O presente trabalho possui um olhar antropológico, de caráter essencialmente bibliográfico, e tem por intenção apresentar, com base nas ideias da antropóloga Sandra Jacqueline Stoll (2003), para quem o Espiritismo, no Brasil, é uma reelaboração original da doutrina fundada por Allan Kardec na França, a tese de que a obra Os Quatro Evangelhos – A revelação da revelação do advogado francês Jean Baptiste Roustaing, contemporâneo de Kardec, é de fundamental importância para a reelaboração do Espiritismo no Brasil.
A pedagoga Elaine Maldonado, do CCA (Centro de Ciências Agrárias) do campus de Araras da Ufscar (Universalidade Federal de São Carlos) realizou o lançamento o livro “Machado de Assis e o Espiritismo”. A obra é fruto da dissertação de mestrado da pesquisadora em História e Sociedade, defendida na Unesp (Universidade Estadual Paulista).
A pedagoga traçou um paralelo entre a obra do autor e a trajetória da doutrina espírita tomando como referência crônicas e contos produzidos por Machado de Assis ao longo de 31 anos.
O Blog dos Espíritas já realizou a leitura da obra e recomenda a mesma para aqueles adeptos que se interessam pela História do Espiritismo no Brasil, assim como para os acadêmicos pesquisadores da doutrina espírita.
Uma pesquisa inédita usa equipamentos de última geração para investigar o cérebro dos médiuns durante o transe. As conclusões surpreendem: ele funciona de modo diferente
DENISE PARANÁ, DA FILADÉLFIA, ESTADOS UNIDOS
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Estávamos no mês de julho de 2008. Na Rua 34 da cidade da Filadélfia, nos Estados Unidos, num quarto do Hotel Penn Tower, um grupo seleto de pesquisadores e médiuns preparava-se para algo inédito. Durante dez dias, dez médiuns brasileiros se colocariam à disposição de uma equipe de cientistas do Brasil e dos EUA, que usaria as mais modernas técnicas científicas para investigar a controversa experiência de comunicação com os mortos. Eram médiuns psicógrafos, pessoas que se identificavam como capazes de receber mensagens escritas ditadas por espíritos, seres situados além da palpável matéria que a ciência tão bem reconhece. O cérebro dos médiuns seria vasculhado por equipamentos de alta tecnologia durante o transe mediúnico e fora dele. Os resultados seriam comparados. Como jornalista, fui convidada a acompanhar o experimento. Estava ali, cercada de um grupo de pessoas que acreditam ser capazes de construir pontes com o mundo invisível. Seriam eles, de fato, capazes de tal engenharia?
A produção de exames de neuroimagem (conhecidos como tomografia por emissão de pósitrons) com médiuns psicógrafos em transe é uma experiência pioneira no mundo. Os cientistas Julio Peres, Alexander Moreira-Almeida, Leonardo Caixeta, Frederico Leão e Andrew Newberg, responsáveis pela pesquisa, garantiam o uso de critérios rigorosamente científicos. Punham em jogo o peso e o aval de suas instituições. Eles pertencem às faculdades de medicina da Universidade de São Paulo, da Universidade Federal de Juiz de Fora, da Universidade Federal de Goiás e da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia. Principal autor do estudo, o psicólogo clínico e neurocientista Julio Peres, pesquisador do Programa de Saúde, Espiritualidade e Religiosidade (Proser), do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, acalentava a ideia de que a experiência espiritual pudesse ser estudada por meio da neuroimagem.
Pela primeira vez, o cérebro dos médiuns foi investigado com os recursos modernos da neurociência
Em frente ao Q.G. dos médiuns no Hotel Penn Tower, o laboratório de pesquisas do Hospital da Universidade da Pensilvânia estava pronto. Lá, o cientista Andrew Newberg e sua equipe aguardavam ansiosos. Médico, diretor de Pesquisa do Jefferson-Myrna Brind Centro de Medicina Integrativa e especialista em neuroimagem de experiências religiosas, Newberg é autor de vários livros, com títulos como Biologia da crença e Princípios de neuroteologia. Suas pesquisas são consideradas uma referência mundial na área. Ele acabou por se tornar figura recorrente nos documentários que tratam de ciência e religião. Meses antes, Newberg escrevera da Universidade da Pensilvânia ao consulado dos EUA, em São Paulo, pedindo que facilitasse a entrada dos médiuns em terras americanas. O consulado foi prestativo e organizou um arquivo especial com os nomes dos médiuns, classificando-o como “Protocolo Paranormal”.
“É conhecido o fato de experiências religiosas afetarem a atividade cerebral. Mas a resposta cerebral à mediunidade, a prática de supostamente estar em comunicação com ou sob o controle do espírito de uma pessoa morta, até então nunca tinha sido investigada”, diz Newberg. Os cientistas queriam investigar se havia alterações específicas na atividade cerebral durante a psicografia. Se houvesse, quais seriam? Os dez médiuns, quatro homens e seis mulheres, participavam do experimento voluntariamente. Foram selecionados no Brasil por meio de uma longa triagem. Entre os pré-requisitos, tinham de ser destros, saudáveis, não ter nenhum tipo de transtorno mental e não usar medicações psiquiátricas. Metade dos voluntários dizia carregar décadas de experiência no “intercâmbio espiritual”. Outros, menos experientes, apenas alguns anos.
Na Filadélfia, antes de a experiência começar, os médiuns passaram por uma fase de familiarização com os procedimentos e o ambiente do hospital onde seriam feitos os exames. O experimento só daria certo se os médiuns estivessem plenamente à vontade. Todos se perguntavam se o transe seria possível tão longe de casa, num hospital em que se podia perguntar se Dr. Gregory House, o personagem de ficção interpretado pelo ator inglês Hugh Laurie, não apareceria ali a qualquer momento.
Numa sala com aviso de perigo, alta radiação, começaram os exames. Por meio do método conhecido pela sigla Spect (Single Photon Emission Computed Tomography, ou Tomografia Computadorizada de Emissão de Fóton Único), mapeou-se a atividade do cérebro por meio do fluxo sanguíneo de cada um dos médiuns durante o transe da psicografia. Como tarefa de controle, o mesmo mapeamento foi realizado novamente, desta vez durante a escrita de um texto original de própria autoria do médium, uma redação sem transe e sem a “cola espiritual”. Os autores do estudo partiam da seguinte hipótese: uma vez que tanto a psicografia como as outras escritas dos médiuns são textos planejados e inteligíveis, as áreas do cérebro associadas à criatividade e ao planejamento seriam recrutadas igualmente nas duas condições. Mas não foi o que aconteceu. Quando o mapeamento cerebral das duas atividades foi comparado, os resultados causaram espanto.
Segundo a pesquisa, a mediunidade pode ser considerada uma manifestação saudável
Surpreendentemente, durante a psicografia os cérebros ativaram menos as áreas relacionadas ao planejamento e à criatividade, embora tenham sido produzidos textos mais complexos do que aqueles escritos sem “interferência espiritual”. Para os cientistas, isso seria compatível com a hipótese que os médiuns defendem: a autoria das psicografias não seria deles, mas dos espíritos comunicantes. Os médiuns mais experientes tiveram menor atividade cerebral durante a psicografia, quando comparada à escrita dos outros textos. Isso ocorreu apesar de a estrutura narrativa ser mais complexa nas psicografias que nos outros textos, no que diz respeito a questões gramaticais, como o uso de sujeito, verbo, predicado, capacidade de produzir texto legível, compreensível etc.
Apesar de haver várias semelhanças entre a ativação cerebral dos médiuns estudados e pacientes esquizofrênicos, os resultados deixaram claro também que aqueles voluntários não tinham esquizofrenia ou qualquer outra doença mental. Os cientistas afirmam que a descoberta de ativação da mesma área cerebral sublinha a importância de mais pesquisas para distinguir entre a dissociação (processo em que as ações e os comportamentos fogem da consciência) patológica e não patológica. Entre o que é e o que não é doença, quando alguém se diz tocado por outra entidade. Os médiuns estudados relataram ilusões aparentes, alucinações auditivas, alterações de personalidade e, ainda assim, foram capazes de usar suas experiências mediúnicas para tentar ajudar os outros. Pode haver, portanto, formas saudáveis de dissociação. Uma das conclusões a que os cientistas chegaram é que a mediunidade envolve um tipo de dissociação não patológica, ou não doentia. A mediunidade pode ser uma expressão comum à natureza humana. Essas conclusões, que ÉPOCA antecipa na edição que chegou às bancas na sexta-feira (16), foram divulgadas na revista científica americana Plos One. O estudo Neuroimagem durante o estado de transe: uma contribuição ao estudo da dissociação tem acesso gratuito desde sexta-feira, dia 16, no endereço eletrônico: dx.plos.org/10.1371/journal.pone.0049360.
O maior de todos os psicógrafos
Naquele verão, na Filadélfia, os dez médiuns produziram psicografias espelhadas – escritas de trás para a frente –, redigiram em línguas que não dominavam bem, descreveram corretamente ancestrais dos cientistas que os próprios pesquisadores diziam desconhecer, entre outras tantas histórias. Convivendo com eles naquele experimento, colhendo suas histórias, ouvindo os dramas e prazeres de viver entre dois mundos, encontrei diferentes biografias. Todos eles compartilham, porém, a crença de que aquilo que veem e ouvem é, de fato, algo real. Outro ponto em comum: todos nutriam enorme respeito por Chico Xavier, considerado o modelo de excelência da prática psicográfica.
Mineiro de família pobre, fala mansa e sorriso tímido, Chico Xavier recebeu apenas o ensino básico. Isso não o impediu de publicar mais de 400 livros, alguns em dez idiomas diferentes, cobrindo variados gêneros literários e amplas áreas do conhecimento. Ao final da vida, vendera cerca de 40 milhões de exemplares, cujos direitos autorais foram doados. Psicografou por sete décadas. Nenhum tipo de fraude foi comprovada. Isso não significa que seus feitos mediúnicos sejam absoluta unanimidade. Há controvérsias. O pesquisador Alexandre Caroli Rocha, doutor em teoria e história literária pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), chegou a conclusões que parecem favorecer a hipótese de que Chico fosse mesmo uma grande e sintonizada antena. Em seu mestrado, ele analisou o primeiro livro publicado pelo médium,Parnaso de além-túmulo, que trazia 259 poemas atribuídos a 83 autores já mortos.
Seu estudo considerou os aspectos estilísticos, formais e interpretativos dos poemas e concluiu que a antologia não era um produto de imitação literária simples. Rocha descobriu, por exemplo, que Guerra Junqueiro (1850-1923), um dos autores mortos, assinava a continuação de um poema inacabado em vida. Não havia indício de que Chico tivesse tido acesso ao poema antes de psicografar sua continuação. No doutorado, Rocha concluiu que Chico reproduzia perfeitamente o estilo do popular escritor Humberto de Campos (1886-1934). Nos textos que saíam da ponta de seu lápis havia, segundo Rocha, um estilo intrincado e sofisticado, detectável apenas por aqueles que conhecem bem como Humberto de Campos funciona. Muitos dos textos atribuídos a Campos continham informações que estavam fora do domínio público. Encerradas num diário secreto, tais informações só foram reveladas 20 anos depois da morte de Campos e do início da produção mediúnica de Chico.
A ciência pode desvendar a natureza da alma?
“Se eu pudesse recomeçar minha vida, deixaria de lado tudo o que fiz, para estudar a paranormalidade.” Essa confissão de Sigmund Freud a seu biógrafo oficial, Ernest Jones, marca um dos capítulos pouco conhecidos da história do pensamento humano. Pouca gente sabe também que muitas das teorias reconhecidas hoje pela ciência sobre o inconsciente e a histeria baseiam-se em trabalhos de pesquisadores que se dedicaram ao estudo da mediunidade. Talvez menos gente saiba que Marie Curie, a primeira cientista a ganhar dois prêmios Nobel, e seu marido, Pierre Curie, também Nobel, dedicaram espaço em suas atribuladas agendas ao estudo de médiuns. No Instituto de Metapsíquica em Paris, no início do século passado, Madame Curie inquiriu com seus assombrados olhos azuis a médium de efeitos físicos Eusapia Palladino. O casal Curie supôs que os segredos da radioatividade poderiam ser revelados por meio de uma fonte de energia espiritual. Quem seria capaz de imaginar isso hoje?
Outros cientistas laureados com o Nobel consagraram parte de sua vida buscando respostas para os mistérios da alma e a possibilidade de comunicação com os mortos. Pesquisas que hoje seriam consideradas assombrosas, como materialização de espíritos, movimentação de objetos à distância, levitação etc., foram realizadas na passagem entre os séculos XIX e XX. Houve forte oposição materialista. Experimentos frustrados e a comprovação de fraude de alguns médiuns lançaram um manto de ceticismo e silêncio sobre o tema. Essa linha de pesquisa entrou em crise. Experimentos com mediunidade aos poucos se tornaram uma mácula nos currículos oficiais dos eminentes cientistas. E a ciência moderna acabou por condenar ao esquecimento inúmeras pesquisas científicas sobre o assunto, algumas rigorosas. Enquanto o cinema, a TV e a literatura cada vez se apropriam mais das questões do espírito, a ciência dominante tem torcido o nariz e deixado essas reflexões fora de seu campo.
A questão tem sido esquecida, mas não totalmente. Apesar de ainda tímidas, pesquisas científicas sobre comunicações mediúnicas, como a da Filadélfia, têm sido realizadas recentemente. Basicamente, encontraram que, além de fenômenos que revelam fraude proposital ou inconsciente do médium, há muito a explicar. Muita coisa não cabe dentro do discurso que prevalece hoje na ciência. Pesquisadores da área acreditam que a telepatia do médium com o consciente ou o inconsciente daquele que deseja uma comunicação espiritual não explica psicografias nas quais se revelam informações desconhecidas das pessoas que o procuram.
A mensagem
Para os céticosA ciência precisa investigar a sério a hipótese da comunicação entre médiuns e mortos
Para os crentes Essa hipótese ainda precisa passar por mais investigações para ser comprovada
Muitas informações fornecidas por médiuns, dizem eles, se confirmaram verdadeiras só mais tarde, após pesquisa sobre o morto. Como pensar então em telepatia se só o morto detinha as informações? Seria possível a ideia de comunicação direta com os mortos? Alguns cientistas que estudam as percepções mediúnicas discordam dessa hipótese. Acreditam que é possível não haver limite de espaço e tempo para percepções mediúnicas. O médium poderia andar para a frente e para trás no tempo e no espaço, coletando as informações que desejasse, quando e onde elas estivessem. Num fenômeno em que comprovadamente não houvesse fraude ou sugestão inconsciente, sobrariam apenas duas hipóteses: ou haveria a capacidade do médium de captar informações em outro espaço e tempo; ou existiria mesmo a capacidade de comunicação entre o médium e o espírito de um morto.
Atuais referências no estudo científico de fenômenos tidos como espirituais, cientistas como Robert Cloninger, Mario Beauregard, Erlendur Haraldsson, Stuart Hameroff e Peter Fenwick aplaudem a iniciativa de Julio Peres em seu estudo. Esse neurocientista brasileiro, que tem colhido apoio em seus pares, afirma que seus achados “compõem um conjunto de dados interessantes para a compreensão da mente e merecem futuras investigações, tanto em termos de replicação como de hipóteses explicativas”. Outro coautor do estudo, o psiquiatra Frederico Camelo Leão, coordenador do Proser, defende mais estudos acerca das experiências tidas como espirituais. “O impacto das pesquisas despertará a comunidade científica para como esse desafio tem sido negligenciado”, diz.
O pesquisador Alexander Moreira-Almeida, coautor do estudo e diretor do Núcleo de Pesquisas em Espiritualidade e Saúde (Nupes), da Universidade Federal de Juiz de Fora, é o principal responsável por colocar o Brasil em destaque nessa área no cenário internacional. Moreira-Almeida recebeu o Prêmio Top Ten Cited, como o primeiro autor do artigo mais citado na Revista Brasileira de Psiquiatria, com Francisco Lotufo Neto e Harold G Koenig. É editor do livro Exploring frontiers of the mind-brain relantionship (Explorando as fronteiras da relação mente-cérebro, em tradução livre), pela reputada editora científica Springer.
Ele afirma que a alma, ou como prefere dizer, a personalidade ou a mente, está intimamente ligada ao cérebro, mas pode ser algo além dele. Para esse psiquiatra fluminense, pesquisas sobre experiências espirituais, como a mediunidade, são importantes para entendermos a mente e testarmos a hipótese materialista de que a personalidade seja um simples produto do cérebro. Moreira-Almeida lembra que Galileu e Darwin só puderam revolucionar a ciência porque passaram a analisar fenômenos que antes não eram considerados. “O materialismo é uma hipótese, não é ainda um fato cientificamente comprovado, como muitos acreditam”, diz Moreira-Almeida.
Apesar de todos os avanços da ciência materialista, a humanidade continua aceitando as dimensões espirituais. Dados do World Values Survey revelam que a maioria da população mundial acredita na vida após a morte. Em todo o planeta, um número expressivo de pessoas declara ter se sentido em contato com mortos: são 24% dos franceses, 34% dos italianos, 26% dos britânicos, 30% dos americanos e 28% dos alemães. Não há dúvida de que o materialismo científico foi instrumento de enorme progresso para a humanidade. A dúvida é se ele, sozinho, seria capaz de explicar toda a experiência humana. Para a maioria da população, a visão materialista parece deixar um vazio atrás de si. Na busca de respostas para nossas principais questões, muitos assinariam embaixo da frase de Albert Einstein: o homem que não tem os olhos abertos para o mistério passará pela vida sem ver nada.
* Denise Paraná é jornalista, doutora em ciências humanas pela Universidade de São Paulo e pós-doutora, como visiting scholar, pela Universidade de Cambridge, Inglaterra
Revista Época - 19 de Novembro de 2012 - Número 757
Atendendo à solicitação do coordenador do Espirit Book, Henrique Ventura Regis, pretendo expor aqui, de modo sintético e amparado no pensamento de Allan Kardec, o que penso sobre a chamada questão religiosa no movimento espírita.
Afinal, o Espiritismo é ou não é religião? Tema complexo, apaixonante, tão antigo quanto o Espiritismo, tornou-se recorrente e motivo de discórdia, de cisão e de posturas sectárias. Tanto que, nos anos 1980, o movimento espírita se viu dividido entre duas posições antagônicas, a dos espíritas religiosos e a dos não-religiosos. Ruptura semelhante à que ocorreu entre os espíritas místicos e os espíritas científicos, no Brasil do século 19. Essa divisão ainda prossegue, sem que possamos vislumbrar algum tipo de consenso.
Todavia, ninguém melhor do que o fundador do Espiritismo para defini-lo. E ele o fez diversas vezes, em vários momentos de sua obra. Apesar da evidente vinculação doutrinária ao cristianismo, Allan Kardec rechaçou de modo veemente o suposto caráter religioso do Espiritismo e condenou o uso da palavra religião para classifica-lo, devido ao seu duplo sentido: de laço e de culto.
Quem primeiro levantou esse tema foi o Abade Chesnel, ao considerar que havia “uma nova religião em Paris”, que deveria ser combatida e reprimida. Através da Revista Espírita, Kardec rebateu a tese do Abade, também expondo-a de forma didática em O Que é o Espiritismo, no debate com o Padre.
Allan Kardec insistiu em definir o Espiritismo como uma ciência de observação, de consequências morais, como qualquer ciência ou forma de conhecimento. A seguir, iremos transcrever de suas obras uma série de pensamentos do Druida de Lyon, a fim de observarmos que ele não vacilou nessa questão e sempre procurou deixar claro, de modo bem didático, o que pensava a respeito do caráter e da natureza da doutrina espírita.
O Que é o Espiritismo
“O Espiritismo é uma ciência que trata da natureza, da origem e do destino dos Espíritos e de suas relações com o mundo corporal.” (p. 44)
“O Espiritismo é, antes de tudo, uma ciência e não se ocupa das questões dogmáticas. Essa ciência tem consequências morais, como todas as ciências filosóficas.” (p. 102)
“O seu verdadeiro caráter é, portanto, o de uma ciência e não o de uma religião.” (p. 103)
“O Espiritismo conta entre os seus partidários homens de todas as crenças, que nem por isso renunciam às suas convicções: católicos fervorosos, protestantes, judeus, muçulmanos, e até budistas e hindus.” (p. 103)
“O Espiritismo não era mais que simples doutrina filosófica; foi a própria Igreja que o proclamou como nova religião.” (p. 100)
“Não somos ateus, porém não implica isso que sejamos protestantes.” (p. 104)
Só “existem duas coisas no Espiritismo: a parte experimental das manifestações e a doutrina filosófica.” (p. 95)
“Sem ser em si mesmo uma religião, o Espiritismo está ligado essencialmente às ideias religiosas.” (p. 116)
A Gênese
“É, pois, rigorosamente exato dizer que o Espiritismo é uma ciência de observação e não produto da imaginação.” (p. 20)
“O Espiritismo é uma revelação (...) na acepção científica da palavra.” (p. 19)
“O Livro dos Espíritos, a primeira obra que levou o Espiritismo a ser considerado de um ponto de vista filosófico, pela dedução das consequências morais dos fatos.” (p. 40 - Nota de rodapé)
“As religiões hão sido sempre instrumentos de dominação.” (p. 17)
O Espiritismo em Sua Expressão Mais Simples
“Do ponto de vista religioso, o Espiritismo tem por base as verdades fundamentais de todas as religiões.” (p. 27)
“Homens de todas as castas, de todas as seitas, de todas as cores, sois todos irmãos.” (p. 39)
Há dezenas de outras afirmações de Allan Kardec que poderiam ser aqui citadas, mas não seriam suficientes para fechar a questão. Há fatores antropológicos, sociológicos, psicológicos e históricos a serem contemplados. Estudos recentes no campo da antropologia social demonstram o caráter religioso do Espiritismo brasileiro. O Espiritismo é uma religião, uma forma de culto, foi assim que ele se desenvolveu historicamente. Não há como negar.
Pensadores espíritas de grande envergadura, como Carlos Imbassahy e Herculano Pires, admitiram o caráter religioso do Espiritismo, como uma doutrina de tríplice aspecto (ciência, filosofia e religião), ideia semelhante ao “triângulo de forças espirituais” do espírito Emmanuel.
Apoiado na conceituação do filósofo francês Henri Bergson, Herculano desenvolveu uma interessante tese da religião como fator natural, dinâmica, a chamada religião natural, em uma conceituação próxima à do iluminista francês Rousseau e do pedagogo suíço Pestalozzi, mestre de Rivail.
Por sua vez, pensadores espíritas outros como David Grossvater, Jon Aizpúrua, Jaci Regis e Krishnamurti de Carvalho Dias, apoiados no humanismo kardequiano e no laicismo espírita, conduziram seu pensamento rumo a uma concepção laica, não-religiosa do Espiritismo. O segmento não-religioso é minoria, mas bastante expressivo, dinâmico, aberto ao debate e às novas ideias.
Na dúvida, ficamos com Allan Kardec. Como vimos, ele rechaçou a ideia de uma religião espírita. Rejeitou a palavra religião para definir o Espiritismo. Não há como negar esse fato.
Afinal, quem estará com a razão? Difícil dizer. O tempo dirá...
OBRAS CITADAS
KARDEC Allan - O Que é o Espiritismo, trad. Joaquim da Silva Sampaio Lobo in Iniciação Espírita, 5ª ed. São Paulo-SP [Edicel].
KARDEC Allan - O Espiritismo na sua Mais Simples Expressão, trad. Joaquim da Silva Sampaio Lobo in Iniciação Espírita, 5ª ed. São Paulo-SP [Edicel].
KARDEC Allan - A Gênese, trad. Guillon Ribeiro, 36ª ed. Rio de Janeiro-RJ [FEB].
KARDEC Allan - Revista Espírita, trad. Júlio Abreu Filho, 1ª ed. São Paulo-SP [Edicel].
Fonte: Espirit Book - http://www.espiritbook.com.br/profiles/blogs/a-questao-religiosa-no
Otoño de 1961, día 09 del mes de Octubre, Barcelona España.
Era media mañana de un día claro, los paisajes estaban verdosos y el clima ameno y aun mismo oscilando en los altos y bajos del día, no ultrapasaba los 27 grados e invitaba a la gente del lugar a un espectáculo más de la vida! el presagio era de la felicidad cotidiana…
En una plaza de la ciudad, Plaza de Quemadero, cerca de ocho hombres en sus diferentes papeles, cumplían, con sus emociones casi imperceptibles, ordenes de la autoridad religiosa local, que condenaba al fuego inquisidor, cerca de 300 libros que “renegaban” la fe vigente en el poder y estaban intactos, diseminar sus ideas apócrifas por el país. Los libros hablaban de moral, de fe, de fenómenos espirituales, de ciencia, de mediúmnidad, de una nueva doctrina (que según algunos supuestamente podría virar la cabeza de los hombres) y hablaban de Dios.
El mirar del padre de la comitiva quemó por unos instantes los ojos de un hombre entre los muchos que lo miraban de aquella multitud enfurecida que asistía al improbable espectáculo. El hombre desvió la mirada del religioso y posó en la cruz que el cargaba en sus manos y que sarcásticamente simbolizaba otra quema de ideas cometida hacia 1961 años antes y pensó: ¿Hasta cuándo nos repetiremos?
El escribiente de las actas del caluroso espectáculo se colocó cautelosamente en una posición apartada del fuego, que era alimentado por tres sirvientes de la aduana sudorosa por el calor y por la energía de indignación que venía del pueblo que gritaba sus pareceres a aquella arremetida de inquisición.
En breve el humo de los fuegos se iba esparciendo en el aire, recordando a todos que era la hora de volver. No sin antes, muchos revisar en los escombros de la violencia y cargar consigo páginas amarillentas, más salvadas del espíritu del fuego.
Verano del 2012, día 11 del mes de Marzo, Río de Janeiro, Brasil.
Al final de la tarde de un domingo soleado de fin de verano, pocas nubes en el cielo, la temperatura excedía los 31 grados y la gente del lugar ya caminaba en dirección a los bares, playas y otras direcciones.
El preludio era de una noche estrellada.
En una casa espirita de la ciudad, cerca de tres mujeres, equipadas de sus autoridades de bibliotecarias del local, son sus facciones impasibles, colocaban en una estantería de hierro muchos libros romanceados donados por un colaborador. En los lugares de destaque y más accesibles de las estanterías, ellos fueron colocados en orden cronológico y adhesivos blancos con letras rojas fueron colocados señalizando los autores. En la última estantería, casi en el suelo, traducciones de aquellos libros quemados en España, se agrupaban en buen estado, sin embargo polvorientos y prodigados por las miradas de los que pasaban por allá. Y era como si hiciesen eco en el local de la constatación de que el fuego no consigue destruir ideas, más si el espíritu destruidor de la ignorancia del hombre puede apagarlas.
El Espíritu del Fuego solo habita en el carácter del hombre encarnado, que hace de él, el hierro que forzosamente formula convicciones.
Puede nuestro fuego interior quemar apenas la inercia, incongruencias, paradigmas y falacias…
Que nuestro fuego espiritual siga encendido para iluminar mentes y su calor sea acogedor y seguro.
Clique aqui para a versão em português. Tradução: Mercedes Cruz
Outono de 1861, dia 09 do mês de outubro, Barcelona, Espanha.
Meio da manhã de um dia claro, as paisagens estavam verdejantes e o clima tão ameno que mesmo oscilando nos altos e baixos do dia, não ultrapassava 27 graus e convidava a gente do lugar a mais um espetáculo de vida! O prenúncio era de felicidade cotidiana...
Numa praça da cidade, Praça de Quemadero, cerca de oito homens em seus diferentes papéis, cumpriam, com suas emoções quase imperceptíveis, ordens da autoridade religiosa local, que condenava ao fogo inquisidor, cerca de 300 livros que “renegavam” a fé vigente no poder e poderiam se intactos, disseminar suas idéias apócrifas pelo país. Os livros falavam de moral, de fé, de fenômenos espirituais, de ciência, de mediunidade, de uma nova doutrina (que segundo alguns, supostamente poderia virar a cabeça dos homens) e falavam de Deus.
O olhar do padre da comitiva queimou por alguns instantes os olhos de um homem dentre os muitos que o miravam daquela multidão enfurecida que assistia ao improvável espetáculo. O homem desviou o olhar do religioso e pousou na cruz que ele carregava em suas mãos e que sarcasticamente simbolizava outra queima de idéias cometida há 1861 anos antes e pensou: Até quando nos repetiremos?
O escrevente da ata do caloroso espetáculo se colocou cautelosamente numa posição afastada do fogo, que era alimentado por três serventes da alfândega suados pelo calor e pela energia de indignação que vinha do povo que gritava seus “abaixos” àquele arremedo de inquisição.
Aos poucos a fumaça dos fogões vai se espalhando no ar, lembrando a todos que já era hora de voltar. Não sem antes, muitos revirarem os escombros da violência e carregarem consigo páginas amarelecidas, mas salvas do espírito do fogo.
Verão de 2012, dia 11 do mês de Março, Rio de Janeiro, Brasil.
Final da tarde de um domingo ensolarado de fim de verão, poucas nuvens no céu, a temperatura não excedia os 31 graus e a gente do lugar já caminhava em direção aos bares, praias e outras direções. O prenúncio era de noite estrelada.
Numa casa espírita da cidade, cerca de três mulheres, munidas de suas autoridades de bibliotecárias do local, com suas feições impassíveis, arrumavam na estante de ferro muitos livros romanceados doados por um colaborador. Nos lugares de destaque e mais acessíveis das prateleiras, eles foram arrumados em ordem cronológica e adesivos brancos com letras vermelhas foram colados sinalizando os autores. Na última prateleira, quase no chão, traduções daqueles livros queimados na Espanha, se agrupavam em bom estado, mas empoeirados e poupados dos olhares dos que passavam por lá. E era como se ecoasse no local a constatação de que o fogo não consegue destruir idéias, mas o espírito destruidor da ignorância do homem pode abafá-las.
O Espírito do Fogo só habita no caráter do homem encarnado, que faz dele, o ferro que forçosamente formata convicções.
Possa nosso fogo interior queimar apenas a inércia, incongruências, paradigmas e falácias...
Que nosso fogo espiritual siga aceso para iluminar mentes e seu calor seja acolhedor e seguro.
El Espiritismo no murió con Kardec… más, también, no prosiguió en Brasil después de que …
Para comprender esta acepción es necesario un pensamiento simple: el de que el Espiritismo fue concebido como ciencia y como filosofía. Y como ciencia y filosofía, el posee método.
La ciencia es algo que debe ser permanentemente ejercitada. En el concepto científico se investiga, se mide, se confiere. Una información cualquiera en una ciencia solamente es válida después de extensos textos y verificaciones para la evaluación de la verdad. Si es así con toda la ciencia, no sería diferente con el Espiritismo. Cualquier información, para ser considerada válida en el Espiritismo, necesita ser AFERIDA. Y para aterir, Kardec estableció un método, que por todos los criterios posibles aun es el mejor. Aun mismo porque no existe y nadie invento ningún otro: el CUEE. Control Universal de las Enseñanzas de los Espíritus.
Sin el CUEE, sin esa confirmación, sin aferición, no podemos decir que una información es verdadera. El problema en Brasil en especifico – y ahora arrastrándose por el resto del mundo – es que mucha gente abdico de la verdad, pues no se preocupa en aceptar cualquier información sin esa confirmación. Se toma en cuenta las emociones del momento y la “fama” de uno u otro autor.
Con todo, cualquier persona sabe que una ciencia solo avanza cuando sus axiomas son probados. Como el método de aferición del Espiritismo no es aplicado en Brasil y aun como los avances científicos de otras áreas son ignorados por la mayoría de los espiritas, entonces, en Brasil, el Espiritismo paró. Y paró en un periodo paradojamente ANTERIOR a Kardec – dentro del réligiosismo ciego que acepta todo sin cuestionar.
Ya el aspecto filosófico debe ser siempre ejercitado, estimulado. El pensamiento, el modo de pensar espirita debe extrapolar en las áreas de comportamiento humano visando comienza en el individuo). Infelizmente, se abdico de eso también en Brasil.
El ejercicio de filosofía en el medio espirita brasileño se limita a la reproducción de textos de autores famosos, de citaciones del Evangelio Según el Espiritismo. Y cuando se piensa que el parte para aprovechar nuevos horizontes, comienzan las visitas que huyen de cualquier lógica prevista en la codificación y aun mismo en el buen sentido, en obras que más se parecen a libros de auto-ayuda.
Entonces, filosóficamente también el Espiritismo en Brasil se estancó en las exigencias de un mercado editorial comercial ávido por “mensajes bonitos”, más nulos de contenido doctrinario y real.
Cuando alguien afirma que algunas personas defienden la codificación y que eso paraliza el Espiritismo, practica la falacia de que justamente la codificación es la que nos incita a avanzar. Y es un real avance, pues se basa en la BUSQUEDA DE LA VERDAD.
El espirita debe, según la codificación, investigar, pesquisar, raciocinar, inquirir, ir al campo, divulgar exactamente y no permitir de ninguna forma que las cosas que no sean verdad prevalezcan. ¿Qué avance seria ese defendido por grupos mayoritarios que se basa en cosas que no se pueden comprobar ni aun mismos por el método del CUEE o por la ciencia? ¿Dónde hay avance en la falta de verificación de las informaciones?
¿Dónde hay avance en el fanatismo ciego que lleva a la mayor parte del movimiento espirita a abandonar exactamente el texto que nos pide buscar la verdad, a cambio de seguir fascinadamente a uno u otro autor individual, que supuestamente psicografia libros también de un único espíritu?
¿Dónde existe la verdad sin aferición?
Y queda la gran duda -¿Cuál es la gran resistencia al verificarse si una información es verdadera o no? ¿Cuál es el gran motivo que impele a personas aceptar cosas sin investigar, apenas tomando en cuenta nombres de autores famosos y que jamás buscaron esa misma verdad?
El Espiritismo no murió con Kardec. El Espiritismo está vivo. Más vivo en los corazones de todos aquellos que lo toman en serio y que buscan lo que es cierto y correcto. Fue para eso que nació la codificación espirita.
*NEFCA - Núcleo Espírita de Filosofía e Ciencias Aplicadas
Desde a chegada do Espiritismo no Brasil, há décadas, vem se acumulando assustadoramente livros e livros de espíritas e espíritos que estão na prateleira do Espiritismo. Entretanto, basta um leitor mais cuidadoso confrontar o conteúdo com a base da Doutrina Espírita, O Livro dos Espíritos, que veremos o choque de conceitos, claramente expressos entre um e outro. Ao cúmulo deste confronto ideológico de conceitos dá-se o nome de “Colônias Espirituais”.
Os incautos podem então afirmar que tanto numa quanto noutra obra são transcritas palavras de espíritos e nada há para validar ou invalidar as afirmações. Contudo, ao curioso e atento leitor que pretenda se denominar Espírita, não há de ter passado despercebido bem no início de O Evangelho Segundo o Espiritismo – outra obra considerada básica no cerne doutrinário espírita – a referência ao Controle Universal do Ensino dos Espíritos (CUEE). Temos ali, revelados numa linguagem relativamente simples e inteligível, o caminho das pedras para a validação de uma obra espírita, inclusive e principalmente, o caminho de aferição da própria Doutrina Espírita, que não “caiu do céu” simplesmente, como acontece com tanta literatura fácil no meio.
O CUEE mostra a preocupação dos Espíritos, acatada por Kardec em todo o seu trabalho, do uso de metodologia, razão e bom senso. O cuidado no aceitar qualquer coisa que venha de um médium ou de um espírito está refletido no alerta do CUEE e também em toda a obra O Livro dos Médiuns.
Deparamo-nos então com dois tipos de erros: a preguiça de aferir pelo método aquilo que supostamente é revelado como novo e o descaso com o rico conteúdo doutrinário que, apesar de não estar fechado, ainda é jovem e fonte preciosa de estudos e revelações. E não raras vezes, a doutrina é rechaçada pela prática espírita vigente, virando mero objeto de ilustração, inspirando por aí, seus supostos “filhos” ou afiliados, mas que não trazem em suas obras, observações e práticas doutrinárias - o fruto que comprovaria seu DNA, se é que assim se pode dizer.
No mais, ainda na referência ao Controle Universal do Ensino dos Espíritas, temos o alerta tão especialmente registrado:
Os Espíritos Superiores procedem, nas suas revelações, com extrema prudência. Só abordam as grandes questões da doutrina de maneira gradual, à medida que a inteligência se torna apta a compreender as verdades de uma ordem mais elevada, e que as circunstâncias são propícias para a emissão de uma ideia nova. Eis porque, desde o começo, eles não disseram tudo, e nem o disseram até agora, não cedendo jamais à impaciência de pessoas muito apressadas, que desejam colher os frutos antes de amadurecerem. Seria, pois, inútil, querer antecipar o tempo marcado pela Providência para cada coisa, porque então os Espíritos verdadeiramente sérios recusam-se positivamente a ajudar. Os Espíritos levianos, porém, pouco se incomodando com a verdade, a tudo respondem. É por essa razão que, sobre todas as questões prematuras, há sempre respostas contraditórias.
Como é vida após a morte? Seria a pergunta chave que culmina em tanta controvérsia entre espíritas diversos.
Defensores do relato dos Espíritos Superiores, laboratório de estudos psíquicos de Kardec, e outras obras mais ligadas ao Espiritismo sério acham graça dos mitos que permeiam as crenças: umbrais, colônias, hospícios, hospitais, verdadeiros ‘elefantes brancos’ espirituais, que, em suma, se existissem, não justificariam a encarnação, pois sendo cópia do mundo terrestre, desnecessário seria aos espíritos deste mundo encarnarem para sua evolução.
O choque materialista trava a batalha entre razão e emoção por evitar conceber um mundo espiritual sem os acessórios terrenos.
Na instrução dos Espíritos da Codificação concluímos, após leitura atenta, que a Terra não é uma cópia do plano espiritual, sendo este o principal, e o material, secundário, que poderia até mesmo nem existir.
O mundo espiritual é fruto das nossas necessidades materiais e orgânicas enquanto espíritos encarnados, desnecessário, portanto, ao espírito desencarnado, cujo foco é o seu progresso intelectual e moral.
O ambiente terrestre também pode ser concebido como o laboratório onde iremos colocar em ação vivencial os nossos avanços. Se na erraticidade tivéssemos uma cópia da terra, encarnar seria supérfluo e desnecessário. Não haveria motivo para encarnar, se o mundo espiritual apresenta as mesmas condições materiais para se evoluir.
Em certa literatura que se denomina espírita lemos:
O Umbral – continuou ele, solícito – começa na crosta terrestre. É a zona obscura de quantos no mundo não se resolveram a atravessar as portas dos deveres sagrados, a fim de cumpri-los, demorando-se no vale da indecisão ou no pântano dos erros numerosos. [...] O Umbral funciona, portanto, como região destinada a esgotamento de resíduos mentais; uma espécie de zona purgatorial, onde se queima, a prestações, o material deteriorado das ilusões que a criatura adquiriu por atacado, menosprezando o sublime ensejo de uma existência terrena.
Entra então o conceito de existir. Será existência "real/material" ou "psíquica"?
Segundo O Livro dos Médiuns, nos redutos espirituais não há existência concreta, são de curta duração, transitórios, fluídicos... O Livro dos Espíritos afirma que não existe purgatório e nem local destinado a penas ou sofrimentos, mas aglomerações por afinidades de Espíritos ainda apegados à matéria. Necessidades materiais apenas são contempladas em mundos materiais e não num contexto espiritual.
Os espíritos na erraticidade se encontram numa dimensão invisível ao nosso olhar racional, mas tecnicamente podem estar aqui do nosso lado, se ainda apegados aos nossos impulsos primários e muito distantes, se avançados em sua evolução.
Cabe-nos entender principalmente que o caminho evolutivo é longo e penoso, não só para os que desligados do corpo terrestre, caminham para o fim destinado a todos os espíritos – o da purificação – como também aos que se encontram neste intervalo encarnatório, em lutas quixotescas contra as páginas de Kardec e dos Espíritos da Codificação que tão bem ilustram nossas dúvidas e anseios do porvir. Duvidas estas embaçadas pelos nossos olhos que se recusam a ver e por nosso orgulho que se recusa a entender.
REFERÊNCIAS
KARDEC, Allan, O Livro dos Espíritos – 1857. Tradução Ed. Lake, 1995, Herculano Pires
KARDEC, Allan, O Evangelho segundo o Espiritismo - 1863, Tradução Ed. Lake, 2003, Herculano Pires
XAVIER, Chico , Nosso Lar - Ed. Feb, 1944 - 45ª edição
Centradas no entendimento religioso da Doutrina Espírita, sofrendo influências de diversas religiões, especialmente as cristãs, africanas e indígenas, as casas espíritas tradicionalmente ostentam nomes que remetem ao conceito de lugar sagrado.
Assim, acompanhando a adjetivação espírita, não é incomum encontrar termos como: templo, congregação, sinagoga, tenda, casa de pai fulano, centro de irmão beltrano, etc. Existem ainda instituições que reverenciam ícones católicos, homenageiam pessoas já mortas ou ainda vivas, que se destacaram no meio espírita e que são consideradas quase “santas”.
Incorrem em erro, pois essa nomenclatura nega, altera ou reduz a identidade espírita e suas propostas originais. É contraproducente também em termos de comunicação social, pois utilizam signos e linguagem que não a especificam ideologicamente, não esclarecem qual seja sua visão, suas metas, ou como atuam.
Deveria haver no âmbito espírita, um movimento de conscientização sobre essas impropriedades, visando eliminar essas denominações, substituindo-as por outras que melhor definissem a atividade, o caráter e o propósito da doutrina.
A estrutura funcional e as práticas da maioria dos centros espíritas são tão inadequadas quanto os nomes. A rigor, inexistem instituições nos moldes do Instituto Parisiense de Estudos Espíritas, fundado por Kardec, que atuava sob enfoque filosófico e com metodologia científica de pesquisa.
A descoberta (e não uma revelação, no sentido místico) da realidade do espírito e do intercâmbio entre encarnados e desencarnados, impôs um conceito ético e moral, que, entretanto não justifica o desenvolvimento de uma religião. Não é necessário seguir um credo, para se viver com moralidade e ética.
A maioria dos espíritas brasileiros, e conseqüentemente, a sociedade em geral, acha que Kardec recomendava práticas evangelizadoras por haver escrito o livro "O Evangelho Segundo o Espiritismo". Kardec não escreveu ou compilou obras de pregação religiosa, não visava fazer apologia e proselitismo cristão. Seu objetivo era o de explicar o pensamento de Jesus sob o enfoque espírita. Por isso, naquela obra, endossou apenas o aspecto moral de seus ensinamentos, não sancionou sua biografia divinizada e seus milagres, alertando para a falta de comprovação histórica desses relatos dos evangelhos canônicos.
Nem mesmo a máxima espírita mais conhecida – “Fora da caridade não há salvação”, escapou de desvirtuamento, pois não é uma recomendação explícita, mas uma paráfrase. O movimento espírita fixou-se em atividades de consolo espiritual e distribuição de bens materiais, distanciando-se do cerne da proposta doutrinária, que privilegia a educação individual e coletiva, única saída para a elevação qualitativa da sociedade. Seria o caso de se perguntar a que se dedicarão os espíritas, quando não mais houver pobres no planeta. Ou de que se ocupam as criaturas que habitam orbes mais avançados do Universo, que não tenham tais desníveis sociais.
Há casas espíritas cujos nomes enfatizam essa distorcida noção de caridade: Pão dos Pobres, Socorristas de Maria, Amantes da Pobreza, etc. Inclusive, nestes dois últimos exemplos, além de incorrerem no erro conceitual, o fazem também no semântico, pois as denominações podem ter dupla significação: pessoas que socorrem a santa católica; amor à pobreza, propriamente dita.
Discriminam os carentes já a partir dos nomes, mantêm atividades assistencialistas sem desenvolver trabalhos educativos que despertem potencialidades e firmem noções de cidadania, para conscientizá-los sobre seus direitos e deveres, tanto individuais como coletivos.
Dessas e de outras interpretações incorretas derivam-se os problemas de caracterização e funcionamento de um centro espírita. A obra kardequiana afirma que a Doutrina Espírita não possui dogmas, hierarquias e cultos. Causa espanto, o fato de os espíritas repetirem essa definição, mas não assumirem que, na prática, há hierarquização e ritualização.
De fato, a federativa nacional é vaticanista, as estaduais funcionam como arcebispados e os centros como paróquias. Em todos os níveis, a quase totalidade dos dirigentes é vitalícia, ou promovem alternâncias periódicas entre os integrantes de grupos fechados e inamovíveis.
No Brasil, o Centro Espírita já virou igreja. É um fato sociologicamente definido. A sua estrutura funcional repete rituais de outras religiões cristãs. As missas católicas adotam módulos entremeados de cânticos e responsórios: Introdução, Ofertório, Leitura do Evangelho, Consagração da Hóstia, Comunhão, Bênção Final, com água benta aspergida sobre a assistência ou individualmente colhida à saída do recinto.
Na casa espírita, sempre de maneira solene e mística, acontecem: prece de abertura, pequena leitura ou preleção religiosa, palestra/sermão de caráter evangélico, oração final, passes e ingestão de "água fluidificada". Algumas instituições até adotam coros e cantorias. A coincidência não é fortuita. É atavismo e desconhecimento do que realmente seja a filosofia espírita.
Para os espíritas religiosos, está tudo correto, embora a divergência com o que Kardec ensinou e praticou. Segundo esse segmento, o espírita deve mesmo ser um pregador do Evangelho, ainda que em nítida desvantagem em relação aos católicos e protestantes que estudam teologia para bem desempenhar seu trabalho, que além do mais, é profissão.
Excetuando algumas pessoas que usam seus conhecimentos gerais e acadêmicos para embasar suas prédicas, a grande maioria é composta por pessoas comunicativas, imbuídas de espírito missioneiro, não raro vaidosas e/ou fanáticas, que embora bem intencionadas, não possuem preparo intelectual ou doutrinário.
Disso, resulta empirismo, interpretações pessoais ou de grupos. Não há estudos, mas sim, catequese. Paradoxalmente, onde deveria haver livre exame de conteúdos, só ocorre veiculação de conceitos repetidos. Os líderes das instituições não se questionam e nem permitem questionamentos sobre a correção do teor daquilo que divulgam. Ficam ofendidos quando isso ocorre, procuram afastar, disfarçada ou ostensivamente, a pessoa que provoca o debate ou diverge. Com poucas exceções, o ensino doutrinário é uma balbúrdia sem metodologia aplicada, tem caráter limitado e reducionista, é feito por tradição oral, tem apenas enfoque evangelizador. Quando muito, os monitores usam apostilas mal compiladas, com pouca base na Codificação, mas que reproduzem idéias de autores encarnados e desencarnados de obras denominadas “literatura complementar”.
O espírita se jacta, afirmando que a doutrina, além de ser religião, é filosofia e ciência. Mas não se faz ciência nos centros espíritas. Não há pesquisas ou experiências metodologicamente estruturadas, ou efetiva comprovação de fenômenos. É só crença, visão estratificada, dedução empírica ou simplesmente, vôos da imaginação. Onde a ciência, então?
Na França, depois de Kardec, o Espiritismo morreu. Muitas razões são apontadas, sendo a mais consistente, os entraves decorrentes das duas grandes guerras do Século XX, que assolaram a Europa. Curiosamente, elas não mataram outras idéias vigentes ou introduzidas à época, que ainda hoje honram e destacam os franceses, ciosos da racionalidade aprendida com seus proeminentes pensadores (René Descartes à frente) e magistralmente utilizada por Kardec.
É muito provável que o aniquilamento da doutrina Kardecista na França tenha ocorrido devido às influências místicas, pois impulsionada por Roustaing, caiu na vala comum da religiosidade crédula. Há uma real possibilidade de ali ter sido esquecida porque deixou de ter o apelo da razão e da lógica, sob as quais nasceu.
No Brasil, firmou-se o avesso dessa gênese: a liderança mística adotou, expandiu e sedimentou a visão religiosa, sem raciocinar que, se Deus é perfeito, portanto despido de prepotência e vaidade, não impõe e nem precisa de nossas súplicas, reverências e bajulações, dispensando dogmas, ritos e crendices no trajeto de sua criatura em direção à perfeição relativa que pode alcançar.
Retirado do site http://assepe.org.br/txt_nicia_centros.html
Quando entregou as obras básicas da codificação para o mundo, Allan Kardec imaginava que o Espiritismo se tornaria uma crença comum e que a aceitação dos seus princípios científico, filosófico e moral transformassem em um tempo relativamente curto as concepções de vida material da sociedade terrena.
E não foi bem isso que ocorreu ao longo de mais de 150 anos de existência da Doutrina dos Espíritos.
A assimilação do Espiritismo por parte da coletividade parece lenta e vem criando uma situação de indiferença para muitas pessoas envolvidas com a doutrina, até mesmo entre espíritas que consideram a imortalidade da alma "uma ficção para se ver no cinema".
Ocorre que se a filosofia espírita fosse integralmente aceita e se tornasse uma questão de sobrevivência, a sociedade terrena iria mudar positivamente em diversos aspectos.
No entanto, essa aceitação se torna uma utopia na medida em que ainda não se percebe sincero interesse dentro do movimento para fazer uma divulgação educativa abrangente, capaz de renovar hábitos e atitudes dessa sociedade ainda muito materialista.
Além disso, o Espiritismo é tido e visto como uma religião que vem sendo manipulada por lideranças, "espiritualmente ligadas à Igreja Católica", que querem a todo custo negar a sua identidade com o conjunto de princípios baseados em leis naturais.
A Doutrina dos Espíritos poderá efetivamente contribuir para promover profundas transformações na sociedade, mas isso levará ainda muito tempo já que carece de uma sensata avaliação, uma definição de caminhos e estratégias que se identifiquem com a atual realidade social e espiritual do nosso conturbado mundo.
Entre os mais de dois milhões de adeptos do Espiritismo existentes no Brasil, é bem provável que um terço ainda permaneça psquicamente atrelado a outras seitas espiritualistas, acendendo velas, incensos, cantando mantras e fazendo "promessas" aos "santos espíritas e católicos" para resolverem seus mesquinhos problemas existenciais.
Muitos cansaram de buscar "consultas espirituais" em suas próprias instituições. Agora recorrem aos "guias" de outros terreiros...
Fonte: Blog Carmem & Carlos Barros - http://carmemcabarros.blogspot.com/2011/03/destinacao-do-espiritismo.html