terça-feira, 3 de maio de 2016

Educação dos Espíritos

22:11 Posted by Fabiano Vidal , , No comments
Por Maria Ribeiro

Na escala espírita descrita por Kardec, embora nada tendo de absoluta, é possível compreender a heterogeneidade na qual vivemos, tanto moral quanto intelectual.

Entretanto, a escala abrange categorias de Espíritos que já alcançaram um grau intelectivo sobre o bem e o mal, visto que, na última classe, a dos Espíritos impuros, suas características apontam que têm propensão ao mal e possuem todas as más paixões. Ora, de acordo com a questão 191, os Espíritos que possuem paixões é que fizeram algum progresso; logo, os impuros fazem uso do seu livre arbítrio optando sempre por fazer o mal. Estes os Espíritos vinculados à Humanidade terrestre.

A escala não abrange os Espíritos primitivos, visto que, a priori, a Terra não lhes corresponde e, na Revista Espírita de março de 1858, Kardec faz descrição onde isola a nona classe, a dos impuros, para caracterizar o que seria um mundo habitado "quase" que exclusivamente por eles.

Porém, em outubro de 1860, há uma outra descrição psicografada de Marte, tomado como um planeta inferior à Terra, onde afirma-se que seria a primeira habitação dos Espíritos, seres rudimentares, desprovidos de beleza e inteligência. Por primeira habitação dos Espíritos pode-se entender que o Espírito acaba de sair dos liames da animalidade, onde adquire o raciocínio contínuo e passa a habitar um corpo mais próximo do humanoide; portanto, Espíritos primitivos.
A Terra é habitação de todos os Espíritos da terceira ordem e, de acordo com a questão 176 de O Livro dos Espíritos, aqui os há nos mais variados graus de moralidade e inteligência. Cabe tentar uma análise onde se possa separar quem são os Espíritos impuros e os primitivos. E assim, pode-se pensar que todo Espírito primitivo seja impuro, mas os impuros não são necessariamente primitivos. Isto porque os Espíritos impuros sejam já experimentados em várias encarnações, nas quais não demonstram a boa vontade para aprenderem a domar as más tendências, se apaixonando pelos vícios e relutando contra as leis naturais. Daí o serem encaminhados para os mundos primitivos, mais adequados aos seus comportamentos. A Terra, segundo as Letras Espíritas, planeta de provas e expiações, guarda relações com seres impuros, já que admite esta classe entre seus habitantes. Ora, então seria necessário que estes viessem ao planeta para que se cumprissem algumas das circunstâncias que põem as provas e as expiações nos caminhos dos indivíduos?

Embora os Espíritos assegurem que a humanidade tem progredido e a própria realidade aponte para avanços no comportamento humano, há os que defendem, levianamente, que "de uns tempos para cá, a coisa está pior", esquecidos das barbáries narradas desde os tempos bíblicos.

Há algumas atitudes humanas que levam muitos a questionarem se realmente partem de um ser humano. Dentre estas, muitas podem partir de Espíritos impuros ou primitivos, que não desenvolveram sentimentos mais nobres, embora os segundos estejam em suas primeiras experiências.

Vale lembrar a passagem intitulada Assassinato de cinco crianças por outra de doze anos - Problema moral, anotada no mês de outubro da RE de 1858.

É preciso também saber discernir o grau de proximidade entre tais estados evolutivos e as supostas patologias mentais, que podem levar a desequilíbrios que causem danos sociais. Sabe-se que o córtex cerebral é o mais recente tecido que agregou-se ao encéfalo. Está dividido em lobos: frontal, um par parietal, um par temporal e lobo occipital, além do lobo límbico. Está conectado às áreas sensoriais e motoras. O lobo frontal é o responsável, por exemplo, pelo julgamento, pelo auto-controle e pelas emoções. Este lobo se desenvolveu muito em todos os primatas sociáveis.  Lesões no lobo frontal podem tornar o indivíduo apático, antissocial, indiferente. Segundo as teorias sobre o desenvolvimento humano, as mudanças corporais incluem o aumento significativo da área cerebral, e evidentemente, as funções se ampliaram. E este desenvolvimento material é que proporciona ensejo de o Espírito por em prática suas potencialidades.

Estando um Espírito primitivo, por exemplo, encarnado sobre a Terra, por causa da lei de hereditariedade, também possuirá a mesma estrutura encefálica organizada dos nativos, embora nestes ela esteja em condições de uso segundo suas conquistas intelecto-morais. Em contrapartida, as aquisições intelecto-morais requerem instrumento capaz de exprimi-las, o que faz concluir que o desenvolvimento físico seja uma exigência natural daquele. Portanto, ainda considerando um Espírito primitivo encarnado num mundo mais adiantado, apesar de possuir uma estrutura física cerebral idêntica aos demais, existem áreas inativas, ou morfologicamente diferentes, o que poderá comprometer sua fisiologia. Semelhantemente ao que ocorre quando uma lesão patológica, como os tumores, se instala no cérebro.

O caso ilustrado não se refere, entretanto, a uma lesão física e patológica, mas a uma condição evolutiva de um ser desprovido de elementos mentais que preencham sua morfologia atual, pois que suas potencialidades se encontram latentes.
O mesmo já não se aplicaria a um Espírito impuro que, a despeito das várias experiências, é refratário ao bom aprendizado e às inspirações dos bons Espíritos, perseverando no caminho da deliberada maldade, demonstrando-se um ser verdadeiramente rebelde. Mas nem por isso sua funcionalidade cerebral seja menos comprometida, com a diferença de que, tendo elementos mentais (distinguem o bem do mal), não desenvolveram moralidade que pudesse se adaptar às estruturas físicas  que possuem, então são como que atrofiadas. Ou seja, a Mente não está bem representada pelo cérebro.

Estudos realizados¹ comprovam que as lesões no córtex frontal produzem diversos transtornos de comportamento. O que pode se potencializar se também estiver associado a traumas psicológicos.

Em várias ocasiões o nobre codificador se referiu à educação como único meio eficaz de transformar o homem. Porém nossas instituições ainda não logram vantagem efetiva pela falta do conhecimento do Espírito e suas exigências, já que elas mesmas são constituídas de homens limitados. Kardec fala de uma educação moral, e não necessariamente da instrução tão somente, visto que esta sozinha se mostra incapaz de tornar um homem mau em bom. Isto porque o maior mal do homem não é a ignorância das ciências que dominam o mundo físico, mas das que prevalecem no mundo moral.

O fato de o planeta estar povoado de várias categorias de Espíritos faz que se reflita sobre as legislações vigentes, que, em suas deficiências, ainda contam com a desvantagem de não agirem individualmente. Pois as várias nuances da Mente humana traz implicações em todos os setores sociais, mas predominantemente nos trâmites criminais e as aplicabilidades das leis que possam interferir no caráter dos indivíduos.
Até hoje as leis são punitivas, sem o compromisso de atribuir ao réu o dever e também o direito da correção. Punições podem intimidar, mas não aniquilam os maus hábitos, que podem ser corrigidos através da educação moral de que noticia Kardec.

Diante disso, parece que também nesta há uma hierarquia, indo desde a educação básica até o momento em que o Espírito seja capaz de se conduzir sozinho² e, segundo as Letras Espíritas, isto não se dá sobre a Terra. Portanto, todos os habitantes terrenos se encontram em fase educacional, nas mais diversas fases. Mas cabe a cada um reconhecer a sua e aproveitar o quanto possível as oportunidades do próprio crescimento.

¹Adrian Raine e outros
² Questão 500 de O Livro dos Espíritos

Fonte: Crítica Espírita - http://criticaespirita.blogspot.com.br/2014/07/educacao-dos-espiritos.html

quinta-feira, 7 de abril de 2016

domingo, 20 de março de 2016

[ESE] - Os Tormentos Voluntários

FÉNELON
Lyon, 1860


O homem está incessantemente à procura da felicidade, que lhe escapa a todo instante, porque a felicidade sem mescla não existe na Terra. Entretanto, apesar das vicissitudes que formam o inevitável cortejo desta vida, dele poderia pelo menos gozar de uma felicidade relativa. Mas ele a procura nas coisas perecíveis, sujeitas às mesmas vicissitudes, ou seja, nos gozos materiais, em vez de buscá-la nos gozos da alma, que constituem uma antecipação das imperecíveis alegrias celestes. Em vez de buscar a paz do coração, única felicidade verdadeira neste mundo, ele procura com avidez tudo o que pode agitá-lo e perturbá-lo. E, coisa curiosa, parece criar de propósito os tormentos, que só a ele cabia evitar.

Haverá maiores tormentos que os causados pela inveja e o ciúme? Para o invejoso e o ciumento não existe repouso: sofrem ambos de uma febre incessante. As posses alheias lhes causam insônias; os sucessos dos rivais lhes provocam vertigens; seu único interesse é o de eclipsar os outros; toda a sua alegria consiste em provocar, nos insensatos como eles, a cólera do ciúme. Pobres insensatos, com efeito, que não se lembram de que, talvez amanhã, tenham de deixar todas as futilidades, cuja cobiça lhes envenena a vida! Não é a eles que se aplicam estas palavras: “Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados”, pois os seus cuidados não têm compensação no céu.

Quantos tormentos, pelo contrário, consegue evitar aquele que sabe contentar-se com o que possui, que vê sem inveja o que não lhe pertence, que não procura parecer mais do que é! Está sempre rico, pois, se olha para baixo, em vez de olhar para cima de si mesmo, vê sempre os que possuem menos do que ele. Está sempre calmo, porque não inventa necessidades absurdas, e a calma em meio das tormentas da vida não será uma felicidade?

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

[RE] - Pode um Espírito recuar ante a prova?

Da Revista Espírita

Uma senhora amiga escreve-nos o seguinte:

Um dia minha filha recebeu a seguinte comunicação espontânea de um Espírito, que começou assinando Euphrosine Bretel. Como o nome não lembrasse ninguém, perguntamos: - Quem és? - Sou um pobre Espírito sofredor. Necessito de preces. Dirijo-me a ti porque me conheceste quando eu não era mais que uma criança.

Rebuscamos a memória e admiti lembrar-me que tal nome de família era o de uma criança de nove a dez anos, que se achava no mesmo internato que minha filha e que adoecera pouco depois da chegada desta. Seu pai veio buscá-la de carro, e as meninas guardaram a lembrança daquela doente, toda embrulhada e gemente. Ela morreu em casa. Em desespero, a mãe a seguiu pouco depois. O pai ficou cego de tanto chorar e morreu no mesmo ano. Desde que admitimos haver reconhecido o nome, o Espírito escreveu: ‘Sou eu. Minha última existência deveria ser uma prova terrível, mas recuei covardemente e desde então sofro sempre. Eu te peço que rogues a Deus para que me conceda a graça de uma nova prova. Submeter-me-ei a ela, por mais dura que seja. Sou tão infeliz! Amo a meu pai e a minha mãe e eles me têm horror. Eles fogem de mim e meu castigo é o de buscá-los incessantemente, para me ver repelida. Vim a ti porque minha lembrança não se apagou inteiramente de tua memória, e dos que podem orar por mim, és a única que conhece o Espiritismo. Adeus! Não me esqueças. Em breve nos veremos.’

Minha filha então lhe perguntou gracejando: ‘Então vou morrer logo?’ A isso o Espírito respondeu: ‘O tempo, que é longo para vós, não tem medida para nós’.

Verificamos depois que o prenome e o nome de família estavam perfeitamente corretos.

Agora me pergunto se é possível a um Espírito encarnado recuar ante uma prova começada.

A essa pergunta respondemos:

Sim, os Espíritos recuam com frequência ante as provas escolhidas e que eles não têm coragem de suportar, e até de enfrentá-las quando chegado o momento. É a causa da maior parte dos suicídios. Eles recuam também quando se desesperam e murmuram, e assim perdem os benefícios da prova.

Eis por que o Espiritismo, dando a conhecer a causa, o objetivo e as consequências das atribulações da vida, dá, ao mesmo tempo, tantas consolações e tanta coragem, e desvia o pensamento de abreviar os dias. Qual a filosofia que produziu tais resultados sobre os homens?

Fonte:  Revista Espírita, outubro de 1862

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

[RE] - Correspondência - Sobre "O Livro dos Espíritos"

Da Revista Espírita
 

Roma, 2 de março de 1861

Senhor,

Há cerca de quatro anos ocupo-me aqui das manifestações espíritas, e tenho a felicidade de ter na família um bom médium, que nos dá comunicações de ordem superior. Temos lido e relido o vosso Livro dos Espíritos, que constitui nossa alegria e nossa consolação, dando-nos as mais sublimes e admissíveis noções da vida futura. Se dela podia duvidar, as provas que tenho agora são mais que suficientes para firmar a minha fé. Perdi pessoas que me eram muito queridas e tenho a inapreciável felicidade de sabê-las felizes e de poder corresponder-me com elas. Dizer da alegria que assim experimentei é inexprimível. A primeira vez que me deram sinais manifestos de sua presença, exclamei: Então é verdade que nem tudo morre com o corpo! Eu vos devo, senhor, o ter-me dado essa confiança. Crede em minha eterna gratidão pelo bem que me fizestes, porque, malgrado meu, o futuro me atormentava. A ideia do nada era horrível, e fora do nada só encontrava uma incerteza acabrunhadora. Agora não mais duvido. Parece que renasci para a vida. Todas as minhas apreensões se dissiparam, e minha confiança em Deus voltou mais forte do que nunca. Espero muito que, graças a vós, meus filhos não tenham os mesmos tormentos, pois são alimentados com essas verdades, de maneira que a razão neles crescente só pode fortalecer-se.

Contudo, faltava-nos um guia seguro para a prática. Se não temesse importunar-vos, desde muito vos teria pedido conselhos da vossa experiência. Felizmente vosso Livro dos Médiuns veio preencher essa lacuna, e agora marchamos a passo mais firme, pois estamos prevenidos contra os escolhos que se podem encontrar.

Remeto, senhor, algumas cópias das comunicações que recebemos recentemente. Foram escritas em italiano e sem dúvida sofreram perdas na tradução. Apesar disto serei muito grato se me disserdes o que pensais delas; se me favorecerdes com uma resposta. Será um encorajamento para nós.

Desculpai-me, eu vos peço, senhor, esta longa carta e crede no testemunho de simpatia do vosso dedicado

CONDE X... 

 
NOTA: O volume da matéria força-nos a adiar a publicação das comunicações transmitidas pelo Sr. Conde X..., em cujo número há algumas muito notáveis. Extraímos apenas as respostas seguintes, dadas por um dos Espíritos que a ele se manifestaram:

1. Conheceis o Livro dos Espíritos?

- Como os Espíritos não conheceriam sua obra? Todos a conhecem.

2. É muito natural em relação aos que nela trabalharam. Mas os outros?

- Há entre os Espíritos uma comunhão de pensamentos e uma solidariedade que não podeis compreender, homens que vos nutris no egoísmo e só vedes pelas estreitas janelas de vossa prisão.

3. Trabalhastes nela?

- Não, não pessoalmente, mas sabia que devia ser feita e que outros Espíritos, muito acima de mim, estavam encarregados dessa missão.

4. Que resultados produzirá ela?

- É uma árvore que já lançou sementes fecundas por toda a Terra. Essas sementes germinam; em breve amadurecerão e logo mais serão colhidos os frutos.

5. Não é de temer a oposição dos detratores?

- Quando se dissipam as nuvens que encobrem o sol, este tem brilho mais vivo.

6. Então as nuvens serão dissipadas?

- Basta um sopro de Deus.

7. Assim, em vossa opinião, o Espiritismo tornar-se-á uma crença geral?

- Dizei universal.

8. Contudo há homens que parecem muito difíceis de convencer.

- Há os que jamais o serão nesta vida, mas diariamente a morte os recolhe.

9. Não virão outros em seu lugar, que se tornarão incrédulos como eles?

- Deus quer a vitória do bem sobre o mal, e da verdade sobre o erro, como anunciou. É preciso que venha o seu reino. Seus desígnios são impenetráveis, mas crede que o que ele quer, o pode.

10. O Espiritismo será para sempre aceito aqui?

- Será aceito e florescerá. (Nesse momento o Espírito leva o lápis sobre a penúltima resposta e a sublinha com força).

11. Qual pode ser a utilidade do Espiritismo para a vitória do bem sobre o mal? Para isto não basta a lei do Cristo?

- Certamente essa lei bastaria, se fosse praticada, mas quantos a praticam? Quantos há que apenas têm a aparência da fé? Assim, vendo Deus que a sua lei era ignorada e incompreendida e que, malgrado essa lei, o homem vai se precipitando cada vez mais no abismo da incredulidade, quis dar-lhe uma nova demonstração de sua bondade infinita, multiplicando aos seus olhos as provas do futuro pelas manifestações brilhantes de que é testemunha, fazendo que seja advertido de todos os lados por esses mesmos que deixaram a Terra e que lhe vêm dizer: Nós vivemos. Em presença desses testemunhos, os que resistirem não terão escusa. Expiarão sua cegueira e seu orgulho por novas existências mais penosas em mundos inferiores, até que, enfim, abram os olhos à luz. Crede que entre os que sofrem na Terra, há muitos que expiam as existências passadas.

12. Pode o Espiritismo ser considerado como uma lei nova?

- Não, não é uma lei nova. As interpretações que os homens deram da lei do Cristo geraram lutas que são contrárias ao seu espírito. Deus não quer mais que a lei de amor seja um pretexto de desordem e de lutas fratricidas. Exprimindo-se sem rodeios e sem alegorias, o Espiritismo está destinado a restabelecer a unidade da crença. Ele é, pois, a confirmação e o esclarecimento do Cristianismo, que é e será sempre a lei divina, a que deve reinar em toda a Terra e cuja propagação vai tornar-se mais fácil por este poderoso auxiliar.

Fonte: Revista Espírita de abril de 1861

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Cuidado na propaganda Espírita

Por Vinícius Matias

Uma mentira pode viajar meio mundo enquanto a verdade ainda está a calçar os sapatos. Acertou em cheio o escritor norte americano, Mark Twain, quando escreveu essa frase. E, no seio espírita, é incrível como boatos e distorções de todos os tipos ganham campo sem pudor algum. E isso, é bom que se diga, pode ser notado desde a desencarnação de Allan Kardec. Não que antes fosse tudo um mar de rosas, não, a fundamental diferença é que todas as calúnias tendentes a desacreditar o Espiritismo encontravam em Kardec uma muralha, fossem elas urdidas por encarnados ou desencarnados, oriundas da má-fé ou da ignorância.

Um exemplo disso pode ser encontrado na obra “Processo dos Espíritas” que narra o triste drama vivido por um grupo de espíritas em Paris no ano de 1875, seis anos depois do desencarne de Kardec. O caso se dá após serem publicadas supostas fotografias de Espíritos na Revista Espírita ao serem compradas de um fotógrafo que fazia das fotos com os invisíveis o seu ganha-pão, tal publicação fez com que o Ministério Público parisiense instaurasse um processo acusando os espíritas de charlatanismo. No fim do embate judicial o saldo para a Doutrina foi desastroso: o presidente da Revista Espírita e o fotógrafo condenados e presos por um ano e a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, fundada por Allan Kardec, multada em 500 francos. A conclusão mais lúcida do lamentável episódio foi de Gabriel Delanne:

“Se tivemos que experimentar uma condenação contra nós, foi porque nos desviamos da rota traçada por Allan Kardec. Este inovador era contrário à retribuição dos médiuns e tinha para isso boas razões. Em sua época, os irmãos Davenport muito fizeram falar de si, mas, como ganhavam dinheiro com suas habilidades, Allan Kardec afastou-se deles, prudentemente.”

A notícia se espalhou logo por toda França e quem nunca havia ouvido falar em Espiritismo passou a conhecê-lo graças ao “procès des spirites”, e se a primeira impressão é a que fica podemos imaginar que dias difíceis viveu a propaganda Espírita . A maior parte das pessoas não se interessa em saber se condenação foi injusta ou não, se o engano foi pontual de determinada pessoa ou da Doutrina como um todo. O fato é que a percepção social do Espiritismo passou a ser maculada, e reabilitar o seu nome é tarefa para lá de hercúlea.

Os anos se passaram o caso do “procès des spirites” ficou esquecido, mas outras deturpações vieram, tente você, Espírita, dizer que o Espiritismo é uma ciência, ou que não há cabimento em ele ser confundido com a Umbanda e Candomblé, ou ainda que romances não podem constituir o conhecimento doutrinário, ou falar de temas como alma gêmea, crianças índigo e cristal, regressão de memória, terapia de cristais, apometria etc., e verá o tanto de premissas falsas que terá que desmontar até conseguir ter um diálogo razoável.

Toda essa dificuldade acontece porque mentiras sobre Espiritismo realmente viajam meio mundo enquanto as verdades sobre ele ainda se encontram dentro dos livros de Kardec esperando que sejam lidas para que comecem a caminhar.

Mesmo sob inúmeros ataques e deturpações ao longo dos anos, podemos dizer com plena segurança que nenhum deles fora mortal para a Doutrina. Para isso seria necessário ferir de morte as obras de Kardec, essas, no entanto acham-se blindadas pela lógica, bom-senso, e pelo controle universal do ensino dos Espíritos¹, tudo isso fruto de uma filosofia experimental, e não de especulações. Mas apesar de não poder ser detida, a propaganda Espírita pode ser entravada. Por isso nosso forte apelo a todos que se ocupam com o Espiritismo, seja para ensiná-lo ou para combatê-lo: aprofunde-se em TODAS as obras de Kardec², e antes de se pronunciar sobre algum tema espírita leiam e releiam tudo o que o Codificador disse a respeito. Do contrário, cale-se e evite que mais um possível engano venha a circular pelo mundo.

1. O Evangelho Segundo o Espiritismo, Introdução, item II- Autoridade da Doutrina Espírita.

2. Obras Básicas:
- O principiante Espírita;
- O que é o Espiritismo;
- Instrução prática sobre as manifestações Espíritas;
- Viagem Espírita de 1862;
- Refutação das críticas contra o Espiritismo;
- Resumo das leis e dos fenômenos Espíritas
- Resposta à mensagem dos Espíritas lioneses por ocasião do ano novo de 1862;
- Coleção de composições inéditas e
- Estudo acerca da poesia mediúnica.
Obras Fundamentais:
- O Livro dos Espíritos;
- O Livro dos Médiuns;
- O Evangelho Segundo o Espiritismo;
- O Céu e o Inferno e
- A Gênese.
Obras subsidiárias:
- Obras Póstumas e
- 12 volumes da Revista Espíritas 1858 a 1869

Texto enviado por e-mail ao blog e postado tal e qual recebido.

[RE] - O Espírito e o Jurado

Da Revista Espírita

Um dos nossos correspondentes, homem de grande saber e portador de títulos científicos oficiais, o que não o impede de cometer a fraqueza de acreditar que temos uma alma e que essa alma sobrevive ao corpo, que depois da morte fica errante no espaço e ainda pode comunicar-se com os vivos, tanto mais quanto ele próprio é um bom médium e mantém conversas com os seres de além-túmulo, dirige-nos a seguinte carta:

“Senhor,

Talvez julgueis acertado agasalhar na vossa interessante revista o fato seguinte:

Há algum tempo eu era jurado. O tribunal devia julgar um moço, apenas saído da adolescência, acusado de ter assassinado uma senhora idosa em circunstâncias horríveis. O acusado confessava e contava os detalhes do crime com uma impassibilidade e um cinismo que faziam fremir a assembleia.

Entretanto é fácil prever, em virtude da sua idade, da sua absoluta falta de educação e dados os estímulos recebidos em família, que fossem apresentadas em seu favor circunstâncias atenuantes, tanto mais que ele fora levado pela cólera, agindo contra uma provocação por injúrias.

Eu quis consultar a vítima a respeito do grau de sua culpabilidade. Chamei-a, no decorrer da sessão, por uma evocação mental. Ela me fez saber que estava presente e eu pus minha mão à sua disposição. Eis a conversação que tivemos - eu, mentalmente, ela pela escrita:

Pergunta: O que a senhora pensa de seu assassino?

Resposta: - Não serei eu quem o acusará.

P. Por quê?

R. - Porque ele foi levado ao crime por um homem que me fez a corte há cinquenta anos e que, nada tendo conseguido de mim, jurou vingar-se. Conservou, após a sua morte, o desejo de vingança e aproveitou as disposições do acusado para lhe inspirar o desejo de matar-me.

P. Como sabe disso?

R. - Porque ele mesmo me disse, quando cheguei a este mundo que hoje habito.

P. Compreendo sua reserva diante dos estímulos que o seu assassino não repeliu como deveria e poderia. Mas a senhora não pensa que a inspiração criminosa, à qual ele voluntariamente obedeceu, não teria sobre ele o mesmo poder, se não houvesse nutrido ou entretido, durante muito tempo, sentimentos de inveja, de ódio e de vingança contra a senhora e a sua família?

R. - Com certeza. Sem isso ele teria sido mais capaz de resistir. Eis por que digo que aquele que quis vingar-se aproveitou as disposições desse moço. O senhor compreende que ele não se teria dirigido a alguém que se dispusesse a resistir.

P. Ele goza com a sua vingança?

R. - Não, pois vê que isso lhe custará caro. Além disso, em lugar de me fazer mal, ele me prestou um serviço, fazendo-me entrar mais cedo no mundo dos Espíritos, onde sou mais feliz. Foi, pois, uma ação má sem proveito para ele.

Circunstâncias atenuantes foram admitidas pelo júri, baseadas nos motivos acima indicados, e a pena de morte foi descartada.

A respeito do que acabo de contar, deve fazer-se uma observação moral de grande importância. É necessário concluir, com efeito, que o homem deve vigiar os seus menores pensamentos malévolos e até mesmo os seus maus sentimentos, aparentemente os mais fugidios, pois eles podem atrair para si Espíritos maus e corrompidos, e expô-lo, fraco e desarmado, às suas inspirações culposas: é uma porta que ele abre ao mal, sem compreender o perigo. Foi, pois, com um profundo conhecimento do homem e do mundo espiritual que Jesus Cristo disse: ‘Todo aquele que olhar para uma mulher para cobiçá-la, já em seu coração adulterou com ela.’ (Mat. 5:28).

Tenho a honra, etc.

Fonte: Revista Espírita, novembro de 1859

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Cientista russo teria fotografado a alma no momento da morte?

Desde setembro de 2013 circula na Internet, através de redes sociais, a notícia segundo a qual um cientista russo de nome Konstantin Korotov teria conseguido, através de experiências, fotografar o momento no qual a alma (espírito encarnado) deixa o corpo físico no momento da morte. Muitos espíritas tem compartilhado essa suposta descoberta sem a devida preocupação em aferi-la, conforme ensinamento de Allan Kardec.

"O Blog dos Espíritas" recomenda que se receba esse tipo de informação com um pé atrás e que se pesquise a veracidade da mesma. Sempre. Com o intuito de esclarecimento, realizamos pesquisa que comprova nossas suspeitas: tal informação é falsa. Clique aqui para acessar matéria do site E-farsas a respeito.

"Na ausência dos fatos, a dúvida se justifica no homem ponderado." (Allan Kardec)

domingo, 6 de dezembro de 2015

[ESE] - A fé e a Caridade

Disse-vos, não há muito, meus caros filhos, que a caridade, sem a fé, não basta para manter entre os homens uma ordem social capaz de os tornar felizes. Pudera ter dito que a caridade é impossível sem a fé. Podereis encontrar, na verdade, impulsos generosos mesmo em pessoas privadas de religião; porém, essa caridade austera, que só com abnegação se pratica, com um constante sacrifício de todo interesse egoísta, somente a fé pode inspirá-la, pois só ela nos faz carregar com coragem e perseverança a cruz desta vida.

Sim, meus filhos, é inútil que o homem ávido de gozos procure iludir-se sobre o seu destino nesse mundo, pretendendo ser-lhe lícito ocupar-se unicamente com a sua felicidade. Sem dúvida, Deus nos criou para sermos felizes na eternidade; entretanto, a vida terrestre deve servir unicamente ao nosso aperfeiçoamento moral, que mais facilmente se adquire com o auxílio dos órgãos físicos e do mundo material. Sem levar em conta as vicissitudes ordinárias da vida, a diversidade dos vossos gostos, de vossos pendores e de vossas necessidades, é também um meio de vos aperfeiçoardes, exercitando-vos na caridade. Com efeito, só a poder de concessões e sacrifícios mútuos podeis manter a harmonia entre elementos tão diversos.

Tereis, contudo, razão, se afirmardes que a felicidade está destinada ao homem nesse mundo, desde que ele a procure, não nos gozos materiais, sim no bem. A história da cristandade fala de mártires que se encaminhavam alegres para o suplício. Hoje, na vossa sociedade, para serdes cristãos, não precisa nem o holocausto do martírio, nem o sacrifício da vida, mas única e simplesmente o sacrifício do vosso egoísmo, do vosso orgulho e da vossa vaidade. Triunfareis, se a caridade vos inspirar e se a fé vos sustentar. 

Espírito protetor. (Cracóvia, 1861.)

(O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XI - Amar o próximo como a si mesmo - Instrução dos Espíritos)

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

O futuro do Espiritismo

Revista Espírita, junho de 1863 - Dissertações espíritas

(Lyon 21 de setembro de 1862 - médium, Sra. B...) 

Perguntas-me qual será o futuro do Espiritismo e que lugar ocupará no mundo. Ele não ocupará somente um lugar. Ele encherá o mundo inteiro. O Espiritismo está no ar, no espaço, na Natureza. É a chave da abóbada do edifício social. Podes pressagiar o seu futuro por seu passado e por seu presente.

O Espiritismo é a obra de Deus. Vós, homens, lhe destes um nome; Deus vos deu a razão, quando chegou o tempo, porque o Espiritismo é a lei imutável do Criador. Desde quando o homem teve inteligência, Deus lhe inspirou o Espiritismo e, de época em época, enviou à Terra Espíritos adiantados, que ensaiaram em sua natureza corpórea a influência do Espiritismo. Se esses homens não triunfaram, foi porque a inteligência humana ainda não se achava suficientemente aperfeiçoada. Mas nem por isso esses homens deixaram de implantar a ideia, e deixaram atrás de si seus nomes e seus atos, como marcos indicadores numa estrada, para que o viajante achasse a rota. Olha para trás e verás quantas vezes Deus já experimentou a influência espírita como melhoramento moral.

Que era o Cristianismo há dezoito séculos senão Espiritismo? Só o nome é diferente. O pensamento é o mesmo. Apenas o homem, com o livre-arbítrio, desnaturou a obra de Deus. A natureza preponderou e o erro veio implantar-se sobre essa preponderância. Depois, o Espiritismo esforçou-se por germinar, mas o terreno era inculto e a semente partiu-se e feriu a fronte dos semeadores por Deus encarregados de semeá-la. Com o tempo a inteligência cresceu, o campo pôde ser lavrado, já que se aproxima a época em que o terreno deve ser novamente semeado. Todos admitem que o Espiritismo se espalha. Até os mais incrédulos o compreendem, e se não o confessam, e se fecham os olhos, é que a luz ofuscante do Espiritismo os cega. Mas Deus protege a sua obra. Ele a sustenta com seu poderoso olhar; ele a encoraja, e em breve todos os povos serão espíritas, porque aí está a universalidade de todas as crenças.

O Espiritismo é a grande niveladora que avança para aplainar todas as heresias. Ele é conduzido pela simpatia; ele é seguido pela concórdia, pelo amor e pela fraternidade; ele avança sem abalos e sem revolução; ele nada vem destruir, nada derrubar na organização social; ele vem a tudo renovar.

Não vejas aqui uma contradição: Tornando-se melhores, os homens aspirarão leis melhores. Compreendendo que o operário é da mesma essência que a sua, o patrão introduzirá leis suaves e sábias nas suas relações comerciais. As relações sociais se transformarão muito natu­ralmente entre a riqueza e a mediocridade. Não podendo o Espírito tornar-se morgado, sentirá o espírita que algo existe de mais importante para si que a riqueza; libertar-se-á da ideia de acumular, que gera a cupidez e, por certo, o pobre ainda será beneficiado por essa diminuição do egoísmo. Não direi que não haverá rebeldes a esta ideia; que todos crescerão universal­mente fecundados pela onda do Espiritismo. Ainda haverá refratários e anjos decaídos, pois os homens têm o livre-arbítrio e, posto não lhes faltem conselhos, muitos deles, vendo apenas de seu acanhado ponto de vista, que restringe o horizonte da cupidez, não quererão render-se à evidência. Pior para eles. Lamentai-os, esclarecei-os, porque não sois juízes e só Deus lhes pode censurar a conduta.

Pelo futuro que te mostro para o Espiritismo, podes julgar da influência que ele exercerá sobre as massas. Como estais organizados, moralmente falando? Fizestes uma estatística de vossas qualidades e defeitos? Os homens levianos e neutros povoam boa parte da Terra. Os benevolentes constituem maioria? É duvidoso. Entre os neutros, isto é, entre os que estão com um pé na balança do bem e outro na do mal, muitos podem meter os dois no prato da benevolência, que é a primeira etapa que conduz rapidamente a níveis mais avançados.

Ainda há no globo uma parcela de seres maus, mas que diariamente tende a diminuir. Quando os homens estiverem imbuídos do pensamento que a pena de Talião é a lei imutável que Deus lhes inflige, lei muito mais terrível que vossas terríveis leis terrenas; mais apavorante e mais lógica que as chamas eternas do inferno, em que não mais acreditam, eles temerão essa reciprocidade de penas e pensarão duas vezes antes de cometerem um ato censurável.

Quando, pela manifestação espírita, o criminoso puder prognosticar a sorte que o espera, recuará ante a ideia do crime, pois saberá que Deus tudo vê e que o crime, ainda que ficasse impune na Terra, ele terá que pagar um dia, e muito caramente, essa impunidade. Então, todas as falhas odiosas, que vêm, vez por outra, trazer a sua marca indelével à fronte da Humanidade, desaparecerão para dar lugar à concórdia e à fraternidade que há séculos vos são pregadas. Vossa legislação abrandar-se-á, na proporção do melhoramento moral, e a escravidão e a pena de morte não permanecerão em vossas leis, a não ser como uma lembrança das torturas da inquisição.

Assim regenerado, o homem poderá ocupar-se mais com seu progresso intelectual. Não mais existindo o egoísmo, as descobertas científicas, que por vezes reclamam o concurso de várias inteligências, desenvolver-se-ão rapidamente, cada um dizendo: “Que importa aquele que produz o bem, desde que o bem seja produzido?” Porque, na verdade, o que muitas vezes detém os vossos cientistas em sua marcha ascendente para o progresso, senão o personalismo, a ambição de ligar seu nome à sua obra?

Eis qual é o futuro e a influência do Espiritismo sobre os povos da Terra. 

Um filósofo do outro mundo.

Os mártires do Espiritismo

Revista Espírita, abril de 1862 - Dissertações espíritas

A propósito do questionamento sobre os milagres do Espiritismo que nos haviam proposto e de que tratamos no último número, também nos propuseram esta pergunta:

“Os mártires selaram com sangue a verdade do Cristianismo. Onde estão os mártires do Espiritismo?”

Tendes mesmo muito interesse em ver os espíritas sobre a fogueira ou lançados às feras! Isto leva a supor que não vos faltaria vontade, caso isso ainda fosse possível. Quereis à fina força pôr o Espiritismo no nível de uma religião! Notai, porém, que ele jamais pretendeu isso; que jamais se arvorou em rival do Cristianismo, do qual se declara filho; que ele combate os seus mais cruéis inimigos: o ateísmo e o materialismo.

 Afirmamos, uma vez mais, que ele é uma filosofia que repousa sobre as bases fundamentais de toda religião e sobre a moral do Cristo. Se renegasse o Cristianismo, ele se desmentiria, suicidar-se-ia. São os seus inimigos que o mostram como uma nova seita; que lhe deram sacerdotes e alto clero. Estes gritarão tantas e tantas vezes que é uma religião, que a gente poderia acabar acreditando.

É necessário existir uma religião para haver seus mártires? A Ciência, as Artes, o gênio, o trabalho, em todos os tempos não tiveram os seus mártires, assim como todas as ideias novas?

Não ajudam a fazer mártires os que apontam os espíritas como condenados, como párias a cujo contato se deve fugir; que açulam contra eles a população ignorante e que chegam até a lhes roubar os recursos do trabalho, esperando vencê-los pela fome, na falta de bons argumentos?

Bela vitória, se triunfassem, mas a semente está lançada e germina em toda a parte. Se é cortada num lugar, brota em cem outros.

Tentai então ceifar toda a Terra, mas deixai que falem os Espíritos que se encarregaram de responder à pergunta.
Pedistes milagres. Hoje pedis mártires. Já existem os mártires do Espiritismo. Entrai nas casas e os vereis.

Pedis perseguidos. Abri o coração desses fervorosos adeptos da ideia nova que lutam contra os preconceitos, com o mundo, e frequentemente até com a família! Como seus corações sangram e se dilatam, quando seus braços se estendem para abraçar um pai, uma mãe, um irmão ou uma esposa e não recebem a paga do carinho e dos transportes, mas sarcasmos, desdém e desprezo.

Os mártires do Espiritismo são os que a cada passo escutam estas palavras insultuosas: louco, insensato, visionário!... e durante muito tempo terão que suportar essas afrontas da incredulidade e outros sofrimentos ainda mais amargos.

Entretanto, a sua recompensa será bela, porque se o Cristo mandou preparar um lugar soberbo aos mártires do Cristianismo, o que prepara aos mártires do Espiritismo será ainda mais brilhante. Os mártires da infância do Cristianismo marchavam para o suplício, corajosos e resignados, porque não contavam sofrer senão dias, horas ou o segundo do martírio, aspirando a morte como única barreira para viver a vida celeste.

Os mártires do Espiritismo não devem nem mesmo aspirar a morte. Devem sofrer tanto tempo quanto praza a Deus deixá-los na Terra e não ousam julgar-se dignos dos puros gozos celestes logo que deixem a vida. Oram e esperam, murmurando baixinho palavras de paz, de amor e de perdão aos que os torturam, esperando novas encarnações nas quais poderão resgatar passadas faltas.

O Espiritismo elevar-se-á como um templo soberbo. A princípio os degraus serão difíceis de subir. Mas, transpostos os primeiros degraus, bons Espíritos ajudarão a vencer os outros até o lugar simples e reto que conduz a Deus.

Ide, ide, filhos, pregar o Espiritismo!

Pedem mártires. Vós sois os primeiros que o Senhor marcou, pois sois apontados a dedo e sois tratados como loucos e insensatos, por causa da verdade! Eu vos digo, entretanto, que em breve chegará a hora da luz e então não mais haverá perseguidores nem perseguidos. Sereis todos irmãos e o mesmo banquete reunirá opressores e oprimidos!

SANTO AGOSTINHO

(Médium: Sr. E. Vézy) 

II 

O progresso do tempo substituiu as torturas físicas pelo martírio da concepção e do nascimento cerebral das ideias que, filhas do passado, serão as mães do futuro. Quando o Cristo veio destruir o costume bárbaro dos sacrifícios; quando veio proclamar a igualdade e a fraternidade entre o saiote proletário e a toga patrícia, os altares, ainda vermelhos, fumegavam o sangue das vítimas imoladas; os escravos tremiam ante os caprichos do senhor e os povos, ignorando sua grandeza, esqueciam a justiça de Deus.

Nesse estado de rebaixamento moral, as palavras do Cristo teriam sido impotentes e desprezadas pela multidão, se não tivessem sido gritadas pelas suas chagas e tornadas sensíveis pela carne palpitante dos mártires. Para ser cumprida, a misteriosa lei das semelhanças, exigia que o sangue derramado pela ideia resgatasse o sangue derramado pela brutalidade.

Hoje os homens pacíficos ignoram as torturas físicas. Só o seu ser intelectual sofre, porque se debate, comprimido pelas tradições do passado, enquanto aspira novos horizontes.

Quem poderá pintar as angústias da geração presente, suas dúvidas pungentes, suas incertezas, seus ardores impotentes e sua extrema lassitude?

Inquietos pressentimentos de mundos superiores, dores ignoradas pela antiguidade material, que só sofria quando não gozava; dores que são a tortura moderna e que transformarão em mártires aqueles que, inspirados pela revelação espírita, crerão e não serão acreditados; falarão e serão censurados; marcharão e serão repelidos.

Não percais a coragem. Vossos próprios inimigos vos preparam uma recompensa tanto mais bela quanto mais espinhos houverem eles semeado em vosso caminho. 

LÁZARO

(Médium: Sra. Costel)

III 

Como bem dizeis, em todos os tempos as crenças tiveram mártires. Porém, é preciso dizer que muitas vezes o fanatismo estava de ambos os lados e então, quase sempre o sangue corria. Hoje, graças aos moderadores das paixões, aos filósofos, ou antes, a essa filosofia que começou com os escritores do século dezoito, o fanatismo apagou o seu facho e embainhou a espada. Em nossa época quase se não imagina a cimitarra de Maomé; a forca e a roda da Idade Média; as fogueiras e as torturas de toda espécie, do mesmo modo que se não imaginam os magos e as feiticeiras.

Outros tempos, outros costumes, diz um sábio provérbio. O vocábulo costumes é aqui muito elástico, como vedes e, conforme a sua etimologia latina, significa hábitos, maneira de viver. Ora, em nosso século, nossa maneira de ser não é de cobrir-se com cilício, de ir às catacumbas nem de dissimular suas preces aos procônsules e aos magistrados da cidade de Paris.

O Espiritismo, pois, não verá erguer-se o machado e as fogueiras devorarem os seus adeptos. A gente se bate a golpes de ideias, a golpes de livros, a golpes de comentários, a golpes de ecletismo e a golpes de teologia, mas a São Bartolomeu não se repetirá.

Certamente poderá haver algumas vítimas nas nações atrasadas, mas nos centros civilizados só a ideia será combatida e ridicularizada.

Assim, pois, não mais os machados, o feixe de varas, o óleo fervente, mas ficai atentos com o espírito voltairiano mal compreendido. Ele é o carrasco. É preciso preveni-lo, mas não desafiá-lo. Ele ri, em vez de ameaçar; lança o ridículo em vez da blasfêmia e seus suplícios são as torturas do espírito que sucumbe ao abraço do sarcasmo moderno.

Mas, sem desagradar aos pequenos Voltaires de nossa época, a juventude compreenderá facilmente estas três palavras mágicas: Liberdade, Igualdade, Fraternidade.

 Quanto aos sectários, estes são mais temíveis porque são sempre os mesmos, malgrado o tempo, malgrado tudo. Eles por vezes podem fazer o mal, mas são coxos, mascarados, velhos e rabugentos. Ora, vós que passais pela fonte de Juventa e cuja alma reverdece e remoça, não os temais, porque o seu fanatismo os perderá. 

LAMENNAIS

(Médium: Sr. A. Didier)