terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A Dificuldade de Aceitar o Novo

Por Jaci Régis

A ciência conseguiu, neste século 20, proezas antes não sonhadas. Em qualquer aspecto da vida e do conhecimento, as proposições, investigações e pesquisas científicas revisaram os conceitos consagrados nos séculos passados.

Apesar desse avanço científico, queimando etapas e ganhando terreno em tempo cada vez menor, a repercussão social parece longe de abalar os velhos conceitos espiritualistas.

Para a grande maioria das pessoas, as descobertas científicas só têm sentido imediato quando produzem remédios e desenvolvem tecnologias para curar doenças, resolver problemas físicos e mentais.

Por isso, permanece o espiritualismo difuso de nossos dias. Principalmente no âmbito das religiões e crenças, sejam do mundo ocidental como do oriental.

A fé da massa não é abalada por essas descobertas, a não ser a longo prazo, pois a pressão dos fatos modela a cultura, levada a aceitá-los e mudar.

E ainda que a crença em Deus seja obscura e baseada em temor, para a maioria deixar de crer num deus, seja o Alá do Islã ou Jeová dos cristãos e judeus, precipita a pessoa num vazio e num vácuo de insegurança.

No cenário confuso da atualidade, coexistem, paralelamente, com os avanços jamais sonhados da ciência, ledores de mãos, jogadores de búzios, adivinhadores, salvadores carismáticos. As igrejas continuam com seus rituais, pessoas participam de sessões de macumba, vudu, umbanda, quimbanda e outras formas sinergéticas e animastes de crenças, ao lado de aparelhos de ressonância magnética, viagens interplanetárias, teorias sobre o início do Universo e na era da cibernética, da comunicação por satélites, enfim, como diria o humorista, um verdadeiro ”samba do crioulo doido”.

É Preciso Atualizar a Doutrina

Diante dessa realidade insofismável, como o Espiritismo se posiciona? Sua mensagem, sua postura, sua forma de atuar está compatível com as novas perspectivas não apenas científicas, mas humanas do mundo atual ?

Falamos de uma quantidade de exigências morais, de valores que foram deixados de lado, principalmente após a 2ª Guerra Mundial. Seriam esses valores apenas repressores? Todas as doutrina religiosas teriam falhado ?

É preciso atualizar o Espiritismo?

Essa pergunta, óbvia para quem segue o pensamento de Allan Kardec, é rechaçada pelo sistema doutrinário. Por que essa proposta de Kardec permanece no limbo das proibições? Será que o projeto de um Espiritismo dinâmico capaz de evitar o imobilismo, sujeito ao progresso era um sonho irrealizável, uma proposta sem sentido?

Ao dizer que foi Jesus Cristo quem elaborou a Doutrina, com o pseudônimo de Espírito da Verdade, reduzindo o papel de Kardec a um escrevente inteligente, imobilizou-se o pensamento doutrinário, porque, então, como afirmou o Conselho Federativo Nacional, ninguém pode atualizar o que veio do “alto”.

Engessou-se o Espiritismo ficando semelhante aos evangélicos que se fixaram nas letras sagradas da Bíblia e do Novo Testamento e dali não arredam o pé. O que está escrito não pode ser mudado, porque os livros bíblicos foram inspirados por Deus e quem pode desdizer Deus? E a Igreja Católica, que, apesar de encíclicas e perdões históricos, mantém sua doutrina com persistência, para justificar o seu alegado legado de representante de Deus na Terra.

A recusa em aceitar que a Doutrina Espírita é capaz de modificar certos conceitos sem perder sua base, mostra como foi descaracterizada, desviada do sentido que lhe deu seu fundador.

A partir do momento que o Espiritismo foi institucionalizado, começou sua descaracterização, transformado numa seita ligada ao modelo judaico cristão do pecado e do castigo.

A descaracterização básica do Espiritismo iniciou-se bem no começo, pela introdução do roustainguismo. Este está muito mais enraizado do que se supõe, pois até os mais ferrenhos anti-roustanguista, mesmo que não o admitam, foram influenciados pelo apelo cristolatra, base do pensamento de Roustaing, referendado pelo Espírito Emmanuel, um adorador de Jesus Cristo.

Calcado nessa cristolatria, que Allan Kardec jamais admitiu, os egressos do catolicismo encontraram um movimento espírita, de modo geral, tão parecido, em termos, com as características das igrejas, que não precisaram de muito esforço para adaptar-se.

Isso pode ser constatada na prática. Presidentes de Mocidades e Centros Espíritas casam-se no ritual católico, fazem missa de sétimo dia, alguns chegam a batizar seus filhos na Igreja. Não se trata de sectarismo, mas de definição. E centenas de freqüentadores assíduos, participantes e médiuns, na hora “h “correm para os braços da Madre Igreja, de onde, estruturalmente, nunca saíram.

O Espiritismo para eles é uma grande capa que os agasalha, mas jamais o aceitaram como uma mudança revolucionária na visão de homem e de mundo.

A idéia de atualizar irrita e amedronta os que estão mergulhados nessa visão cristã do Espiritismo.

Artigo de Julho de 2000

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