hipollyte Léon Denizard Rivail — Allan Kardec — pode ser conceituado como um autêntico filósofo, na lídima acepção do termo.

Observação: No tocante às definições de filosofia, usamos expressões do livro “Teoria do Conhecimento”, do professor Johannes Hessen, 3a edição - Armênio Amado Editor, Coimbra - Portugal.

Fonte: revista “A Reencarnação”, n º 401 - Ano L - outubro de 1984, órgão de divulgação da Federação Espírita do Rio Grande do Sul.
Jaci Regis (1932-2010), psicólogo, jornalista, economista e escritor espírita, foi o fundador e presidente do Instituto Cultural Kardecista de Santos (ICKS), idealizador do Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita (SBPE), fundador e editor do jornal de cultura espírita “Abertura” e autor dos livros “Amor, Casamento & Família”, “Comportamento Espírita”, “Uma Nova Visão do Homem e do Mundo”, “A Delicada Questão do Sexo e do Amor”, “Novo Pensar - Deus, Homem e Mundo”, dentre outros.

Retirado do site PENSE - http://viasantos.com/pense/arquivo/1359.html

quinta-feira, 5 de julho de 2012

La Moral En La Doctrina Espirita

 Por Manuel S. Porteiro

La moral es muy importante en la vida de los hombres, Jesús, como Krishna y como otros espíritus luminosos que supieron ordenar al hombre sin imponerle claudicaciones, no fundaron ninguna religión positiva; enseñaron, sí, una moral sublime, idéntica para todos los hombres, sin sujeción a tiempos, lugares ni circunstancias, sin casuística ni acomodos, moral que lo mismo sirve para realizar el ideal de felicidad humana en este mundo, que para guiar al espíritu en la senda de su progreso indefinido. Esta moral es esencialmente idéntica a la que se desprende de la filosofía espiritista, pero esta última tiene el valor de su fundamento científico, de sustituir el parabolismo de aquélla con una forma racional de explicación y dar también al hombre su razón de ser moral.

El Espiritismo viene hoy a levantar la moral caída, a darle una base científica, a demostrar que lo que ayer fue intuición filosófica, es hoy verdad positiva; viene a  probar con hechos que los principios morales entran grados de desarrollo, que son propios del espíritu, no del organismo ni de la materia, que la moralidad se manifiesta en cada uno según el grado de evolución alcanzado; viene a demostrar que el hombre es un espíritu encarnado, sujeto a continua evolución, que ha vivido en anteriores existencias en estados biológicos interiores y que una vez abandonado su cuerpo material, continúa evolucionando progresivamente, subiendo de tramo en tramo la escala infinita de su progreso, en este o en otros mundos más en armonía con su desarrollo espiritual, que la mayor capacidad moral e intelectual depende del esfuerzo propio de cada ser, de la actividad que despliegue para alcanzarla, que la adquisición de esta capacidad, siempre creciente en su infinito desarrollo, consiste en el ejercicio de todas sus facultades y aptitudes, inspiradas en el bien y puestas al servicio de sus semejantes y, en lo posible, de los demás seres que le rodean; viene a establecer la fraternidad universal sobre las mismas leyes de la evolución, demostrando que la solidaridad no es una palabra vacía, por cuanto no puede existir progreso moral individual, sin progreso colectivo, ni éste sin aquél y que, por consiguiente, cuanto más bien hacemos a los demás, más bien nos hacemos a nosotros mismos; viene a dar al ser una sanción justa y ecuánime, natural y divina, que está en las leyes de su propia evolución, en el principio de causalidad, que nos enseña que toda causa produce un efecto proporcional, que toda acción tiene en sí misma las consecuencias de su bondad o de su maldad, sanción, a la cual no escapan las intenciones ni las circunstancias; viene, en fin, a reafirmar la creencia en un Ser supremo, principio inteligente, creador eterno, manantial de sabiduría, de amor, de justicia, de bondad y de belleza, de donde emanamos y adonde vivimos, sin percatarnos de nuestra pequeñez y al mismo tiempo de nuestra grandeza.

De este conocimiento que se desprende del Espiritismo científico, de las manifestaciones mismas de los seres que han vivido en la tierra y superviven a la muerte con la visión de sus existencias pasadas, de sus mensajes mismos, se desprende la moral espírita, moral sublime que, como hemos dicho, abraza todo lo que hay de bueno y de justo en las demás filosofías y religiones, verdadera ciencia deductiva que descansa en principios inalterables y universales.

La moral espírita enseña a practicar el bien sin interés de recompensas, premios ni castigos, a no ser bueno por temor ni por cálculo, sino porque el bien es la ley suprema de nuestra vida, aumenta nuestra riqueza espiritual, nos eleva y nos engrandece; a proceder con justicia en todos los actos de nuestra vida. Ante el dilema si hemos de ser buenos, justos y veraces, cuando la bondad, la justicia y la verdad nos perjudican, o si hemos de ser todo lo contrario cuando la maldad, la injusticia y la mentira nos benefician, la moral espírita se inclina decididamente por lo primero.

Nos enseña también a practicar la caridad con altruismo, con amor y con delicadeza, demostrándonos que lo que hacemos en bien de los demás es en nuestro bien propio, y que, al obrar así, no hacemos más que cumplir con un deber de solidaridad; a proteger al débil y amparar al desgraciado, cualquiera que sea su debilidad y su desgracia; a levantar al caído, a instruir al ignorante, a ver en cada delincuente un hermano, que hay que redimir con amor, y en cada delito, un enemigo que hay que combatir sin piedad; a no juzgar ni castigar, ni a dar derecho ni atribuciones a nadie para que juzgue ni castigue, considerando que todos somos pecadores y delincuentes en más o menos grado, que los pecados y delitos son propios de nuestra imperfección y de muestro atraso y que, para atenuarlos, hay que instruir, educar y suprimir en lo posible las causas que los producen; a obrar bien con entereza y con rectitud, sin temor a la crítica mundana; a gozar de todos los placeres de la vida, con honestidad y moderación, prefiriendo siempre los placeres  espirituales y, en fin, a trabajar y vivir del producto de nuestro propio trabajo, considerando éste no como un fin sino como un medio para el ejercicio y desarrollo de todas nuestras facultades espirituales y para domar nuestro espíritu de sus rudezas y sus bajas pasiones.

La moral espírita es evolucionista, en el sentido de que se irá imponiendo paulatinamente  a medida de la comprensión y del progreso moral de los individuos y los pueblos, pero en su esencia y en sus principios es absoluta, no admite términos medios, y en sus mandatos es radical e imperativa; no dice al hombre: haz el bien con arreglo a tal o cual circunstancia; sé justo con relación a tal o cual época o lugar; di la verdad, pero que ella no lastime a tales o cuales mentiras, a tales o cuales injusticias, a tales o cuales convencionalismos o intereses. Por el contrario, afirma categóricamente: sé bueno, sé justo, sé veraz, aunque el mundo y sus prejuicios se resientan por tu bondad, por tu justicia, por tu verdad.

La moral espírita es, pues, una moral de principios; no es una moral de circunstancias que, como la establecida por la ley civil y por las costumbres sociales, se adapta al medio y a la estructura económica y política de la sociedad; no es una moral que beneficia los intereses de unos en detrimento de los intereses de los demás; por el contrario, tiende a mancomunar los intereses particulares en un solo interés general, haciendo que todos los hombres sean solidarios en la producción y en el goce de la riqueza social, de acuerdo con sus fuerzas, sus aptitudes y con sus necesidades; no tiene clases, no admite prerrogativas ni categorías sociales su sanción, a todos los alcanza por igual según sean sus acciones, el grado de comprensión, el mérito o demérito de cada uno; y ante el Juez Supremo, que falla en la conciencia y en las leyes de la misma evolución, no caben títulos ni riquezas, ni castas, ni absurdos privilegios sociales.

Enseña la humildad (en el límite de la suavidad y de la modestia), sin humillación ni rebajamiento, aconseja la tolerancia, pero sin descender al consentimiento del mal, ni convivir con él. El juicio crítico que tiende a su mayor grado de perfeccionamiento del individuo y de la sociedad, es una facultad que debe emplearse contra el crimen y la injusticia; consentir éstos, convivir con ellos, no es una virtud, sino más bien una cobardía, que puede ocasionar mayores males que los que tolera.

La nueva moral que desprende del Espiritismo científico viene, pues, a transformar por completo la sociedad, y a su influencia se deberá la desaparición de muchos crímenes, de muchas injusticias, de muchas mentiras e inmoralidades que se tienen hoy por muy morales y muy sagradas; y, en cambio, se afianzarán muchas verdades, muchas virtudes, muchas aspiraciones justas que la moral hipócrita de nuestra sociedad desecha como cosas moralmente malas.

Esta doctrina redentora, lejos de ser rígida disciplina, impuesta arbitrariamente a la conciencia, es un código de amor, de paz, de esperanzas, de consuelos, de promesas y de infinitas satisfacciones espirituales. El que esto escribe, ha sentido en su alma el bálsamo consolador de esta doctrina en sus momentos de desvaríos, cuando las recrudescencias de la vida laceraban sin piedad su corazón. Al borde de más de un abismo ha encontrado en esta moral sublime el apoyo para no caer; y reconfortado su espíritu por la visión de un superior destino, volvió los ojos a la luz con la alegría de vivir, huyendo de las negruras abismales donde la amargura, el despecho o la pasión lo hacían zozobrar. Y este milagro, que se habrá producido en la conciencia de muchos espiritistas sólo puede hacerlo la convicción profunda que nos da el Espiritismo.

Extraído del libro Origen de las Ideas Morales – Manuel S. Porteiro
Livro originalmente publicado en 1998 pelo Movimiento de Cultura Espírita – CIMA, en Caracas, Venezuela.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Porque Não Considerar o Espiritismo Como Religião

Por Jorge Muta, do blog "Espiritismo com Profundidade"

Artigo baseado em trechos do livro "O Laço e o Culto" de Krishnamurti Carvalho Dias.

A questão de saber se o espiritismo é ou não uma religião, mais que todas as outras questões, não é matéria meramente opinativa, pois depende de apreciação de muitos fatos, mas conduz a posições opinativas, a radicalizações. Irei nesse tópico apenas elencar fatos históricos e etimológicos trazidos por Kardec sobre a questão "religião", na Revista Espírita.

Sentindo Kardec que as palavras se revestem de imensa importância, cuidou de garantir, assegurar, que o espiritismo, todo um novíssimo universo de idéias e fatos, pudesse ser traduzido, vazado, por um elenco de palavras perfeitamente explícito, com um mínimo risco de confusões e obscuridade possível.

A codificação é, no seu contexto, tão explicita, tão clara, que me pergunto como pode haver alguma dúvida sobre as transparentes colocações de Kardec.

Para ler o artigo na íntegra, baixe o pdf aqui. O disponibilizamos para download e não o postamos na íntegra por este possuir 12 páginas.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

¿Espiritismo: Filosofía, Ciencia O Religión?

Por Maria Ribeiro

Clique aqui para a versão em português.

Aun hoy actualmente, hay dudas entre los adeptos del Espiritismo en cuanto a su real naturaleza. ¿Al fin de cuentas, el Espiritismo es religión, ciencia o filosofía?

Sin pretensiones poco razonables, nos gustaría examinar las Letras Espiritas, con la finalidad de buscar la luz para tal, callejos sin salida.

En el capítulo I, Ítem, 17 de La Génesis, Kardec elucida que “Todas las ciencias se encadenan y se suceden en un orden raciona; ellas nacen una de las otras; a medida que encuentran un punto de apoyo en las ideas y conocimientos anteriores.”

Ya en el ítem anterior, el lucido maestro lionés hizo paralelo entre los objetos de estudio de ambos, la ciencia ordinaria y el espiritismo, siendo el primero el de las leyes del principio material y el segundo, el de las leyes del principio espiritual. Es del conocimiento general que, para constituirse una ciencia es necesario que haya un objeto de estudio. El espiritismo, bajo este aspecto investigativo, es, por tanto, Ciencia, con sus propios métodos y postulados explorando al máximo el uso de la observación, de la lógica, de la racionalidad.

Se entiende que la ciencia espirita da proseguimiento a investigaciones que la ciencia está imposibilitada de actuar. Al menos por los mismos medios, pues, dentro de su campo de acción, también participa de la gran obra divina, que es trazar informaciones y disponibilidades en las más diversas áreas para los hombres. Son palabras del magno codificador en Obras Póstumas, en el capítulo titulado “Preguntas y Problemas”: “… (El espiritismo) no repudia ninguno de los descubrimientos de la ciencia, teniendo en vista que la ciencia es la recopilación de las leyes de la naturaleza, y que, siendo esas leyes de Dios, repudiar la ciencia seria repudiar la obra de Dios.”

¡Y mientras tanto las ciencias han progresado! En todos los sectores, las mejoras están surgiendo con nuevos ropajes para hacernos creer que son creaciones inéditas. Los avances en la medicina nos dejan en la expectativa del surgimiento de curas, o al menos tratamientos más eficaces y al mismo tiempo menos agresivo, para las enfermedades como el cáncer y aun mismo para el AIDS. La tecnología contribuyo creando mecanismos y aparatos cada vez más modernos en prácticamente todos los niveles. No se puede negar en cuanto al progreso que ha promovido mayor bienestar para la vida humana.

El Espiritismo es una doctrina filosófica que tienen consecuencias religiosas, como toda doctrina espiritualista”. Encontramos en la Doctrina Espirita los más elevados valores que desde tiempos inmemoriales vienen siendo predicados por diversas personalidades que visitaron el planeta. Muchas veces considerados como locos, agitadores y subversivos, tuvieron sus grandezas de almas reconocidas, solamente después que desencarnaron.

Con este corto periodo, Kardec no deja espacio para la separación del Espiritismo, filosofía y religión, una vez que la Filosofía es que dio origen a las religiones y a las ciencias. Por eso, es incomprensible la forma de ver el Espiritismo sin Filosofía, sin ciencia. Y sin religión, ya que el texto Espirita nos sugiere ser la Doctrina la fusión armónica de un trió que, por causa de la ignorancia de los hombres, estuvo disperso por largos siglos.

Hay, obviamente, que considerar, en como los hombres constituyeron sus creencias, organizándolas según un entendimiento limitado perfectamente inteligible. Surgiendo disidencias, lo que puede parecer natural, surgen también nuevas formas de adoración al ser superior, nuevos dogmas, nuevos rituales, y otra vez nuevas disidencias, formando grupos muy heterogéneos solamente en determinados aspectos. La Doctrina Espirita no se compara a nada de eso, porque no es una disidencia de ninguna otra, más si, la suma de todas las verdades contenidas esparcidamente en las diversas expresiones religiosas, nada menos que el consolador prometido por Cristo. “Más aquel consolador, el Espíritu santo, que el Padre enviara en mi nombre, os enseñará todas las cosas, y os hará recordar todo cuanto os tengo dicho” (Juan, 14, 26).

Ahora, Jesús habla de "todas las cosas" – os enseñará todas las cosas. si reconocemos el Espiritismo como el cumplimiento de esta promesa de Jesús, es necesario atribuirle el merito que el merece. No pude ser reducido a una u otra esfera de acción. Examinemos lo que el ítem XIII de la introducción de El Libro de los Espíritus asevera: “Por tanto, no nos engañemos: el estudio del Espiritismo es inmenso, toca en todas las cuestiones de la metafísica y de la orden social, y es todo un mundo que se abre ante nosotros.” en otras palabras, no es lo mismo que Jesús pronunció? En todos los aspectos – científico, filosófico y religiosos, precisa ser investigado, comprendido y divulgado, bajo pena de reforzar la ya existente idea de que Espiritismo es diferente de religión, que es diferente de ciencia. Una cosa es utilizar formas didácticas para mejor comprensión de su compleja transcendencia, otra es querer deturpar palabras y esclarecimientos de Espíritus que están mucho más allá de nosotros, como el propio Codificador, apenas para entender una fracción de audaz orgullo.

Por otro lado, “el Espiritismo, esencialmente positivo en sus creencias, repele todo misticismo”, conforme señala Kardec, (Obras Póstumas, Preguntas y problemas). Y, sin saber aun si felizmente o infelizmente, existe una vertiente para este lado, más sin sombra de duda, es anti doctrinario. Lo que puede haber de errado en una persona al ofrecer o recibir una aplicación de Reiki, o de hacer tratamientos cromoterapia, o de someter las terapias con cristales, pirámides y florales? ¿Será que es errado el que alguien tome un baño de sal gruesa, o encender inciensos y velas o practicar cosas afines? Ciertamente que errado no es, teniendo en vista las buenas intenciones con que son hechas, más sustentar que eso tiene que ver con el Espiritismo es un error grave, pues entre ambos van una distancia galáctica.

Siendo, esencialmente positivo en sus creencias, el espiritismo está basado en los hechos y en la experiencia; es un objeto de carácter práctico y objetivo. Dirige la fe del hombre para el raciocinio. De ahí no parecer racional creer que la quema de incienso sea capaz de espantar los malos Espíritus y fluidos “cargados”, olvidando el ítem 13 del noveno capítulo de El Libro de los Médiums. También es alarmante ver la confianza que se deposita en el tratamiento de las tales flores, que garantizan interferencias benéficas según algunos, en el periespiritu, cuando se sabe que sin reformulaciones de valores llevados a efecto cotidianamente, no existe otra forma de adquirirse el bienestar físico o psíquico.

La reflexión que se hace importante es que el respeto por las diversas formas de creencias es preciso que exista, ya que somos parte de un grupo heterogéneo de Espíritus en diferentes grados evolutivos. De ahí, el concluirse que, entre los Espíritas habrá aquellos en estado de transición, donde la total convicción aun no surgió y solo la hará gradualmente, como es natural. Entretanto, no será por causa de eso que se dejará de esclarecerlos, preservando siempre y a todo costo, la pureza doctrinaria.

Bajo la identificación de Un espíritu, un compañero de la patria espiritual nos elucida aun en la Obras Póstumas, en el capitulo cuyo título es “El futuro del espiritismo”: “El Espiritismo está llamado a desempeñar un papel inmenso sobre la Tierra; será el que reformará la legislación tan frecuentemente contraria a las leyes divinas; será el que rectificará los errores de la historia; será el que reconducirá a la religión de Cristo que, en las manos de los sacerdotes, se torno un comercio y un vil tráfico; instituirá la verdadera religión, la religión natural, la que parte del corazón y va directo a Dios, sin detenerse en las franjas de una sotana, o en las escaleras de un altar(…)

El Hermano habla de una “religión de Cristo”, de una religión natural que parte del corazón y va directo a Dios, removiendo en nosotros cualquier pensamiento de alguna forma ligado a la cuestión religiosa, resucitando su real significado.

Lo que se entendió por religión, en realidad, jamás lo fue. Del latín religar asume significación diversa. El “religar” el hombre a Dios jamás puede hacer entender practicas externas acosadas por una caprichosa superstición, abstracción hecha para los hombres aun de entendimiento elementales, y a los abusos que se registraron, principalmente en el periodo dantesco de la Edad Media.

La Doctrina Espirita vino a restaurar el cristianismo que a lo largo de la historia sufrió deturpación, mutilaciones y abusos de toda suerte. ¿Cómo eximirla de cualquiera de sus aspectos, sin repetir los mismos errores del Pasado?

Es una necesidad urgente que los espiritas asuman pronto su papel, ya que tantas responsabilidades están reservadas al espiritismo, que solo actuará mediante la acción efectiva de sus adeptos. Estos parecen esperar que acontezca algo extraordinario por si mismo, mientras pequeñas divergencias amenazan intimidar verazmente difundiendo las ideas espiritas. Afortunadamente el codificador garantizo:”Qué importan, más allá, de algunas disidencias que están más en la forma que en el fondo! Observad que los principios fundamentales son los mismos por todas partes y deben uniros en un pensamiento común: el amor a Dios y la práctica del bien. Cualquiera que sean, por tanto, el modo de progresión que se admita, o las condiciones normales de la existencia futura, el objetivo final es el mismo: hacer el bien; ahora, no hay dos maneras de hacerlo. “ (El Libro de los Espíritus – Conclusión ítem, IX)