quinta-feira, 20 de maio de 2010

Bonus-hora - Caridade remunerada?

Por Randy*

Nossa comunidade é tão avançada no aprofundamento das questões espíritas que não raras vezes nos esquecemos de nosso caráter esclarecedor sobre o Espiritismo para quem ainda não teve contato com nossos debates mais complexos.

E diante disso, a pessoa que entra aqui ainda acreditando nas colonias só pode crer também em todo o pacote que a lenda das "colonias espirituais" traz. Afinal, somos criticados por desmascarar a farsa dessa invenção de Chico Xavier, mas os críticos esquecem-se facilmente do que vem junto com as tais colonias.

O que vem junto com a idéia de colonias?

Vêm as paisagens... Sim... rios espirituais, montanhas espirituais, nuvens espirituais, céu espiritual, animais espirituais, plantas espirituais e tudo o que comporia um cenário renascentista que pudesse reproduzir Adão e Eva no Paraíso. Afinal, qual é o sentido de existirem montanhas num plano espiritual, se montanhas são consequencia de graves colapsos das placas tectónicas em nosso planeta?... Porventura estaría Chico Xavier afirmando que terremotos também existem no plano espiritual???? E os animais, se a codificação nos ensina que eles reencarnam imediatamente após seu desencarne?

Isso são questões pontuais que ridicularizam a racionalidade de um sistema de "colonias espirituais", já tratados em diversos tópicos por aqui.

Mas, agrava-se a questão quando adentra contradições morais profundas para com a codificação espírita e nisso está especialmente os "bonus-hora".

Segundo o suposto espírito André Luiz em supostas obras psicografadas, os espiritos medianos são "estimulados" à prática do bem pela recompensa de "bônus-horas".

Qualquer pessoa que atente para as lições do Evangelho Segundo o Espiritismo, sobre a necessidade do homem se tornar bom, amar ao próximo e a este auxiliar, no que se chama de "caridade", fica PASMO em ler o que transcrevo abaixo.

- Todos cooperam no engrandecimento do patrimônio comum e dele vivem. Os que trabalham, porém, adquirem direitos justos. Cada habitante de "Nosso Lar" recebe provisões de pão e roupa, no que se refere ao estritamente necessário; mas os que se esforçam na obtenção do bônus-hora conseguem certas prerrogativas na comunidade social. O espírito que ainda não trabalha, poderá ser abrigado aqui; no entanto, os que cooperem podem ter casa própria. O ocioso vestirá, sem dúvida; mas o operário dedicado vestirá o que melhor lhe pareça; compreendeu? Os inativos podem permanecer nos campos de repouso, ou nos parques de tratamento, favorecidos pela intercessão de amigos; entretanto, as almas operosas conquistam o bônus-hora e podem gozar a companhia de irmãos queridos, nos lugares consagrados ao entretenimento, ou o contacto de orientadores sábios, nas diversas escolas dos Ministérios em geral. Precisamos conhecer o preço de cada nota de melhoria e elevação. Cada um de nós, os que trabalhamos, deve dar, no mínimo, oito horas de serviço útil, nas vinte e quatro de que o dia se constitui. Os programas de trabalho, porém, são numerosos e a Governadoria permite quatro horas de esforço extraordinário, aos que desejem colaborar no trabalho comum, de boa-vontade. Desse modo, há muita gente que consegue setenta e dois bônus-hora, por semana, sem falar dos serviços sacrificiais, cuja remuneração é duplicada e, às vezes, triplicada.

- Mas, é esse o único título de remuneração? - perguntei.

- Sim, é o padrão de pagamento a todos os colaboradores da colônia, não só na administração, como também na obediência.

Todos os grifos são nossos.

O trecho acima é retirado de "Nosso Lar".

Você não precisa ser defensor da pureza doutrinária, nem ortodoxo, para responder às interrrogações que surgem a cada trecho em negrito. O suposto autor defende claramente a existência de uma remuneração pela prática do bem...

Nesse caso, onde foram parar os principios do Evangelho Segundo o Espiritismo? Note: claramente se avalia que se o sujeito quiser se dar bem numa colonia, tem que juntar "bonus hora" para COMPRAR" vantagens, inclusive a de... entretenimento..

Por que os trabalhadores precisam de "provisões de roupas e comida", se a codificação é clarissima em dizer que o espírito não possui necessidades físiologicas (alimentação) e ele mesmo é capaz de, por meio de ações sobre o perispírito, tecer a própria aparência? E nem estamos falando em "roupas", mas de órgãos externos, face, cabelos, etc...

Por que um espírito iria precisar de... "casa própria"????... Mas, os defensores da existência das colonias não sustentam o tempo todo que essas... casas... são criações fluidicas dos próprios espíritos?... Então, ainda que um espírito necessite de uma... casa (num lugar onde não há ladrões, nem chuva, nem sol, nem frio, nem calor), pela teoria das colonias, não seria ele próprio capaz de "criar" uma casa para si? Por que a necessidade de "ganhar bonus hora" para "ganhar uma casa própria"???

E se o principio dos espiritos é o da comunhão, porque tal casa, se realmente existisse, teria que ser... "própria"?... Isso não é um ato de profundo egoismo?...

A questão é que essa história de bonus-hora mata a credilibilidade do sistema de mérito moral. E pior ainda: o Evangelho Segundo o Espiritismo nos diz claramente que NÃO PODEMOS JULGAR A MORAL DO PRÓXIMO... Sendo assim, como se mede a prática do bem de uma pessoa por meio de "horas trabalhadas"?

São extremas as contradições entre a história de "bonus-horas" e a codificação espírita. QUALQUER INDIVIDUO QUE ESTUDE A CODIFICAÇÃO fica estarrecido com essa comparação.

Vale lembrar que citamos apenas um pequeno trecho. "Nosso Lar" pretende ser uma comédia moderna no sentido Aligueriano. A obra reproduz outra produção clássica: o capitalismo industrial do século XIX. Sequer se compara ao do século XX. E por que afirmamos isso? Porque ele estabelece uma "semana de bonus hora" de setenta e duas horas", quando no capitalismo moderno não se ultrapassam quarenta e quatro horas de trabalho semanais.

- Ora - dirá alguém - mas um espirito não se cansa como um encarnado e portanto pode trabalhar setenta e duas horas semanais.

Ao que responderei:

- Se não se cansa - e não se cansa mesmo - porque ele teria necessidade de... entretenimento?

Não fomos nós quem inserimos a questão e a expressão "remuneração" na dita obra. Foi seu autor. E o conceito de remuneração, pelo Direito Brasileiro, é o seguinte:

Remuneração é o conjunto de retribuições recebidas habitualmente pelo empregado pela prestação de serviços, seja em dinheiro ou em utilidade, provenientes do empregador ou de terceiros, mas decorrentes do contrato de trabalho, de modo a satisfazer suas necessidades básicas e de sua família.

Atenção para as expressões "retribuição" e "satisfazer necessidades básicas".

Sobre retribuição, não enseja o Evangelho Segundo o Espiritismo que ninguém pratique o bem desejando ser retribuido.

E sobre necessidades básicas, quais seriam as dos espiritos desencarnados, senão aprender com os erros para evoluir rumo à perfeição?

E por décadas sobreviveu mais uma lenda no Meio Espirita. Os "Bonus horas", como facilmente se elucida, não possuem nenhum tipo de respaldo dentro da codificação espirita e atuam em direta contradição com esta. Mais um absurdo no qual acreditam os incautos e os mal intencionados que lucram com vendas de livros ou com sua vaidade intelectual despejada em palestras espiritas e comunidades espiritualistas de Orkut.

* Randy é moderador da comunidade "Eu Sou Espirita - Espiritismo" do Orkut.

4 comentários:

  1. Fé raciocinada... não tenho opinião formada sobre Chico Xavier, mas sem dúvida este blog nos leva a por em prática a fé raciocinada...

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  2. Esta ai.. concordo com você!
    Estou montando uma aula que fala sobre Mundos superiores..(Aula de mocidade).. e não acreditei em bonus hora... só falta dizer que la tbm tem CLT.

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  3. Hoje temos conhecimento necessário para questionarmos vários temos , abordados não só dos livros de Chico Xavier, mas como de vários outros autores; mas não podemos e nem devemos supor que não são necessários pois ainda estamos em um nível de aprendizado que muitas vezes as figuras de linguagem ainda são necessárias, cristo não as utilizava a mais de 2000 anos? Conseguimos por em prática a caridade, sem querermos recompensas? Então como vimos, como julgar os outros se ainda não conseguimos compreender a necessidade alheia?

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  4. Irmaos, voces estao interpretando de forma incorreta tanto o Evangelho como o livro Nosso Lar. Quando Jesus nos presenteou com a parabola dos trabalhadores da ultima hora usou suas palavras cuidadosamente. Ele diz que o patrao dara aos seus trabalhadores o que ele julgar justo. Os trabalhadores que estavam desempregados tinham em seu coracao a vontade de trabalhar, e so isso para o patrao ja era valido e justo, por isso foi que o patrao foi caridoso pagou o mesmo salario a todos os trabalhadores, os que trabalharam todo o dia e os que so trabalharam as horas no fim do dia. A doutrina espirita nos ensina que no plano espiritual existe sim, uma hierarquia, quanto mais puro o espirito, mais leve e seu periespirito e mais liberdade goza de poder acender a planos mais elevados. Essa ascencao se da ataves de merecimentos. O que Andre Luiz nos explica atraves do bonus-hora e que todos os trabalhadores da colonia estao organizados de tal forma a poder ascender na escala espiritual que nos ensina o espiritismo. Alem disso, em Nosso Lar temos o exemplo de Andre Luiz que ele mesmo estava ja pedindo trabalho para si, mas que so comecou a realizar o seu trabalho no momento em que seu coracao quis, no momento em que comecou seu trabalho na cidade espiritual limpando o chao do hospital em que estava inicialmente so como observador, deixando de lado todo o orgulho de medico na terra, nesse momento ele ganhou seu bonus-hora e teve a sua ascencao espiritual, nao poderia ser de outra forma. Que Deus esteja com todos.

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