terça-feira, 19 de abril de 2011

Como se forma um magnetizador?

Por Randy*

Frequentemente temos dito que não existe o "passe espirita" e somos muito especificos quando dizemos isso.

A codificação não prevê esse tipo de coisa que se vê por aí: gente dançando, estalando dedos, "alisando" o ar e etc. E se criaram diversas teorias para esse tipo de coisa, deram nomes aos passes, deram direções, mas tudo baseado em...

Não sabemos no que se baseia esse tipo de coisa.

A codificação fala em cura mediunica e magnetização. Não vamos falar em cura mediunica, posto que esta é rara. Mas, sobre a magnetização... O que é isso? Seriam os "passistas" magnetizadores? Aliás, qualquer um pode ser um magnetizador?

Vemos nos CE´s que qualquer um pode ser "passista". Mas, em alguns há até "curso de passes", baseados em Jacob de Mello e em Edgar Armond. Isso suplantaria o que seria necessário para tornar alguém um magnetizador?

Não vemos como isso seria possível. O magnetizador, no conceito clássico, também é o hipnotizador. E foi sobre o conceito clássico que Kardec trabalhou, já que ele conheceu Mesmer (o "codificador" da magnetização). Além disso, o problema é que não existem manuais confiáveis de como perceber a capacidade magnetizadora e tampouco como desenvolvê-la.

A maior parte do material sobre o assunto não fala sobre esta questão e sim sobre a confusão que reside com o "passe".

A nossa questão sobre o passe espírita, suposto que seja, mas inexistente enquanto conceito, está no:

- conceito

- método

- treinamento

O conceito é o clássico. O método...

O método, segundo a codificação é unicamente a imposição de mãos.

O treinamento... Bem, para começar, a magnetização só surte efeitos positivos quando realizada por pessoas que possuem elevada moral, posto que a qualidade do magnetismo diz respeito a essa qualidade.

Portanto, NÃO, nem todo mundo pode ser magnetizador espirita e NÃO, o povo que anda por aí dando passes que não conheça os mecanismos de magnetização e elevada moral não poderiam estar aplicando os tais "passes".

Então, o passe, por conta disso, não existe, não é eficaz e não atua sobre sólida estrutura cientifica.

Mas, permanece a pergunta: como se forma um magnetizador espirita?

Vamos à codificaçao para verificar algumas coisas:

32. São extremamente variados os efeitos da ação fluídica sobre os doentes, de acordo com as circunstâncias. Algumas vezes é lenta e reclama tratamento prolongado, como no magnetismo ordinário; doutras vezes é rápida, como uma corrente elétrica. Há pessoas dotadas de tal poder, que operam curas instantâneas nalguns doentes, por meio apenas da imposição das mãos, ou, até, exclusivamente por ato da vontade. Entre os dois pólos extremos dessa faculdade, há infinitos matizes. Todas as curas desse gênero são variedades do magnetismo e só diferem pela intensidade e pela rapidez da ação. O princípio é sempre o mesmo: o fluido, a desempenhar o papel de agente terapêutico e cujo efeito se acha subordinado à sua qualidade e a circunstâncias especiais.

Observem os destaques. A magnetização pode ser feita sem a imposição de mãos. Nesse caso, por que todos os passistas que conhecemos bailam com suas mãos? Resposta - porque não são magnetizadores - apenas repetem o que lhe foi repassado sem o devido estudo, SELEÇÃO MORAL e treinamento DE MAGNETIZAÇÃO.

Notem ainda que se fala em "fluidos subordinados à qualidade". Então, não há mais uma vez, como imaginar que qualquer um poderia ser um magnetizados (ou passista, como dizem os equivocados).

E finalmente, diz-se de "circunstancias especiais". Mas... oras... Nos CE´s sempre há filas de pessoas que se obrigam a tomar passes e dezenas de "mediuns" misteriosamente escolhidos que aplicam os tais passes indiscriminadamente. Então, onde estão as circunstancias especiais de que fala a codificação?

Vamos ainda a outros conceitos...

33. A ação magnética pode produzir-se de muitas maneiras:

1º pelo próprio fluido do magnetizador; é o magnetismo propriamente dito, ou magnetismo humano, cuja ação se acha adstrita à força e, sobretudo, à qualidade do fluido;

2º pelo fluido dos Espíritos, atuando diretamente e sem intermediário sobre um encarnado, seja para o curar ou acalmar um sofrimento, seja para provocar o sono sonambúlico espontâneo, seja para exercer sobre o indivíduo uma influência física ou moral qualquer. É o magnetismo espiritual, cuja qualidade está na razão direta das qualidades do Espírito;

3º pelos fluidos que os Espíritos derramam sobre o magnetizador, que serve de veículo para esse derramamento. É o magnetismo misto, semi-espiritual, ou, se o preferirem, humano-espiritual. Combinado com o fluido humano, o fluido espiritual lhe imprime qualidades de que ele carece. Em tais circunstâncias, o concurso dos Espíritos é amiúde espontâneo, porém, as mais das vezes, provocado por um apelo do magnetizador.

Nota-se a questão da "qualidade" sendo insistentemente colocada. Quando não se fala da qualidade de um magnetizador, fala-se da qualidade do espirito. Mas... a qualidade do espirito que se utiliza de um medium também se liga por afinidade MORAL ao medium, salvo, como diz o Livro dos Mediuns, em "casos especiais". Casos especiais não podem ser frequentes, ou não seriam especiais.

Vamos prosseguir:

34. É muito comum a faculdade de curar pela influência fluídica e pode desenvolver-se por meio do exercício; mas, a de curar instantaneamente, pela imposição das mãos, essa é mais rara e o seu grau máximo se deve considerar excepcional. No entanto, em épocas diversas e no seio de quase todos os povos, surgiram indivíduos que a possuíam em grau eminente. Nestes últimos tempos, apareceram muitos exemplos notáveis, cuja autenticidade não sofre contestação. Uma vez que as curas desse gênero assentam num princípio natural e que o poder de operá-las não constitui privilégio, o que se segue é que elas não se operam fora da Natureza e que só são miraculosas na aparência.

Vejam... diversas pessoas entram numa "câmara de passe" com dores aqui, ali e dizem sairem dali curadas. Mas, é evidente que dores de cabeça ou musculares ou em outras partes do corpo não constituem cura, mas amenização de efeitos. E nesse ponto, como diz o trecho acima sobre a excepcionalidade, até onde vai a autenticidade, tanto do passista, quanto do suposto doente?

Porém, o mais importante aqui é o trecho que inspirou este tópico: a faculdade magnétizadora pode se desenvolver por meio do exercicio.

Mas... nao se fala que tipo de exercicio seria esse.

Já captamos que o magnetizador precisa ter moral elevada. Já captamos que nem todos são magnetizadores natos. Mas, não elaboramos como, se fato, de exercita um magnetizador.

Eis a raiz da questão. A magnetização surgiu como ciência e veio ainda conjugada com a hipnose. Quase sempre o magnetizador é um hipnotizador. Sendo assim, não há como dizer que os passistas sejam magnetizadores, nem que o que eles aplicam - o passe - seja magnetização. O passe - essa coisa que se faz por aí - não existe. É um placebo realizado por uma maioria de pessoas que desconhecem conceitos e treinamento.

No entanto, permanece a questão de cunho cientifico para nós:

- Como descobrir e treinar um magnetizador?

* Moderador da comunidade Eu Sou Espírita - Espiritismo do Orkut

domingo, 17 de abril de 2011

Reencarnação no Contexto Histórico

Por Paulo da Silva Neto Sobrinho

“Pois não há nada de escondido que não venha a ser revelado, e não existe nada de oculto que não venha a ser conhecido”. (JESUS, Mt 10,26).

A cada dia que desenvolvemos nossos estudos sobre o tema reencarnação estamos vendo que, infelizmente, muitas coisas foram expurgadas das Sagradas Escrituras, a verdade pouco lhes importa, com o objetivo de justificar a manutenção de dogmas religiosos. Dogmas esses que ainda servem aos interesses das lideranças religiosas, que buscam de todas as formas fazer com que seus fiéis permaneçam na ignorância e assim sigam acreditando nessa teologia “Adão e Eva”.

Assim, é que já em Êxodo 20, 5, mudaram a preposição, que fatalmente nos levaria à conclusão da existência da reencarnação, quando trocam o “na” por “até”, vejamos:

“... porque eu, Iahweh teu Deus, sou um Deus ciumento, que puno a iniqüidade dos pais sobre os filhos até a terceira e quarta geração dos que me odeiam”.

Só que, com essa mudança, o texto entra em conflito com outra passagem bíblica:

“Os pais não serão mortos em lugar dos filhos, nem os filhos em lugar dos pais. Cada um será executado por seu próprio crime”. (Dt 24, 16) [ [1] ].

Entretanto, se colocarmos a preposição “na” em lugar da usada no texto, ficaremos perfeitamente coerentes com essa passagem anterior e a justiça divina não puniria um inocente, mas o próprio espírito culpado que nasceria como neto ou bisneto dele mesmo, ou seja, o próprio criminoso reencarnado como um de seus descendentes.

Sempre lemos, de outros autores, que a idéia da reencarnação existia no cristianismo primitivo e existe no judaísmo, como por exemplo, Dr. Severino Celestino da Silva, em Analisando as Traduções Bíblicas, H. Spencer Lewis, F.R.C, Ph.D., no livro A Vida Mística de Jesus e o teólogo alemão Holger Kersten, autor de Jesus Viveu na Índia, do qual transcrevemos:

“Até agora, quase todos os historiadores da Igreja acreditaram que a doutrina da reencarnação foi declarada herética durante o Concílio de Constantinopla em 553. No entanto, a condenação da doutrina se deve a uma ferrenha oposição pessoal do imperador Justiniano, que nunca esteve ligado aos protocolos do Concílio. Segundo Procópio, a ambiciosa esposa de Justiniano, que, na realidade, era quem manejava o poder, era filha de um guardador de ursos do anfiteatro de Bizâncio. Ela iniciou sua rápida ascensão ao poder como cortesã. Para se libertar de um passado que a envergonhava, ordenou, mais tarde, a morte de quinhentas antigas ‘colegas’ e, para não sofrer as conseqüências dessa ordem cruel em uma outra vida como preconizava a lei do Carma, empenhou-se em abolir toda a magnífica doutrina da reencarnação. Estava confiante no sucesso dessa anulação, decretada por ‘ordem divina’”.

“Em 543 d.C. o imperador Justiniano, sem levar em conta o ponto de vista papal, declarou guerra frontal aos ensinamentos de Orígenes, condenando-os através de um sínodo especial. Em suas Obras De Principiis e Contra Celsum, Orígenes (185-235 d.C), o grande Padre da Igreja, tinha reconhecido, abertamente, a existência da alma antes do nascimento e sua dependência de ações passadas. Ele pensava que certas passagens do Novo Testamento poderiam ser explicadas somente à luz da reencarnação”.

“Do Concílio convocado pelo imperador Justiniano só participaram bispos do Oriente (ortodoxos). Nenhum de Roma. E o próprio Papa, que estava em Constantinopla naquela ocasião, deixou isso bem claro”.

“O Concílio de Constantinopla, o quinto dos Concílios, não passou de um encontro, mais ou menos em caráter privado, organizado por Justiniano, que, mancomunado com alguns vassalos, excomungou e maldisse a doutrina da pré-existência da alma, apesar dos protestos do Papa Virgílio, com a publicação de seus Anathemata.

“A conclusão oficial a que o Concílio chegou após uma discussão de quatro semanas teve que ser submetida ao Papa para ratificação. Na verdade, os documentos que lhe foram apresentados (os assim-chamados ‘Três Capítulos’) versavam apenas sobre a disputa a respeito dos três eruditos que Justiniano, há quatro anos, havia por um edito declarado heréticos. Nada continham sobre Orígenes. Os Papas seguintes, Pelágio I (556-561), Pelágio II (579-590) e Gregório (590-604), quando se referiram ao quinto Concílio, nunca tocaram no nome de Orígenes”.

“A Igreja aceitou o edito de Justiniano – ‘Todo aquele que ensinar esta fantástica pré-existência da alma e sua monstruosa renovação será condenado’ – como parte das conclusões do Concílio. Portanto, a proibição da doutrina da reencarnação não passa de um erro histórico, sem qualquer validade eclesiástica”. (pág. 240-241).

E especificamente quanto ao judaismo podemos comprovar pelo historiador judeu Flavius Josephus, citado por Dr. Hernani de Guimarães Andrade, no livro Você e a Reencarnação, à página 28. Dr. Hernani em referência a WHISTON (The Works of Flavius Josephus, trad. Willian Whiston, M.A., London: War, Loc & Co. Limited.), diz-nos:

Flavius Josephus (37 a 95 a.D.), intelectual e historiador judeu, em sua famosa obra De Bello Judaico, faz a seguinte advertência aos soldados judeus que preferiam desertar, suicidando-se:

"Não vos recordais de que todos os espíritos puros que se encontram em conformidade com a vontade divina vivem no mais humildes dos lugares celestiais, e que no decorrer do tempo eles serão novamente enviados de volta para habitar corpos inocentes? Mas que as almas daqueles que cometeram suicídio serão atiradas às regiões trevosas do mundo inferior?" (Josephus, 1910).

Entretanto, até nessa clássica obra desse autor da antiguidade modificaram o texto para, obviamente, fugir da idéia da reencarnação, conforme podemos comprovar pela tradução de Vicente Pedroso, publicada no livro História dos Hebreus, (CPAD, 7ª ed., 2003), que diz o seguinte (pág. 600):

Não sabeis que Ele difunde suas bênçãos sobre a posteridade daqueles, que depois de ter chamado para junto de si, entregam em suas mãos, a vida, que, segundo as leis da natureza, Ele lhes deu e que suas almas voam puras para o céu, para lá viverem felizes e voltar, no correr dos séculos, animar corpos que sejam puros como elas (*) e que ao invés, as almas dos ímpios, que por uma loucura criminosa dão a morte a si mesmos são precipitados nas trevas do inferno.

(*) Parece, segundo estas palavras, que Josefo acreditava na metempsicose.

Observar que apesar dos textos serem bem semelhantes, mudaram todo o sentido do original para fugir da idéia da reencarnação. Dúvida que envolveu até o próprio editor: “Parece, segundo estas palavras, que Josefo acreditava na metempsicose”, querendo dissimular o pensamento sobre a reencarnação.

Mas se esqueceu de modificar o que disse Josephus, quando fala no que acreditavam os fariseus:

“Eles julgam que as almas são imortais, que são julgadas em um outro mundo e recompensadas ou castigadas segundo foram neste, viciosas ou virtuosas; que umas são eternamente retidas prisioneiras nessa outra vida e que outras voltam a esta”. (op. cit., pág. 416).

Entretanto, o mesmo não aconteceu com a tradução do livro Atos dos Apóstolos 23, 8, onde se diz que os fariseus sustentam “a ressurreição”, quando, na verdade, deveria ser “a reencarnação”, conforme nos informa o historiador judeu.

Podemos ainda acrescentar as informações contidas no livro As Rodas da Alma, onde o Rabino Philip S. Berg desenvolvendo o tema dentro da ótica cabalista, diz a certa altura (pág. 29):

“Entre todos os que aceitam a doutrina da reencarnação, talvez os cabalistas sejam os únicos que acreditam que uma alma pode retornar num nível inferior daquele que deixou em uma vida anterior. Efetivamente, se o peso do tikun (correção) for suficientemente pesado, uma alma humana poderá se encontrar reencarnada no corpo de um animal, de uma planta ou até mesmo de uma pedra”.

“A Cabala é o significado mais profundo e oculto da Torá, ou Bíblia”, diz Berg, o que confirma que é um conhecimento do judaísmo místico, segundo suas próprias palavras.

Trazemos também a opinião de Sérgio F. Aleixo, escritor e estudioso da Bíblia, que em seu livro Reencarnação – Lei da Bíblia, Lei do Evangelho, Lei de Deus, diz o seguinte (pág. 21):

“Neste trabalho, queremos demonstrar que a cultura judaico-cristã tem precedentes reencarnacionistas incontestáveis, a despeito de as políticas igrejeiras, sustentadas pelos mais absurdos teologismos, se obstinarem ainda em negá-los”.

É comum a certas pessoas advogarem que devemos, para interpretar a Bíblia, levar em conta o contexto histórico, mas quando o fato é reencarnação não seguem a sua própria recomendação. Os fatos históricos estão aí relatados, e não há como mudá-los. Resta então aos fanáticos a humildade de mudarem de posicionamento em relação ao assunto. Embora sinceramente achamos isso muito difícil, pois são completamente cegos, cuja única verdade que aceitam é a que lhes ensinaram, pouco importa se corresponde à realidade ou não. Todos os que pensam diferente deles são “heréticos” que precisam ser combatidos.

Aos que ainda nos dias de hoje perseguem os Espíritas por causa desse princípio doutrinário do Espiritismo, recomendamos que leiam mais, mas saiam da literatura de autores “recomendados” e busquem a verdade em outras obras, principalmente de outros autores, estudiosos e pesquisadores da reencarnação, que não os de sua corrente religiosa. Somente os que temem a verdade é que proíbem a leitura de obras fora do “nihil obstat” de sua liderança religiosa.

Referências Bibliográficas:

ALEIXO, S.F. Reencarnação – Lei da Bíblia, Lei do Evangelho, Lei de Deus, Niterói, Lachâtre, 2003.

ANDRADE, H.G. Você e a Reencarnação, Bauru, CEAC, 2002.

BERG, P. S. As Rodas da Alma, São Paulo, Centro de Estudos da Cabala, 1998.

CHAVES, J. R. A Reencarnação Segundo a Bíblia e a Ciência, São Paulo, 2002.

DIVERSOS. Bíblia de Jerusalém, São Paulo, Paulus, 2002.

KERSTEN, H. Jesus Viveu na Índia. São Paulo, Best Seller, 1988.

LEWIS, H.S. A Vida Mística de Jesus, Curitiba, AMORC, 2001.

SILVA, S. C. Analisando as Traduções Bíblicas. João Pessoa; Idéia, 2001.


[1] Ver tb: Ex 34, 7; Nm 14, 18; Jr 31, 29-30 e Ez 18, 2-4, 20.

domingo, 10 de abril de 2011

Los Criptógamos Carnudos de J.B. Roustaing

Por José Herculano Pires

Para ler a versão em português, clique aqui.

Esa es la revelación de la revelación. Roustaing copia y desfigura a Kardec acrecentando a sus enseñanzas los mayores absurdos. Tómese en cuenta que esas criaturas extrañas, en forma de larvas y babosas, son encarnaciones de espíritus humanos que habían tenido alta evolución sin pasar por la encarnación humana. Después de desenvolver la razón en alto grado y de haber colaborado con dios en los procesos de la Creación, llegando a un mismo a orientar a criaturas humanas, vuelven a la condición de criptógamos carnudos.

¿Más por que hablan los reveladores en sustancias humanas? ¿Por qué no simplifican las cosas diciendo simplemente que esos espíritus decaídos van a encarnarse en babosas? ¿Por qué es preciso engañar a los espiritistas que aceptan a Kardec y que saben que la evolución espiritual es irreversible, que el espíritu humanizado no puede retrogradar al plano animal? Es el mismo proceso de sofisma, de hacer trampa, usado en la cuestión del aparente cuerpo de Jesús, cuando hablan de encarnación fluídica para escapar al anatema de Juan contra los que dicen que Cristo no vino de carne. Las sustancias humanas de los criptógamos carnudos son una invención absurda y tonta. ¡ Y tanta gente para defender esas bobadas dentro del espiritismo!

¡Más que son los criptógamos carnudos? ¿Por qué ese nombre tan extraño? Todo tiene su razón en la máquina infernal del ilogismo roustanguista, aunque sea siempre a anti razón la que entra en escena. Apreciemos el asunto a la luz de la razón para intentar esclarecerlo.

La palabra criptógamo es empleada científicamente para designar plantas cuyos órganos reproductores no aparecen, están ocultos. El origen del término es griego: kryptos, que quiere decir oculto, y gamos, que quiere decir casamiento, unión. Así, criptógamos es un ejemplar de especie vegetal que tiene sus órganos reproductores escondidos. Los “reveladores” roustanguista acrecentaron la palabra carnudo para adaptar la designación al reino animal. Así, criptógamo carnudo seria una especie de animal (más no animal porque formado de substancias humanas) en que se encarnan espíritus humanos que retrogradaron al plano vegetal y animal.

Atención para esto: cuando decimos que ellos retrogradaron al plano vegetal y animal no estamos forzando la interpretación. Científicamente los animales semejantes a las plantas están localizados en la línea divisoria de los reinos vegetal y animal, son desenvolvimiento de plantas. Si existiesen esos criptógamos carnudos la Ciencia los catalogaría como formar de pasaje de los criptógamos vegetales para el reino animal.

Tenemos así la teoría de la Metempsicosis, tan seguramente refutada por la lógica de Kardec, devuelta al medio espirita por ilogismo roustanguista. Bastaría ese triste episodio, tomado del caldero diabólico de los absurdos de “Los Cuatro Evangelios” para probarnos, sin la menor sombra de duda, que esa obra es de autoría de las tinieblas y que su finalidad es confundir a los espiritistas poco habituados a pasar las cosas por la criba de la razón.

Más que esto, sin embargo, el objetivo evidente es el de la ridicularizar el Espiritismo para apartar a las personas de buen sentido.

(O Verbo e a Carne, Júlio Abreu Filho e J. Herculano Pires, edições Cairbar, SP, 1ª ed., 1973, págs. 43/45)

Retirado do livro "Conscientização Espírita", de Gélio Lacerda da Silva.

Traducido por M. C. R.

Las Advertencias de Kardec a Roustaing Y La Profecía de Erasto

Por Sergio Aleixo

Para ler a versão em português, clique aqui.

En la Revista Espirita de junio de 1863 hay un articulo kardeciano sobre la no retrogradación de los Espíritus. Este texto fue citado por el abogado de Bordéus y sometido al examen de los autores espirituales de Los Cuatro Evangelios en el número 59 de la obra. Los guías de la pretendida Revelación de la Revelación concluyeron que los que piensan que la encarnación es una necesidad general “no fueron esclarecidos, o no reflexionaron bastante”.

Kardec dice en su artículo de junio de 1863 que la idea rustenista de que “los Espíritus no habían sido creados para encarnar”, que “la encarnación seria solamente el resultado de su falta”, constituye un sistema “especioso a primera vista” y que, “tal sistema cae por la mera consideración de que, si ningún Espíritu hubiese fallado, no habría hombres en la Tierra, ni en los otros mundos”.

Según el Codificador, el hombre “es una de los engranajes esenciales de la creación” y, por esta razón “Dios no podía subordinar la realización de esta parte de su obra a la caída eventual de sus criaturas, a menos que contase por tanto con un número siempre suficiente de culpados para ofrecer operarios a los mundos creados y por crear”. Para Kardec “El buen sentido repele tal idea”.

Más a esto respondieron los guías de Roustaing: “La última frase debe ser riscada”. Y aun admitiendo que era “pronto” para resolver el “origen del Espíritu” - en relación a lo que, de hecho, ya recomendara Kardec de máxima cautela [1]-, los guías rustenistas exhortaron la vanidad de los más sensibles y del propio jurisconsulto de esta manera:

Serbios de lo que os decimos [sobre el origen de las cosas], porque, al mismo tiempo en que vuestro trabajo aparece a los ojos de todos, los Espíritus encarnados ya se hallaran más dispuestos para recibir lo que entonces [cuando, en el Libro de los Espíritus, fue dicho que el Espíritu era creado simple e ignorante], y aun mismo hoy [abril de 1863], tomarían por una monstruosidad, o por una tontería ridícula.[2]

Kardec reafirmo en su artículo de junio de 1863 la doctrina de El Libro de los Espíritus y negó la tesis rustenista que asegura que la reencarnación es ocasionada como castigo a los Espíritus faltosos. Esto prueba irrefutablemente que no es verdadera la propaganda centenaria de la F.E.B., la cual siempre dio cuenta de que Kardec y Roustaing solo divergían en cuanto a la naturaleza del cuerpo de Jesús, concordando en todo lo demás.

El Codificador dijo en alta voz que el estado primitivo del Espíritu no es el de “inocencia inteligente y raciocinada”. Estos términos utilizados por el maestro lionés en junio de 1863 resumen con precisión las tesis “especiales” de la revelación de la Revelación, que, sin embargo, solamente seria publicada tres años después. Si no, veamos:

Alcanzando el punto de preparación para entrar en el reino humano, los Espíritus se preparan, de hecho, en mundo ad-hoc, para la vida espiritual consciente, independiente y libre. Es en ese momento en el que entran en aquel estado de inocencia y de ignorancia. La voluntad del soberano Señor les da la conciencia de su inocencia y facultades y, por consiguiente, de sus actos, conciencia que produce el libre albedrio, la vida moral, la inteligencia independiente y capaz de raciocinio, la responsabilidad. Llegando de este modo a la condición de Espíritu formado, de Espíritu pronto para ser humanizado si fuera a fallar, el Espíritu en un estado de inocencia completa, habiendo abandonado, con sus últimas envolturas animales, los instintos oriundos de las exigencias de la animalidad. […] Los que se conservan puros también desenvuelven actividades e inteligencia, con el fin de progresar, en el estado fluídico, por medio de esfuerzos espirituales que necesitan hacer para, de la fase de inocencia y de ignorancia, de infancia y de instrucción, llegar, sin haber fallado, a la perfección![3]

Esta flagrante coincidencia de palabras y la citación, en el numero 59 de Los Cuatro Evangelios, de la absoluta negativa de Kardec a la tesis de la “caída” evidencia que, de alguna suerte, ya en 1863, el Codificador había tomado ciencia del material que estaba siendo compilado por Roustaing desde diciembre de 1861. Ponderaba el nostálgico colega Gelio Lacerda de la Silva, ex presidente de la Federación Espirita del Estado del Espíritu santo:

Para entender como Kardec contesto, en 1863, un asunto que Roustaing vinculo en su libro, publicado en 1866, todo lleva a creer que Roustaing, antes de su libro llegar al público, ya divulgaba su contenido. Fue en abril de 1863 cuando los Espíritus mistificadores dictaron a Roustaing, a través de Mme. Collignon, la enseñanza anti doctrinaria de que el Espíritu solo será humanizado si fallara, conforme la nota en la página. 295, 1. º Volumen, 5ª ed. De Los Cuatro Evangelios; por tanto, no hay duda de que Kardec, en junio de 1863, en su referido artículo, se alabó a Roustaing en el mensaje dictado en abril de 1863. [4]

Y agregó a esto un hecho relevante. El Codificador, cierta vez, publicó una carta de la médium Emilie Collignon encaminando para sí dictados espirituales. Aseguraba la sensitiva que uno de esos comunicados era de un espíritu que, antes, se presentara a Kardec en substitución al de Gerard de Codemberg. Rebatidos los argumentos de la médium, el genio lionés le dijo que el texto “presenta todas los caracteres de una comunicación apócrifa.” [5]

Luego Kardec publica mensaje del Espíritu Bernardin a la misma sensitiva, en la que proclama en el "pensamiento filosófico", "lleno de sabiduría", el supuesto hecho de que “somos una esencia creada pura, más decaída; pertenecemos a una patria donde todo es pureza; culpables, fuimos exiliados por algún tiempo, más solo por algún tiempo”. ¡Ya era la doctrina rustenista de la caída del espíritu!

En clara reparación, el maestro recomienda, entre paréntesis, la lectura de su aclamado articulo de enero de 1862, sobre la doctrina de los ángeles decaídos, como también, en su observación final, advierte del peligro de, en ciertas comunicaciones, espíritus no muy elevados emitir opiniones personales, que reflejan apenas sistemas e ideas no siempre justas acerca de los hombres y de las cosas. Según Kardec:

Publicadas sin corrección, esas ideas falsas apenas lanzaran descredito sobre el espiritismo, ofrecerán armas a sus enemigos y sembraran la duda y la inseguridad entre los neófitos. Con los comentarios y las explicaciones dados a propósito, el propio mal algunas veces se torna instructivo. Sin esto podrían responsabilizar a la doctrina por todas las utopías enunciadas por ciertos Espíritus más orgullosos que lógicos. Si el Espiritismo pudiese ser retardado en su marcha, no sería por los ataques abiertos de sus enemigos declarados, más si por el celo irreflexivo de los amigos imprudentes. No se trata, pues, de hacer compilaciones indigestas, donde todo se halla amontonado confusamente y cuyo menor inconveniente seria molestar al lector; es preciso evitar con cuidado todo cuanto pueda falsear la opinión sobre el Espiritismo. Ahora, todo esto exige un trabajo que justifica la demora de tales publicaciones. [6]

La situación no era del todo buena para la médium, que ya estaba recibiendo la pretendida Revelación de la Revelación desde diciembre de 1861, y que se extendería hasta mayo de 1865,[7] y en clima, ahora, quien sabe, de probable melindre, en función de estos pareceres desfavorables de Kardec. Anote el estudioso que el maestro lionés habla, en su observación, sobre “Espíritus más orgullosos que lógicos”, “celo irreflexivo de los amigos imprudentes” y “compilaciones indigestas, donde todo se haya amontonado confusamente y cuyo menos inconveniente seria molestar al lector”. ¡No resta duda! El material rustenista fue enviado a Kardec ya en 1862, más el maestro luego percibió las inconsistencias y peligros.

Roustaing, por tanto, puede contar con la previa advertencia del Codificador, que se digno hasta preservarlo del ridículo, dada su distinción social, no mencionándole el nombre a aquel artículo de junio de 1863, sobre la no retrogradación de los Espíritus. Elegante, más firme, Kardec definió la tesis rustenista de la caída como “un sistema que tiene algo de engañoso a primera vista”, argumentando de la forma que ya destaque en el inicio.

El abogado bordelés, por tanto, debería haber acatado el entendimiento de su “muy honrado jefe Espírita”. Fue dada a Roustaing la oportunidad de desistir de aquel trabajo, todavía no lo interrumpió; de cierto, por el orgullo herido. Un ex presidente de la Orden de los Abogados, miembro del tribunal Imperial de Bordéus, al ser “desacatado” por un profesor lionés radicado en Paris. No, esto no podía ser, aun mismo que se tratase de un aclamado autor pedagógico.

La médium Collignon y el abogado Roustaing. Ambos en situación de evidente amargura por no haber obtenido de Kardec el respaldo que ambicionaban para sus trabajos mediúmnicos. Combinación explosiva que generó el primer cisma en el movimiento espirita, cuyos ecos, infelizmente, se pueden oír aun.

No obstante estas advertencias de Kardec, Espíritus orientadores habían expedido alertas al respecto de un ataque de entidades mistificadoras en la ciudad de Bordéus. Durante la sesión general allá ocurrida el 14 de octubre de 1861, Kardec leyó, después de su discurso, una epístola de Erasto a los espiritas de aquella localidad. [8]

En voz un tanto más severa, el amigo espiritual de la codificación Kardeciana aseguró ser necesario prevenir a los espiritas bordeleses contra un peligro que era su deber señalarles. Erasto los avisó, entonces, del inminente asalto de una turba de Espíritus engañadores, cuya finalidad seria fomentar la cesión, la división, y llevar a una ruptura lamentable por todos los títulos. Repitiendo lo que los propios guías espirituales del movimiento en Bordéus dijeron a los espiritas de aquella ciudad. Erasto esclareció que habría dos tipos de mistificadores en el ataque. Un tipo vendría con combinaciones abiertamente hostiles a las enseñanzas de los legítimos misioneros del Espíritu de Verdad, este, el presidente de la regeneración planetaria y guía personal del Kardec y del espiritismo. Otro tipo de mistificadores, sin embargo, se presentaría con disertaciones sabiamente combinadas, en las cuales, gracias tiradas piadosas, insinuarían la herejía o algún principio disolvente.

¿Roustaing tomo conocimiento de la epístola por terceros? ¿O, como adeptos suyos afirman hoy sin pruebas, estuvo presente en la sesión general? De cualquier forma, no fue por falta de esta advertencia que cometió el error de publicar su pretendida Revelación de la Revelación, cuyos dictados comenzarían a aparecer ya en diciembre de aquel año, dos meses después de la sesión general, insinuando exactamente la herejía gnóstica docetista de Jesús fluídico y el principio disolvente de la reencarnación como resultado de una supuesta caída, especie de falencia, verdadera retrogradación que, según los guías rustenistas, sería aplicable hasta Espíritus con responsabilidades planetarias. [9]

Todo se dio tal cual la predicación. Fue un vaticinio de Erasto; en esta ocasión, mensajero del espíritu de Verdad; este último, por otra parte, algunos espíritus vinculados a la Iglesia primitiva habían identificado como Jesús, al señor Roustaing y el Sr. Sabo, a quien Kardec recomendó lo primero, para que se iniciase en el Espiritismo. Al lado del mal, se ve que Dios puso el remedio, más no fue utilizado. [10]

La nomenclatura creada por Kardec – la palabra Espiritismo, inclusive – estaba en toda la supuesta Revelación de la revelación, aun mismo en el titulo: “Espiritismo Cristiano”. Como si nunca fuera dicho por Kardec: “El punto esencial es que la enseñanza de los Espíritus es eminentemente cristiano: el se apoya en la inmortalidad del alma, en las penas y recompensas futuras, en el libre albedrio del hombre, en la moral de Cristo, y por tanto no es irreligioso”. [11]

El hecho es que Roustaing, infelizmente, se apoderó del nombre y de los términos de una doctrina cuya codificación nunca le cabio. Más allá de esto, ni el ni sus discípulos jamás demostraron en que, al final de cuentas, la tesis basilar de su “escuela” se distingue de la antigua tesis de los agnósticos docetista. En el decir autorizado de E. Pagels, la antigua secta postulaba que “Jesús no era un ser humano, y si un ser espiritual que se adapto a la percepción humana”, [12] o sea, conforme en el Espiritismo se dice: un agênere.

No se trata, claro, del agênere desenvolver la percepción física, mas, esto si, de adaptarse a la percepción humana, esto es, de terceros, a fin de que lo puedan notar, aun mismo desencarnado; tanto es asi, que los rustenistas pregonaban que Jesús no tenía “cuerpo material humano, sujeto a la muerte”, que “no podía sufrir, según nuestro modo de entender material” y que – asómbrense – “no murió efectivamente en el Gólgota”. [13] ¡Hora! Dice el espiritismo muy contundentemente:

[…] el Espíritu que no tiene cuerpo material no puede experimentar los sufrimientos que son el resultado de la alteración de la materia, de donde también es forzoso concluir que, si Jesús sufrió materialmente, lo que no se puede dudar, es porque tenía un cuerpo material de naturaleza semejante a la de los cuerpos de toda la gente. 14]

Se aladea eso el flagrante de que, para el rustenismo, en la práctica, la carne humana es un efecto “del mal”; apenas asumen a los Espíritus que son punidos por las faltas cometidas en “estado fluídico”. Y el docetismo, según Pastorino, entendía exactamente esto: “[…] todo lo que es material es imperfecto e impuro, pues es obra del Principio del Mal; como Jesús presentaba el Principio del Bien, el Padre, no podía haberse sometido al Principio del Mal, no podía haber tenido cuerpo físico carnal”. [15]

De hecho, en este texto de Los Cuatro Evangelio, de entre otros, se puede constatar el horror de los guías docetista al cuerpo humano, vinculándolo a “lama”, al “sufrimiento”, a la “falibilidad”, tornándolo efecto inherente a la condición de “culpable” :

Mayor aun era la diferencia entre ese cuerpo de Jesús vuestros cuerpos de lama. […] no lo olvidéis: todo aquel que reviste la carne y sufre, como vosotros, la encarnación material humana es falible. Jesús era demasiadamente puro para vestir la librea del culpado. Su naturaleza espiritual era incompatible con la encarnación material, tal como la sufrís. (Vol. 1, n. 14.)

Posible seria concluir entonces, con los guías rustenistas, que Jesús no cometió imperfecciones morales cuando estuvo en la Tierra no solo porque nunca las practicara en los planos del espíritu, más también porque no estaba revestido de carne humana. La instrucción 625 de El Libro de los Espíritus caducaría.

¿Si, pues qué valor poseería para nosotros el guía y el modelo de una perfección que le fue conferida por proceso evolutivo diferente de la que nos encontramos? Sería un guía errado, un modelo errado para una humanidad errada, porque nada sabría de nuestra vida terrestre, con la cual su pureza siempre habría sido incompatible.

Y más: Jesús habría mentido cuando dijo a Nicodemo: “Hablo de lo que se; doy testimonio de lo que vi”, porque nada conocería ni nada habría visto acerca de nuestra experiencia humana. El rustenismo, por estas y otras, es un insulto a la autoridad moral y espiritual del Maestro de Nazaret, a pesar de suponer exaltarla.

[1] “São essas opiniões pessoais que os Espíritos orgulhosos nos dão como verdades absolutas. É sobretudo a respeito do que deve permanecer oculto, como o futuro e o princípio das coisas, que eles mais insistem, a fim de darem a impressão de que conhecem os segredos de Deus. E é também sobre esses pontos que há mais contradições.” (O Livro dos Médiuns, 300.)
[2] Os Quatro Evangelhos. Vol. I, n. 56. F.E.B, 5.ª ed., 1971, p. 295. Entre colchetes, palavras minhas.
[3] Os Quatro Evangelhos. Vol. I, ns. 56 e 59.
[4] Conscientização Espírita. Do Princípio da Não Retrogradação dos Espíritos.
[5] Revista Espírita. Jun/1862. Princípio Vital das Sociedades Espíritas.
[6] Revista Espírita. Jun/1862. Ensinos e Dissertações Espíritas. O Espiritismo Filosófico. Bordeaux, 4 de abril de 1862. Médium: Sra. Collignon. Observação [de Kardec].
[7] Cf. Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 5.ª ed., 1971, pp. 64 e 66.
[8] Revista Espírita. Nov/1861. Primeira Epístola de Erasto aos Espíritas de Bordéus.
[9] Os Quatro Evangelhos. Vol. I, n. 59. F.E.B, 5.ª ed., 1971, p. 325-326. Cf. Cap. 14: Estranhezas do Ensino Rustenista.
[10] Cf. Revista Espírita. Jun/1861. Correspondência.
[11] O Livro dos Espíritos, 222.
[12] Os Evangelhos Gnósticos, IV.
[13] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 59.
[14] KARDEC, Allan. A Gênese, XV, 65.
[15] Sabedoria do Evangelho. Vol. 3. Jesus Anda Sobre a Água.

Retirado do blog "O Primado de Kardec" - http://oprimadodekardec.blogspot.com/2011/02/capitulo-4-as-advertencias-de-kardec.html

Traducido por M. C. R.

sábado, 9 de abril de 2011

Os Milagres Segundo O Espiritismo

Allan Kardec - A Gênese

Os milagres no sentido teológico - O Espiritismo não faz milagres - Faz Deus milagres? - O sobrenatural e as religiões

Os milagres no sentido teológico

1. - Na acepção etimológica, a palavra milagre (de mirari, admirar) significa: admirável, coisa extraordinária, surpreendente. A Academia definiu-a deste modo: Um ato do poder divino contrário às leis da Natureza, conhecidas.

Na acepção usual, essa palavra perdeu, como tantas outras, a significação primitiva. De geral, que era, se tornou de aplicação restrita a uma ordem particular de fatos. No entender das massas, um milagre implica a idéia de um fato extranatural; no sentido teológico, é uma derrogação das leis da Natureza, por meio da qual Deus manifesta o seu poder. Tal, com efeito, a acepção vulgar, que se tornou o sentido próprio, de modo que só por comparação e por metáfora a palavra se aplica às circunstâncias ordinárias da vida.

Um dos caracteres do milagre propriamente dito é o ser inexplicável, por isso mesmo que se realiza com exclusão das leis naturais. É tanto essa a idéia que se lhe associa, que, se um fato milagroso vem a encontrar explicação, se diz que já não constitui milagre, por muito espantoso que seja. O que, para a Igreja, dá valor aos milagres é, precisamente, a origem sobrenatural deles e a impossibilidade de serem explicados. Ela se firmou tão bem sobre esse ponto, que o assimilarem-se os milagres aos fenômenos da Natureza constitui para ela uma heresia, um atentado contra a fé, tanto assim que excomungou e até queimou muita gente por não ter querido crer em certos milagres.

Outro caráter do milagre é o ser insólito, isolado, excepcional. Logo que um fenômeno se reproduz, quer espontânea, quer voluntariamente, é que está submetido a uma lei e, desde então, seja ou não seja conhecida a lei, já não pode haver milagres.

2. - Aos olhos dos ignorantes, a Ciência faz milagres todos os dias. Se um homem, que se ache realmente morto, for chamado à vida por intervenção divina, haverá verdadeiro milagre, por ser esse um fato contrário às leis da Natureza. Mas, se em tal homem houver apenas aparências de morte, se lhe restar uma vitalidade latente e a Ciência, ou uma ação magnética, conseguir reanimá-lo, para as pessoas esclarecidas ter-se-á dado um fenômeno natural, mas, para o vulgo ignorante, o fato passará por miraculoso. Lance um físico, do meio de certas campinas, um papagaio elétrico e faça que o raio caia sobre uma árvore e certamente esse novo Prometeu será tido por armado de diabólico poder. Houvesse, porém, Josué detido o movimento do Sol, ou, antes, da Terra e teríamos aí o verdadeiro milagre, porquanto nenhum magnetizador existe dotado de bastante poder para operar semelhante prodígio.

Foram fecundos em milagres os séculos de ignorância, porque se considerava sobrenatural tudo aquilo cuja causa não se conhecia. À proporção que a Ciência revelou novas leis, o círculo do maravilhoso se foi restringindo; mas, como a Ciência ainda não explorara todo o vasto campo da Natureza, larga parte dele ficou reservada para o maravilhoso.

3. - Expulso do domínio da materialidade, pela Ciência, o maravilhoso se encastelou no da espiritualidade, onde encontrou o seu último refúgio. Demonstrando que o elemento espiritual é uma das forças vivas da Natureza, força que incessantemente atua em concorrência com a força material, o Espiritismo faz que voltem ao rol dos efeitos naturais os que dele haviam saído, porque, como os outros, também tais efeitos se acham sujeitos a leis. Se for expulso da espiritualidade, o maravilhoso já não terá razão de ser e só então se poderá dizer que passou o tempo dos milagres. (Cap. I, nº 18.)
O Espiritismo não faz milagres

4. - O Espiritismo, pois, vem, a seu turno, fazer o que cada ciência fez no seu advento: revelar novas leis e explicar, conseguintemente, os fenômenos compreendidos na alçada dessas leis.

Esses fenômenos, é certo, se prendem à existência dos Espíritos e à intervenção deles no mundo material e isso é, dizem, o em que consiste o sobrenatural. Mas, então, fora mister se provasse que os Espíritos e suas manifestações são contrárias às leis da Natureza; que aí não há, nem pode haver, a ação de uma dessas leis.

O Espírito mais não é do que a alma sobrevivente ao corpo; é o ser principal, pois que não morre, ao passo que o corpo é simples acessório sujeito à destruição. Sua existência, portanto, é tão natural depois, Como durante a encarnação; está submetido às leis que regem o princípio espiritual, como o corpo o está às que regem o princípio material; mas, como estes dois princípios têm necessária afinidade, como reagem incessantemente um sobre o outro, como da ação simultânea deles resultam o movimento e a harmonia do conjunto, segue-se que a espiritualidade e a materialidade são duas partes de um mesmo todo, tão natural uma quanto a outra, não sendo, pois, a primeira uma exceção, uma anomalia na ordem das coisas.

5. - Durante a sua encarnação, o Espírito atua sobre a matéria por intermédio do seu corpo fluídico ou perispírito, dando-se o mesmo quando ele não está encarnado. Como Espírito e na medida de suas capacidades, faz o que fazia como homem; apenas, por já não ter o corpo carnal para instrumento, serve-se, quando necessário, dos órgãos materiais de um encarnado, que vem a ser o a que se chama médium. Procede então como um que, não podendo escrever por si mesmo, se vale de um secretário, ou que, não sabendo uma língua, recorre a um intérprete. O secretário e o intérprete são os médiuns de um encarnado, do mesmo modo que o médium é o secretário ou o intérprete de um Espírito.

6. - Já não sendo o mesmo que no estado de encarnação o meio em que atuam os Espíritos e os modos por que atuam, diferentes são os efeitos, que parecem sobrenaturais unicamente porque se produzem com o auxílio de agentes que não são os de que nos servimos. Desde, porém, que esses agentes estão na Natureza e as manifestações se dão em virtude de certas leis, nada há de sobrenatural, ou de maravilhoso. Antes de se conhecerem as propriedades da eletricidade, os fenômenos elétricos passavam por prodígios para certa gente; desde que se tornou conhecida a causa, desapareceu o maravilhoso. O mesmo ocorre com os fenômenos espíritas, que não são mais aberrantes das leis naturais do que os fenômenos elétricos, acústicos, luminosos e outros, que serviram de fundamento a uma imensidade de crenças supersticiosas.

7. - Entretanto, dir-se-á, admitis que um Espírito pode levantar uma mesa e mantê-la no espaço sem ponto de apoio; não está aí uma derrogação da lei da gravidade? - Sim, da lei conhecida. Conhecem-se, porém, todas as leis? Antes que se houvesse experimentado a força ascensional de alguns gases, quem diria que uma pesada máquina, transportando muitos homens, poderia triunfar da força de atração? Ao vulgo, isso não pareceria maravilhoso, diabólico? Aquele que se houvera proposto, há um século, a transmitir uma mensagem a 500 léguas e receber a resposta dentro de alguns minutos, teria passado por louco; se o fizesse, teriam acreditado estar o diabo às suas ordens, porquanto, então, só o diabo era capaz de andar tão depressa. Hoje, no entanto, não só se reconhece possível o fato, como ele parece naturalíssimo. Por que, pois, um fluido desconhecido careceria da propriedade de contrabalançar, em dadas circunstâncias, o efeito da gravidade, como o hidrogênio contrabalança o peso do balão? É, efetivamente, o que sucede, no caso de que se trata. (O Livro dos Médiuns, 2ª Parte, cap. IV.)

8. - Uma vez que estão no quadro dos da Natureza, os fenômenos espíritas se hão produzido em todos os tempos; mas, precisamente, porque não podiam ser estudados pelos meios materiais de que dispõe a ciência vulgar, permaneceram muito mais tempo do que outros no domínio do sobrenatural, donde o Espiritismo agora os tira.

Baseado em aparências inexplicadas, o sobrenatural deixa livre curso à imaginação que, a vagar pelo desconhecido, gera as crenças supersticiosas. Uma explicação racional, fundada nas leis da Natureza, reconduzindo o homem ao terreno da realidade, fixa um ponto de parada aos transviamentos da imaginação e destrói as superstições. Longe de ampliar o domínio do sobrenatural, o Espiritismo o restringe até aos seus limites extremos e lhe arrebata o último refúgio. Se é certo que ele faz crer na possibilidade de alguns fatos, não menos certo é que, por outro lado, impede a crença em diversos outros, porque demonstra, no campo da espiritualidade, a exemplo da Ciência no da materialidade, o que é possível e o que não o é. Todavia, como não alimenta a pretensão de haver dito a última palavra seja sobre o que for, nem mesmo sobre o que é da sua competência, ele não se apresenta como absoluto regulador do possível e deixa de parte os conhecimentos reservados ao futuro.

9. - Os fenômenos espíritas consistem nos diferentes modos de manifestação da alma ou Espírito, quer durante a encarnação, quer no estado de erraticidade. É pelas manifestações que produz que a alma revela sua existência, sua sobrevivência e sua individualidade; julga-se dela pelos seus efeitos; sendo natural a causa, o efeito também o é. São esses efeitos que constituem objeto especial das pesquisas e do estudo do Espiritismo, a fim de chegar-se a um conhecimento tão completo quanto possível, assim da natureza e dos atributos da alma, como das leis que regem o princípio espiritual.

10. - Para os que negam a existência do princípio espiritual independente, que negam, por conseguinte, a da alma individual e sobrevivente, a Natureza toda está na matéria tangível; todos os fenômenos que concernem à espiritualidade são, para esses negadores, sobrenaturais e, portanto, quiméricos. Não admitindo a causa não podem eles admitir os efeitos e, quando estes são patentes, os atribuem à imaginação, à ilusão, à alucinação e se negam a aprofundá-los. Daí, a opinião preconcebida em que se acastelam e que os torna inaptos a apreciar judiciosamente o Espiritismo, porque parte do princípio de negação de tudo o que não seja material.

11. - Do fato, porém, de o Espiritismo admitir os efeitos, que são corolário da existência da alma, não se segue que admita todos os efeitos qualificados de maravilhosos e que se proponha a justificá-los e dar-lhes crédito; que se faça campeão de todos os devaneios, de todas as utopias, de todas as excentricidades sistemáticas, de todas as lendas miraculosas. Fora preciso conhecê-lo muito pouco, para pensar assim. Seus adversários julgam opor-lhe um argumento irreplicável, quando, depois de haverem feito eruditas pesquisas sobre os convulsionários de Saint-Médard, sobre os camisardos das Cevenas, ou sobre os religiosos de Loudun, chegaram a descobrir fatos patentes de embuste, que ninguém contesta. Mas, essas histórias serão, porventura, o Evangelho do Espiritismo? Já terão seus adeptos negado que o charlatanismo haja explorado em proveito próprio alguns fatos; que a imaginação os tenha criado; que o fanatismo os haja exagerado muitíssimo? Ele é tão solidário com as extravagâncias que se cometam em seu nome, como a Ciência o é com os abusos da ignorância e a verdadeira religião com os abusos do fanatismo. Muitos críticos julgam do Espiritismo pelos contos de fadas e pelas lendas populares, ficções daqueles contos. O mesmo seria julgar da História pelos romances históricos ou pelas tragédias.

12. - Os fenômenos espíritas são as mais das vezes espontâneos e se produzem sem nenhuma idéia preconcebida da parte das pessoas com quem eles se dão e que, em regra, são as que neles menos pensam. Alguns há que, em certas circunstâncias, podem ser provocados pelos agentes denominados médiuns. No primeiro caso, o médium é inconsciente do que se produz por seu intermédio no segundo, age com conhecimento de causa, donde a classificação de médiuns conscientes e médiuns inconscientes. Estes últimos são os mais numerosos e se encontram com freqüência entre os mais obstinados incrédulos que, assim, praticam o Espiritismo sem o saberem, nem quererem. Por isso mesmo, os fenômenos espontâneos revestem capital importância, visto não se poder suspeitar da boa-fé dos que os obtêm. Dá-se aqui o que se dá com o sonambulismo que, em certos indivíduos, é natural e involuntário, enquanto que noutros é provocado pela ação magnética. (1)

(1) O Livro dos Médiuns, 2ª Parte, cap. V. - Revue Spirite; exemplos: dezembro de 1865, pág. 370, agosto de 1865, pág. 231.

Resultem, porém, ou não esses fenômenos de um ato da vontade, a causa primária é exatamente a mesma e não se afasta uma linha das leis naturais. Os médiuns, portanto, nada absolutamente produzem de sobrenatural; por conseguinte, nenhum milagre fazem. As próprias curas instantâneas não são mais milagrosas, do que os outros efeitos, dado que resultam da ação de um agente fluídico, que desempenha o papel de agente terapêutico, cujas propriedades não deixam de ser naturais por terem sido ignoradas até agora. É, pois, totalmente impróprio o epíteto de taumaturgos que a crítica ignorante dos princípios do Espiritismo há dado a certos médiuns. A qualificação de milagres emprestada, por comparação, a esta espécie de fenômenos, somente pode induzir em erro sobre o verdadeiro caráter deles.

13. - A intervenção de inteligências ocultas nos fenômenos espíritas não os torna mais milagrosos do que todos os outros fenômenos devidos a agentes invisíveis, porque esses seres ocultos que povoam os espaços São uma das forças da Natureza, força cuja ação é incessante sobre o mundo material, tanto quanto sobre o mundo moral.

Esclarecendo-nos acerca dessa força, o Espiritismo faculta a elucidação de uma imensidade de coisas inexplicadas e inexplicáveis por qualquer outro meio e que, por isso, passaram por prodígios nos tempos idos. Do mesmo modo que o magnetismo, ele revela uma lei, senão desconhecida, pelo menos mal compreendida; ou, melhor dizendo, conheciam-se os efeitos, porque eles em todos os tempos se produziram, porém não se conhecia a lei e foi o desconhecimento desta que gerou a superstição. Conhecida essa lei, desaparece o maravilhoso e os fenômenos entram na ordem das coisas naturais. Eis por que tanto operam um milagre os espíritas quando fazem que uma mesa se mova sozinha, ou que os mortos escrevam, como um milagre opera o médico, quando faz que um moribundo reviva, ou o físico, quando faz que o raio caia. Aquele que pretendesse, com o auxílio desta ciência, fazer milagres seria ou um ignorante do assunto, ou um enganador de tolos.

14. - Pois que o Espiritismo repudia toda pretensão às coisas miraculosas, haverá, fora dele, milagres, na acepção usual desta palavra?

Digamos, primeiramente, que, dos fatos reputados milagrosos, ocorridos antes do advento do Espiritismo e que ainda no presente ocorrem, a maior parte, senão todos, encontram explicação nas novas leis que ele veio revelar. Esses fatos, portanto, se compreendem, embora sob outro nome, na ordem dos fenômenos espíritas e, como tais, nada têm de sobrenatural. Fique, porém, bem entendido que nos referimos aos fatos autênticos e não aos que, com a denominação de milagres, são produto de uma indigna trampolinice, com o fito de explorar a credulidade. Tampouco nos referimos a certos fatos lendários que podem ter tido, originariamente, um fundo de verdade, mas que a superstição ampliou até ao absurdo. Sobre esses fatos é que o Espiritismo projeta luz, fornecendo meios de apartar do erro a verdade.

Faz Deus milagres?

15. - Quanto aos milagres propriamente ditos, Deus, visto que nada lhe é impossível, pode fazê-los. Mas, fá-los? Ou, por outras palavras; derroga as leis que dele próprio emanaram? Não cabe ao homem prejulgar os atos da Divindade, nem os subordinar à fraqueza do seu entendimento. Contudo, em face das coisas divinas, temos, para critério do nosso juízo, os atributos mesmos de Deus. Ao poder soberano reúne ele a soberana sabedoria, donde se deve concluir que não faz coisa alguma inútil.

Por que, então, faria milagres? Para atestar o seu poder, dizem. Mas, o poder de Deus não se manifesta de maneira muito mais imponente pelo grandioso conjunto das obras da criação, pela sábia previdência que essa criação revela, assim nas partes mais gigantescas, como nas mais mínimas, e pela harmonia das leis que regem o mecanismo do Universo, do que por algumas pequeninas e pueris derrogações que todos os prestímanos sabem imitar? Que se diria de uni sábio mecânico que, para provar a sua habilidade, desmantelasse um relógio construído pelas suas mãos, obra-prima de ciência, a fim de mostrar que pode desmanchar o que fizera? Seu saber, ao contrário, não ressalta muito mais da regularidade e da precisão do movimento da sua obra?

Não é, pois, da alçada do Espiritismo a questão dos milagres; mas, ponderando que Deus não faz coisas inúteis, ele emite a seguinte opinião: Não sendo necessários os milagres para a glorificação de Deus, nada no Universo se produz fora do âmbito das leis gerais. Deus não faz milagres, porque, sendo, como são, perfeitas as suas leis, não lhe é necessário derrogá-las. Se há fatos que não compreendemos, é que ainda nos faltam os conhecimentos necessários.

16. - Admitido que Deus houvesse alguma vez, por motivos que nos escapam, derrogado acidentalmente leis por ele estabelecidas, tais leis já não seriam imutáveis. Mesmo, porem, que semelhante derrogação seja possível, ter-se- á, pelo menos, de reconhecer que só ele, Deus, dispõe desse poder; sem se negar ao Espírito do mal a onipotência, não se pode admitir lhe seja dado desfazer a obra divina, operando, de seu lado, prodígios capazes de seduzir até os eleitos, pois que isso implicaria a idéia de um poder igual ao de Deus. E, no entanto, o que ensinam. Se Satanás tem o poder de sustar o curso das leis naturais, que são obra de Deus, sem a permissão deste, mais poderoso é ele do que a Divindade. Logo, Deus não possui a onipotência e se, como pretendem, delega poderes a Satanás, para mais facilmente induzir os homens ao mal, falta-lhe a soberana bondade. Em ambos os casos, há negação de um dos atributos sem os quais Deus não seria Deus.

Daí vem a Igreja distinguir os bons milagres, que procedem de Deus, dos maus milagres, que procedem de Satanás. Mas, como diferençá-los? Seja satânico ou divino um milagre, haverá sempre uma derrogação de leis emanadas unicamente de Deus. Se um indivíduo é curado por suposto milagre, quer seja Deus quem o opere, quer Satanás, não deixará por isso de ter havido a cura. Forçoso se torna fazer pobríssima idéia da inteligência humana para se pretender que semelhantes doutrinas possam ser aceitas nos dias de hoje.

Reconhecida a possibilidade de alguns fatos considerados miraculosos, há-se de concluir que, seja qual for a origem que se lhes atribua, eles são efeitos naturais de que se podem utilizar Espíritos desencarnados ou encarnados, como de tudo, como da própria inteligência e dos conhecimentos científicos de que disponham, para o bem ou para o mal, conforme neles preponderem a bondade ou a perversidade. Valendo-se do saber que haja adquirido, pode um ser perverso fazer coisas que passem por prodígios aos olhos dos ignorantes; mas, quando tais efeitos dão em resultado um bem qualquer, fora ilógico atribuir-se-lhes uma origem diabólica.

17. - Mas, a religião, dizem, se apóia em fatos que nem explicados, nem explicáveis são. Inexplicados, talvez; inexplicáveis, é questão muito outra. Que sabe o homem das descobertas e dos conhecimentos que o futuro lhe reserva? Sem falar do milagre da criação, o maior de todos sem contestação possível, já pertencente ao domínio da lei universal, não vemos reproduzirem-se hoje, sob o império do magnetismo, do sonambulismo, do Espiritismo, os êxtases, as visões, as aparições, as percepções a distância, as curas instantâneas, as suspensões, as comunicações orais e outras com os seres do mundo invisível, fenômenos esses conhecidos desde tempos imemoráveis, tidos outrora por maravilhosos e que presentemente se demonstra pertencerem à ordem das coisas naturais, de acordo com a lei constitutiva dos seres? Os livros sagrados estão cheios de fatos desse gênero, qualificados de sobrenaturais; como, porém, outros análogos e ainda mais maravilhosos se encontram em todas as religiões pagãs da antigüidade, se a veracidade de uma religião dependesse do numero e da. natureza de tais fatos, não se saberia dizer qual a que devesse prevalecer.

O sobrenatural e as religiões

18. - Pretender-se que o sobrenatural é o fundamento de toda religião, que ele é o fecho de abóbada do edifício cristão, é sustentar perigosa tese. Assentar exclusivamente as verdades do Cristianismo sobre a base do maravilhoso é dar-lhe fraco alicerce, cujas pedras facilmente se soltam. Essa tese, de que se constituíram defensores eminentes teólogos, leva direito à conclusão de que, em breve tempo, já não haverá religião possível, nem mesmo a cristã, desde que se chegue a demonstrar que é natural o que se considerava sobrenatural, visto que, por mais que se acumulem argumentos, não se logrará sustentar a crença de que um fato é miraculoso, depois de se haver provado que não o é. Ora, a prova existe de que um fato não constitui exceção às leis naturais, logo que pode ser explicado por essas mesmas leis e que, podendo reproduzir-se por intermédio de um indivíduo qualquer, deixa de ser privilégio dos santos. O de que necessitam as religiões não é do sobrenatural, mas do princípio espiritual, que erradamente costumam confundir com o maravilhoso e sem o qual não há religião possível.

O Espiritismo considera de um ponto mais elevado a religião cristã; dá-lhe base mais sólida do que a dos milagres: as imutáveis leis de Deus, a que obedecem assim o princípio espiritual, como o princípio material. Essa base desafia o tempo e a Ciência, pois que o tempo e a Ciência virão sancioná-la.

Deus não se torna menos digno da nossa admiração, do nosso reconhecimento, do nosso respeito, por não haver derrogado suas leis, grandiosas, sobretudo, pela imutabilidade que as caracteriza. Não se faz mister o sobrenatural, para que se preste a Deus o culto que lhe é devido. A Natureza não é de si mesma tão imponente, que dispense se lhe acrescente seja o que for para provar a suprema potestade? Tanto menos incrédulos topará a religião, quanto mais a razão a sancionar em todos os pontos. O Cristianismo nada tem que perder com semelhante sanção; ao contrário, só tem que ganhar. Se alguma coisa o há prejudicado na opinião de muitas pessoas, foi precisamente o abuso do sobrenatural e do maravilhoso.

19. - Se tomarmos a palavra milagre em sua acepção etimológica, no sentido de coisa admirável, teremos milagres incessantemente sob as vistas. Aspiramo-los no ar e calcamo-los aos pés, porque tudo então é milagre em a Natureza.

Querem dar ao povo, aos ignorantes, aos pobres de espírito uma idéia do poder de Deus? Mostrem-no na sabedoria infinita que preside a tudo, no admirável organismo de tudo o que vive, na frutificação das plantas, na apropriação de todas as partes de cada ser às suas necessidades, de acordo com o meio onde ele é posto a viver. Mostrem-lhes a ação de Deus na vergôntea de um arbusto, na flor que desabrocha, no Sol que tudo vivifica. Mostrem-lhes a sua bondade na solicitude que dispensa a todas as criaturas, por mais ínfimas que sejam, a sua previdência, na razão de ser de todas as coisas, entre as quais nenhuma inútil se conta, no bem que sempre decorre de um mal aparente e temporário. Façam-lhes compreender, principalmente, que o mal real é obra do homem e não de Deus; não procurem espavori-los com o quadro das penas eternas, em que acabam não mais crendo e que os levam a duvidar da bondade de Deus; antes, dêem-lhes coragem, mediante a certeza de poderem um dia redimir-se e reparar o mal que hajam praticado. Apontem-lhes as descobertas da Ciência como revelações das leis divinas e não como obras de Satanás. Ensinem-lhes, finalmente, a ler no livro da Natureza, constantemente aberto diante deles; nesse livro inesgotável, em cada uma de cujas páginas se acham inscritas a sabedoria e a bondade do Criador. Eles, então, compreenderão que um Ser tão grande, que com tudo se ocupa, que por tudo vela, que tudo prevê, forçosamente dispõe do poder supremo. Vê-lo-á o lavrador, ao sulcar o seu campo; e o desditoso, nas suas aflições, o bendirá dizendo: Se sou infeliz, é por culpa minha. Então, os homens serão verdadeiramente religiosos, racionalmente religiosos, sobretudo, muito mais do que acreditando em pedras que suam sangue, ou em estátuas que piscam os olhos e derramam lágrimas.

Dossiê Espírito de Verdade

(In: O Espírito das Revelações, Lachâtre, 2001.)

Por Sérgio Fernandes Aleixo

“(...) discutiremos, mas não disputaremos. (...) há polêmica e polêmica; e há uma diante da qual não recuaremos jamais, que é a discussão séria dos princípios que professamos”. Allan Kardec (Revista espírita. Janeiro de 1858. Introdução. Novembro de 1858. Polêmica espírita.)

Observação: Esta matéria, publicada no livro, de nossa autoria, O ESPÍRITO DAS REVELAÇÕES (Lachâtre, 2001), constitui uma resposta a um artigo que na imprensa espírita foi certa vez publicado. Pela extensão deste nosso material, aquele órgão de comunicação julgou por bem publicá-lo apenas em parte. Como nosso objetivo é sempre tão-só esclarecer, e convicto de que respondemos aqui a muitas indagações acerca do assunto, entregamo-lo ao leitor. Não identificamos o articulista a que nos referimos, bem como o periódico. Nosso intuito é apenas a produção de conhecimento espírita, e nada mais.


Qualquer estudo reclama perseverança, máxime no âmbito da doutrina espírita. Não há razões para hesitarmos no que respeita à individualidade e à identidade do Espírito de Verdade. A obra de Kardec é a fonte impoluta a que devemos recorrer para dirimir quaisquer dúvidas em matéria de espiritismo. Assim também deve ser neste caso.

Necessário considerarmos primeiramente que o Espírito de Verdade não é uma falange. Esse conceito, aliás, não é da codificação. Para Kardec, em definitiva, o Espírito de Verdade é “inspirador” e “presidente” do “ensino” de uma “doutrina soberanamente consoladora”, personificada no Evangelho segundo João sob o nome de “Consolador”. (Cf. A gênese, XVII:39 e 40. O evangelho segundo o espiritismo, VI:4.)

Portanto, trata-se de um espírito, não de vários. A tal respeito, o mestre de Lyon assim se exprimiu: “A qualificação de Espírito de Verdade não pertence senão a um e pode ser considerada como nome próprio; ela é especificada no Evangelho. De resto, esse espírito se comunica raramente, e somente em circunstâncias especiais; deve-se manter em guarda contra aqueles que se apoderam indevidamente desse título”. (Revista espírita. Julho de 1866. Qualificação de santo aplicada a certos espíritos. IDE, Tomo IX, p. 222.)

O Espírito de Verdade, ao demais, assina O livro dos espíritos juntamente com outras individualidades espirituais; fosse ele o nome de uma coletividade de espíritos e tornaria inúteis as demais assinaturas. (Cf. Exposição Preliminar, ou Prolegômenos.)

Superada esta questão da individualidade do Espírito de Verdade, elucidemos o problema crucial de sua identidade.

Em 25 de março de 1856, o guia espiritual do mestre lionês disse-lhe: “Para ti chamar-me-ei a Verdade”. (Cf. Obras póstumas.) Evidente, para nós, que é Jesus, o único espírito que se pode declarar dessa forma sem prejuízo à sua honestidade. (Cf. João 14:6.) Mas, a fim de confirmarmos isso em termos rigorosamente kardecianos, basta uma consulta ao item 48 de O livro dos médiuns, no qual, ao refutar o sistema unispírita, o codificador trata Jesus por “o Espírito da Verdade”, “o Espírito do bem por excelência”, “santo entre todos”. Este texto não permite ambigüidades. É inapelável. Não podemos desmenti-lo sem desmentir o próprio Allan Kardec. Poderíamos encerrar aqui este assunto. O Espírito de Verdade é Jesus!

Porém, na mesma obra, devemos perscrutar ainda a nota do mestre lionês à dissertação IX do capítulo XXXI. Tal dissertação, que em O livro dos médiuns aparece assinada por “Jesus de Nazaré”, figura em O evangelho segundo o espiritismo (VI:5) como de autoria de “o Espírito de Verdade”, o que constitui prova inconcussa de que ambos são a mesma individualidade.

Diz Kardec que o espiritismo “é obra do Cristo, que preside, conforme também o anunciou, à regeneração que se opera e prepara o reino de Deus na Terra”. (O evangelho segundo o espiritismo, I:7.) Ao mesmo tempo, afirma também o codificador, indistintamente, que “o Espírito de Verdade preside ao grande movimento da regeneração”, e que esse espírito “é o verdadeiro Consolador” (A gênese, I:42), decerto, o mesmo “Cristo Consolador” do capítulo VI de O evangelho segundo espiritismo.

Se ainda hesitarmos, é só conferirmos o que é dito ao mestre quando escreve, em Ségur, O evangelho segundo o espiritismo: “Acaba a tua obra e conta com a proteção do teu guia, guia de todos nós (...) Conta conosco e conta sobretudo com a grande alma do mestre de todos nós, que te protege de modo muito particular”. (Obras póstumas, 9 de agosto de 1863.)

Além destas provas, há outras ainda.

Na Revista espírita de outubro de 1861, o prudentíssimo Erasto revela em sua epístola aos espíritas lioneses: “(...) o Espírito de Verdade, nosso mestre bem-amado (...)”. (IDE, Tomo IV, p. 303.) Já na Revista espírita de janeiro de 1864, o sábio Hahnemann afirma: “(...) o Espírito de Verdade, que dirige este Globo (...)”. (Um caso de possessão. Senhorita Julie. IDE, Tomo VII, p. 16.)

Em maio de 1864, o Espírito de Verdade comunicou-se em termos reveladores, dizendo, entre outras coisas, o seguinte: “Há dezoito séculos eu vim, por ordem de meu Pai (...). Hoje, por ordem do Eterno, os bons espíritos, seus mensageiros, vêm sobre todos os pontos do globo fazer ouvir a trombeta retumbante. Escutai as suas vozes; são aquelas destinadas a vos mostrar o caminho que conduz aos pés do Pai celeste. Sede dóceis aos seus ensinos; os tempos preditos são chegados; todas as profecias serão cumpridas (...)”. (Revista espírita. Dezembro de 1864. Comunicação espírita. A propósito de A Imitação do Evangelho. IDE, Tomo VII, p. 399.)

Em sua nota à citada comunicação, Kardec mostra a circunspecção, a cautela e a modéstia que sempre o caracterizaram, ressaltando, porém, que, descartadas as evidentemente apócrifas, em muitas comunicações que trazem o nome Espírito de Verdade, ou o nome Jesus, “(...) embora obtidas por médiuns diferentes e em épocas diferentes, nota-se entre elas uma analogia evidente de tom, de estilo e de pensamentos que acusa uma fonte única.” (Ibidem, p. 400.)

Numa comunicação de 9 de abril de 1856, o guia espiritual de Kardec dizia ao então futuro codificador do espiritismo, entre outras coisas: “Nesse mundo, a vida material é muito de ter-se em conta; não te ajudar a viver seria não te amar”. Em nota que bem mais tarde apôs a essa comunicação, o próprio mestre lionês demonstra ter vindo a saber quem era esse guia, e demonstra ainda ter-se surpreendido bastante com isso: “A proteção desse espírito, cuja superioridade eu então estava longe de imaginar, jamais, de fato, me faltou”. (Obras póstumas. 25 de março de 1856.)

Ora! Em termos rigorosamente kardecianos está dirimida esta dúvida quanto à individualidade e à identidade do Espírito de Verdade. Ele é único! Ele é Jesus! A menos que não confiemos em Kardec e nos espíritos da codificação.

Resta então apenas o problema da exegese escriturística, e esse é outro departamento, mas que também pode ser elucidado pela aplicação adequada do conhecimento espírita.

Quando Jesus disse que enviaria o Consolador, o Espírito de Verdade, se referiu simbolicamente à doutrina, nada obstante a, por outro lado, afirmar: “A vós convém que eu vá, porque, se eu não for, não virá a vós o paráclito (...) Não vos deixarei órfãos, voltarei a vós outros (...) Tenho ainda muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora (...) Estas cousas vos tenho dito por meio de figuras; vem a hora em que não vos falarei por meio de comparações, mas vos falarei claramente a respeito do Pai”. (João 14:18; 16:7,12 e 25.) Isto já nos convida ao entendimento de que o próprio Jesus se encarregaria, mais tarde, de ensinar espiritualmente aquilo que não pudera quando encarnado.

Não há contradição. Há simbologia. Não nos informou João Evangelista que, pela compreensão do espiritismo, explicados, os “erros” se tornariam verdades? (Cf. O evangelho segundo o espiritismo, VIII:18.)

Por ser o Espírito de Verdade o próprio Jesus e por esse fato constituir o cumprimento das profecias acima citadas é que o mestre lionês assegurou, convicto: “Jesus reservou para si a completação ulterior de seus ensinamentos”. (A gênese, XVII:37.) Claro que o Cristo não estava sozinho, fez-se acompanhar de numerosa coletividade superior, a qual, por ter o seu comando direto, foi chamada “falange do Espírito de Verdade”, ou “do Consolador”. O Espírito de Verdade (segundo Kardec, “o verdadeiro Consolador”) não é, portanto, a falange em si, mas o comandante dela, o que é muito diferente.

Se o Espírito de Verdade fosse uma coletividade de espíritos, razão não haveria para que a promessa de sua vinda não houvesse sido cumprida no dia de pentecostes, como afirmam as igrejas ter acontecido, pois o que ocorreu naquele dia foi justamente um encontro mediúnico entre o apostolado cristão primitivo e uma excelsa coletividade de espíritos. (Cf. Atos, 2.)

Allan Kardec, porém, diz em A gênese (cf. XVII:42) que, no pentecostes, não se cumpriu o que Jesus profetizara do Consolador. E por quê? Porque as características declinadas pelo Cristo não se referiam propriamente a uma coletividade de espíritos, mas a uma doutrina; a chefia dessa coletividade e a responsabilidade maior pelo advento de tal doutrina é do Espírito de Verdade: inapelavelmente, Jesus. Kardec e os espíritos superiores é que o asseguram.

Ora! Se a codificação a define tão claramente, não podemos considerar esta verdade como simples conjectura. Ou será que estamos nos esforçando em cumprir aquela profecia do Espírito de Verdade, a qual adverte para o fato de que as melhores instruções de Kardec seriam desprezadas e falseadas? (Cf. Obras póstumas, 12 de junho de 1856.)

Ouçamos, por fim, o que nos diz o instrutor espiritual Alexandre, em Missionários da luz, obra ditada por André Luiz ao médium Francisco Cândido Xavier: “Por que audácia incompreensível imaginais a realização sublime sem vos afeiçoardes ao Espírito de Verdade, que é o próprio Senhor?”. (Cf. 21ª ed., FEB, 1988, p. 99). Alguma dúvida, leitor amigo?

No que tange às objeções ao fato de ser Jesus o Espírito de Verdade, nós as respeitamos enquanto expressão das possibilidades de estudo e compreensão daqueles que as utilizam... Entretanto, repetimos a frase com que iniciamos este artigo: Qualquer estudo reclama perseverança, máxime no âmbito da doutrina espírita.

Fonte: Revista Internacional de - Março/2000

domingo, 3 de abril de 2011

As Advertências de Kardec a Roustaing e a Profecia de Erasto

Por Sérgio Aleixo

Na Revista Espírita de junho de 1863 há um artigo kardeciano sobre a não retrogradação dos Espíritos. Este texto foi citado pelo advogado de Bordéus e submetido ao exame dos autores espirituais de Os Quatro Evangelhos no número 59 da obra. Os guias da pretendida Revelação da Revelação concluíram que os que pensam ser a encarnação uma necessidade geral “não foram esclarecidos, ou não refletiram bastante”.

Kardec diz em seu artigo de junho de 1863 que a ideia rustenista de que “os Espíritos não teriam sido criados para encarnarem”, que “a encarnação seria tão somente o resultado de sua falta”, constitui um sistema “especioso à primeira vista”, e que “tal sistema cai pela mera consideração de que, se nenhum Espírito tivesse falido, não haveria homens na Terra, nem em outros mundos”.

Segundo o Codificador, o homem “é uma das engrenagens essenciais da criação” e, por esta razão, “Deus não podia subordinar a realização desta parte de sua obra à queda eventual de suas criaturas, a menos que contasse para tanto com um número sempre suficiente de culpados para fornecer operários aos mundos criados e por criar”. Para Kardec: “O bom-senso repele tal ideia”.

Mas a isto responderam os guias de Roustaing: “A última frase deve ser riscada”. E mesmo confessando que era “cedo” para resolver a “origem do Espírito” — em relação ao quê, aliás, Kardec já recomendara máxima cautela[1] —, os guias rustenistas exortaram a vaidade da sensitiva e do próprio jurisconsulto assim:

Utilizai-vos do que vos dizemos [sobre a origem das coisas], porquanto, ao tempo em que este vosso trabalho aparecer aos olhos de todos, os Espíritos encarnados já se acharão mais dispostos a receber o que então [quando, em O Livro dos Espíritos, foi dito que o Espírito era criado simples e ignorante], e mesmo hoje [abril de 1863], tomariam por uma monstruosidade, ou por uma tolice ridícula.[2]

Kardec reafirmou em seu artigo de junho de 1863 a doutrina de O Livro dos Espíritos e negou a tese rustenista que assegura que a reencarnação é ocasionada por castigo a Espíritos faltosos. Isto prova irrefutavelmente que não é verdadeira a propaganda centenária da F.E.B., a qual sempre deu conta de que Kardec e Roustaing só divergiam quanto à natureza do corpo de Jesus, concordando em tudo mais.

O Codificador disse em alto e bom som que o estado primitivo do Espírito não é o de “inocência inteligente e raciocinada”. Estes termos utilizados pelo mestre lionês em junho de 1863 resumem com precisão as teses “especiosas” da Revelação da Revelação que, no entanto, somente seria publicada três anos depois. Se não, vejamos:

Atingindo o ponto de preparação para entrarem no reino humano, os Espíritos se preparam, de fato, em mundos ad-hoc, para a vida espiritual consciente, independente e livre. É nesse momento que entram naquele estado de inocência e de ignorância. A vontade do soberano Senhor lhes dá a consciência de suas inocência e faculdades e, por conseguinte, de seus atos, consciência que produz o livre-arbítrio, a vida moral, a inteligência independente e capaz de raciocínio, a responsabilidade. Chegado deste modo à condição de Espírito formado, de Espírito pronto para ser humanizado se vier a falir, o Espírito se encontra num estado de inocência completa, tendo abandonado, com os seus últimos invólucros animais, os instintos oriundos das exigências da animalidade. [...] Os que se conservam puros também desenvolvem atividades e inteligência, a fim de progredirem, no estado fluídico, por meio dos esforços espirituais que necessitam fazer para, da fase de inocência e de ignorância, de infância e de instrução, chegarem, sem falir, à perfeição![3]

Esta flagrante coincidência de vocábulos e a citação, no número 59 de Os Quatro Evangelhos, da absoluta negativa de Kardec à tese da “queda” evidenciam que, de alguma sorte, já em 1863, o Codificador havia tomado ciência do material que estava sendo compilado por Roustaing desde dezembro de 1861. Ponderava o saudoso confrade Gélio Lacerda da Silva, ex-presidente da Federação Espírita do Estado do Espírito Santo:

Para entender como Kardec contestou, em 1863, um assunto que Roustaing veiculou no seu livro, publicado em 1866, tudo leva a crer que Roustaing, antes do seu livro vir a público, já divulgava o seu conteúdo. Foi em abril de 1863 que os Espíritos mistificadores ditaram a Roustaing, através de Mme. Collignon, o ensino antidoutrinário de que o Espírito só será humanizado se vier a falir, conforme nota de rodapé da pág. 295, 1.º volume, 5.ª ed. de Os Quatro Evangelhos; portanto, não há dúvida de que Kardec, em junho de 1863, no seu referido artigo, se louvou na mensagem ditada a Roustaing em abril de 1863.[4]

E aduzo a isto um fato relevante. O Codificador, certa vez, publicou carta da médium Émilie Collignon encaminhando a si ditados espirituais. Acreditara a sensitiva que um desses comunicados era de um espírito que, antes, se apresentara a Kardec em substituição ao de Gérard de Codemberg. Rebatidos os argumentos da médium, o gênio lionês diz-lhe que o texto “apresenta todos os caracteres de uma comunicação apócrifa.”[5]

A seguir, Kardec publica mensagem do Espírito Bernardin à mesma sensitiva, na qual se apregoa na conta de “pensamento filosófico”, “cheio de sabedoria”, o suposto fato de que “somos uma essência criada pura, mas decaída; pertencemos a uma pátria onde tudo é pureza; culpados, fomos exilados por algum tempo, mas só por algum tempo”. Já era a doutrina rustenista da queda do espírito!

Em clara reparação, o mestre recomenda, entre parênteses, a leitura de seu aclamado artigo de janeiro de 1862, sobre a doutrina dos anjos decaídos, bem como, em sua observação final, adverte para o perigo de, em certas comunicações, espíritos não muito elevados emitirem opiniões pessoais, que refletem apenas sistemas e ideias nem sempre justos acerca dos homens e das coisas. Segundo Kardec:

Publicadas sem corretivo, essas ideias falsas apenas lançarão descrédito sobre o Espiritismo, fornecerão armas aos seus inimigos e semearão a dúvida e a incerteza entre os neófitos. Com os comentários e as explicações dados a propósito, o próprio mal por vezes se torna instrutivo. Sem isto poderiam responsabilizar a doutrina por todas as utopias enunciadas por certos Espíritos mais orgulhosos que lógicos. Se o Espiritismo pudesse ser retardado em sua marcha, não seria pelos ataques abertos de seus inimigos declarados, mas pelo zelo irrefletido dos amigos imprudentes. Não se trata, pois, de fazer coletâneas indigestas, onde tudo se acha amontoado confusamente e cujo menor inconveniente seria aborrecer o leitor; é preciso evitar com cuidado tudo quanto possa falsear a opinião sobre o Espiritismo. Ora, tudo isto exige um trabalho que justifica a demora de tais publicações.[6]

A situação não era de todo boa para a médium, que já estava recebendo a pretensa Revelação da Revelação desde de dezembro de 1861, o que se estenderia até maio de 1865,[7] e em clima, agora, quem sabe, de provável melindre, em função destes pareceres desfavoráveis de Kardec. Anote o estudioso que o mestre lionês fala, em sua observação, sobre “Espíritos mais orgulhosos que lógicos”, “zelo irrefletido dos amigos imprudentes” e “coletâneas indigestas, onde tudo se acha amontoado confusamente e cujo menor inconveniente seria aborrecer o leitor”. Não resta dúvida! O material rustenista foi enviado a Kardec já em 1862, mas o mestre logo lhe percebeu as inconsistências e perigos.

Roustaing, portanto, pôde contar com a prévia advertência do Codificador, que se dignou até poupá-lo do ridículo, dada sua distinção social, não lhe mencionando o nome naquele artigo de junho de 1863, sobre a não retrogradação dos Espíritos. Elegante, mas firme, Kardec definiu a tese rustenista da queda como “um sistema que tem algo de especioso à primeira vista”, argumentado da forma que já destaquei de início.

O jurisconsulto bordelês, portanto, deveria ter acatado o entendimento do seu “muito honrado chefe Espírita”. Foi dada a Roustaing a oportunidade de desistir daquele trabalho, todavia não o interrompeu; na certa, por orgulho ferido. Um ex-presidente da Ordem dos Advogados, membro do Tribunal Imperial de Bordéus, a ser “desacatado” por um professor lionês radicado em Paris. Não, isto não podia ser, ainda mesmo que se tratasse de um autor pedagógico aclamado.

A médium Collignon e o advogado Roustaing. Ambos em situação de evidente mágoa por não haverem obtido de Kardec o respaldo que ambicionavam para seus trabalhos mediúnicos. Combinação explosiva que gerou o primeiro cisma no movimento espírita, cujos ecos, infelizmente, se podem ouvir ainda.

Não bastassem estas advertências de Kardec, Espíritos orientadores haviam expedido alertas a respeito de um ataque de entidades mistificadoras na cidade de Bordéus. Durante a sessão geral lá ocorrida a 14 de outubro de 1861, Kardec leu, após o seu discurso, uma epístola de Erasto aos espíritas daquela localidade. [8]

Em voz um tanto mais severa, o amigo espiritual da codificação kardeciana assegurou ser necessário premunir os espíritas bordeleses contra um perigo que era seu dever lhes assinalar. Erasto avisou-os, então, do iminente assalto de uma turba de Espíritos enganadores, cuja finalidade seria fomentar a cisão, a divisão, e levar a uma ruptura por todos os títulos lamentável. Repetindo o que os próprios guias espirituais do movimento em Bordéus disseram aos espíritas daquela cidade, Erasto esclareceu que haveria dois tipos de mistificadores no ataque. Um tipo viria com combinações abertamente hostis aos ensinos dos legítimos missionários do Espírito de Verdade, este, o presidente da regeneração planetária e guia pessoal de Kardec e do Espiritismo. Outro tipo de mistificadores, porém, apresentar-se-ia com dissertações sabiamente combinadas, nas quais, graças a tiradas piedosas, insinuariam a heresia ou algum princípio dissolvente.

Roustaing tomou conhecimento da epístola por terceiros? Ou, como adeptos seus afirmam hoje sem provas, esteve presente à sessão geral? De qualquer forma, não foi por falta de mais este aviso que cometeu o erro de publicar sua pretensa Revelação da Revelação, cujos ditados começariam a aparecer já em dezembro daquele ano, dois meses depois da sessão geral, insinuando exatamente a heresia gnóstico-docetista do Jesus fluídico e o princípio dissolvente da reencarnação como resultado de uma suposta queda, espécie de falência, verdadeira retrogradação que, segundo os guias rustenistas, seria aplicável até a Espíritos com responsabilidades planetárias.[9]

Tudo se deu tal qual a predição. Foi um vaticínio de Erasto; na ocasião, mensageiro do Espírito de Verdade; este último, aliás, alguns Espíritos ligados à Igreja dos primeiros tempos já haviam identificado como Jesus, em casa do Sr. Roustaing e do Sr. Sabo, a quem Kardec recomendou o primeiro, para que se iniciasse no Espiritismo. Ao lado do mal, vê-se que Deus pusera o remédio, mas não foi usado.[10]

A nomenclatura criada por Kardec — a palavra Espiritismo, inclusive — estava em toda a suposta Revelação da Revelação, mesmo no título: “Espiritismo cristão”. Como se nunca fora dito por Kardec: “O ponto essencial é que o ensinamento dos Espíritos é eminentemente cristão: ele se apoia na imortalidade da alma, nas penas e recompensas futuras, no livre-arbítrio do homem, na moral do Cristo, e portanto não é antirreligioso”.[11]

O fato é que Roustaing, infelizmente, se apoderou do nome e dos termos de uma doutrina cuja codificação nunca lhe coube. Além disto, nem ele nem seus discípulos jamais demonstraram em quê, afinal de contas, a tese basilar de sua “escola” se distingue da antiga tese dos gnósticos docetistas. No dizer autorizado de E. Pagels, a antiga seita postulava que “Jesus não era um ser humano, e sim um ser espiritual que se adaptara à percepção humana”,[12] ou seja, conforme no Espiritismo se diz: um agênere.

Não se trata, claro, de o agênere desenvolver percepção física, mas, isto sim, de adaptar-se à percepção humana, isto é, de terceiros, a fim de que o possam notar, mesmo desencarnado; tanto assim, que os rustenistas apregoavam que Jesus não tinha “corpo material humano, sujeito à morte”, que “não podia sofrer segundo o nosso modo de entender material” e que — pasmem — “não morreu efetivamente no Gólgota”.[13] Oras! Diz o Espiritismo mui contundentemente:

[...] o Espírito que não tem corpo material não pode experimentar os sofrimentos que são o resultado da alteração da matéria, de onde também é forçoso concluir que, se Jesus sofreu materialmente, do que não se pode duvidar, é porque tinha um corpo material de natureza semelhante à dos corpos de toda a gente.[14]

Acresça-se a isso o flagrante de que, para o rustenismo, na prática, a carne humana é mesmo um efeito “do mal”; apenas a assumem os Espíritos que são punidos por faltas cometidas no “estado fluídico”. E o docetismo, segundo Pastorino, entendia exatamente isto: “[...] tudo o que é material é imperfeito e impuro, pois é obra do Princípio do Mal; como Jesus apresentara o Princípio do Bem, o Pai, não podia ter-se submetido ao Princípio do Mal e, portanto, não poderia ter tido corpo físico carnal”.[15]

De fato, neste texto de Os Quatro Evangelhos, dentre outros, pode-se constatar o horror dos guias docetistas ao corpo humano, vinculando-o à “lama”, ao “sofrimento”, à “falibilidade”; tornando-o efeito inerente à condição de “culpado”:

Maior ainda era a diferença entre esse corpo de Jesus e os vossos corpos de lama. [...] não o esqueçais: todo aquele que reveste a carne e sofre, como vós, a encarnação material humana é falível. Jesus era demasiadamente puro para vestir a libré do culpado. Sua natureza espiritual era incompatível com a encarnação material, tal como a sofreis. (Vol. I, n. 14.)

Possível seria concluir então, com os guias rustenistas, que Jesus não cometeu imperfeições morais quando esteve na Terra não só porque nunca as praticara nos planos do Espírito, mas também porque não estava revestido da carne humana. A instrução 625 de O Livro dos Espíritos caducaria.

Sim, pois que valor possuiria para nós o guia e o modelo de uma perfeição que lhe foi conferida por processo evolutivo diferente daquele em que nos encontramos? Seria um guia errado, um modelo errado para uma humanidade errada, porque nada saberia de nossa vida terrestre, com a qual sua pureza sempre teria sido incompatível.

E mais: Jesus teria mentido quando disse a Nicodemos: “Falo do que sei; dou testemunho do que vi”, porquanto nada conheceria nem nada teria visto acerca da nossa experiência humana. O rustenismo, por estas e outras, é um insulto à autoridade moral e espiritual do Mestre de Nazaré, a despeito de supor exaltá-la.

[1] “São essas opiniões pessoais que os Espíritos orgulhosos nos dão como verdades absolutas. É sobretudo a respeito do que deve permanecer oculto, como o futuro e o princípio das coisas, que eles mais insistem, a fim de darem a impressão de que conhecem os segredos de Deus. E é também sobre esses pontos que há mais contradições.” (O Livro dos Médiuns, 300.)
[2] Os Quatro Evangelhos. Vol. I, n. 56. F.E.B, 5.ª ed., 1971, p. 295. Entre colchetes, palavras minhas.
[3] Os Quatro Evangelhos. Vol. I, ns. 56 e 59.
[4] Conscientização Espírita. Do Princípio da Não Retrogradação dos Espíritos.
[5] Revista Espírita. Jun/1862. Princípio Vital das Sociedades Espíritas.
[6] Revista Espírita. Jun/1862. Ensinos e Dissertações Espíritas. O Espiritismo Filosófico. Bordeaux, 4 de abril de 1862. Médium: Sra. Collignon. Observação [de Kardec].
[7] Cf. Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 5.ª ed., 1971, pp. 64 e 66.
[8] Revista Espírita. Nov/1861. Primeira Epístola de Erasto aos Espíritas de Bordéus.
[9] Os Quatro Evangelhos. Vol. I, n. 59. F.E.B, 5.ª ed., 1971, p. 325-326. Cf. Cap. 14: Estranhezas do Ensino Rustenista.
[10] Cf. Revista Espírita. Jun/1861. Correspondência.
[11] O Livro dos Espíritos, 222.
[12] Os Evangelhos Gnósticos, IV.
[13] Os Quatro Evangelhos. Prefácio. F.E.B., 1920, p. 59.
[14] KARDEC, Allan. A Gênese, XV, 65.
[15] Sabedoria do Evangelho. Vol. 3. Jesus Anda Sobre a Água.

Retirado do blog "O Primado de Kardec" - http://oprimadodekardec.blogspot.com/2011/02/capitulo-4-as-advertencias-de-kardec.html