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terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Kardec analisa Swedenborg


Por Maria das Graças Cabral

Na Revista Espírita do mês de novembro de 1859, Allan Kardec publica um artigo altamente esclarecedor sobre a veracidade ou não de certas doutrinas e revelações feitas por Espíritos. Na realidade, o Mestre nos dá uma aula sobre tal problemática, analisando as experiências mediúnicas de Swedenborg, e suas constatações pós mortem.

Inicialmente, o Codificador faz um breve resumo biográfico de Swedenborg, e comenta que o mesmo “é um desses personagens mais conhecidos de nome que de fato, ao menos para o vulgo.” Segundo Kardec, “suas obras muito volumosas e, em geral, muito abstratas, quase que só são lidas pelos eruditos.” Daí, para uns, “ele é considerado um grande homem, para outros, não passa de um charlatão, de um visionário, de um taumaturgo.”

Assevera o Codificador, que na realidade a doutrina defendida por Swedenborg deixa muito a desejar. E que o próprio Swedenborg, na condição de Espírito, está longe de aprová-La em todos os pontos! No entanto, segundo as palavras de Kardec, “por mais refutável que seja, nem por isso deixará de ser um dos homens mais eminentes do seu século.”

Afinal, quem foi Swedenborg? - Emmanuel Swedenborg, nasceu em 1688, em Estocolmo, e faleceu em Londres, em 1722, aos 84 anos de idade. Destacou-se em todas as ciências, especialmente na Teologia, na Mecânica, na Física e na Metalurgia. Em 1716, Carlos XII o nomeou seu assessor na Escola de Metalurgia de Estocolmo. A rainha Ulrica o fez nobre, e ele ocupou os pontos de maior relevo, com distinção, até 1743, época em que teve a sua primeira revelação espírita. Tinha então, 55 anos. Pediu demissão e não quis mais se ocupar senão de seu apostolado e do estabelecimento da doutrina Nova Jerusalém.

Allan Kardec observa que “mesmo rendendo justiça ao mérito pessoal de Swedenborg, como cientista e como homem de bem, não nos podemos constituir defensores de doutrinas que o mais elementar bom-senso condena. À esse respeito, vale pontuar que hodiernamente, tal determinação kardeciana, é totalmente desconsiderada! Qualquer mensagem mediúnica, ou entendimentos pessoais de médiuns e/ou palestrantes famosos ou não, por mais esdrúxulos e contraditórios que sejam, são acatados, publicados e divulgados como preceitos espíritas válidos e procedentes.

Acrescenta o Codificador: - “Ele (Swedenborg) cometeu um equívoco dificilmente perdoável, não obstante sua experiência das coisas do mundo oculto: o de aceitar cegamente tudo quanto lhe era ditado, sem o submeter ao controle severo da razão. Se tivesse pesado maduramente os prós e os contras, teria reconhecido princípios irreconciliáveis com a lógica, por menos rigorosa que fosse. (...) A qualidade que a si mesmo se atribui o Espírito que a ele se manifestou bastaria para o por em guarda, sobretudo se considerarmos a trivialidade de sua apresentação. (...) Seus próprios erros devem ser um ensinamento para os médiuns demasiado crédulos, que certos Espíritos procuram fascinar, lisonjeando-lhes a vaidade ou os preconceitos por uma linguagem pomposa ou de aparências enganosas.(grifei) Observemos o alerta de Kardec para o controle severo da razão!

Prosseguindo em seus esclarecimentos, o Mestre transcreve uma comunicação dada pelo Espírito de Swedenborg, na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, em 23 de setembro de 1859, na qual, o Espírito faz a abertura da sessão, pontuando dentre outras coisas, que sua moral espírita e a sua doutrina, não estariam isentas de grandes erros, os quais atualmente (na condição de Espírito) reconhece. Nega por exemplo, a “eternidade das penas“, como também a existência “do mundo dos anjos”. Assim se expressa o Espírito: “O que eu também dizia do mundo dos anjos, que é o que pregam os templos, não passava de ilusão dos meus sentidos; acreditei vê-lo, agia de boa-fé, mas enganei-me.” (grifei) Vale ressaltar aqui, o cuidado para as tais “cidades espirituais” tão em voga na literatura espiritualista!

Vejamos agora, algumas indagações feitas por Allan Kardec, e as respectivas respostas dadas pelo Espírito de Swedenborg:

- Qual foi o Espírito que vos apareceu, dizendo ser o próprio Deus? Era realmente Deus? Resposta - Não. Acreditei no que me falava porque nele via um ser sobre-humano e fiquei lisonjeado. (grifei)

- Por que ele tomou o nome de Deus?
Resposta - Para ser mais bem obedecido. (grifei) O Espírito utiliza-se do nome de personalidades famosas e respeitadas para que seja facilmente obedecido pelo médium lisonjeado e temeroso.

- Aquele Espírito que vos fez escrever coisas que hoje reconheceis como errôneas. Ele o fez com boa ou com má intenção?
- Não o fez com má intenção; ele próprio se enganou, porque não era suficientemente esclarecido. Agora percebo que as ilusões do meu próprio Espírito e de minha inteligência o influenciavam, mau grado seu. Entretanto, no meio de alguns erros de sistema, fácil é reconhecer grandes verdades. (grifei)

Oportuno observar na fala de Swedenborg, que o Espírito comunicante era de grau evolutivo inferior, e se deixava também influenciar pelas “ilusões” criadas por Swedenborg, “mau grado seu”!

- O princípio de vossa doutrina repousa sobre as correspondências. Continuais acreditando nessas relações que encontráveis entre cada coisa do mundo material, e cada coisa do mundo moral?
Resposta - Não; é uma ficção. (grifei)

- Poderíeis dizer-nos de que maneira recebíeis as comunicações dos Espíritos? Escrevíeis aquilo que vos era revelado à maneira de nossos médiuns, ou por inspiração?
Resposta - Quando me achava em silêncio e em recolhimento, meu Espírito ficava como que maravilhado, extasiado, e eu via claramente uma imagem diante de mim, que me falava e ditava o que deveria escrever; algumas vezes minha imaginação se misturava nisso. (grifei)

Diante de ensinamentos tão importantes, ministrados e exemplificados com tanta propriedade pelo Mestre Allan Kardec, constatamos da necessidade do estudo efetivo e aprofundado das Obras Fundamentais da Codificação, e da Revista Espírita. Só assim poderemos identificar e rechaçar a avalanche de mensagens de Espíritos desencarnados e/ou encarnados, produto de ilusões e mistificações, e que acabam por confundir e desvirtuar os preceitos doutrinários Espíritas, levando multidões de desavisados ao engano e a futuras decepções. 
 
REFERÊNCIA:
KARDEC, Allan. REVISTA ESPÍRITA, Jornal de Estudos Psicológicos. Ano II, novembro de 1859. Ed. FEB., RJ/RJ, 2ª edição, 2004, p. 437/446.

In: Um Olhar Espírita - http://umolharespirita1.blogspot.com/2012/02/kardec-analisa-swedenborg.html

sábado, 30 de julho de 2011

Kardec e os Exilados

Por Sérgio Aleixo

Em A Caminho da Luz, lê-se: “Há muitos milênios, um dos orbes da Capela, que guarda muitas afinidades com o globo terrestre, atingira a culminância de um dos seus extraordinários ciclos evolutivos. As lutas finais de um longo aperfeiçoamento estavam delineadas, como ora acontece convosco, relativamente às transições esperadas no século XX, neste crepúsculo de civilização”.[1]

Mas em termos kardecianos: “Toda teoria em contradição manifesta com o bom-senso, com uma lógica rigorosa, com os dados positivos que possuímos, por mais respeitável que seja o nome que a assine, deve ser rejeitada”.[2]

O bom-senso, a princípio, não afasta o que se lê em A Caminho da Luz. Entretanto, isto não ocorre quanto à “lógica rigorosa”, pois esta, no caso, exige “os dados positivos que possuímos”, isto é, o que diz a ciência sobre Capela, não importando se esse conhecimento é limitado, até porque qualquer conhecimento o é por natureza. A Doutrina Espírita, porém, estará sempre com a ciência naquilo que compete a esta, sob pena de obscurantismo.

Segundo especialistas, Capela não tem planetas, e mesmo que algum fosse encontrado, nenhuma estabilidade apresentaria que possibilite ­(ou mesmo que tenha possibilitado em bilhões de anos passados) o surgimento de vida. Eles têm ainda por certo que só estrelas simples ocasionam probabilidades para o desenvolvimento de formas orgânicas. Capela, porém, é um sistema de nove estrelas (duas principais e mais sete) com tremendas instabilidades de várias ordens.

Assim, em nome do Espiritismo, não se poderia sustentar que há ou que houve vida num planeta que não existe nem nunca existiu no sistema Capela, menos ainda se “guarda muitas afinidades com o globo terrestre”, na culminância de um ciclo evolutivo cujas lutas finais teriam ocorrido como as nossas, em relação às transições que eram “esperadas no século XX”. Eram... Pois o século 20 acabou sem que houvesse mudança alguma na ordem natural das coisas, como asseguraram, desde sempre, Kardec e os espíritos superiores da sua magna Codificação.

Num conto de ficção que nada tem a ver com este assunto do exílio, Flammarion chegou a supor os capelinos como seres dotados de faculdades de percepção elevadas, por não estarem encarnados em corpos grosseiros como os nossos. Mas ouviu do codificador que, embora houvesse concordância de muitos pontos com o Espiritismo, a obra representava apenas uma “hipótese” ilustrativa.[3] Vai longe o tempo em que a doutrina era tratada com tamanha prudência.

Diante do texto de A Caminho da Luz, entretanto, em seu antigo habitat, a vida dos capelinos só podia ser como a vida aqui na Terra: orgânica. De outra forma, o texto não faria o menor sentido; tanto assim, que fala de mundos capelinos que “já se purificaram física e moralmente”,[4] numa clara indicação de que aquele orbe de onde teriam vindo os exilados não se houvera depurado. O texto, aliás, apesar de se referir a uma ação ocorrida “há muitos milênios”, diz que esse mundo “guarda muitas afinidades com o globo terrestre”. Emmanuel, pois, asseverou que o planeta ainda estava lá, no tempo em que lá o quis sediar: 1938. Sem dúvidas, trata-se de ambiente físico, e não de um mundo indetectável.

De qualquer modo, a ideia que Kardec admitiu como Espiritismo — porque “aceita pela maioria dos espíritas como a mais racional e a mais de acordo com a soberana justiça de Deus” e, sobretudo, “confirmada pela generalidade das instruções dadas pelos espíritos sobre esse assunto” —[5] foi a de que houve um exílio, não “há muitos milênios”, e sim, como se aprende no n. 51 de O Livro dos Espíritos, há alguns milênios, “cerca de 4.000 anos antes do Cristo”. Espíritos foram mandados para a Terra a fim de que os habitantes desta, mais atrasados, progredissem com este contato, e para que os exilados expiassem suas faltas, porquanto se haviam rebelado contra a lei de Deus num mundo “feliz”, “mais adiantado e menos material do que o nosso”. É o que se lê, sem apelação, em A Gênese, XI, 36 (ou 38), e XII, 22 (ou 23).

36 (ou 38). Segundo o ensino dos espíritos, foi uma dessas grandes imigrações, ou, se quiserem, uma dessas colônias de espíritos vinda de outra esfera, que deu origem à raça simbolizada na figura de Adão, e, por essa razão mesma, chamada de raça adâmica. Quando ela chegou aqui, a Terra já estava povoada desde tempos imemoriais, assim como a América, quando os europeus chegaram lá. A raça adâmica, mais adiantada do que aquelas que a haviam precedido na Terra, é, com efeito, a mais inteligente, é ela que impele todas as outras ao progresso.

22 (ou 23). Admitamos, ao demais, que [Adão e Eva] tenham vivido em um mundo mais adiantado e menos material do que o nosso, onde o trabalho do espírito substituía o do corpo, e que, por sua rebelião contra a lei de Deus, simbolizada pela desobediência, tenham sido, por punição, afastados de lá e exilados para a Terra, onde o homem, pela natureza do globo, é constrangido a um trabalho corporal, e reconheceremos que Deus tinha razão em lhes dizer: ‘No mundo onde ireis viver daqui por diante, cultivareis a terra e dela tirareis o alimento com o suor da vossa fronte’, e em dizer à mulher: ‘Parirás com dor’, porque esta é a situação desse mundo. O paraíso terrestre, cujos vestígios se têm procurado inutilmente na Terra, era portanto a representação do mundo feliz onde Adão havia vivido, ou melhor dizendo, a raça dos espíritos da qual ele é a personificação. [...]

Não foi, portanto, indicada a localização cósmica do planeta original dos exilados, nem se falou que tinha muitas afinidades com a Terra. Se o movimento espírita considerasse como palavra de ordem os conteúdos e, sobretudo, a criteriologia da obra de Kardec; se fosse capaz de obedecer às determinações do velho mestre pelos méritos que indiscutivelmente possuem, deveria rejeitar a ideia de que os exilados vieram de um orbe da Capela portador de “muitas afinidades” com o nosso mundo, num momento em que suas lutas eram como as nossas, no séc. 20 (bem materiais então!), porque a ciência, em assunto que é da sua estrita competência, nunca ofereceu subsídios para essa indicação. Só um eventual futuro respaldo da astrobiologia pode ocasionar mudança de postura espírita quanto a este assunto. Até lá, deve prevalecer para os adeptos sinceros e devotados a dita de Erasto:

Na dúvida, abstém-te, diz um dos vossos antigos provérbios. Não admitais, pois, o que não for para vós de evidência inegável. Ao aparecer uma nova opinião, por menos que vos pareça duvidosa, passai-a pelo crivo da razão e da lógica. O que a razão e o bom-senso reprovam, rejeitai corajosamente. Mais vale rejeitar dez verdades do que admitir uma única mentira, uma única teoria falsa. Com efeito, sobre essa teoria poderíeis edificar todo um sistema que desmoronaria ao primeiro sopro da verdade, como um monumento construído sobre a areia movediça.[6]

Edgar Armond e similares, imbuídos das melhores intenções, mas driblando Kardec para estabelecer seus sistemas pessoais, apenas fizeram exatamente isto: edificaram sobre a areia movediça de A Caminho da Luz, em cujo “Antelóquio” se lê, com surpresa, que “não deverá ser um trabalho histórico”, o que contraria seu subtítulo: “História da Civilização à Luz do Espiritismo”. E o que dizer daqueles prognósticos ao final do capítulo XXV? Caducaram por completo. O século 21 aí está, com “as forças do mal” em “posições de domínio” e as “ovelhas” ainda bem misturadas. Mas o suposto livro complementar de A Gênese assim profetizou:

São chegados os tempos em que as forças do mal serão compelidas a abandonar as suas derradeiras posições de domínio nos ambientes terrestres [...]. Vive-se agora [1938], na Terra, um crepúsculo, ao qual sucederá profunda noite; e ao século XX compete a missão do desfecho desses acontecimentos espantosos. [...] O século que passa efetuará a divisão das ovelhas do imenso rebanho.

Como A Caminho da Luz poderia ser um livro complementar à Gênese de Kardec se lhe descumpre esta orientação fundamental:

[...] os espíritos realmente sábios nunca predizem nada com épocas determinadas; eles se limitam a nos prevenir sobre a sequência dos fatos que nos seja útil conhecer. Insistir em obter detalhes precisos é expor-se às mistificações dos espíritos levianos, que predizem tudo o que se quer, sem se importarem com a verdade, e se divertem com os terrores e as decepções que causam. [...] Pode-se ter por certo que, quanto mais circunstanciadas [as predições], mais elas são suspeitas.[7]

Quanto àquela pretensa confirmação de vida em Capela desde a Revista Espírita, os textos devem ser lidos mais atentamente, sem precipitações apaixonadas. Como disse acima, logo no primeiro artigo, Kardec é bem claro: “O autor imagina um diálogo entre um indivíduo vivo chamado Sitiens”. E aduz então: “A teoria que ele dá da visão da alma é notável”. [8] Mais adiante, assevera o mestre: “[...] não podendo essa experiência ser feita diretamente pelos homens, o autor supõe um espírito que dá conta de suas sensações, e colocado em condições de poder estabelecer uma comparação entre a Terra e o mundo que habita [um dos planetas de Capela]”. Ainda que Kardec haja reconhecido ao texto de Flammarion “uma importância capital”, no segundo artigo, reafirmou:

[...] não se deve perder de vista que esta história não passa de uma hipótese, destinada a tornar mais acessíveis à inteligência e, de certo modo palpáveis pela entrada em ação, da demonstração de uma teoria científica, como fizemos observar em nosso artigo precedente.[9]

Em nenhum momento ficou estabelecido que o conto literário de Flammarion era portador de um princípio espírita no que respeita ao sistema Capela. Kardec apenas viu méritos na maneira pela qual a separação entre alma e corpo e as faculdades daquela foram tratadas no relato ficcional de seu famoso “amigo” astrônomo. Em mais dois anos, esse “amigo” acusaria o velho mestre, em pleno funeral deste, de haver suscitado rivalidades e de haver feito escola de forma um pouco pessoal, como se houvesse nisto alguma falha;[10] além de já ter presenteado Kardec com o “favor” de psicografar um “Galileu” que ignorava a existência dos satélites de Marte. É verdade que Fobos e Deimos foram descobertos apenas depois dessas psicografias, em 1877. Não surpreende que os espíritos deixem de revelar o que só aos homens compete descobrir, mas quando prestam informações falsas, o caso é outro.[11]

Na ficção do astrônomo, ao demais, o espírito Lumen diz que os capelinos não seriam encarnados num invólucro grosseiro, o que os dotaria de “faculdades de percepção elevadas num eminente grau de poder”.[12] Caso se tratasse de elevar à condição de princípio doutrinário do Espiritismo a localização desses seres em Capela (e Kardec não o fez!), ainda assim tal ideia estaria em conflito com a informação emmanuelina de que viviam num orbe que guarda muitas afinidades com o nosso globo, em meio às lutas finais de um longo aperfeiçoamento, como nos acontecia no séc. 20.

Por fim, diga-se em alto e bom som que, na negação de que os exilados teriam vindo de Capela, nenhum princípio sequer do Espiritismo está em litígio, e sim uma tradição espiritual improvável de que há ou de que houve vida orgânica num suposto mundo desse sistema estelar sem planetas. Emmanuel, aliás, já fizera declarações temerárias não só de caráter intergaláctico, mas acerca mesmo do nosso sistema planetário:

Assim como Marte ou Saturno já atingiram um estado mais avançado em conhecimentos, melhorando as condições de suas coletividades, o vosso orbe tem, igualmente, o dever de melhorar-se, avançando, pelo aperfeiçoamento das suas leis, para um estágio superior, no quadro universal.[13]

Coletividades em melhores condições? É... Evoluíram tanto que sumiram da face desses planetas, fisicamente estéreis e desabitados.[14] O movimento espírita precisa entender que a simples opinião, por si só, deste ou daquele espírito, seja qual for, por que médium o for, não constitui Espiritismo quando se desalinha em relação a Kardec. Este e outros assuntos precisam ser tratados em termos kardecianos. É a hora da codificação espírita! Ou nos tornaremos uma trupe de fascinados, presas dos mais lamentáveis obscurantismos.

[1] A Caminho da Luz. III. As raças adâmicas. Um mundo em transições. p. 34.
[2] O Evangelho Segundo o Espiritismo. Introdução, II.
[3] Revista Espírita. Mar/1867. Notícias Bibliográficas. Lumen. E mai/1867, Lumen.
[4] A Caminho da Luz. III. As raças adâmicas. O sistema de Capela, p. 34.
[5] A Gênese, XI, 42, nota 173.
[6] O Livro dos Médiuns, 230.
[7] A Gênese, XVI, 16.
[8] Revista Espírita. Março/1867. Notícias Bibliográficas. Lumen.
[9] Revista Espírita. Maio/1867. Lumen.
[10]Obras Póstumas. Discurso pronunciado sobre o túmulo de Kardec.
[11] Cf. A Gênese, VI, 26: “Alguns planetas como Mercúrio, Vênus e Marte não deram origem a nenhum astro secundário; enquanto que outros, como a Terra, Júpiter, Saturno, etc., formaram um ou mais”.
[12] Revista Espírita. Março/1867. Notícias Bibliográficas. Lumen.
[13] Emmanuel. A Tarefa dos Guias Espirituais.
[14] Veja-se neste meu trabalho o texto Kardec Versus Emmanuel em 12 Passos. http://ensaiosdahoraextrema.blogspot.com/2011_06_12_archive.html.

Fonte: http://ensaiosdahoraextrema.blogspot.com/2010_03_29_archive.html

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Discernimento e Bom Senso

Por Orson Peter Carrara

Recomendação é para uso permanente, sem medo.

Eis vocábulos que nunca podem faltar na prática espírita. Uma pessoa sem discernimento é alguém que age impensadamente, sem reflexão; discernimento é exatamente uma apreciação prévia de fatos e situações, prudência no agir, refletindo antecipadamente. Bom senso é a faculdade de discernir, de julgar, de raciocinar.

Como espíritas somos sempre convidados a refletir sobre o que lemos, o que fazemos, como fazemos. O critério de discernimento e bom senso deve estar apoiado na lógica, mas especialmente ligado ao bem geral. Isto exige atenção, amadurecimento, conhecimento.

Allan Kardec, O Codificador da Doutrina Espírita, é reconhecido pelos espíritas como o "bom senso encarnado", tamanha sua capacidade de refletida análise - que bem demonstrou em seus escritos - diante dos fenômenos que teve oportunidade de presenciar e estudar. A própria aceitação pessoal da realidade das manifestações esteve sujeita a esta característica de sua personalidade, acostumada à análise ponderada e cuidadosa de fatos, situações e novidades que a vida lhe apresentava. É interessante ponderar sobre este aspecto da personalidade do então professor Rivail, pois o detalhe foi de máxima importância na organização do corpo doutrinário do Espiritismo, já que ele tudo submetia à análise prévia da razão, da lógica e do bom senso.

Encarando os fenômenos apresentados pelas manifestações dos espíritos, Allan Kardec estudou-os e os submeteu a rigoroso método científico de observação, optando pela publicação daquilo que ficou conhecido como a "universalidade dos ensinos", quer dizer: os ensinos foram os mesmos, ainda que recebidos por médiuns desconhecidos entre si, de diversos pontos do planeta, e primavam pela concordância entre si. Fato notável esse, pois essa concordância é que dá garantia dos ensinos.

Dessas reflexões, destacamos trecho importante colhido na Revista Espírita (1): "(...) Sabemos que os Espíritos estão longe de possuir a soberana ciência e que se podem enganar; que, por vezes, emitem idéias próprias, justas ou falsas; que os Espíritos superiores querem que o nosso julgamento se exercite em discernir o verdadeiro do falso, aquilo que é racional daquilo que é ilógico. É por isso que nada aceitamos de olhos fechados. Assim, não haveria ensino proveitoso sem discussão. Mas, como discutir comunicações com médiuns que não suportam a menor controvérsia, que se melindram com uma observação crítica, com uma simples observação, e acham mau que não se aplaudam as coisas que recebem, mesmo aquelas lançadas de grosseiras heresias científicas? Essa pretensão estaria deslocada se o que escrevem fosse produto de sua inteligência; é ridícula desde que eles não são mais que instrumentos passivos, pois se assemelham a um ator que ficaria ofuscado, se nós achássemos maus os versos que tem de declamar. Seu próprio Espírito não se pode chocar com uma crítica que não o atinge; então é o próprio comunicante que se magoa e transmite ao médium a sua impressão. Por isto o Espírito trai a sua influência, porque quer impor as suas idéias pela fé cega e não pelo raciocínio ou, o que dá no mesmo, porque só ele quer raciocinar. Disso resulta que o médium que se acha com tais disposições está sob o império de um Espírito que merece pouca confiança, desde que mostra mais orgulho que saber. Assim, sabemos que os Espíritos dessa categoria geralmente afastam seus médiuns dos centros onde não são aceitos sem reservas.

Esse capricho, em médiuns assim atingidos, é um grande obstáculo ao estudo. Se só buscássemos o efeito, isto seria sem importância; mas como buscamos a instrução, não podemos deixar de discutir, mesmo com o risco de desagradar aos médiuns. (...) Aos seus olhos, os obsedados são aqueles que não se inclinam diante de suas comunicações. Alguns levam a sua susceptibilidade a ponto de se formalizarem com a prioridade dada à leitura das comunicações recebidas por outros médiuns. Por que uma comunicação é preferida à sua? Compreende-se o mal-estar imposto por tal situação. Felizmente, no interesse da ciência espírita, nem todos são assim (...)" (2).

Observem os leitores que a simples citação, no início do texto, indicando que os espíritos não sabem tudo, que podem se enganar e emitir idéias próprias, já por si só convida ao bom senso de analisar criteriosamente tudo que venha dos espíritos. Este simples cuidado é capaz de afastar toda investida de misticismo que possa haver por iniciativa dos espíritos ou mesmo no comportamento que venha dos encarnados, de vez que sabendo, por antecedência, que os espíritos estão ainda em patamares de evolução e limitados em seu saber e moralidade, teremos o cuidado de avaliar e refletir, usando o discernimento e o bom senso nestas avaliações.

Por outro lado, sem envolver-se diretamente com os fenômenos advindos da mediunidade, a própria vida do espírita, em particular, suas ações e engajamento no movimento espírita, também solicitam a aplicação desses dois princípios. Seja na conduta, seja na vida social ou familiar, pois são princípios norteadores de uma vida equilibrada. Usando-os, sempre teremos onde nos apoiar.

A continuidade do texto apresentado por Kardec, acima parcialmente transcrito, permite alargar o horizonte de observação para outro aspecto marcante deste tesouro espiritual chamado Espiritismo. É que, estudando-o metodicamente - com o mesmo sentido observador e crítico, característico do discernimento e do bom senso - alcançaremos um degrau importante no entendimento de sua proposta: seremos adeptos esclarecidos, conscientes, coerentes.

Adeptos esclarecidos, conscientes, coerentes formarão a própria consciência espírita; esta consciência espírita permitirá saber que rumo tomar, que diretrizes usar, identificar descompassos na prática espírita - inclusive de dirigentes, que também são seres em aperfeiçoamento e experiências necessárias -, para agir com segurança.

Ora, é esta mesma consciência espírita que faz o espírita compreender o dever de agir em favor de seus irmãos, enquanto age concomitantemente pelo próprio progresso; é ela mesma que toma posições, que não se deixa abater pelos obstáculos, que não se afasta da Doutrina em virtude de comportamentos equivocados de companheiros espíritas, enfim já desperta para o grave compromisso de estarmos reencarnados.

Efeitos naturais de uma consciência espírita formada pelo estudo e embasada pelas virtudes do discernimento e do bom senso, caminhos seguros para o espírita consciente.

E já que o Espiritismo não está restrito à prática mediúnica, o campo é vasto e pede ponderada análise do que estamos fazendo.

Citações:

(1) Publicação fundada por Allan Kardec em 1858.
(2) Trecho parcial de discurso de Allan Kardec na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, na abertura do ano social, a 1º de abril de 1862 (extraído da Revista Espírita de junho de 1862, ano V, vol. 6, edição EDICEL).
Artigo publicado originariamente na RIE - Revista Internacional de Espiritismo - de janeiro de 2004.