segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O Livro dos Espíritos

Por Nair de Moraes

A Editora Dentu, Palais-Royal – Paris - publicou em 18 de abril de 1857, de Allan Kardec, O Livro dos Espíritos.

O Courier de Paris, de 11 de junho de 1857 (Revista Espírita – janeiro de 1858), trouxe um artigo assinado por G. Du Chalard que procurou informar os leitores sobre o valor e o significado da obra.

"Notável, curiosa" são os dois adjetivos empregados por Chalard para defini-la. Não arriscou mais, afirma, por julgar qualquer classificação banal, diante da importância do conteúdo apresentado.

Considerando-a como "uma página nova no grande livro do infinito", escreve não conhecer o autor mas, proclama bem alto, gostaria de conhecê-lo porque quem escreveu a introdução (Kardec) "deve ter uma alma aberta a todos os sentimentos nobres".

Descreve o local onde leu o livro: "há vinte léguas de Paris, ao cair da tarde quando em nossa volta tínhamos apenas algumas cabanas esparsas, pensamos naturalmente em coisas muito diversas da bolsa de valores, do macadame dos bulevares ou das corridas de Longchamps".

Posiciona-se como alguém que muitas vezes se interrogava "a respeito do que se passava nas regiões que se convencionou chamar de o Alto". Chegou a esboçar "uma teoria sobre os mundos invisíveis", porém guardou-a só para si. Sentia-se feliz agora por encontrá-la "quase que por inteiro no livro do Sr. Allan Kardec".

Exortam então, a todos os deserdados da Terra, "a todos quantos regam com suas lágrimas o pó da estrada" a ler O Livro dos Espíritos, pois ele os tornaria mais fortes !
Convida, também, "aos felizes, aos que pelo caminho só encontram as aclamações e os sorrisos da fortuna" a estudá-lo, e ele os tornaria melhores.

A obra é dos Espíritos que a ditaram, como o próprio Kardec afirmou. Chalard, entretanto, comenta que se as respostas dos Espíritos são por vezes sublimes, é necessário atribuir um grande mérito a Kardec, que soube provocá-las pelas suas perguntas.

Desafia aos mais incrédulos a rirem "quando lerem esse livro no silêncio e na solidão" e conclui: "todos honrarão aquele que escreveu o prefácio".

Analisando de forma admirável a obra do Codificador, resume a doutrina na expressão "não façais aos outros o que não quereis que vos façam" e convida ao homem de estudo, que tem a fé apenas necessitada de instruir-se, a ler o Primeiro Livro; à criatura que só se preocupa consigo mesma e nada enxerga além dos próprios interesses, a ler as Leis Morais e àquele que a desgraça persegue e a dúvida tortura, a ler o terceiro livro, Esperanças e Consolações.

Note-se que Chalard está se referindo à primeira edição de O Livro dos Espíritos. A segunda edição, publicada em março de 1860, refundida e ampliada é a que conhecemos através da tradução de diferentes autores. Nela, Esperanças e Consolações é o quarto livro.

A CODIFICAÇÃO E O LIVRO DOS ESPÍRITOS

O Livro dos Espíritos representa o arcabouço geral da Codificação, como bem definiu Herculano Pires em artigo escrito em 1957, comemorando os cem anos do surgimento da Doutrina. Examinando-o em relação às demais obras de Kardec, observa-se, diz ele, que estas partem de seu conteúdo. Assim, O Livro dos Médiuns (1861) tem sua origem no Livro II (Mundo Espírita ou dos Espíritos), que focaliza especialmente a parte experimental da Codificação.

O Evangelho Segundo o Espiritismo (1864) é uma decorrência natural do Livro III, que estuda as leis morais, como aplicação prática dos princípios da moral cristã.

O Céu e o Inferno (1865) surge do Livro IV (Esperanças e Consolações), no qual Kardec examina o que aguarda o Espírito após a morte, vida futura na linguagem do Codificador, e consequentemente os conceitos de céu, inferno, purgatório, penas eternas e ressurreição da carne.

A Gênese (1868) representa uma retomada dos assuntos estudados no Livro I (As Causas Primárias) e de alguns capítulos do Livro II, nos quais Kardec examina a evolução do princípio inteligente através da matéria e da sua peregrinação pelos diferentes mundos do Universo.

A Codificação forma um todo homogêneo e coerente. De um modo geral, certos temas colocados em O Livro dos Espíritos têm o seu desenvolvimento em obras posteriores.

As ligações entre o Espiritismo e o Cristianismo, por exemplo, se definem completamente em O Evangelho Segundo o Espiritismo; o problema da origem do homem encontra a sua tese final em A Gênese; as questões mediúnicas acham suas respostas em O Livro dos Médiuns, e os problemas teológicos e escriturísticos, em O Céu e o Inferno.

Herculano Pires, após essa magnífica análise, faz uma observação que representa um desafio aos estudiosos do Espiritismo: as ligações assinaladas podem e devem ser esclarecidas em profundidade por um estudo minucioso do conteúdo das diversas partes de O Livro dos Espíritos, em confronto com as demais obras.

Esse estudo exigiria, complementa Herculano arrancando uma exclamação de surpresa do aprendiz, uma análise dos textos primitivos, das primeiras edições, que foram, como se sabe, ampliadas por Kardec nas edições seguintes.

O Livro dos Espíritos completou 147 anos! As aprecições de Chalard e de Herculano Pires nos levam a refletir: será que conhecemos em toda a sua extensão a obra que representa não só a pedra fundamental mas o núcleo central, o delineamento da Doutrina Espírita?

Se a dúvida for a resposta, aceitemos o convite com o qual Charlard encerra o seu artigo:
"Todos quantos aninham pensamentos nobres no coração e acreditam no bem, leiam o livro da primeira à última página".

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