terça-feira, 6 de outubro de 2009

Erraticidade e fantasias espirituais

Por Iso Jorge Teixeira

Natureza da vida depois da morte

O Espiritismo é uma Doutrina consoladora por excelência, ele demonstra por fatos patentes a imortalidade da alma, a sua individualidade após a morte e a necessidade de reencarnação para o aperfeiçoamento, pois somos perfectíveis. Todos esses princípios estão resumidos nas questões 149, 150, 152, 166, 166-a, 166-b, 166-c e 223 de O Livro dos Espíritos de ALLAN KARDEC.

Destino das Almas depois da morte

Que acontece com a alma após a morte? A dos bons irão para o céu e a dos maus para o inferno? Haveria um purgatório, um lugar determinado para a ascensão ao céu ou como preparativo para a reencarnação daquelas almas necessitadas de purificação?...

Essas perguntas, exceto a primeira, seriam respondidas com um sim pela maioria dos religiosos brasileiros... Inclusive DANTE ALIGHIERI em sua A Divina Comédia, descreve minuciosamente INFERNO, PURGATÓRIO e CÉU, de maneira genial, embora com os ensinamentos e os conhecimentos "científicos" e míticos medievais e o não menos genial GUSTAVO DORÉ ilustrou magistralmente tal obra, a bico-de-pena.

Curiosamente, alguns confrades sincretizam tais conceitos de céu, inferno e purgatório e admitem coisas semelhantes àquelas descritas n' A Divina Comédia – do obscurantismo medieval –dizendo que após a morte seremos encaminhados para um "Pronto - Socorro Espiritual" e daí, para "colônias espirituais". No entanto, não é isso que está explícito e implícito na Doutrina dos Espíritos; por isso, julgamos importante tratar aqui da questão básica relativa à erraticidade e dos Espíritos errantes...

Que seremos ao desencarnarmos?

Estamos encarnados na Terra para provas e expiações, por isso somos, na esmagadora maioria, Espíritos inferiores. Ao desencarnarmos seremos, na quase totalidade, Espíritos errantes e isso está bem claro na resposta à questão 224 de O Livro dos Espíritos de ALLAN KARDEC, ou seja, nos intervalos da encarnações a alma é um "Espírito errante, que aspira a um novo destino e o espera".

A erraticidade não é um sinal de inferioridade entre os Espíritos, pois estes ali existem em todos os graus (cf. resposta à questão 225, op.cit.), mas somente os Espíritos Puros não são errantes, pois seu estado é definitivo (cf. resposta à questão 226, op. cit.).

Enfim, Espíritos errantes são aqueles em trânsito, que esperam uma oportunidade de reencarnação em nosso planeta ou em outro... Embora possamos evoluir no estado errante – através do estudo do nosso passado e observando os lugares que percorrermos, ouvindo os homens esclarecidos e captando os conselhos dos espíritos mais elevados (cf. resposta à questão 227, op. cit.) –, é através da existência corpórea que pomos em prática as idéias adquiridas na erraticidade (resposta à questão 230 'in fine').

Ora, há uma série de livros mediúnicos em que aparecem Espíritos, com falsa modéstia indisfarçável, que se dizem "imperfeitos" e que estariam "ajudando os irmãozinhos encarnados", durante séculos na erraticidade. Como um deles, num Centro em que freqüentamos, que dizia ser o "pai Joaquim", que – após uma troca de idéias, preparatória, para uma sessão mediúnica –, dirigiu-se diretamente a nós, dizendo:

–– Dr., o Sr. tem preconceito contra os pretos - velhos?

Ao que respondemos, então:

–– É por não ter preconceito que não entendo porque o Sr. se intitula "pai Joaquim"!

Em seguida, ele fez uma longa explanação, aliás repetida em muitos Centros, de que a encarnação preferida dele foi a de um escravo, por isso se intitulava assim. E finalmente disse:

–– Estou aqui neste plano há mais de 300 anos, tenho muitas imperfeições, mas procuro ajudar os irmãozinhos encarnados.

Retrucamos, então:

–– Se está há tanto tempo aí, e com imperfeições, por que não reencarna?...

A seguir, ele (não sei se o Espírito ou o médium) mostrou-se desconcertado, hesitante, sem graça; tropeçou nas palavras e não trouxe nenhum ensinamento novo, somente frases – feitas...

Ou seja, determinados livros mediúnicos estão afastando cada vez mais as pessoas da Doutrina dos Espíritos, pois algumas excrescências doutrinárias são tidas como verdadeira Doutrina... As chamadas "colônias espirituais" são de existência questionável.

Há uma grande falha em nosso movimento espírita ao admitir que fiquemos, quase enclausurados em "colônias espirituais", a receber conselhos de Espíritos, como se aí estivéssemos encarnados, como naquelas imagens de DORÉ sobre a Divina Comédia de DANTE... Até um tal "vale dos suicidas" é creditado como verdadeira Doutrina dos Espíritos!... Contudo, nas obras de KARDEC não há a menor referência nem às colônias espirituais nem ao vale dos suicidas. Seria uma omissão imperdoável da Espiritualidade Superior!

Acreditamos em que, ao desencarnarmos, a nova vida é eminentemente espiritual, nada de mundos especiais, "cópias aperfeiçoadas dos objetos da Terra", como dizem alguns confrades. O mundo da erraticidade é um mundo de reflexão em que nos preparamos para uma nova encarnação, mas essa preparação não tem nada de material.

Alguns argumentam que aqueles Espíritos mais terra-a-terra não conseguiriam viver sem a matéria !!! Ora, se não conseguirem viver sem a matéria, ao desencarnarem não sairão daqui do orbe terrestre, é o que se infere do início da resposta à questão 232 de O Livro dos Espíritos, isto é:

"(...) Quando o Espírito deixou o corpo ainda não está completamente desligado da matéria e PERTENCE ao mundo em que viveu ou um mundo do mesmo grau(...)"– o destaque é nosso.

Espíritos superiores não podem reencarnar-se?

Nunca devemos esquecer-nos de que estamos rodeados de espíritos desencarnados, errantes, e são eles que nos dão boas ou más inspirações. Embora aqui na Terra predominem os maus espíritos, temos também Espíritos Superiores, em menor número, é o caso dos Espíritos – Guias de cada um de nós...

A propósito, é um sofisma afirmar-se que um Espírito Superior teria dificuldade de vir à Terra e seria impossível, em determinado caso, a sua reencarnação terrena; pois, argumentam, o seu fluido é muito diáfano para suportar os fluidos terrenos. Ora, o perispírito é extraído do planeta em que o indivíduo está encarnado (cf. questão 94, op. cit.) ou situado; obviamente, há variações individuais, mas a sua constituição é sempre a mesma para cada orbe.

A Doutrina dos Espíritos é bem clara neste aspecto, ela nos diz em relação aos Espíritos Superiores, os de segunda ordem: "Quando, por exceção, se encarnam na Terra, é para cumprir uma missão de progresso e, então, nos oferece o tipo de perfeição a que a humanidade pode aspirar neste mundo."(cf. item 111, 'in fine', de O Livro dos Espíritos). Um exemplo maravilhoso deste caso foi a encarnação de JESUS (cf. questão 625 , op. cit.) e a este respeito disse KARDEC:

"Jesus é para o homem o tipo de perfeição moral a que pode aspirar a humanidade na Terra(...)" (cf. Comentário ab initio à questão 625, op. cit.).

Sabemos que o assunto é polêmico em relação a JESUS, pois alguns julgam-no um Espírito Puro, de primeira ordem e, por isso, não mais sujeito à encarnação. Mesmo admitindo que JESUS seja um Espírito Puro, qual a impossibilidade de sua encarnação ?... Em nosso modo de entender não há nenhuma impossibilidade, tanto assim que ele reencarnou de fato e há provas disso. Mas não entraremos nesta discussão, pois não é o escopo deste estudo.

Enfim, na erraticidade não existe céu, inferno nem purgatório, em lugares determinados; eles existem sim, na consciência individual. Muitas vezes esses Espíritos atraem-se por sintonia, mas, como Espíritos não são capazes de formar quadrilhas, como do Comando Vermelho, Terceiro Comando, aqui da Terra. São espíritos cujo "inferno" consiste – quando renitentes no mal –, em não poderem por em prática os seus maus pendores e isto está bem claro na resposta à questão 970, 'in fine', de O Livro dos Espíritos:

"Desejam todos os gozos e não podem satisfazê-los. É isso que os tortura".

Muitos confrades temem os obsessores numa reunião mediúnica, alegando até que alguns são chefes de falanges infernais!... Mais importante que doutrinar o obsessor (o que é mais fácil) é levar o obsidiado a desprender-se da sintonia que o liga ao seu algoz, pois afinal de contas ambos são algozes - vítimas.

Epílogo

O Céu, o Inferno, o Purgatório, as Colônias espirituais, são fantasias espirituais sem nenhuma sustentação científico – doutrinária, são elucubrações místicas de Espíritos ainda apegados à matéria e de algumas pessoas simplórias que não conseguem conceber o mundo espiritual sem materialidade.

Ao desencarnarmos na Terra, um planeta inferior, por melhores que sejamos não atingiremos , imediatamente, a condição de Espíritos Puros e por mais obstinados que sejamos no mal, não ficaremos eternamente nessa condição de "legionários infernais", pois a Providência Divina nos dá o livre-arbítrio, propiciando-nos o arrependimento. A Lei Divina é Misericordiosa...

Iso Jorge Teixeira é Psiquiatra. Livre-Docente de Psicopatologia e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

A saúde pode ser afetada pela obsessão?

Por Orson Peter Carrara

Desafio está em conhecer origem dos casos

Uma interessante matéria publicada por Allan Kardec na Revista Espírita (1) utiliza a expressão loucura obsessional. O texto, que recomendamos aos leitores, é um estudo sobre os Possessos de Morzine, uma localidade em determinada região francesa, alvo de carta endereçada ao Codificador pelo capitão B. (membro da Sociedade Espírita de Paris e naquele momento radicado na cidade de Anecy). Allan Kardec publicou a carta na edição de abril (2), seguida de instruções dos espíritos Georges e Erasto e ainda acrescentou lúcido comentário sobre a questão. Depois na edição de dezembro (3) voltou ao assunto, desdobrando-o em bem argumentada análise.

Trata-se de uma obsessão coletiva que atingiu toda uma coletividade e Kardec usa nas duas edições referidas toda a lógica da Doutrina Espírita para explicar a questão da natureza dos espíritos e sua permanente influência junto à humanidade através do perispírito e da mediunidade. Porém, abre importante caminho no entendimento da enfermidade classificada como loucura e acrescenta que “(...) Ao lado de todas as variedades de loucura patológica, convém, pois, acrescentar a loucura obsessional (...)” E acrescenta: “Mas como poderá um médico materialista estabelecer essa diferença ou, mesmo admiti-la? (...)” (1).

A questão suscita observações interessantes sobre a saúde mental. Ocorre que é grande o número de pessoas consideradas como lesionadas no cérebro e portanto internadas em hospitais psiquiátricos ou em tratamento mental ou psicológico, quando na verdade estão apenas sob forte influência de espíritos que agem ainda com ódio premeditado ou mesmo atuam inconscientemente. Claro que há, e isto ninguém contesta, os que podem ser considerados vítimas de lesões cerebrais irreversíveis com indicações claras de tratamentos ou internações inadiáveis. Mas, a influência perniciosa de um espírito desequilibrado e “que não passou de acidental, por vezes toma um caráter de permanência quando o Espírito é mau, porque para ele o indivíduo se torna verdadeira vítima, à qual ele pode dar a aparência de verdadeira loucura. Dizemos aparência, porque a loucura propriamente dita sempre resulta de uma alteração dos órgãos cerebrais (...) Não há, pois, loucura real, mas aparente, contra a qual os remédios da terapêutica são inoperantes, como o prova a experiência (...)” (1), conforme acentua o Codificador.

Como sabem os estudiosos da Doutrina Espírita, a obsessão é capítulo importante no relacionamento entre encarnados e desencarnados, tendo inclusive merecido capítulo específico em O Livro dos Médiuns (4) e como destacado pelo próprio Codificador o desafio está em enfrentar esta loucura aparente – pois não há lesões cerebrais –, causada pela presença e influência de espíritos maus e perversos, que constrange e/ou paralisa a vontade e a razão de sua vítima, fazendo-a pensar, falar e agir por ele, levando-a a atos e posturas extravagantes ou ridículas. Considere-se que estamos num planeta ainda dominado pelo egoísmo, onde a maioria das criaturas que o habitam – estejam encarnados ou desencarnados – estão envolvidas com interesses mesquinhos e sem finalidades educativas ou de aperfeiçoamento. E fica fácil, então, imaginar o mundo invisível formando inumerável população que forma a atmosfera moral do planeta, caracterizado pela inferioridade das lutas mundanas e dos interesses que o egoísmo, a vaidade, o orgulho ou a inveja podem criar. Para resistir a tudo isso, usando palavras do próprio Kardec, “são necessários temperamentos morais dotados de grande vigor”.(5)

E é interessante notar que, conforme ponderações do próprio Kardec (6), “(...) a ignorância, a fraqueza das faculdades, a falta de cultura intelectual” oferecem mais condições de assédio aos espíritos imperfeitos que tentam e muitas vezes conseguem dominar as criaturas humanas através do real fenômeno da obsessão, tantas vezes confundido como loucura ou lesões no cérebro.Diante desse quadro todo, percebe-se claramente a importância do estudo e da divulgação espírita perante todas as classes de indivíduos do planeta. Nesta área da saúde, o Espiritismo vem esclarecer a obscura questão das doenças mentais, apresentando uma causa que não era considerada e constitui perigo real evidente, provado pela experiência e pela observação: o da obsessão ou influência dos espíritos sobre os seres humanos.

(1) Dezembro de 1862, páginas 360, edição EDICEL, tradução de Júlio Abreu Filho.

(2) Abril de 1862, páginas 107/108, edição EDICEL, tradução de Júlio Abreu Filho.

(3) Dezembro de 1862, páginas 360 a 365, edição EDICEL, tradução de Júlio Abreu Filho.

(4) Capítulo XXIII.

(5) página 356 da edição de Dezembro de 1862 da Revista Espírita, edição EDICEL, tradução de Júlio Abreu Filho.

(6) Abril de 1862 da Revista Espírita, página 111, edição EDICEL, tradução de Júlio Abreu Filho.

Matéria publicada originariamente no jornal O CLARIM, edição de dezembro de 2004.

Ressurreição e Reencarnação: Católicos, Protestantes e Espíritas

Por Dalmo Duque dos Santos

O Cristianismo é uma filosofia moral que abrange os três momentos existenciais do ser humano, bem como as transformações deles decorrentes.

Na infância acontece o plantio da semente num terreno novo, de grandes possibilidades de germinação, porém sujeito a toda sorte de problemas e obstáculos contrário ao seu desenvolvimento. Mostra-se frágil e promissora.

Na adolescência a semente tornou-se uma planta que já sofreu as provas da exteriorização e busca firmar-se no ambientem hostil e perigoso. Mostra-se insegura ou agressiva, porém cheia de esperança no futuro.

Na fase adulta a semente já é uma árvore formada e consciente. Mostra-se adaptada ao ambiente e considera-se realizada dentro do seu plano existencial. Não busca mais nenhuma mudança.

Na perspectiva existencial a árvore é ponto ideal e a finalidade última da semente. A morte representa o fim.

Porém, na perspectiva consciencial, a árvore é o ponto ideal, mas não significa o ponto final. Além desse ponto abrem-se outras possibilidades de novos pontos ideais. A morte física e existencial pode ser seguida de uma segunda morte, uma crise ressurreicional na qual o ser desperta para novas e ilimitadas experiências mentais. Isso vai depender da sua maturidade e da sua vontade de transformação interior. Para ocorrer a ressurreição antes deve ocorrer um processo de amadurecimento e renovação através da reencarnação. A reencarnação é a porta de entrada das existências. A ressurreição é a porta de entrada da Vida. É por esse motivo que a transformação essencial do ser humano sempre ocorre na infância, que representa o reinício, um recomeço de outras existências que passaram e das quais se acumularam experiências mentais. A reencarnação seria a Porta Larga na qual ingressamos com muitas promessas de renovação e, todavia, nos acomodamos com as facilidades e ilusões do mundo carnal. Já a Ressurreição é a Porta Estreita diante da qual quase sempre recuamos, pois representam as provas e vicissitudes. As duas portas se apresentam constantemente em nosso caminho na forma de situações contraditórias e nas quais temos que fazer escolhas e usar corretamente o livre-arbítrio.

Na perspectiva histórica existencial o Catolicismo é a fase adulta do Cristianismo. O Protestantismo é a fase adolescente e o Espiritismo a sua infância, pois renasceu recentemente. No entanto, se analisarmos pela perspectiva histórica consciencial, essas posições se invertem e se nos revela a verdadeira face da transformação e da evolução espiritual do ser.

No catolicismo filosofia fossilizou-se na perspectiva existencial e bloqueia, pela tradição dogmática, qualquer possibilidade e interesse pela transformação. A morte vale mais que a Vida , pois é vista como um martírio que nos livra da culpa dos pecados.

No protestantismo a filosofia cristã persiste na ótica existencial e agoniza, não só pela tradição dogmática, mas também pelo medo terrificante do fracasso e da crença na eternidade do inferno. A morte é vista como uma punição que antecede o julgamento do Juízo Final. A transformação é superficial e enganosa, alimentada pela crença de que o arrependimento é suficiente para nos livrarmos dos pecados e da culpa. Nas duas situações anteriores, a mente humana faz o ser mentir para si mesmo, como fuga e defesa, negando a relação de causa e efeito entre o erro e o sofrimento. A religiosidade foi pervertida e tornou-se religião.

No Espiritismo a filosofia cristã reacende a religiosidade, porém rejeita a religião; aceita a ótica consciencial, reconhece a utilidade existencial, mas não se escraviza a ela e liberta-se dos dogmas. Ao fazer a necessária relação de causa e efeito entre o erro e o sofrimento, o ser passa a dar mais valor à necessidade de transformação interior. Isso não significa que ele consiga realizá-la de imediato, pois é apenas um entendimento racional e intelectual. A mudança efetiva só ocorre quando se processa uma compreensão integral da sua condição (razão, sentimento e ação). Ao aceitar a realidade consciencial, ou seja, que além do corpo e da morte existem outras experiências, se estabelece uma harmonia entre a visão existencial e a consciencial, que antes era conflituosa, dialética. Diminuem então as fugas, os medos irracionais e o caminho para as escolhas ficam mais abertos às decisões sensatas. As portas largas vão sendo trocadas pelas portas estreitas, de experiências mais valiosas e qualitativas. Mesmo estando na infância existencial o Espiritismo goza da maturidade consciencial, pois, através da compreensão da reencarnação (que não é uma crença, mas uma lei natural) penetra na essência espiritual do ser, que é a sua verdadeira ressurreição.

Dalmo Duque dos Santos é Bacharel em História, Mestre em Comunicação e licenciado em Pedagogia. É autor dos livros “A Inteligência Espiritual” e “Você em Busca de Você Mesmo”.

O Repouso Eterno

Sociedade de Paris, 13 de outubro de 1865 – Médium: Sr. Leymarie

Quando deixei o invólucro terreno, pronunciaram vários discursos sobre o meu túmulo, impregnados todos pela mesma idéia.

Sonnez, meu amigo, ides gozar do repouso eterno.

Alma, dizia o padre, repousai na contemplação divina.

Amigo, repetia o terceiro, dorme em paz, após uma vida de tantas realizações.

Enfim, era o repouso eterno contínuo, que ressaltava do fundo de tantos adeuses comoventes.

O repouso eterno! Que entendiam por esta expressão e pelas mesmas palavras continuamente repetidas, cada vez que um homem desaparecia na Terra e ia para o desconhecido?

Ah! meus amigos, dizeis que repousamos. Estranho erro! compreendeis o repouso à vossa maneira.

Olhai ao redor de vós: existe repouso? Neste momento as árvores vão despojar-se de seus envoltórios encantadores; tudo geme nesta estação; a Natureza parece preparar-se para a morte e, no entanto, se se procurar, achar-se-á a vida em preparação sob essa morte aparente; tudo se depura nesse grande laboratório terrestre: a seiva e a flor, o inseto e o fruto, tudo que deve adornar e fecundar.

Esta montanha, que parece ter uma imobilidade eterna, não repousa. As moléculas infinitas que a compõem realizam um trabalho enorme; umas tendem a se agregar, outras a se separar; e essa lenta transformação inicialmente causa espanto e depois admiração ao pesquisador que acha em tudo instintos diversos e mistérios a explorar.

E se a Terra assim se agita em suas entranhas, é que esse grande cadinho elabora e prepara o ar que respirais, os gases que devem sustentar a Natureza inteira.

É que ela imita os milhões de planetas que percebeis no espaço, e cujos movimentos diários, o trabalho contínuo, obedecem à vontade soberana.

Sua evolução é matemática, e se encerram outros elementos além dos que vos fazem agir, ide! crede-o, esses elementos trabalham a sua depuração, a sua perfeição. Sim, a sua perfeição; porque é a palavra eterna.

A perfeição é o objetivo e, para alcançá-lo, átomos, moléculas, seiva, minerais, árvores, animais, homens, planetas e Espíritos se empenham nesse movimento geral, que é admirável por sua diversidade, pois é harmonia. Todas as tendências visam ao mesmo objetivo, e esse objetivo é Deus, centro de toda atração.

Depois de minha partida da Terra, minha missão não está realizada. Busco e trabalho todos os dias; meu pensamento alargado abarca melhor o poder dirigente; sinto-me melhor fazendo o bem e, como eu, legiões inumeráveis de Espíritos preparam o futuro. Não acrediteis no repouso eterno! Os que pronunciam tais palavras não lhes compreendem o vazio. Vós todos que ouvis, podeis aniquilar o pensamento, forçá-lo ao repouso?

Oh! não; a vagabunda procura e procura sempre e não desagrada aos amáveis e úteis charlatães, que negam o Espírito e o seu poder. O Espírito existe, nós o provamos e o provaremos melhor quando chegar a hora. Nós lhes ensinaremos, a esses apóstolos da incredulidade, que o homem não é o nada, uma agregação de átomos reunidos ao acaso e destruídos da mesma forma. Nós lhes mostraremos o homem radiante por sua vontade e seu livre-arbítrio, senhor de seus destinos e elaborando na geena terrena o poder da ação necessária a outras vidas, a outras provas.

SONNEZ

Fonte: Revue Spirite (Revista Espírita) – novembro de 1865, “Dissertações Espíritas”. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. p. 467-469.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

ESE - Perda de Pessoas Amadas e Mortes Prematuras

Quando a morte vem ceifar em vossas famílias, levando sem consideração os jovens em lugar dos velhos, dizeis freqüentemente: “Deus não é justo, pois sacrifica o que está forte e com o futuro pela frente, para conservar os que já viveram longos anos, carregados de decepções: leva os que são úteis e deixa os que não servem para nada mais; fere um coração de mãe, privando-o da inocente criatura que era toda a sua alegria”.

Criaturas humanas, são nisto que tendes necessidades de vos elevar, para compreender que o bem está muitas vezes onde pensais ver a cega fatalidade. Por que medir a justiça divina pela medida da vossa? Podeis pensar que o Senhor dos Mundos queira, por um simples capricho, infligir-vos penas cruéis? Nada se faz sem uma finalidade inteligente, e tudo o que acontece tem a sua razão de ser. Se perscrutásseis melhor todas as dores que vos atingem, sempre encontraria nela a razão divina, razão regeneradora, e vossos miseráveis interesses representariam umas considerações secundárias, que relegaríeis ao último plano.

Acreditai no que vos digo: a morte é preferível, mesmo numa encarnação de vinte anos, a esses desregramentos vergonhosos que desolam as famílias respeitáveis, ferem um coração de mãe, e fazem branquear antes do tempo os cabelos dos pais. A morte prematura é quase sempre um grande benefício, que Deus concede ao que se vai, sendo assim preservado das misérias da vida, ou das seduções que poderiam arrastá-lo à perdição. Aquele que morre na flor da idade não é uma vítima da fatalidade, pois Deus julga que não lhe será útil permanecer maior tempo na Terra.

É uma terrível desgraça, dizeis, que uma vida tão cheia de esperanças seja cortada tão cedo! Mas de que esperanças querem falar? Das esperanças da Terra onde aquele que se foi poderia brilhar, fazer sua carreira e sua fortuna? Sempre essa visão estreita, que não consegue elevar-se acima da matéria! Sabeis qual teria sido a sorte dessa vida tão cheia de esperanças, segundo entendeis? Quem vos diz que ela não poderia estar carregada de amarguras? Considerais como nada as esperanças da vida futura, preferindo as da vida efêmera que arrastais pela Terra? Pensais, então, que mais vale um lugar entre os homens que entre os Espíritos bem-aventurados?

Regozijai-vos em vez de chorar, quando apraz a Deus retirar um de seus filhos deste vale de misérias. Não é egoísmo desejar que ele fique, para sofrer convosco? Ah! essa dor se concebe entre os que não tem fé, e que vêem na morte a separação eterna. Mas vós, espíritas, sabeis que a alma vive melhor quando livre de seu invólucro corporal. Mães, vós sabeis que vossos filhos bem-aventurados estão perto de vós; sim, eles estão bem perto: seus corpos fluídicos vos envolvem, seus pensamentos vos protegem, vossa lembrança os inebria de contentamento; mas também as vossas dores sem razão os afligem, porque revela uma falta de fé e constituem uma revolta contra a vontade de Deus.

Vós que compreendeis a vida espiritual, escutai as pulsações de vosso coração, chamando esses entes queridos. E se pedirdes a Deus para os abençoar, sentireis em vós mesmas a consolação poderosa que faz secarem as lágrimas, e essas aspirações sedutoras, que vos mostram o futuro prometido pelo soberano Senhor.

SANSÃO
Antigo membro da Sociedade Espírita de Paris, 1863.

Fonte: KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Tradução de José Herculano Pires.

ESE - A Felicidade Não É Deste Mundo

Não sou feliz! A felicidade não foi feita para mim! Exclama geralmente o homem, em toda as posições sociais. Isto prova, meus caros filhos, melhor que todos os raciocínios possíveis, a verdade desta máxima do Eclesiastes: “A felicidade não é deste mundo”. Com efeito, nem a fortuna, nem o poder, nem mesmo a juventude em flor, são condições essenciais da felicidade. Digo mais: nem mesmo a reunião dessas três condições, tão cobiçadas, pois que ouvimos constantemente, no seio das classes privilegiadas, pessoas de todas as idades lamentarem amargamente a sua condição de existência.

Diante disso, é inconcebível que as classes trabalhadoras invejem com tanta cobiça a posição dos favorecidos da fortuna. Neste mundo, seja quem for, cada qual tem a sua parte de trabalho e de miséria, seu quinhão de sofrimento e desengano. Pelo que é fácil chegar-se à conclusão de que a Terra é um lugar de provas e de expiações.

Assim, pois, os que pregam que a Terra é a única morada do homem, e que somente nela, e numa única existência, lhe é permitido alcançar o mais elevado grau de felicidade que a sua natureza comporta, iludem-se e enganam aqueles que os ouvem. Basta lembrar que está demonstrado, por uma experiência multissecular, que este globo só excepcionalmente reúne as condições necessárias à felicidade completa do indivíduo.

Num sentido geral, pode afirmar-se que a felicidade é uma utopia, a cuja perseguição se lançam as gerações, sucessivamente, sem jamais a alcançarem. Porque, se o homem sábio é uma raridade neste mundo, o homem realmente feliz não se encontra com maior facilidade.

Aquilo em que consiste a felicidade terrena é de tal maneira efêmera para quem não se guiar pela sabedoria, que por um ano, um mês, uma semana de completa satisfação, todo o resto da existência se passa numa seqüência de amarguras e decepções. E notai, meus caros filhos que estou falando dos felizes da Terra, desses que são invejados pelas massas populares.

Conseqüentemente, se a morada terrena se destina a provas e expiações, é forçoso admitir que existem, além, moradas mais favorecidas, em que o Espírito do homem, ainda prisioneiro de um corpo material, desfruta em sua plenitude as alegrias inerentes à vida humana. Foi por isso que Deus semeou, no vosso turbilhão, esses belos planetas superiores para os quais os vossos esforços e as vossas tendências vos farão um dia gravitar, quando estiverdes suficientemente purificados e aperfeiçoados.

Não obstante, não se deduza das minhas palavras que a Terra esteja sempre destinada a servir de penitenciária. Não, por certo! Porque, do progresso realizado podeis facilmente deduzir o que será o progresso futuro, e das melhoras sociais já conquistadas, as novas e mais fecundas melhoras que virão. Essa é a tarefa imensa que deve ser realizada pela nova doutrina que os Espíritos vos revelaram.

Assim, pois, meus queridos filhos, que uma santa emulação vos anime, e que cada um dentre vós se despoje energicamente do homem velho. Entregai vos inteiramente à vulgarização desse Espiritismo, que já deu início à vossa própria regeneração. É um dever fazer vossos irmãos participarem dos raios dessa luz sagrada. À obra, portanto, meus caros filhos! Que nesta reunião solene, todos os vossos corações se voltem para esse alvo grandioso, de preparar para as futuras gerações um mundo em que felicidade não seja mais uma palavra vã.

FRANÇOIS-NICOLAS-MADELAINE
Cardeal Morlot, Paris, 1863

Fonte: KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Tradução de José Herculano Pires.

sábado, 3 de outubro de 2009

As influências espirituais

- “Influem os Espíritos em nosso pensamento, e em nossos atos?”.

- Muito mais do que imaginais. Influem a tal ponto, que, de ordinário, são eles que vos dirigem.”

(O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 459.)

A assertiva dos Espíritos a Allan Kardec demonstra que, na maioria das vezes, estamos todos nós - encarnados - agindo sob a influência de entidades espirituais que se afinam com o nosso modo de pensar e de ser, ou em cujas faixas vibratórias respiramos.

Isto não nos deve causar admiração, pois se analisarmos a questão sob o aspecto puramente terrestre chegaremos à conclusão de que vivemos em permanente sintonia com as pessoas que nos rodeiam, familiares ou não, das quais recebemos influenciações através das ideias que exteriorizam, dos exemplos que nos são dados, e também que influenciamos com a nossa personalidade e pontos de vista.

Quando acontece de não conseguirmos exercer influência sobre alguém de nosso convívio e que desejamos aja sob o nosso prisma pessoal, via de regra tentamos por todos os meios convencê-lo com argumentos persuasivos de diferente intensidade, a fim de lograrmos o nosso intento.

Natural, portanto, ocorra o mesmo com os habitantes do mundo espiritual, já que são eles os seres humanos desencarnados, não tendo mudado, pelo simples fato de deixarem o invólucro carnal, a sua maneira de pensar e as características da sua personalidade.

Assim, vamos encontrar desde a atuação benéfica de Benfeitores e Amigos Espirituais, que buscam encaminhar-nos para o bem, até os familiares que, vencendo o túmulo, desejam prosseguir gerindo os membros do seu clã familiar, seja com bons ou maus intentos, bem como aqueles outros a quem prejudicamos com atos de maior ou menor gravidade, nesta ou em anteriores reencarnações, e que nos procuram, no tempo e no espaço, para cobrar a divida que contraímos.

Por sua vez, os que estão no plano extrafísico também se acham passíveis das mesmas influenciações, partidas de mentes que lhes compartilham o modo de pensar, ou de outras que se situam em planos superiores, e, no caso de serem ainda de evolução mediana ou inferior, de desafetos, de seres que se buscam intensamente pelo pensamento, num conúbio de vibrações e sentimentos incessantes.

Essa permuta é contínua e cabe a cada indivíduo escolher, optar pela onda mental com que irá sintonizar.

Portanto, a resposta dos Espíritos a Kardec nos dá uma noção exata do intercâmbio existente entre os seres humanos, seja ele inconsciente ou não, mas, de qualquer modo, real e constante.

Fonte: SCHUBERT, Suley Caldas. “Obsessão e Desobsessão”.

O Alcoolismo

Por Victor Hugo (espírito)

Sem nos determos no exame dos fatores sócio-psicológicos causais do alcoolismo generalizado, de duas ordens são as engrenagens que o desencadeiam,- observado o problema do ponto de vista espiritual.

Antigos viciados e dependentes do álcool, em desencarnando não se liberam do hábito, antes sofrendo-lhe mais rude imposição.

Prosseguindo a vida, embora a ausência do corpo, os vícios continuam vigorosos, jungindo os que a eles se aferraram a uma necessidade enlouquecedora. Atônitos e sedentos, alcoólatras desencarnados se vinculam às mentes irresponsáveis, de que se utilizam para dar larga à continuação do falso prazer, empurrando-os, a pouco e pouco, do aperitivo tido como inocente ao lamentável estado de embriaguez. Os que lhes caem nas malhas, tomam-se, por isso mesmo, verdadeiros recipientes por meio dos quais absorvem os vapores deletérios, caindo, também, em total desequilíbrio, até quando a morte advém à vítima, ou as Soberanas Leis os recambiam à matéria, que padecerá das dolorosas injunções constritoras que lhe impõe o corpo perispiritual...

Normalmente, quando reencarnados, os antigos viciados recomeçam a atividade mórbida, servindo, a seu turno, de instrumento do gozo infeliz, para os que se demoram na Erraticidade inferior...

Outras vezes, os adversários espirituais, na execução de uma programática de desforço pelo ódio, induzem os seus antigos desafetos à iniciação alcoólica, mediante pequenas doses, com as quais no transcurso do tempo os conduzem à obsessão, desorganizando-lhes a aparelhagem físio-psíquica e dominando-os totalmente.

No estado de alcoolismo faz-se muito difícil a recomposição do paciente, dele exigindo um esforço muito grande para a recuperação da sanidade.

Não se afastando a causa espiritual, torna-se menos provável a libertação, desde que, cessados os efeitos de quaisquer terapêuticas acadêmicas, a influência psíquica se manifesta, insidiosa, repetindo-se a lamentável façanha destruidora...

A obsessão, através do alcoolismo, é mais generalizada do que parece.

Num contexto social permissivo, o vício da ingestão de alcoólicos torna-se expressão de status, atestando a decadência de um período histórico que passa lento e doído.

Pelos idos de 1851, porque enxameassem os problemas derivados da alcoolofilia, Magno Huss realizou, por vez primeira, um estudo acurado da questão, promovendo um levantamento dos danos causados no indivíduo e alertando as autoridades para as conseqüências que produz na sociedade.

Os que tombam na urdidura alcoólica, justificam-lhe o estranho prazer, que de início lhes aguça a inteligência, faculta-lhes sensações agradáveis, liberando-os dos traumas e receios, sem se darem conta de que tal estado é fruto das excitações produzidas no aparelho circulatório, respiratório com elevação da temperatura para, logo mais; produzir o nublar da lucidez, a alucinação, o desaparecimento do equilíbrio normal dos movimentos...

Inevitavelmente, o viciado sofre uma congestão cerebral intensa ou experimenta os dolorosos estados convulsivos, que se tornam perfeitos delírios epilépticos, dando margem a distúrbios outros: digestivos, circulatórios, nervosos que podem produzir lesões irreversíveis, graves.

A dependência e continuidade do vício conduz ao delirium tremens, resultante da cronicidade do alcoolismo, gerando psicoses, alucinações várias que culminam no suicídio, no homicídio, na loucura irrecuperável.

Mesmo em tal caso, a constrição obsessiva segue o seu curso lamentável, já que, não obstante destrambelhadas as aparelhagens do corpo, o espírito encarnado continua a ser dominado pelos seus algozes impenitentes em justas de difícil narração...

Além dos danos sociais que o alcoolismo produz, engendrando a perturbação da ordem, a queda da natalidade, a incidência de crimes vários, a decadência econômica e moral, é enfermidade espiritual que o vero Cristianismo erradicará da Terra, quando a moral evangélica legítima substituir a débil moral social, conveniente e torpe.

Ao Espiritismo cumpre o dever de realizar a psicoterapia valiosa junto a tais enfermos e, principalmente, a medida preventiva pelos ensinos corretos de como viver-se em atitude consentânea com as diretrizes da Vida Maior.

Fonte: Calvário de Libertação. Psicografia de Divaldo P. Franco

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

A GÊNESE - A Geração Nova

Para que na Terra sejam felizes os homens, preciso é que somente a povoem Espíritos bons, encarnados e desencarnados, que somente ao bem se dediquem.

Havendo chegado o tempo, grande emigração se verifica dos que a habitam: a dos que praticam o mal pelo mal, ainda não tocados pelo sentimento do bem, os quais, já não sendo dignos do planeta transformado, serão excluídos, porque, senão, lhe ocasionariam de novo perturbação e confusão e constituiriam obstáculo ao progresso.

Irão expiar o endurecimento de seus corações, uns em mundo inferiores, outros em raças terrestres ainda atrasadas, equivalente a mundos daquela ordem, aos quais levarão os conhecimentos que hajam adquirido, tendo por missão fazê-las avançar. Substitui-los-ão Espíritos melhores, que farão reinar em seu seio a justiça, a paz e a fraternidade.

A Terra, no dizer dos Espíritos, não terá de transformar-se por meio de um cataclisma que aniquile de súbito uma geração. A atual desaparecerá gradualmente e a nova lhe sucederá do mesmo modo, sem que haja mudança alguma na ordem natural das coisas.

Tudo, pois, se processará exteriormente, como deve acontecer, com a única, mas capital diferença, de que uma parte dos Espíritos que encarnavam na Terra aí não mais tornarão a encarnar. Em cada criança que nascer, em vez de um Espírito atrasado e inclinado ao mal, que antes nela encarnaria, virá um Espírito mais adiantado e propenso ao bem.

A época atual é de transição; confundem-se os elementos das duas gerações. Colocados no ponto intermediário, assistimos à partida de uma e à chegada da outra, já se assinalando cada uma, no mundo, pelos caracteres que lhe são peculiares.

Têm idéias e pontos de vista opostos as duas gerações que se sucedem. Pela natureza das disposições morais, porém, sobretudo das disposições intuitivas e inatas, torna-se fácil distinguir a qual das duas pertence cada indivíduo.

Cabendo-lhe fundar a era do progresso moral, a nova geração se distingue por inteligência e razão geralmente precoces, juntas ao sentimento inato do bem e a crenças espiritualistas, o que constitui sinal indubitável de certo grau de adiantamento anterior.

Não se comporá exclusivamente de Espíritos eminentemente superiores, mas dos que, já tendo progredido, se acham predispostos a assimilar todas as idéias progressistas e aptos a secundar o movimento de regeneração.

O que, ao contrário, distingue os Espíritos atrasados é, em primeiro lugar, a revolta contra Deus, pelo se negarem a reconhecer qualquer poder superior aos poderes humanos; a propensão instintiva para as paixões degradantes, para os sentimentos antifraternos de egoísmo, de orgulho, de inveja, de ciúme, enfim, o apego a tudo que é material: a sensualidade, a cupidez, a avareza.

Desses vícios é que a Terra tem que ser expurgada pelo afastamento dos que se obstinam em não emendar-se; porque são incompatíveis com o reinado da fraternidade e porque o contato com eles constituirá sempre um sofrimento para os homens de bem. Quando a Terra se achar livre deles, os homens caminharão sem óbices para o futuro melhor, que lhes está reservado, mesmo neste mundo, por prêmio de seus esforços e de sua perseverança, enquanto esperam que uma depuração mais completa lhes abra o acesso aos mundos superiores.

***

É muito simples o modo por que se opera a transformação, sendo, como se vê, todo ele de ordem moral, sem se afastar em nada das leis da Natureza.

Sejam os que componham a nova geração Espíritos melhores, ou Espíritos antigos que se melhoraram, o resultado é o mesmo. Desde que trazem disposições melhores, há sempre uma renovação. Assim, segundo suas disposições naturais, os Espíritos encarnados formam duas categorias: de um lado, os retardatários, que partem; de outro, os progressistas, que chegam. O estado dos costumes e da sociedade estará, portanto, no seio de um povo, de uma raça, ou do mundo inteiro, em relação com aquela das duas categorias que preponderar.

Por estarem muitos, apesar de suas imperfeições, maduros para a transformação, é que muitos partem, a fim de apenas se retemperarem em fonte mais pura. Enquanto se conservassem no mesmo meio e sob as mesmas influências, persistiriam nas suas opiniões e nas suas maneiras de apreciar as coisas. Uma estada no mundo dos Espíritos bastará para lhes descerrar os olhos, por isso que aí vêem o que não podiam ver na Terra. O incrédulo, o fanático, o absolutista, poderão, conseguintemente, voltar com idéias inatas de fé, tolerância e liberdade. Ao regressarem, acharão mudadas as coisas e experimentarão a influência do novo meio em que houverem nascido. Longe de se oporem às novas idéias, constituir-se-ão seus auxiliares.

A regeneração da Humanidade, portanto, não exige absolutamente a renovação integral dos Espíritos: basta uma modificação em suas disposições morais. Essa modificação se opera em todos quantos lhe estão predispostos, desde que sejam subtraídos à influência perniciosa do mundo. Assim, nem sempre os que voltam são outros Espíritos; são com freqüência os mesmos Espíritos, mas pensando e sentindo de outra maneira.

Fonte: ‘A Gênese’ – Allan Kardec
(Cap. XVIII – São Chegados os Tempos – Itens 27 a 35)

O Espiritismo, por Allan Kardec

O Espiritismo é uma doutrina filosófica de efeitos religiosos, como qualquer filosofia espiritualista, pelo que forçosamente vai ter às bases fundamentais de todas as religiões: Deus, a alma e a vida futura. Mas, não é uma religião constituída, visto que não tem culto, nem rito, nem templos e que, entre seus adeptos, nenhum tomou, nem recebeu o título de sacerdote ou de sumo-sacerdote. Estes qualificativos são de pura invenção da crítica.

As crenças que propugna, as tendências que manifesta e o fim a que visa se resumem nas proposições seguintes:

1º) O elemento espiritual e o elemento material são os dois princípios, as duas forças vivas da Natureza, as quais se completam uma a outra e reagem incessantemente uma sobre a outra, indispensáveis ambas ao funcionamento do mecanismo do Universo.

Da ação recíproca desses dois princípios se originam fenômenos que cada um deles, isoladamente, não tem possibilidade de explicar.

À Ciência, propriamente dita, cabe a missão especial de estudar as leis da matéria.

O Espiritismo tem por objeto o estudo do elemento espiritual em suas relações com o elemento material e aponta na união desses dois princípios a razão de uma imensidade de fatos até então inexplicados.

O Espiritismo caminha ao lado da Ciência, no campo da matéria: admite todas as verdades que a Ciência comprova; mas, não se detém onde esta última pára: prossegue nas suas pesquisas pelo campo da espiritualidade.

2º) Sendo o elemento espiritual um estado ativo da Natureza, os fenômenos em que ele intervém estão submetidos a leis e são por isso mesmo tão naturais quanto os que derivam da matéria neutra.

Alguns de tais fenômenos foram reputados sobrenaturais, apenas por ignorância das leis que os regem. Em virtude desse princípio, o Espiritismo não admite o caráter de maravilhoso atribuído a certos fatos, embora lhes reconheça a realidade ou a possibilidade. Não há, para ele, milagres, no sentido de derrogação das leis naturais, donde se segue que os espíritas não fazem milagres e que é impróprio o qualificativo de taumaturgos que umas tantas pessoas lhes dão.

O conhecimento das leis que regem o princípio espiritual prende-se de modo direto à questão do passado e do futuro do homem. Cinge-se a sua vida à existência atual? Ao entrar neste mundo, vem ele do nada e volta para o nada ao deixá-lo? Já viveu e ainda viverá? Como viverá e em que condições? Numa palavra: donde vem ele e para onde vai? Por que está na Terra e por que sofre aí? Tais as questões que cada um faz a si mesmo, porque são para toda gente de capital interesse e às quais ainda nenhuma doutrina deu solução racional. A que lhe dá o Espiritismo, baseada em fatos, por satisfazer às exigências da lógica e da mais rigorosa justiça, constitui uma das causas principais da rapidez de sua propagação.

O Espiritismo não é uma concepção pessoal, nem o resultado de um sistema preconcebido. É a resultante de milhares de observações feitas sobre todos os pontos do globo e que convergiram para um centro que os coligiu e coordenou. Todos os seus princípios constitutivos, sem exceção de nenhum, são deduzidos da experiência. Esta precedeu sempre a teoria.

O Espiritismo não é solidário com aqueles a quem apraza dizerem-se espíritas, do mesmo modo que a Medicina não o é com os que a exploram, nem a sã religião com os abusos e até crimes que se cometam em seu nome. Ele não reconhece como seus adeptos senão os que lhe praticam os ensinos, isto é, que trabalham por melhorar-se moralmente, esforçando-se por vencer os maus pendores, por ser menos egoístas e menos orgulhosos, mais brandos, mais humildes, mais caridosos para com o próximo, mais moderados em tudo, porque é essa a característica do verdadeiro espírita.

É-se espírita pelo só fato de simpatizar com os princípios da doutrina e por conformar com esses princípios o proceder. Trata-se de uma opinião como qualquer outra, que todos têm o direito de professar, como têm o de ser judeus, católicos, protestantes, simonistas, voltairiano, cartesiano, deísta e, até, materialista.

Coerente com seus princípios, o Espiritismo não se impõe a quem quer que seja; quer ser aceito livremente e por efeito de convicção. Expõe suas doutrinas e acolhe os que voluntariamente o procuram. Não cuida de afastar pessoa alguma das suas convicções religiosas; não se dirige aos que possuem uma fé e a quem essa fé basta; dirige-se aos que, insatisfeitos com o que se lhes dá, pedem alguma coisa melhor.

Assim, desde o começo, o Espiritismo lançou raízes por toda parte. A História nenhum exemplo oferece de uma doutrina filosófica ou religiosa que, em dez anos, tenha conquistado tão grande número de adeptos. Entretanto, não empregou, para se fazer conhecido, nenhum dos meios vulgarmente em uso; propagou-se por si mesmo, pelas simpatias que inspirou.

O Espiritismo proclama a liberdade de consciência como direito natural; reclama-a para os seus adeptos, do mesmo modo que para toda a gente. Respeita todas as convicções sinceras e faz questão da reciprocidade. Da liberdade de consciência decorre o direito de livre-exame em matéria de fé. O Espiritismo combate a fé cega, porque ela impõe ao homem que abdique da sua própria razão; considera sem raiz toda fé imposta, donde o inscrever entre suas máximas: Não é inabalável, senão a fé que pode encarar de frente a razão em todas as épocas da Humanidade.

Fonte: KARDEC, Allan. Obras Póstumas.

ESE - A Prece

“Se eu, pois, não entender o que significam as palavras, serei um bárbaro para aquele a quem falo; e o que fala, sê-lo-á para mim do mesmo modo. Porque, se eu orar numa língua estrangeira, verdade é que o meu espírito ora, mas o meu entendimento fica sem fruto. Mas se louvares com o espírito, o que ocupa o lugar do simples povo como dirá Amém sobre a tua benção, visto não entender ele o que tu dizes? Verdade é que tu dás bem as graças, mas o outro não é edificado.” (Paulo, I Coríntios, XIV: 11 - 14, 16-17).

Uma das condições essenciais da prece, segundo São Paulo é a de ser inteligível, para que possa tocar o nosso espírito. Para isso, entretanto, não basta que ela seja proferida na língua habitual, pois há preces que, embora em termos populares, não dizem mais à nossa inteligência do que as de uma língua estranha, e por isso mesmo não nos tocam o coração. As poucas idéias que encerram são em geral sufocadas pela superabundância das palavras e o misticismo da linguagem.

A principal qualidade da prece é a clareza. Ela deve ser simples e concisa, sem fraseologia inútil ou excesso de adjetivação, que não passam de meros ouropéis. Cada palavra deve ter o seu valor, exprimir uma idéia, tocar uma fibra da alma. Enfim: deve levar à reflexão. E somente assim pode atingir o seu objetivo, pois, de outro modo não passa de palavrório. Veja-se, entretanto, com que distração e volubilidade elas são proferidas, na maioria das vezes. Percebemos que os lábios se agitam, mas, pela expressão fisionômica e pela própria voz, percebe-se que é um ato maquinal, puramente exterior, de que a alma não participa.


Os Espíritos sempre disseram: “A forma não é nada, o pensamento é tudo. Faça cada qual a sua prece de acordo com as suas convicções, de maneira que mais lhe agrade, pois um bom pensamento vale mais do que numerosas palavras que não tocam o coração”.


O Espiritismo reconhece como boas as preces de todos os cultos, desde que sejam ditas de coração, e não apenas com os lábios. Não impõe nem condena nenhuma. Deus é sumamente grande, segundo o Espiritismo, para repelir a voz que implora ou que canta louvores, somente por não o fazer desta ou daquela maneira. Quem quer que condene as preces que não constem do seu formulário, demonstra desconhecer a grandeza de Deus. Acreditar que Deus se apegue à determinada fórmula, é atribuir-lhe a pequenez e as paixões humanas.


Fonte: KARDEC, Allan.O Evangelho Segundo o Espiritismo. (Cap. 28)

ESE - É permitido repreender os outros?

Ninguém sendo perfeito, não se segue que ninguém tem o direito de repreender o próximo?

Certamente que não, pois cada um de vós deve trabalhar para o progresso de todos, e sobretudo dos que estão sob a vossa tutela. Mas isso é também uma razão para o fazerdes com moderação, com uma intenção útil, e não como geralmente se faz, pelo prazer de denegrir. Neste último caso, a censura é uma maldade; no primeiro, é um dever que a caridade manda cumprir com todas as cautelas possíveis; e ainda assim, a censura que se faz a outro deve ser endereçada também a nós mesmos, para vermos se não a merecemos.


Será repreensível observar as imperfeições dos outros, quando disso não possa resultar nenhum benefício para eles, mesmo que não as divulguemos?


Tudo depende da intenção. Certamente que não é proibido ver o mal, quando o mal existe. Seria mesmo inconveniente ver-se por toda a parte somente o bem: essa ilusão prejudicaria o progresso. O erro está em fazer essa observação em prejuízo do próximo, desacreditando-o sem necessidade na opinião pública. Seria ainda repreensível fazê-la com um sentimento de malevolência e de satisfação por encontrar os outros em falta. Mas dá-se inteiramente o contrário, quanto, lançando um véu sobre o mal, para ocultá-lo do público, limitamo-nos a observá-lo para proveito pessoal, ou seja, para estudá-lo e evitar aquilo que censuramos nos outros. Essa observação, aliás, não é útil ao moralista? Como descreveria ele as extravagâncias humanas, se não estudasse os seus exemplos?


Há casos em que seja útil descobrir o mal alheio?


Esta questão é muito delicada e precisamos recorrer à caridade bem compreendida. Se as imperfeições de uma pessoa só prejudicam a ela mesma, não há jamais utilidade em divulgá-las. Mas se elas podem prejudicar a outros, é necessário preferir o interesse do maior número ao de um só. Conforme as circunstâncias, desmascarar a hipocrisia e a mentira pode ser um dever, pois é melhor que um homem caia, do que muitos serem enganados e se tornarem suas vítimas. Em semelhante caso, é necessário balancear as vantagens e os inconvenientes.


SÃO LUIS - Paris, 1860


Fonte: Evangelho Segundo o Espiritismo – Allan Kardec (Cap. X)