quarta-feira, 15 de julho de 2009

Machado de Assis e o Espiritismo

21:06 Posted by Fabiano Vidal , , ,

No ano que marca o centenário de morte, ou, melhor dizendo, de imortalidade de Machado de Assis, é natural que voltemos a nos debruçar sobre sua obra buscando ainda compreender o processo de formação de um escritor de seu nível. A dimensão da obra machadiana é tal que se torna até o momento inesgotável, sendo possível ao pesquisador encontrar na mesma um vasto campo temático para suas análises.

Como homem de seu tempo, Machado se nos apresenta como um inteligente observador da sociedade, capaz de transformar os acontecimentos mais corriqueiros em farto material para sua produção literária em todas as expressões a que se dedicou.

No texto que hora se inicia, procurarei mapear algumas das referências e usos estilísticos que O Bruxo do Cosme Velho fez a um dos “produtos” importados de França pelos brasileiros: o Espiritismo

Afirmar que Machado de Assis era conhecedor dos conceitos espíritas não é nenhum absurdo e pode ser constatado pelas palavras do próprio escritor. Antes de nos determos na produção literária de Machado, recorramos às suas crônicas a fim de verificar o seu contato com o Espiritismo.

Em crônica publicada no dia 05 de outubro de 1885, na “Gazeta de Notícias”, Machado começa com seu habitual tom jovial: “MAL ADIVINHAM os leitores onde estive sexta-feira. Lá vai; estive na sala da Federação Espírita Brasileira, onde ouvi a conferência que fez o Sr. M. F. Figueira sobre o espiritismo.”.

Na seqüência da crônica, o Bruxo conta ao leitor como (num processo hoje chamado de “projeção”) desprendeu-se do corpo e visitou em espírito a sede da FEB, onde assistiu à palestra na qual se convenceu da inexistência do diabo e jurou converter-se à nova doutrina. Ao retornar a casa encontrou seu corpo animado por um espírito que se identificou como sendo o próprio diabo; este lhe expõe a idéia de que o Espiritismo não passava de mais um modismo condenado ao esquecimento assim que não surtisse o efeito dele esperado.

É evidente que estamos diante de uma das ironias finas de Machado, não nos sendo possível crer na sua viagem espiritual até a sede da FEB ou em sua conversa com o diabo. Entretanto a narrativa que ele faz de sua projeção interessa-nos, sobretudo por mostrar conhecimento do processo envolvido no desprendimento da alma do corpo, conforme descrito em diversos tratados espíritas desde Kardec até os dias atuais. Também é de se ressaltar que Machado estava a par das atividades desenvolvidas pela FEB e das pessoas nelas envolvidas, pois, como é sabido, Nos anos de 1885, 1886 e 1887, a FEB promoveu as “Conferências públicas sobre o Espiritismo” nas quais os princípios da Doutrina Espírita eram expostos ao público leigo por diversos estudiosos membros da FEB entre os quais estava o primeiro vice-presidente da mesma, Manuel Fernandes Figueira.

Na crônica seguinte, datada de 11 de outubro do mesmo ano, Machado volta a falar de sua conversão ao Espiritismo. Vejamos o que ele nos conta.

Fui iniciado quinta-feira, às nove horas da noite, e não conto nada do que se passou, porque jurei calá-lo, por todos os séculos dos séculos. Uma vez admitido no grêmio, preparei as malas para ir estabelecer-me em Santo Antônio de Pádua.

Claro era o meu plano. Metia-me na vila, deixava-me inspirar por potências invisíveis, predizia as coisas mais joviais ou mais melancólicas deste e do outro mundo, reunia gente, e fundava uma igreja filial. Antes de seis meses podíamos ter ali um bom contingente.

Para aquele que possui um mínimo conhecimento do Espiritismo o texto soa altamente risível pelos seguintes fatos:

1- Não há, e nunca houve, no Espiritismo qualquer tipo de cerimônia de iniciação, muito menos juramentos secretos.
2- Não é função prioritária do Espiritismo o intercâmbio mediúnico, mas sim a renovação moral do indivíduo mediante o estudo e a prática da caridade.

Apesar do deslize (creio que proposital), Machado ainda nos demonstra nesta crônica como as práticas religiosas não católicas eram perseguidas na época:

(...) Tudo estava pronto, malas, alma e algibeiras, quando li o código de posturas da Câmara Municipal de Santo Antônio de Pádua, que está sujeito à aprovação da assembléia provincial do Rio de Janeiro. Nesse código leio este ominoso artigo, o art. 113:

“Fica proibido fingir-se inspirado por potências invisíveis, ou predizer cousas tristes ou alegres”.

(...)

Não me digam que o artigo apenas veda a simulação. Os fiscais de Santo Antônio de Pádua não podem saber quando é que a gente finge ou é deveras inspirado.

Mas não foi essa a última vez que os leitores do cronista iriam ler sobre o Espiritismo em suas linhas. Em diversas ocasiões encontramos referências ao Espiritismo nas crônicas machadianas, e em muitos casos nosso escritor demonstra pleno conhecimento do assunto. Passemos a alguns exemplos mais significativos.

3 de julho de 1892 – Expõe sobre a reencarnação, fazendo a distinção entre esta de acordo com o Espiritismo e a metempsicose dos brâmanes. Interessante notar que ele reproduz praticamente na íntegra a inscrição encontrada no túmulo de Allan Kardec: “A lei é esta: nascer, morrer, tornar a nascer e renascer ainda, progredir sempre.” (Assis, 1997: 12).

23 de setembro de 1894 – Mais considerações a respeito da reencarnação e de como ela poderia explicar um caso de acusação de bigamia.

27 de outubro de 1895 – Entre outras considerações gerais surge o questionamento da divergência entre o artigo 157 do Código Penal de 1890, que declara crime “praticar o espiritismo, a magia e seus sortilégios”, e a Constituição Republicana, chamada de “mãe do Código”, que acabava com a religião do Estado.

Há outras referências ao Espiritismo nas crônicas de Machado de Assis que julgo desnecessário enumerar por constituírem meras citações de menor relevância no contexto de cada crônica. O mais importante é ressaltarmos que a penetração da Doutrina Espírita em terras brasileiras marcou profundamente a nossa intelectualidade e que até mesmo nosso maior escritor, embora mantivesse seu ceticismo e tom irônico costumeiros, dialogou de alguma forma com as idéias apresentadas pelo Codificador.

Fontes:

ASSIS, Machado de. Balas de estalo & Crítica. São Paulo: Globo, 1997, p. 103-5.

ASSIS, Machado de. Op cit, 1997, p. 106-7

Texto de Glaucio Cardoso
Publicado no Recanto das Letras em 22/08/2008

segunda-feira, 13 de julho de 2009

A GÊNESE - O Bem e o Mal

21:39 Posted by Fabiano Vidal , , , ,

Origem do bem e do mal.

-Sendo Deus infinitamente sábio, justo e bom, é evidente que o mal existente não pode NELE ter-se originado. Por outro lado, se existisse um Satanás (personificação eterna do mal), não podendo ser igual, seria inferior a Deus, logo, teria sido criado por ELE, o que implicaria na negação da bondade infinita do Criador.

-Os males tanto físicos como morais pertencem a duas categorias:

1)- Os que independem da vontade do homem - os flagelos naturais. Os flagelos se afiguram maus e injustos aos homens, por não poderem compreender a Sabedoria Divina que em cada acontecimento manifesta oportunidade para o progresso da humanidade. Os flagelos permitem ao homem desenvolver sua inteligência a ponto de preveni-los, amenizar seus efeitos, através das ciências aplicadas à melhoria de condições de vida e bem-estar no planeta. "A dor é o aguilhão que o impele para frente, na senda do progresso".

2)- Os criados pelos vícios, orgulho, egoísmo, ambição, cupidez e por todos os excessos.

Apesar da consciência que lhe foi outorgada pelo Criador, das advertências dos mensageiros quanto ao cumprimento das Leis Divinas que têm por objetivo o bem e o progresso, insiste o homem em causar guerras, injustiças, opressão do fraco pelo forte, usando assim seu livre-arbítrio para a satisfação de seus vícios e sua vaidade.

Graças à bondade divina, porém, chega um momento em que o mal moral se torna intolerável, reconhece o homem a necessidade de mudar de vida. Usa então de seu livre-arbítrio para moralizar-se a fim de ser mais feliz.

-"O mal é a ausência do bem" . "Onde não existe o bem forçosamente existe o mal". O mal decorre portanto do estado de imperfeição do homem. Existe um limite natural à satisfação das necessidades. Se, por seu livre-arbítrio comete excesso, tem como resultado as enfermidades, a morte, que lhe advirão por sua imprevidência e não por castigo de Deus.

- A alma foi criada simples e ignorante sujeita à Lei do Progresso. Quiz Deus que o progresso resulte do próprio trabalho a fim de que lhe pertença o fruto deste como também é de sua responsabilidade o mal que pratique.

- As raízes das paixões e dos vícios se acham no instinto de conservação, intenso nos animais e seres animalizados onde inexiste o senso moral e a vida intelectual. Com o desenvolvimento da inteligência o instinto se enfraquece, fazendo com que paulatinamente haja o domínio do espírito sobre a matéria. Quanto mais se deixe dominar pela matéria, atrasa seu desenvolvimento identificando-se com o bruto. Assim, as paixões que lhe eram um bem, por que eram necessidades de sua natureza, passam a ser um mal por que se tornam prejudiciais à espiritualização do ser. "O mal é, portanto, relativo e a responsabilidade é proporcional ao grau de desenvolvimento".

O instinto e a inteligência.

-O instinto é a força oculta que solicita atos espontâneos e involuntários visando à conservação da espécie.

-É pelo instinto que a planta se volta para a luz e dirige as raízes para a água ou terra, que os animais migram cfe. a mudança de clima, constroem seus abrigos, armadilhas para caçar seu alimento, que os sexos se aproximam, que a mãe protege seu filho. No início da vida os atos humanos são puramente instintivos. Mesmo no adulto muitos atos são movidos pelos instintos como o de conservação, equilíbrio do corpo, adaptação das pálpebras à luz, etc.

- A inteligência é um atributo da alma e se revela por atos voluntários, refletidos, premeditados e combinados de acordo com as circunstâncias.

- O instinto é previdente e nunca se engana. A Inteligência, por ser livre, está sujeita a errar. O adulto anda naturalmente, instintivamente, mesmo quando está desatento ao ato de andar. Ao aumentar a velocidade, passa a usar sua inteligência, podendo p.ex. vir a cair.

-Certa teoria considera os atos instintivos provenientes dos protetores espirituais, que diminuiriam sua ação à medida que seu protegido desenvolvesse sua inteligência. Contraria, entretanto, a unidade de causa que se observa universalmente nos instintos, o que não seria possível se proviessem de cada protetor.

-Se considerar-se todos os seres mergulhados no fluído divino, soberanamente inteligente e previdente, entender-se-á a unidade dos movimentos instintivos que visam ao bem de cada indivíduo, tanto mais ativamente quanto menor for o desenvolvimento da inteligência.

- O instinto é portanto guia seguro que se enfraquece à medida do desenvolvimento da inteligência.

- As paixões são também forças inconscientes, nascem das necessidades do corpo e dependem do organismo. São individuais, produzem efeitos variados em intensidade e natureza. São úteis até o surgimento do senso moral, quando passam a ser prejudiciais ao progresso do espírito. "O instinto se aniquila por si mesmo; as paixões somente pelo esforço da vontade podem domar-se".

Destruição dos seres vivos uns pelos outros.

- A verdadeira vida, tanto do animal como do homem, não está no invólucro corporal mas sim no princípio inteligente que preexiste e sobrevive ao corpo.

- Em sua infinita sabedoria o Criador faz com que os seres orgânicos se nutram uns dos outros. No homem materializado domina o instinto animal e mata para se alimentar. Posteriormente ao contrabalançar-se o sentimento moral, luta e destroi para satisfazer sua ambição, orgulho, poder. Ao preponderar o senso moral diminui a necessidade de destruir, tendendo a desaparecer, por se tornar odiosa. Passa então a lutar intelectualmente, contra as dificuldades, não mais contra seus semelhantes.

Fonte: Sociedade Espírita Nova Era - Blumenau - Santa Catarina

A GÊNESE - Existência de Deus - Da natureza divina - A Providência - A visão de Deus.

21:30 Posted by Fabiano Vidal , , , ,

Existência de Deus - Deus é a causa primária de todas as coisas, a origem de tudo o que existe.

- "Pelo efeito se julga uma causa"."Todo efeito inteligente decorre necessariamente de uma causa inteligente".

- Ao contemplar uma obra de arte conclui-se somente poderia tê-la produzido um homem de gênio, nunca um idiota ou um animal, menos ainda que teria sido obra do acaso.

- Ao contemplar a Natureza, notando-lhe a sabedoria, a providência, a harmonia, ou seja, efeitos inteligentes que superam a capacidade humana, somente se pode concluir ser obra de uma inteligência superior à Humanidade.

Muito embora as forças materiais atuem mecanicamente, pelas leis de atração e repulsão, como as plantas nascem, brotam, crescem e se reproduzem sempre da mesma maneira, por ação do calor, eletricidade, luz, umidade, não se pretende afirmar que tais forças sejam inteligentes. São postas em ação, distribuidas apropriadamente de modo a produzir um efeito útil por uma causa inteligente. "Deus não se mostra, mas se revela pelas suas obras".

Da natureza divina -

- Falta-nos o sentido próprio para compreender a natureza divina, o qual só adquiriremos com a completa depuração do espírito. Podemos, no entanto, conhecer seus ATRIBUTOS:

1)- Deus é a suprema e soberana inteligência;
2)- Deus é eterno; (Não teve começo nem fim).
3)- Deus é imutável;
4)- Deus é imaterial; (Se não o fosse estaria sujeito a mudanças).
5)- Deus é onipotente;
6)- Deus é soberanamente justo e bom; (Se tivesse qualquer resquício de maldade, não poderia ser infinitamente justo, bom e perfeito).
7)- Deus é infinitamente perfeito;
8)- Deus é único;

- Assim, qualquer religião, filosofia, dogma, que estiver em contradição com quaisquer destes atributos divinos, não poderá estar com a verdade. "A religião perfeita será aquela cujos artigos de fé jamais contrariem tais atributos, suportando a prova de verificação sem nada sofrerem".

A Providência.

- A ação providencial divina se faz sentir nas menores coisas, demonstrando que tudo vê, a tudo preside, está em toda a parte agindo através das LEIS GERAIS DO UNIVERSO de modo que toda a criatura está submetida à sua ação, sem que haja necessidade da intervenção incessante da Providência.

- Imaginemos um fluido inteligente que preencha todo o universo, de modo que a Natureza inteira esteja mergulhada neste fluído divino.

Assim, todos os seres estão saturados dele, de modo que qualquer pensamento, por menor que seja, estará diretamente em contato com o Criador. "Estamos NELE como ELE está em nós".

- Assim como uma sensação em qualquer parte do corpo é percebida pelo espírito, através do fluído perispirítico, também o pensamento de qualquer criatura será instantaneamente sentido por Deus.

- Admitindo-se que deva haver um centro de onde a Soberana Inteligência irradie incessantemente por todo o Universo, pode-se supor também que percorra constantemente todas as regiões do espaço, ou ainda que não necessite movimentar-se por sua CONSCIÊNCIA abranger todo o Universo, podendo assim estar em qualquer local ao mesmo tempo.

A visão de Deus

- Enquanto encarnados podemos ter a compreensão de Deus através de seus atributos. Somente nossa alma pode ter a percepção de Deus, percepção esta que será maior à medida que o espírito progrida moralmente através de suas várias encarnações, despojando-se das imperfeições que lhe toldam a visão espiritual, até alcançar a plenitude de suas faculdades. Somente as almas puras, portanto, possuem a faculdade de ver o Criador.

Fonte: Sociedade Espírita Nova Era - Blumenau - Santa Catarina

A GÊNESE - Caráter da Revelação Espírita

A Gênese segundo o Espiritismo

REVELAR = "sair de sob o véu"; descobrir, dar a conhecer uma coisa secreta ou desconhecida. Assim pode-se considerar que:

- A Astronomia revelou o mundo astral;
- A Geologia revelou a formação da Terra;
- A Química, a lei das afinidades;
- A Fisiologia, as funções do organismo, etc.

A REVELAÇÃO tem por característica a VERDADE. Se for desmentida por fatos, deixa de ter origem Divina, pois Deus não se engana nem mente.

O Professor, ao ensinar seus alunos, é um revelador de fatos não conhecidos por eles. Ensina o que aprendeu; por isso é revelador de SEGUNDA ORDEM. O homem de gênio ensina o que descobriu por esforço próprio; é o revelador de PRIMEIRA ORDEM. O homem de gênio não é mais do que um espírito mais experiente, adiantado, missionário, por ter vivido muitas vidas e adquirido mais conhecimentos do que o comum dos homens. A preexistência da alma e a pluralidade das vidas é a explicação racional para a existência de homens de gênio, pois caso contrário ter-se-ia que admitir que Deus é parcial. São como professores ou messias, que, através de suas revelações, auxiliam os homens em seu adiantamento científico como também moral, que seria muito lento se ficassem entregues às próprias forças.

Todas as religiões tiveram seus reveladores; semearam germens do progresso, que acabariam por se desenvolver à luz brilhante do Cristianismo, apesar da existência dos pretensos messias, que exploram a credulidade em proveito de sua ganância, de seu orgulho.

Os espíritos adiantados, quando encarnados, podem ministrar conhecimentos próprios ou recebê-los mesmo dos mensageiros de Deus que falam em Seu nome, através da Inspiração, audição das palavras, tornam-se visíveis durante as visões e aparições, durante a vigília ou sonho do revelador que é sempre um médium inspirado, audiente ou vidente.

A revelação pode ser SÉRIA, VERDADEIRA ou apócrifa, mentirosa. "O caráter essencial da revelação divina é o da eterna verdade".

O DECÁLOGO tem característica de revelação DIVINA: permaneceu inalterado ao longo dos séculos, tendo servido de base para os ensinamentos de CRISTO que aboliu outras leis mosaicas por não serem mais apropriadas ao desenvolvimento do povo.

O ESPIRITISMO é uma verdadeira revelação, pois dá a conhecer: o mundo invisível que nos cerca; as Leis que regem suas relações com o mundo visível; o destino do homem depois da morte.

Tem caráter de revelação divina por ter origem nos ensinamentos dos ESPÍRITOS SUPERIORES.

Participa do caráter de revelação científica por ser seu ensino acessível a todos os homens, não de maneira passiva, mas sendo-lhes recomendado o exame, pesquisa, raciocínio, respeitando-lhes o livre-arbítrio. Não pretende ser completa nem imposta à fé cega.

A revelação espírita é portanto: de origem divina, de iniciativa dos espíritos, sendo a sua elaboração fruto do trabalho do homem.

Utiliza o método experimental, observando fatos novos inexplicados pelas leis conhecidas, comparando, analisando-os; dirigindo-se dos efeitos para as CAUSAS, chega à LEI que os rege. Através do processo DEDUTIVO chega às suas conseqüências buscando as aplicações úteis.

Observando os fatos concluiu pela existência dos espíritos, deduzindo da mesma forma todos os demais princípios, não partindo portanto de nenhuma teoria preconcebida.

Um exemplo: Observou-se várias manifestações de espíritos que não tinham conhecimento de seu estado de desencarnados, o que permitiu deduzir tratar-se de uma fase da vida do espírito pouco adiantado moralmente, peculiar a certos gêneros de morte, podendo durar de horas a anos. Pois bem, os espíritos superiores não revelaram tais fatos; permitiram tais manifestações submetendo-as à observação a fim de deduzir-se a regra.

O objeto da CIÊNCIA é o estudo das leis do princípio material, assim como o objeto do ESPIRITISMO é o conhecimento do princípio espiritual. Como os dois princípios reagem um sobre o outro, o ESPIRITISMO e a CIÊNCIA completam-se reciprocamente.

A Ciência evoluiu ao longo dos séculos, tendo abandonado os quatro princípios constitutivos da matéria (terra, água, fogo, ar), concebendo um único elemento gerador. O Espiritismo demonstrou-lhe a existência acrescentando a ele o elemento espiritual.

Assim como a Alquimia gerou a Química, a Astrologia gerou a Astronomia, o ESPIRITISMO, através da experimentação, observação, demonstrando as leis que regem o mundo espiritual, seguiu-se à magia e feitiçaria, as quais, embora aceitassem a manifestação dos espíritos, misturavam crenças ridículas, por desconhecerem as verdadeiras leis das manifestações.

A primeira grande revelação veio com MOISÉS:

- Um DEUS ÚNICO, Soberano Senhor e Orientador de tudo que existe.
- Promulgou a Lei do Sinai;
- Lançou as bases da verdadeira FÉ.

Entretanto o DEUS revelado era cruel, implacável, vingativo, injusto, pois, era tido por ferir o filho pela culpa dos pais, ordenava guerras, escravizando os povos, matando mulheres e crianças.

Com JESUS CRISTO veio a segunda revelação, exemplificando um DEUS clemente, soberanamente justo, bom e misericordioso. Revelou que a verdadeira pátria não é deste mundo, mas no REINO CELESTIAL, onde os humildes serão elevados e os orgulhosos serão humilhados. Ensinou a necessidade do PERDÃO e da CARIDADE para que sejamos perdoados, retribuir o mal com o BEM.

Com Moisés os homens aprenderam a TEMER A DEUS, enquanto que através de Cristo foram levados a AMAR A DEUS.

Cristo ensinava por meio de parábolas, pois, o povo da época não tinha condições de entendê-lo completamente. Prometeu a vinda do Espírito de Verdade - "que restabelecerá todas as coisas e vo-las explicará todas".

O ESPIRITISMO é a terceira revelação, o Consolador prometido por Jesus, acrescentando à idéia da vida futura, a existência do mundo invisível, definiu os laços que unem a alma ao corpo, desvendou os mistérios do nascimento e da morte. Demonstra a Lei do Progresso manifestada através da Reencarnação dos espíritos até atingir a Perfeição.

O sofrimento passa a ser visto como mola do progresso, quando do mau uso do livre-arbítrio. Todos têm as mesmas oportunidades de progredir através do trabalho. Os "demônios" são espíritos imperfeitos que no futuro se transformarão em "anjos": espíritos puros. "TODOS OS SERES SÃO CRIADOS SIMPLES E IGNORANTES E GRAVITAM PARA UM FIM COMUM QUE É A PERFEIÇÃO".

É a grande Lei de Unidade que rege o Universo.

Pela lei de Causa e Efeito constata-se que a desdita é resultado da prática do mal. Entretanto, o sofrimento cessa com o arrependimento e a reparação, inexistindo portanto o "sofrimento eterno - o inferno" conceitos estes contrários à suprema Bondade e Justiça divinas.

A pluralidade das existências foi ensinada por Cristo e demonstrada pelo Espiritismo, explicando as aparentes anomalias da vida, mortes prematuras, diferenças sociais, mentais e intelectuais; justifica os laços de família, mostrando a inutilidade dos preconceitos de raças, castas, posição social, etc, incentivando o exercício da fraternidade universal.

O princípio da sobrevivência da alma dá ao homem a certeza de que, mais que uma máquina organizada sem responsabilidade, tem um destino maior - a perfeição.

A preexistência da alma concilia a doutrina do pecado original com a Justiça Divina, na medida em que cada espírito é responsabilizado pelas suas faltas e não as de outrem, podendo em cada existência redimir-se e progredir, despojando-se de suas imperfeições.

O Espiritismo Experimental demonstrou a existência do perispírito, citado por São Paulo como corpo espiritual, invólucro fluídico inseparável da alma e um dos elementos constitutivos do ser humano.

O estudo das propriedades do perispírito, dos fluídos espirituais e atributos fisiológicos da alma explica fenômenos como:

- vista dupla, visão à distância, sonambulismo, catalepsia e letargia, presciência, pressentimentos, aparições, transfigurações, transmissão do pensamento, obsessões, curas instantâneas, etc.

Demonstra que ocorrem segundo leis naturais, podendo ser reproduzidos, fazendo desmoronar o império do maravilhoso e sobrenatural.

O Espiritismo veio confirmar, explicar e desenvolver os ensinamentos de Cristo, elucidando os pontos obscuros existentes no Evangelho; pregando a moral cristã e demonstrando que até aos últimos minutos de vida o homem pode crescer em inteligência e moral, confirma a promessa de Cristo: é o Consolador dos aflitos, o Espírito de Verdade.

Foram, a primeira e segunda revelação, personificadas por Moisés e Cristo, enquanto que a terceira surgiu simultaneamente por todos os pontos da Terra, sendo portanto, coletiva. Kardec, na humildade própria aos espíritos elevados, atribui a si o papel de coordenador dos ensinos dos espíritos. É o CODIFICADOR da doutrina espírita.

Tendo surgido em uma época de maior madureza intelectual, em que a aceitação ocorre após estudo e exame dos fatos, a terceira revelação fez-se parcialmente, por partes, em pontos diversos do planeta, de modo que a coordenação e seleção de todos os assuntos parciais constituiu a doutrina espírita. Não decorreu, assim, de um sistema preconcebido, tendo os princípios sido apresentados somente após passarem pelo crivo da razão e de todas as comprovações.

As publicações espíritas desempenham a função de elo de ligação de idéias e experiências entre os pontos mais distantes, condensando metodicamente o ensino universal nas várias línguas do globo.

Enquanto a ciência em geral necessitou de vários anos, mesmo séculos, para atingir maior grau de desenvolvimento, bastou ao Espiritismo poucos anos para se constituir em doutrina, isto em virtude da multidão de espíritos que, pela Vontade Divina, manifestaram-se simultaneamente trazendo as várias partes da doutrina que, reunidas, compuseram o todo.

Assim cada espírito, com maior ou menor grau de conhecimentos, contribuiu com uma pedra para a construção do edifício, solidariamente, de modo que o Espiritismo emergiu da coletividade dos trabalhos, comprovados uns pelos outros.

A revelação espírita progride juntamente com a ciência, assimilando novas descobertas, de modo que jamais ficará obsoleta.

Muito embora exista no homem a voz da consciência, que nem sempre é observada, permite Deus que de tempos em tempos os missionários insistam na prática dos preceitos morais. Sócrates e Platão já ensinavam a moral pregada posteriormente por Cristo. Assim também os espíritos voltam a reprisar os conceitos da moral cristã fazendo- se ouvir em todos os recantos, pobres e ricos, do globo. Tornam conhecidos, ainda, os princípios que relacionam os encarnados e desencarnados, a natureza origem e futuro da alma, demonstrando que a solidariedade, caridade e fraternidade representam uma necessidade social muito mais do que um dever.

A autoridade da revelação espírita vem do fato de que os espíritos se limitam a pôr o homem no caminho das deduções que ele mesmo pode tirar observando os fatos. Assim tanto espíritos elevados como também os menos adiantados colaboram no trabalho de deduzir as leis que regem os fatos. Usando a lógica e o bom-senso pode o estudioso beneficiar-se de todos os gêneros de manifestações, tendo em conta que os espíritos superiores se abstêm de revelar tudo o que o homem, com trabalho próprio, possa descobrir.

Permitiu Deus que assim fosse a fim de que uma multidão de espíritos desencarnados se manifestassem em vários pontos do planeta e viessem convencer os vivos das realidades espirituais, pois, difícil e demorada seria a aceitação global se a revelação se fizesse por apenas um espírito, encarnado ou não, mesmo que fosse um Moisés ou um Sócrates.

Deve-se levar em conta que, pelo fato de desencarnar, o espírito não passa a categoria de sábio. Entretanto, livre das limitações da matéria, pode ver as coisas de modo mais elevado, compreendendo seus erros, reformando conceitos falsos ou inexatos. De acordo com o desenvolvimento atingido, pode, portanto, melhor aconselhar o encarnado. Com relação ao futuro da alma após a morte, tanto os espíritos elevados como os de menos luzes podem auxiliar na elucidação, tendo em vista relatarem suas próprias experiências.

Pode-se comparar a revelação espírita a um navio que, partindo para um país distante, tenha naufragado, tendo-se notícia de se terem afogado todos os passageiros, levando o luto a seus familiares. Entretanto, tendo conseguido os tripulantes aportar em uma ilha ensolarada, lá permaneceram em vida ditosa. Posteriormente outro navio os encontrou e levou notícia aos familiares de que estavam bem. Embora não pudessem ver-se, permutavam demonstrações de afeto à distância, podendo inclusive corresponder-se.

Assim, como o segundo navio, o Espiritismo é a boa-nova que revela a sobrevivência dos entes queridos aos quais nos reuniremos um dia.

Resumindo, os espíritos vieram nos esclarecer que:

- o nada não existe; clareiam o caminho dos homens quanto ao futuro, demonstrando que a vida terrena é passageira; mostrando a natureza do sofrimento, fazem-nos ver a justiça de Deus; o bem é uma necessidade, a fraternidade longe de ser uma teoria, funda-se numa lei da Natureza.

- se tudo acabasse com a vida o egoísmo reinaria; com a certeza no porvir os espaços infinitos se povoam não havendo vazio nem solidão, todos os seres unidos pela solidariedade.

- É o reino da caridade; "UM POR TODOS E TODOS POR UM".

- Quando do desencarne de um ente querido em vez de doloroso adeus, passa-se a dizer "até breve".

Fonte: Sociedade Espírita Nova Era - Blumenau - Santa Catarina

domingo, 12 de julho de 2009

ESE - Autoridade da doutrina espírita - Controle universal do ensino dos espíritos

18:58 Posted by Fabiano Vidal , , ,

Se a Doutrina Espírita fosse de concepção puramente humana, não ofereceria por penhor senão as luzes daquele que a houvesse concebido. Ora, ninguém, neste mundo, poderia alimentar fundadamente a pretensão de possuir, com exclusividade, a verdade absoluta. Se os Espíritos que a revelaram se houvessem manifestado a um só homem, nada lhe garantiria a origem, porquanto fora mister acreditar, sob palavra, naquele que dissesse ter recebido deles o ensino. Admitida, de sua parte, sinceridade perfeita, quando muito poderia ele convencer as pessoas de suas relações; conseguiria sectários, mas nunca chegaria a congregar todo o mundo.

Quis Deus que a nova revelação chegasse aos homens por mais rápido caminho e mais autêntico. Incumbiu, pois, os Espíritos de levá-la de um pólo a outro, manifestando-se por toda a parte, sem conferir a ninguém o privilégio de lhes ouvir a palavra. Um homem pode ser ludibriado, pode enganar-se a si mesmo; já não será assim, quando milhões de criaturas vêem e ouvem a mesma coisa. Constitui isso uma garantia para cada um e para todos. Ao demais, pode fazer-se que desapareça um homem; mas não se pode fazer que desapareçam as coletividades; podem queimar-se os livros, mas não se podem queimar os Espíritos. Ora, queimassem-se todos os livros e a fonte da doutrina não deixaria de conservar-se inexaurível, pela razão mesma de não estar na Terra, de surgir em todos os lugares e de poderem todos dessedentar-se nela. Faltem os homens para difundi-la: haverá sempre os Espíritos, cuja atuação a todos atinge e aos quais ninguém pode atingir.

São, pois, os próprios Espíritos que fazem a propagação, com o auxílio dos inúmeros médiuns que, também eles, os Espíritos, vão suscitando de todos os lados. Se tivesse havido unicamente um intérprete, por mais favorecido que fosse, o Espiritismo mal seria conhecido. Qualquer que fosse a classe a que pertencesse, tal intérprete houvera sido objeto das prevenções de muita gente e nem todas as nações o teriam aceitado, ao passo que os Espíritos se comunicam em todos os pontos da Terra, a todos os povos, a todas as seitas, a todos os partidos, e todos os aceitam. O Espiritismo não tem nacionalidade e não faz parte de nenhum culto existente; nenhuma classe social o impõe, visto que qualquer pessoa pode receber instruções de seus parentes e amigos de além-túmulo. Cumpre seja assim, para que ele possa conduzir todos os homens à fraternidade. Se não se mantivesse em terreno neutro, alimentaria as dissensões, em vez de apaziguá-las.

Nessa universalidade do ensino dos Espíritos reside a força do Espiritismo e, também, a causa de sua tão rápida propagação. Enquanto a palavra de um só homem, mesmo com o concurso da imprensa, levaria séculos para chegar ao conhecimento de todos, milhares de vozes se fazem ouvir simultaneamente em todos os recantos do planeta, proclamando os mesmos princípios e transmitindo-os aos mais ignorantes, como aos mais doutos, a fim de que não haja deserdados. É uma vantagem de que não gozara ainda nenhuma das doutrinas surgidas até hoje. Se o Espiritismo, portanto, é uma verdade, não teme o malquerer dos homens, nem as revoluções morais, nem as subversões físicas do globo, porque nada disso pode atingir os Espíritos.

Não é essa, porém, a única vantagem que lhe decorre da sua excepcional posição. Ela lhe faculta inatacável garantia contra todos os cismas que pudessem provir, seja da ambição de alguns, seja das contradições de certos Espíritos. Tais contradições, não há negar, são um escolho; mas que traz consigo o remédio, ao lado do mal.

Sabe-se que os Espíritos, em virtude da diferença entre as suas capacidades, longe se acham de estar, individualmente considerados, na posse de toda a verdade; que nem a todos é dado penetrar certos mistérios; que o saber de cada um deles é proporcional à sua depuração; que os Espíritos vulgares mais não sabem do que muitos homens; que entre eles, como entre estes, há presunçosos e sofômanos, que julgam saber o que ignoram; sistemáticos, que tomam por verdades as suas idéias; enfim, que só os Espíritos da categoria mais elevada, os que já estão completamente desmaterializados, se encontram despidos das idéias e preconceitos terrenos; mas, também é sabido que os Espíritos enganadores não escrupulizam em tomar nomes que lhes não pertencem, para impingirem suas utopias. Daí resulta que, com relação a tudo o que seja fora do âmbito do ensino exclusivamente moral, as revelações que cada um possa receber terão caráter individual, sem cunho de autenticidade; que devem ser consideradas opiniões pessoais de tal ou qual Espírito e que imprudente fora aceitá-las e propagá-las levianamente como verdades absolutas.

O primeiro exame comprobativo é, pois, sem contradita, o da razão, ao qual cumpre se submeta, sem exceção, tudo o que venha dos Espíritos. Toda teoria em manifesta contradição com o bom senso, com uma lógica rigorosa e com os dados positivos já adquiridos, deve ser rejeitada, por mais respeitável que seja o nome que traga como assinatura. Incompleto, porém, ficará esse exame em muitos casos, por efeito da falta de luzes de certas pessoas e das tendências de não poucas a tomar as próprias opiniões como juizes únicos da verdade. Assim sendo, que hão de fazer aqueles que não depositam confiança absoluta em si mesmos? Buscar o parecer da maioria e tomar por guia a opinião desta. De tal modo é que se deve proceder em face do que digam os Espíritos, que são os primeiros a nos fornecer os meios de consegui-lo.

A concordância no que ensinem os Espíritos é, pois, a melhor comprovação. Importa, no entanto, que ela se dê em determinadas condições. A mais fraca de todas ocorre quando um médium, a sós, interroga muitos Espíritos acerca de um ponto duvidoso. É evidente que, se ele estiver sob o império de uma obsessão, ou lidando com um Espírito mistificador, este lhe pode dizer a mesma coisa sob diferentes nomes. Tampouco garantia alguma suficiente haverá na conformidade que apresente o que se possa obter por diversos médiuns, num mesmo centro, porque podem estar todos sob a mesma influência.

Uma só garantia séria existe para o ensino dos Espíritos: a concordância que haja entre as revelações que eles façam espontaneamente, servindo-se de grande número de médiuns estranhos uns aos outros e em vários lugares.

Vê-se bem que não se trata aqui das comunicações referentes a interesses secundários, mas do que respeita aos princípios mesmos da doutrina. Prova a experiência que, quando um principio novo tem de ser enunciado, isso se dá espontaneamente em diversos pontos ao mesmo tempo e de modo idêntico, senão quanto à forma, quanto ao fundo.

Se, portanto, aprouver a um Espírito formular um sistema excêntrico, baseado unicamente nas suas idéias e com exclusão da verdade, pode ter-se a certeza de que tal sistema conservar-se-á circunscrito e cairá, diante das instruções dadas de todas as partes, conforme os múltiplos exemplos que já se conhecem. Foi essa unanimidade que pôs por terra todos os sistemas parciais que surgiram na origem do Espiritismo, quando cada um explicava à sua maneira os fenômenos, e antes que se conhecessem as leis que regem as relações entre o mundo visível e o mundo invisível.

Essa a base em que nos apoiamos, quando formulamos um principio da doutrina. Não é porque esteja de acordo com as nossas idéias que o temos por verdadeiro. Não nos arvoramos, absolutamente, em árbitro supremo da verdade e a ninguém dizemos: "Crede em tal coisa, porque somos nós que vo-lo dizemos." A nossa opinião não passa, aos nossos próprios olhos, de uma opinião pessoal, que pode ser verdadeira ou falsa, visto não nos considerarmos mais infalível do que qualquer outro. Também não é porque um principio nos foi ensinado que, para nós, ele exprime a verdade, mas porque recebeu a sanção da concordância.

Na posição em que nos encontramos, a receber comunicações de perto de mil centros espiritas sérios, disseminados pelos mais diversos pontos da Terra, achamo-nos em condições de observar sobre que principio se estabelece a concordância. Essa observação é que nos tem guiado até hoje e é a que nos guiará em novos campos que o Espiritismo terá de explorar. Porque, estudando atentamente as comunicações vindas tanto da França como do estrangeiro, reconhecemos, pela natureza toda especial das revelações, que ele tende a entrar por um novo caminho e que lhe chegou o momento de dar um passo para diante. Essas revelações, feitas muitas vezes com palavras veladas, hão freqüentemente passado despercebidas a muitos dos que as obtiveram. Outros julgaram-se os únicos a possui-las. Tomadas insuladamente, elas, para nós, nenhum valor teriam; somente a coincidência lhes imprime gravidade. Depois, chegado o momento de serem entregues à publicidade, cada um se lembrará de haver obtido instruções no mesmo sentido. Esse movimento geral, que observamos e estudamos, com a assistência dos nossos guias espirituais, é que nos auxilia a julgar da oportunidade de fazermos ou não alguma coisa

Essa verificação universal constitui uma garantia para a unidade futura do Espiritismo e anulará todas as teorias contraditórias. Aí é que, no porvir, se encontrará o critério da verdade. O que deu lugar ao êxito da doutrina exposta em O Livro dos Espíritos e em O Livro dos Médiuns foi que em toda a parte todos receberam diretamente dos Espíritos a confirmação do que esses livros contêm. Se de todos os lados tivessem vindo os Espíritos contradizê-la, já de há muito haveriam aquelas obras experimentado a sorte de todas as concepções fantásticas. Nem mesmo o apoio da imprensa as salvaria do naufrágio, ao passo que, privadas como se viram desse apoio, não deixaram elas de abrir caminho e de avançar celeremente. E que tiveram o dos Espíritos, cuja boa vontade não só compensou, como também sobrepujou o malquerer dos homens. Assim sucederá a todas as idéias que, emanando quer dos Espíritos, quer dos homens, não possam suportar a prova desse confronto, cuja força a ninguém é lícito contestar.

Suponhamos praza a alguns Espíritos ditar, sob qualquer título, um livro em sentido contrário; suponhamos mesmo que, com intenção hostil, objetivando desacreditar a doutrina, a malevolência suscitasse comunicações apócrifas; que influência poderiam exercer tais escritos, desde que de todos os lados os desmentissem os Espíritos? E com a adesão destes que se deve garantir aquele que queira lançar, em seu nome, um sistema qualquer. Do sistema de um só ao de todos, medeia a distancia que vai da unidade ao infinito. Que poderão conseguir os argumentos dos detratores, sobre a opinião das massas, quando milhões de vozes amigas, provindas do Espaço, se façam ouvir em todos os recantos do Universo e no seio das famílias, a infirmá-los? A esse respeito já não foi a teoria confirmada pela experiência? Que é feito das inúmeras publicações que traziam a pretensão de arrasar o Espiritismo? Qual a que, sequer, lhe retardou a marcha? Até agora, não se considera a questão desse ponto de vista, sem contestação um dos mais graves. Cada um contou consigo, sem contar com os Espíritos.

O princípio da concordância é também uma garantia contra as alterações que poderiam sujeitar o Espiritismo às seitas que se propusessem apoderar-se dele em proveito próprio e acomodá-lo a vontade. Quem quer que tentasse desviá-lo do seu providencial objetivo, malsucedido se veria, pela razão muito simples de que os Espíritos, em virtude da universalidade de seus ensinos, farão cair por terra qualquer modificação que se divorcie da verdade.

De tudo isso ressalta uma verdade capital: a de que aquele que quisesse opor-se à corrente de idéias estabelecida e sancionada poderia, é certo, causar uma pequena perturbação local e momentânea; nunca, porém, dominar o conjunto, mesmo no presente, nem, ainda menos, no futuro.

Também ressalta que as instruções dadas pelos Espíritos sobre os pontos ainda não elucidados da Doutrina não constituirão lei, enquanto essas instruções permanecerem insuladas; que elas não devem, por conseguinte, ser aceitas senão sob todas as reservas e a título de esclarecimento.

Daí a necessidade da maior prudência em dar-lhes publicidade; e, caso se julgue conveniente publicá-las, importa não as apresentar senão como opiniões individuais, mais ou menos prováveis, porém, carecendo sempre de confirmação. Essa confirmação é que se precisa aguardar, antes de apresentar um princípio como verdade absoluta, a menos se queira ser acusado de leviandade ou de credulidade irrefletida.

Com extrema sabedoria procedem os Espíritos superiores em suas revelações. Não atacam as grandes questões da Doutrina senão gradualmente, à medida que a inteligência se mostra apta a compreender verdade de ordem mais elevada e quando as circunstâncias se revelam propicias à emissão de uma idéia nova. Por isso é que logo de principio não disseram tudo, e tudo ainda hoje não disseram, jamais cedendo à impaciência dos muito afoitos, que querem os frutos antes de estarem maduros. Fora, pois, supérfluo pretender adiantar-se ao tempo que a Providência assinou para cada coisa, porque, então, os Espíritos verdadeiramente sérios negariam o seu concurso. Os Espíritos levianos, pouco se preocupando com a verdade, a tudo respondem; daí vem que, sobre todas as questões prematuras, há sempre respostas contraditórias.

Os princípios acima não resultam de uma teoria pessoal: são conseqüência forçada das condições em que os Espíritos se manifestam. E evidente que, se um Espírito diz uma coisa de um lado, enquanto milhões de outros dizem o contrário algures, a presunção de verdade não pode estar com aquele que é o único ou quase o único de tal parecer. Ora, pretender alguém ter razão contra todos seria tão ilógico da parte dos Espíritos, quanto da parte dos homens. Os Espíritos verdadeiramente ponderados, se não se sentem suficientemente esclarecidos sobre uma questão, nunca a resolvem de modo absoluto; declaram que apenas a tratam do seu ponto de vista e aconselham que se aguarde a confirmação.

Por grande, bela e justa que seja uma idéia, impossível é que desde o primeiro momento congregue todas as opiniões. Os conflitos que daí decorrem são conseqüência inevitável do movimento que se opera; eles são mesmo necessários para maior realce da verdade e convém se produzam desde logo, para que as idéias falsas prontamente sejam postas de lado. Os espíritas que a esse respeito alimentassem qualquer temor podem ficar perfeitamente tranqüilos: todas as pretensões insuladas cairão, pela força mesma das coisas, diante do enorme e poderoso critério da concordância universal.

Não será à opinião de um homem que se aliarão os outros, mas à voz unânime dos Espíritos; não será um homem, nem nós, nem qualquer outro que fundará a ortodoxia espírita; tampouco será um Espírito que se venha impor a quem quer que seja: será a universalidade dos Espíritos que se comunicam em toda a Terra, por ordem e eus. Esse o caráter essencial da Doutrina Espírita; essa a sua força, a sua autoridade. Quis Deus que a sua lei assentasse em base inamovível e por isso não lhe deu por fundamento a cabeça frágil de um só.

Diante de tão poderoso areópago, onde não se conhecem corrilhos, nem rivalidades ciosas, nem seitas, nem nações, é que virão quebrar-se todas as oposições, todas as ambições, todas as pretensões à supremacia individual; é que nos quebraríamos nós mesmos, se quiséssemos substituir os seus decretos soberanos pelas nossas próprias idéias. Só Ele decidirá todas as questões litigiosas, imporá silêncio às dissidências e dará razão a quem a tenha. Diante desse imponente acordo de todas as vozes do Céu, que pode a opinião de um homem ou de um Espírito? menos do que a gota d’água que se perde no oceano, menos do que a voz da criança que a tempestade abafa.

A opinião universal, eis o juiz supremo, o que se pronuncia em última instância. Formam-na todas as opiniões individuais. Se uma destas é verdadeira, apenas tem na balança o seu peso relativo. Se é falsa, não pode prevalecer sobre todas as demais. Nesse imenso concurso, as individualidades se apagam, o que constitui novo insucesso para o orgulho humano.

Já se desenha o harmonioso conjunto. Este século não passará sem que ele resplandeça em todo o seu brilho, de modo a dissipar todas as incertezas, porquanto daqui até lá potentes vozes terão recebido a missão de se fazerem ouvir, para congregar os homens sob a mesma bandeira, uma vez que o campo se ache suficientemente lavrado. Enquanto isso se não dá, aquele que flutue entre dois sistemas opostos pode observar em que sentido se forma a opinião geral; essa será a indicação certa do sentido em que se pronuncia a maioria dos Espíritos, nos diversos pontos em que se comunicam, e um sinal não menos certo de qual dos dois sistemas prevalecerá.

Fonte: KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

ESE - Sócrates e Platão, precursores da idéia cristã e do Espiritismo

18:54 Posted by Fabiano Vidal , , , , ,

Por Allan Kardec

Do fato de haver Jesus conhecido a seita dos essênios, fora errôneo concluir-se que a sua doutrina hauriu-a ele na dessa seita e que, se houvera vivido noutro meio, teria professado outros princípios. As grandes idéias jamais irrompem de súbito. As que assentam sobre a verdade sempre têm precursores que lhes preparam parcialmente os caminhos. Depois, em chegando o tempo, envia Deus um homem com a missão de resumir, coordenar e completar os elementos esparsos, de reuni-los em corpo de doutrina. Desse modo, não surgindo bruscamente, a idéia, ao aparecer, encontra espíritos dispostos a aceitá-la. Tal o que se deu com a idéia cristã, que foi pressentida muitos séculos antes de Jesus e dos essênios, tendo por principais precursores Sócrates e Platão. 

Sócrates, como o Cristo, nada escreveu, ou, pelo menos, nenhum escrito deixou. Como o Cristo, teve a morte dos criminosos, vítima do fanatismo, por haver atacado as crenças que encontrara e colocado a virtude real acima da hipocrisia e do simulacro das formas; por haver, numa palavra, combatido os preconceitos religiosos. Do mesmo modo que Jesus, a quem os fariseus acusavam de estar corrompendo o povo com os ensinamentos que lhe ministrava, também ele foi acusado, pelos fariseus do seu tempo, visto que sempre os houve em todas as épocas, por proclamar o dogma da unidade de Deus, da imortalidade da alma e da vida futura. Assim como a doutrina de Jesus só a conhecemos pelo que escreveram seus discípulos, da de Sócrates só temos conhecimento pelos escritos de seu discípulo Platão. Julgamos conveniente resumir aqui os pontos de maior relevo, para mostrar a concordância deles com os princípios do Cristianismo. 

Aos que considerarem esse paralelo uma profanação e pretendam que não pode haver paridade entre a doutrina de um pagão e a do Cristo, diremos que não era pagã a de Sócrates, pois que objetivava combater o paganismo; que a de Jesus, mais completa e mais depurada do que aquela, nada tem que perder com a comparação; que a grandeza da missão divina do Cristo não pode ser diminuída; que, ao demais, trata-se de um fato da História, que a ninguém será possível apagar. O homem há chegado a um ponto em que a luz emerge por si mesma de sob o alqueire. Ele se acha maduro bastante para encará-la de frente; tanto pior para os que não ousem abrir os olhos. Chegou o tempo de se considerarem as coisas de modo amplo e elevado, não mais do ponto de vista mesquinho e acanhado dos interesses de seitas e de castas. 

Além disso, estas citações provarão que, se Sócrates e Platão pressentiram a idéia cristã, em seus escritos também se nos deparam os princípios fundamentais do Espiritismo.

V. Resumo da doutrina de Sócrates e de Platão

I. O homem é uma alma encarnada. Antes da sua encarnação, existia unida aos tipos primordiais, às idéias do verdadeiro, do bem e do belo; separa-se deles, encarnando, e, recordando o seu passado, é mais ou menos atormentada pelo desejo de voltar a ele.
 
Não se pode enunciar mais claramente a distinção e independência entre o princípio inteligente e o princípio material. E, além disso, a doutrina da preexistência da alma; da vaga intuição que ela guarda de um outro mundo, a que aspira; da sua sobrevivência ao corpo; da sua saída do mundo espiritual, para encarnar, e da sua volta a esse mesmo mundo, após a morte. É, finalmente, o gérmen da doutrina dos Anjos decaídos. 

1I.A alma se transvia e perturba, quando se serve do corpo para considerar qualquer objeto; tem vertigem, como se estivesse ébria, porque se prende a coisas que estão, por sua natureza, sujeitas a mudanças; ao passo que, quando contempla a sua própria essência, dirige-se para o que é puro, eterno, imortal, e, sendo ela desta natureza, permanece aí ligada, por tanto tempo quanto passa. Cessam então os seus transviamentos, pois que está unida ao que é imutável e a esse estado da alma é que se chama sabedoria.
 
Assim, ilude-se a si mesmo o homem que considera as coisas de modo terra-a-terra, do ponto de vista material. Para as apreciar com justeza, tem de as ver do alto, isto é, do ponto de vista espiritual. Aquele, pois, que está de posse da verdadeira sabedoria, tem de isolar do corpo a alma, para ver com os olhos do Espírito. E o que ensina o Espiritismo. (Cap. II, nº 5.)
III. Enquanto tivermos o nosso corpo e a alma se achar mergulhado nessa corrupção, nunca possuiremos o objeto dos nossos desejos: a verdade. Com efeito, o corpo nos suscita mil obstáculos pela necessidade em que nas achamos de cuidar dele. Ao demais, ele nos enche de desejos, de apetites, de temores, de mil quimeras e de mil tolices, de maneira que, com ele, impossível se nos torna ser ajuizados, sequer por um instante. Mas, se não nos é possível conhecer puramente coisa alguma, enquanto a alma nos está ligada ao corpo, de duas uma: ou jamais conheceremos a verdade, ou só a conheceremos após a morte. Libertos da loucura do corpo, conversaremos então, lícito é esperá-lo, com homens igualmente libertos e conheceremos, por nós mesmos, a essência das coisas. Essa a razão por que os verdadeiros filósofos se exercitam em morrer e a morte não se lhes afigura, de modo nenhum, temível.
 
Está ai o princípio das faculdades da alma obscurecidas por motivo dos órgãos corporais e o da expansão dessas faculdades depois da morte. Mas trata-se apenas de almas já depuradas; o mesmo não se dá com as almas impuras. (O Céu e o Inferno, 1ª Parte, cap. II; 2ª Parte, cap. I.) 

IV. A alma impura, nesse estado, se encontra oprimida e se vê de novo arrastado para o mundo visível, pelo horror do que é invisível e imaterial. Erra, então, diz-se, em torno dos monumentos e dos túmulos, junto aos quais já se têm visto tenebrosos fantasmas, quais devem ser as imagens das almas que deixaram o corpo sem estarem ainda inteiramente puras, que ainda conservam alguma coisa do forma material, o que faz que a vista humana possa percebê-las. Não são as almas dos bons; silo, porém, as dos maus, que se vêem forçadas a vagar por esses lugares, onde arrastam consigo a pena do primeira vida que tiveram e onde continuam a vagar até que os apetites inerentes à forma material de que se revestiram as reconduzam a um corpo. Então, sem dúvida, retomam os mesmos costumes que durante a primeira vida constituíam objeto de suas predileções.
 
Não somente o princípio da reencarnação se acha ai claramente expresso, mas também o estado das almas que se mantêm sob o jugo da matéria é descrito qual o mostra o Espiritismo nas evocações. Mais ainda: no tópico acima se diz que a reencarnação num corpo material é conseqüência da impureza da alma, enquanto as almas purificadas se encontram isentas de reencarnar. Outra coisa não diz o Espiritismo, acrescentando apenas que a alma? que boas resoluções tomou na erraticidade e que possui conhecimentos adquiridos, traz, ao renascer, menos defeitos, mais virtudes e idéias intuitivas do que tinha na sua existência precedente. Assim, cada existência lhe marca um progresso intelectual e moral. (O Céu e o Inferno, 2.ª Parte: Exemplos.)
 
V. Após a nossa morte, o gênio (daimon, demônio), que nos fora designado durante a vida, leva-nos a um lugar onde se reúnem todos os que têm de ser conduzidas ao Hades, para serem julgados. As almas, depois de haverem estado no Hades o tempo necessário, são reconduzidas a esta vida em múltiplos e longos períodos.
 
É a doutrina dos Anjos guardiães, ou Espíritos protetores, e das reencarnações sucessivas, em seguida a intervalos mais ou menos longos de erraticidade. 

VI. Os demônios ocupam o espaço que separa o céu da Terra; constituem o laço que une o Grande Todo a si mesmo. Não entrando nunca a divindade em comunicação direta com o homem, é por intermédio dos demônios que os deuses entram em comércio e se entretêm com ele, quer durante a vigília, quer durante o sono.
 
A palavra daimon, da qual fizeram o termo demônio, não era, na antigüidade, tomada à má parte, como nos tempos modernos. Não designava exclusivamente seres malfazejos, mas todos os Espíritos, em geral, dentre os quais se destacavam os Espíritos superiores, chamados deuses, e os menos elevados, ou demônios propriamente ditos, que comunicavam diretamente com os homens. Também o Espiritismo diz que os Espíritos povoam o espaço; que Deus só se comunica com os homens por intermédio dos Espíritos puros, que são os incumbidos de lhe transmitir as vontades; que os Espíritos se comunicam com eles durante a vigília e durante o sono. Ponde, em lugar da palavra demônio, a palavra Espírito e tereis a doutrina espírita; ponde a palavra anjo e tereis a doutrina cristã. 

VII. A preocupação constante do filósofo (tal como o compreendiam Sócrates e Platão) é, a de tomar o maior cuidado com a alma, menos pelo que respeita a esta vida, que não dura mais que um instante, do que tendo em vista a eternidade. Desde que a alma é, imortal, não será prudente viver visando a eternidade?
 
O Cristianismo e o Espiritismo ensinam a mesma coisa. 

VIII. Se a alma é imaterial, tem de passar, após essa vida, a um mundo igualmente invisível e imaterial, do mesmo modo que o corpo, decompondo-se, volta à matéria, Muito importa, no entanto, distinguir bem a alma pura, verdadeiramente imaterial, que se alimente, como Deus, de ciência e pensamentos, da alma mais ou menos maculada de impurezas materiais, que a impedem de elevar-se para o divino e a retêm nos lugares da sua estada na Terra.
 
Sócrates e Platão, como se vê, compreendiam perfeitamente os diferentes graus de desmaterialização da alma. Insistem na diversidade de situação que resulta para elas da sua maior ou menor pureza. O que eles diziam, por intuição, o Espiritismo o prova com os inúmeros exemplos que nos põe sob as vistas. (O Céu e o Inferno, 2ª Parte.) 

IX. Se a morte fosse a dissolução completa do homem, muito ganhariam com a morte os maus, pois se veriam livres, ao mesmo tempo, do corpo, da alma e dos vícios. Aquele que guarnecer a alma, não de ornatos estranhos, mas com os que lhe são próprios, só esse poderá aguardar tranqüilamente a hora da sua partida para o outro mundo.
 
Eqüivale isso a dizer que o materialismo, com o proclamar para depois da morte o nada, anula toda responsabilidade moral ulterior, sendo, conseguintemente, um incentivo para o mal; que o mau tem tudo a ganhar do nada. Somente o homem que se despojou dos vícios e se enriqueceu de virtudes, pode esperar com tranqúilidade o despertar na outra vida. Por meio de exemplos, que todos os dias nos apresenta, o Espiritismo mostra quão penoso é, para o mau, o passar desta à outra vida, a entrada na vida futura. (O Céu e o Inferno, 2ª Parte, cap. 1.)
 
X. O corpo conserva bem impressos os vestígios dos cuidados de que foi objeto e dos acidentes que sofreu. Dá-se o mesmo com a alma. Quando despida do corpo, ela guarda, evidentes, os traços do seu caráter, de suas afeições e as marcas que lhe deixaram todos os atos de sua visa. Assim, a maior desgraça que pode acontecer ao homem é ir para o outro mundo com a alma carregado de crimes. Vês, Cálicles, que nem tu, nem Pólux, nem Górgias podereis provar que devamos levar outra vida que nos seja útil quando estejamos do outro lado. De tantas opiniões diversas, a única que permanece inabalável é a de que mais vale receber do que cometer uma injustiça e que, acima de tudo, devemos cuidar, não de parecer, mas de ser homem de bem. (Colóquios de Sócrates com seus discípulos, na prisão.)
 
Depara-se-nos aqui outro ponto capital, confirmado hoje pela experiência: o de que a alma não depurada conserva as idéias, as tendências, o caráter e as paixões que teve na Terra. Não é inteiramente cristã esta máxima: mais vale receber do que cometer uma injustiça? O mesmo pensamento exprimiu Jesus, usando desta figura: "Se alguém vos bater numa face, apresentai-lhe a outra." (Cap. XII, nº 7 e nº 8.) 

XI. De duas uma: ou a morte é uma destruição absoluta, ou é passagem da alma para outro lugar. Se tudo tem de extinguir-se, a morte será como uma dessas raras noites que passamos sem sonho e sem nenhuma consciência de nós mesmos. Todavia, se a morte é apenas uma mudança de morada, a passagem para o lugar onde os mortos se têm de reunir, que felicidade a de encontrarmos lá aqueles a quem conhecemos! O meu maior prazer seria examinar de perto os habitantes dessa outra morada e distinguir lá, como aqui, os que são dignos dos que se julgam tais e não o são. Mas, é tempo de nos separarmos, eu para morrer, vós para viverdes. (Sócrates aos seus juizes.)
 
Segundo Sócrates, os que viveram na Terra se encontram após a morte e se reconhecem. Mostra o Espiritismo que continuam as relações que entre eles se estabeleceram, de tal maneira que a morte não é nem uma interrupção, nem a cessação da vida, mas uma transformação, sem solução de continuidade. 

Houvessem Sócrates e Platão conhecido os ensinos que o Cristo difundiu quinhentos anos mais tarde e os que agora o Espiritismo espalha, e não teriam falado de outro modo. Não há nisso, entretanto, o que surpreenda, se considerarmos que as grandes verdades são eternas e que os Espíritos adiantados hão de tê-las conhecido antes de virem a Terra, para onde as trouxeram; que Sócrates, Platão e os grandes filósofos daqueles tempos bem podem, depois, ter sido dos que secundaram o Cristo na sua missão divina, escolhidos para esse fim precisamente por se acharem, mais do que outros, em condições de lhe compreenderem as sublimes lições; que, finalmente, pode dar-se façam eles agora parte da plêiade dos Espíritos encarregados de ensinar aos homens as mesmas verdades. 

XII. Nunca se deve retribuir com outra uma injustiça, nem fazer mal a ninguém, seja qual for o dano que nos hajam causado. Poucos, no entanto, serão os que admitam esse principio, e os que se desentenderem a tal respeito nada mais farão, sem dúvida. do que se votarem uns aos outros mútuo desprezo.
 
Não está aí o princípio de caridade, que prescreve não se retribua o mal com o mal e se perdoe aos inimigos? 

XII. É pelos frutos que se conhece a árvore. Toda ação deve ser qualificada pelo que produz: qualificá-la de má, quando dela provenha mal; de boa, quando dê origem ao bem.
 
Esta máxima: "Pelos frutos é que se conhece a árvore", se encontra muitas vezes repetida textualmente no Evangelho. 

XIV. A riqueza é um grande perigo. Todo homem que ama a riqueza não ama a si mesmo, nem ao que é seu; ama a uma coisa que lhe é ainda mais estranha do que o que lhe pertence. (Capítulo XVI.)
 
XV. As mais belas preces e os mais belos sacrifícios prazem menos à Divindade do que uma alma virtuosa que faz esforços por se lhe assemelhar. Grave coisa fora que os deuses dispensassem mais atenção às nossas oferendas, do que a nossa alma; se tal se desse, poderiam os mais culpados conseguir que eles se lhes tornassem propícios. Mas, não: verdadeiramente justos e retos só o são os que, por suas palavras e atos, cumprem seus deveres para com os deuses e para com os homens. (Cap. X, nº 7 e nº e 8.)
 
XVI. Chamo homem vicioso a esse amante vulgar, que mais ama o corpo do que a alma. O amor está por toda parte em a Natureza, que nos convida ao exercício da nossa inteligência; até no movimento dos astros o encontramos. É o amor que orna a Natureza de seus ricos tapetes; ele se enfeita e fixa morada onde se lhe deparem flores e perfumes. É ainda o amor que dá paz aos homens, calma ao mar, silêncio aos ventos e sono a dor.
 
O amor, que há de unir os homens por um laço fraternal, é uma conseqüência dessa teoria de Platão sobre o amor universal, como lei da Natureza. Tendo dito Sócrates que "o amor não é nem um deus, nem um mortal, mas um grande demônio", isto é, um grande Espírito que preside ao amor universal, essa proposição lhe foi imputada como crime. 

XVII. A virtude não pode ser ensinada; vem por dom de Deus aos que a possuem.
 
É quase a doutrina cristã sobre a graça; mas, se a virtude é um dom de Deus, é um favor e, então, pode perguntar-se por que não é concedida a todos. Por outro lado, se é um dom, carece de mérito para aquele que a possui. O Espiritismo é mais explícito, dizendo que aquele que possui a virtude a adquiriu por seus esforços, em existências sucessivas, despojando-se pouco a pouco de suas imperfeições. A graça é a força que Deus faculta ao homem de boa vontade para se expungir do mal e praticar o bem. 

XVIII. É disposição natural em todos nós a de nos apercebermos muito menos dos nossos defeitos, do que dos de outrem.
 
Diz o Evangelho: "Vedes a palha que está no olho do vosso próximo e não vedes a trave que está no vosso." (Cap. X, nº 9 e nº 10.) 

XIX. Se os médicos são malsucedidos, tratando da maior parte das moléstias, é que tratam do corpo, sem tratarem da alma. Ora, não se achando o todo em bom estado, impossível é que uma parte dele passe bem.
 
O Espiritismo fornece a chave das relações existentes entre a alma e o corpo e prova que um reage incessantemente sobre o outro. Abre, assim, nova senda para a Ciência. Com o lhe mostrar a verdadeira causa de certas afecções, faculta-lhe os meios de as combater. Quando a Ciência levar em conta a ação do elemento espiritual na economia, menos freqüentes serão os seus maus êxitos. 

XX. Todos os homens, a partir da infância, muito mais fazem de mal, do que de bem.
Essa sentença de Sócrates fere a grave questão da predominância do mal na Terra, questão insolúvel sem o conhecimento da pluralidade dos mundos e da destinação do planeta terreno, habitado apenas por uma fração mínima da Humanidade. Somente o Espiritismo resolve essa questão, que se encontra explanada aqui adiante, nos capítulos II, III e V. 

XXI. Ajuizado serás, não supondo que sabes o que ignoras.
 
Isso vai com vistas aos que criticam aquilo de que desconhecem até mesmo os primeiros termos. Platão completa esse pensamento de Sócrates, dizendo: "Tentemos, primeiro, torná-los, se for possível, mais honestos nas palavras; se não o forem, não nos preocupemos com eles e não procuremos senão a verdade. Cuidemos de instruir-nos, mas não nos injuriemos." E assim que devem proceder os espíritas com relação aos seus contraditores de boa ou má-fé. Revivesse hoje Platão e acharia as coisas quase como no seu tempo e poderia usar da mesma linguagem. Também Sócrates toparia criaturas que zombariam da sua crença nos Espíritos e que o qualificariam de louco, assim como ao seu discípulo Platão.
Foi por haver professado esses princípios que Sócrates se viu ridiculizado, depois acusado de impiedade e condenado a beber cicuta. Tão certo é que, levantando contra si os interesses e os preconceitos que elas ferem, as grandes verdades novas não se podem firmar sem luta e sem fazer mártires.

Fonte: KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo

O CÉU E O INFERNO - Causas do Temor da Morte

18:22 Posted by Fabiano Vidal , , , ,
1 - O homem, seja qual for a escala de sua posição social, desde selvagem tem o sentimento inato do futuro; diz-lhe a intuição que a morte não é a última fase da existência e que aqueles cuja perda lamentamos não estão irremissivelmente perdidos. A crença da imortalidade é intuitiva e muito mais generalizada do que a do nada.

Entretanto, a maior parte dos que nele crêem apresentam-se-nos possuídos de grande amor às coisas terrenas e temerosos da morte! Por quê?

2. - Este temor é um efeito da sabedoria da Providência e uma conseqüência do instinto de conservação comum a todos os viventes. Ele é necessário enquanto não se está suficientemente esclarecido sobre as condições da vida futura, como contrapeso à tendência que, sem esse freio, nos levaria a deixar prematuramente a vida e a negligenciar o trabalho terreno que deve servir ao nosso próprio adiantamento.

Assim é que, nos povos primitivos, o futuro é uma vaga intuição, mais tarde tornada simples esperança e, finalmente, uma certeza apenas atenuada por secreto apego à vida corporal.

3 . - A proporção que o homem compreende melhor a vida futura, o temor da morte diminui; uma vez esclarecida a sua missão terrena, aguarda-lhe o fim calma, resignada e serenamente. A certeza da vida futura dá-lhe outro curso às idéias, outro fito ao trabalho; antes dela nada que se não prenda ao presente; depois dela tudo pelo futuro sem desprezo do presente, porque sabe que aquele depende da boa ou da má direção deste.

A certeza de reencontrar seus amigos depois da morte, de reatar as relações que tivera na Terra, de não perder um só fruto do seu trabalho, de engrandecer-se incessantemente em inteligência, perfeição, dá-lhe paciência para esperar e coragem para suportar as fadigas transitórias da vida terrestre. A solidariedade entre vivos e mortos faz-lhe compreender a que deve existir na Terra, onde a fraternidade e a caridade têm desde então um fim e uma razão de ser, no presente como no futuro.

4. - Para libertar-se do temor da morte é mister poder encará-la sob o seu verdadeiro ponto de vista, isto é, ter penetrado pelo pensamento no mundo espiritual, fazendo dele uma idéia tão exata quanto possível, o que denota da parte do Espírito encarnado um tal ou qual desenvolvimento e aptidão para desprender-se da matéria.

No Espírito atrasado a vida material prevalece sobre a espiritual. Apegando-se às aparências, o homem não distingue a vida além do corpo, esteja embora na alma a vida real; aniquilado aquele, tudo se lhe afigura perdido, desesperador.

Se, ao contrário, concentrarmos o pensamento, não no corpo, mas na alma, fonte da vida, ser real a tudo sobrevivente, lastimaremos menos a perda do corpo, antes fonte de misérias e dores. Para isso, porém, necessita o Espírito de uma força só adquirível na madureza.

O temor da morte decorre, portanto, da noção insuficiente da vida futura, embora denote também a necessidade de viver e o receio da destruição total; igualmente o estimula secreto anseio pela sobrevivência da alma, velado ainda pela incerteza.

Esse temor decresce, à proporção que a certeza aumenta, e desaparece quando esta é completa.

Eis aí o lado providencial da questão. Ao homem não suficientemente esclarecido, cuja razão mal pudesse suportar a perspectiva muito positiva e sedutora de um futuro melhor, prudente seria não o deslumbrar com tal idéia, desde que por ela pudesse negligenciar o presente, necessário ao seu adiantamento material e intelectual.

5. - Este estado de coisas é entretido e prolongado por causas puramente humanas, que o progresso fará desaparecer. A primeira é a feição com que se insinua a vida futura, feição que poderia contentar as inteligências pouco desenvolvidas, mas que não conseguiria satisfazer a razão esclarecida dos pensadores refletidos. Assim, dizem estes: "Desde que nos apresentam como verdades absolutas princípios contestados pela lógica e pelos dados positivos da Ciência, é que eles não são verdades." Daí, a incredulidade de uns e a crença dúbia de um grande número.

A vida futura é-lhes uma idéia vaga, antes uma probabilidade do que certeza absoluta; acreditam, desejariam que assim fosse, mas apesar disso exclamam: "Se todavia assim não for! O presente é positivo, ocupemo-nos dele primeiro, que o futuro por sua vez virá"

E depois, acrescentam, definitivamente que é a alma? Um ponto, um átomo, uma faísca, uma chama? Como se sente, vê ou percebe? E que a alma não lhes parece uma realidade efetiva, mas uma abstração.

Os entes que lhes são caros, reduzidos ao estado de átomos no seu modo de pensar, estão perdidos, e não têm mais a seus olhos as qualidades pelas quais se lhes fizeram amados; não podem compreender o amor de uma faísca nem o que a ela possamos ter. Quanto a si mesmos, ficam mediocremente satisfeitos com a perspectiva de se transformarem em mônadas. Justifica-se assim a preferência ao positivismo da vida terrestre, que algo possui de mais substancial.

É considerável o número dos dominados por este pensamento.

6. - Outra causa de apego às coisas terrenas, mesmo nos que mais firmemente crêem na vida futura, é a impressão do ensino que relativamente a ela se lhes há dado desde a infância. Convenhamos que o quadro pela religião esboçado, sobre o assunto, é nada sedutor e ainda menos consolatório.

De um lado, contorções de condenados a expiarem em torturas e chamas eternas os erros de uma vida efêmera e passageira. Os séculos sucedem-se aos séculos e não há para tais desgraçados sequer o lenitivo de uma esperança e, o que mais atroz é, não lhes aproveita o arrependimento. De outro lado, as almas combalidas e aflitas do purgatório aguardam a intercessão dos vivos que orarão ou farão orar por elas, sem nada fazerem de esforço próprio para progredirem.

Estas duas categorias compõem a maioria imensa da população de além-túmulo. Acima delas, paira a limitada classe dos eleitos, gozando, por toda a eternidade, da beatitude contemplativa. Esta inutilidade eterna, preferível sem dúvida ao nada, não deixa de ser de uma fastidiosa monotonia. É por isso que se vê, nas figuras que retratam os bem-aventurados, figuras angélicas onde mais transparece o tédio que a verdadeira felicidade.

Este estado não satisfaz nem as aspirações nem a instintiva idéia de progresso, única que se afigura compatível com a felicidade absoluta. Custa crer que, só por haver recebido o batismo, o selvagem ignorante - de senso moral obtuso -, esteja ao mesmo nível do homem que atingiu, após longos anos de trabalho, o mais alto grau de ciência e moralidade práticas. Menos concebível ainda é que a criança falecida em tenra idade, antes de ter consciência de seus atos, goze dos mesmos privilégios somente por força de uma cerimônia na qual a sua vontade não teve parte alguma. Estes raciocínios não deixam de preocupar os mais fervorosos crentes, por pouco que meditem.

7. - Não dependendo a felicidade futura do trabalho progressivo na Terra, a facilidade com que se acredita adquirir essa felicidade, por meio de algumas práticas exteriores, e a possibilidade até de a comprar a dinheiro, sem regeneração de caráter e costumes, dão aos gozos do mundo o melhor valor.

Mais de um crente considera, em seu foro íntimo, que assegurado o seu futuro pelo preenchimento de certas fórmulas ou por dádivas póstumas, que de nada o privam, seria supérfluo impor-se sacrifícios ou quaisquer incômodos por outrem, uma vez que se consegue a salvação trabalhando cada qual por si.

Seguramente, nem todos pensam assim, havendo mesmo muitas e honrosas exceções; mas não se poderia contestar que assim pensa o maior número, sobretudo das massas pouco esclarecidas, e que a idéia que fazem das condições de felicidade no outro mundo não entretenha o apego aos bens deste, acoroçoando o egoísmo.

8. - Acrescentemos ainda a circunstância de tudo nas usanças concorrer para lamentar a perda da vida terrestre e temer a passagem da Terra ao céu. A morte é rodeada de cerimônias lúgubres, mais próprias a infundirem terror do que a provocarem a esperança. Se descrevem a morte, é sempre com aspecto repelente e nunca como sono de transição; todos os seus emblemas lembram a destruição do corpo, mostrando-o hediondo e descarnado; nenhum simboliza a alma desembaraçando-se radiosa dos grilhões terrestres. A partida para esse mundo mais feliz só se faz acompanhar do lamento dos sobreviventes, como se imensa desgraça atingira os que partem; dizem-lhes eternos adeuses como se jamais devessem revê-los. Lastima-se por eles a perda dos gozos mundanos, como se não fossem encontrar maiores gozos no além-túmulo. Que desgraça, dizem, morrer tão jovem, rico e feliz, tendo a perspectiva de um futuro brilhante! A idéia de um futuro melhor apenas toca de leve o pensamento, porque não tem nele raízes. Tudo concorre, assim, para inspirar o terror da morte, em vez de infundir esperança.

Sem dúvida que muito tempo será preciso para o homem se desfazer desses preconceitos, o que não quer dizer que isto não suceda, à medida que a sua fé se for firmando, a ponto de conceber uma idéia mais sensata da vida espiritual.

9. - Demais, a crença vulgar coloca as almas em regiões apenas acessíveis ao pensamento, onde se tornam de alguma sorte estranhas aos vivos; a própria Igreja põe entre umas e outras uma barreira insuperável, declarando rotas todas as relações e impossível qualquer comunicação. Se as almas estão no inferno, perdida é toda a esperança de as rever, a menos que lá se vá ter também; se estão entre os eleitos, vivem completamente absortas em contemplativa beatitude. Tudo isso interpõe entre mortos e vivos uma distância tal que faz supor eterna a separação, e é por isso que muitos preferem ter junto de si, embora sofrendo, os entes caros, antes que vê-los partir, ainda mesmo que para o céu.

E a alma que estiver no céu será realmente feliz vendo, por exemplo, arder eternamente seu filho, seu pai, sua mãe ou seus amigos?

Por que os espíritas não temem a morte

10. - A Doutrina Espírita transforma completamente a perspectiva do futuro. A vida futura deixa de ser uma hipótese para ser realidade. O estado das almas depois da morte não é mais um sistema, porém o resultado da observação. Ergueu-se o véu; o mundo espiritual aparece-nos na plenitude de sua realidade prática; não foram os homens que o descobriram pelo esforço de uma concepção engenhosa, são os próprios habitantes desse mundo que nos vêm descrever a sua situação; aí os vemos em todos os graus da escala espiritual, em todas as rases da felicidade e da desgraça, assistindo, enfim, a todas as peripécias da vida de além-túmulo. Eis aí por que os espíritas encaram a morte calmamente e se revestem de serenidade nos seus últimos momentos sobre a Terra. Já não é só a esperança, mas a certeza que os conforta; sabem que a vida futura é a continuação da vida terrena em melhores condições e aguardam-na com a mesma confiança com que aguardariam o despontar do Sol após uma noite de tempestade. Os motivos dessa confiança decorrem, outrossim, dos fatos testemunhados e da concordância desses fatos com a lógica, com a justiça e bondade de Deus, correspondendo às íntimas aspirações da Humanidade.

Para os espíritas, a alma não é uma abstração; ela tem um corpo etéreo que a define ao pensamento, o que muito é para fixar as idéias sobre a sua individualidade, aptidões e percepções. A lembrança dos que nos são caros repousa sobre alguma coisa de real. Não se nos apresentam mais como chamas fugitivas que nada falam ao pensamento, porém sob uma forma concreta que antes no-los mostra como seres viventes. Além disso, em vez de perdidos nas profundezas do Espaço, estão ao redor de nós; o mundo corporal e o mundo espiritual identificam-se em perpétuas relações, assistindo-se mutuamente.

Não mais permissível sendo a dúvida sobre o futuro, desaparece o temor da morte; encara-se a sua aproximação a sangue-frio, como quem aguarda a libertação pela porta da vida e não do nada.

Fonte: KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno.